Knowledge of blind women on natural contraception methods: an exploratory descriptive study

 

Conhecimentos das mulheres cegas sobre métodos contraceptivos naturais: estudo exploratório descritivo

 

Mariana Gonçalves de Oliveira1, Lorita Marlena Freitag Pagliuca2

 

1,2Universidade Federal do Ceará, CE, Brasil

 

Abstract: The goal was to identify blind women’s knowledge on natural contraception methods. A descriptive exploratory study was carried out at the women’s place of choice in July 2010. For data collection, an individual interview was held and its contents were analyzed. Results were categorized into: (1) Statements showing these women’s lack of knowledge on natural contraception methods; (2) Incorrect statements and (3) Correct statements about the women’s knowledge on natural contraceptive methods. In conclusion, these women know little about their body, underlining the lack of knowledge on natural contraception methods.

Key-words: Blindness, Contraception, Nursing.

 

Resumo: Objetivou-se identificar os conhecimentos de mulheres cegas sobre métodos contraceptivos naturais. Estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa, realizado em local escolhido pelas mulheres, no mês de julho de 2010. Para a coleta de dados foi realizada entrevista individual e analisado seu conteúdo. Resultados categorizados em: (1) Falas que expõe o desconhecimento dessas mulheres sobre os métodos contraceptivos naturais; (2) Falas incorretas e (3) Falas corretas em relação aos conhecimentos das mulheres sobre os métodos contraceptivos naturais. Conclui-se que as mulheres pouco sabem sobre seu corpo, corroborando com a falta de conhecimento sobre os métodos contraceptivos naturais.

Palavras-chave: Cegueira; Anticoncepção; Enfermagem.

 

 

INTRODUÇÃO

Sexualidade é a necessidade universal de receber e expressar afeto e contato, com consequentes sensações prazerosas. Assim, a sexualidade não é apenas o ato sexual em si, pois se manifesta pelo toque, o abraço, o gesto, a palavra que transmitem prazer entre as pessoas. Assim, ocorre desde antes de se nascer, durante a infância e ao longo de toda a vida. Conforme o processo de crescimento e desenvolvimento acontece, descobre-se também o prazer provocado pelo contato sexual, por meio do relacionamento com outras pessoas1. Com base nesses relacionamentos com sexo é possível gerar filhos, por isso a exigência do planejamento familiar, para controlar o tamanho da família e escolher o momento adequado para engravidar.

Vivenciar de forma adequada a sexualidade faz a pessoa sentir-se bem consigo mesma, com os outros e com o mundo. Ao ir além do sexo, engloba desejos e práticas inerentes à satisfação, afetividade, prazer, sentimentos e exercício da liberdade2. Como direito intrínseco ao ser humano a sexualidade deve ser respeitada e vivenciada. Tal como outros, os direitos sexuais repousam na liberdade, dignidade e igualdade para todos os seres humanos, tornando-se direitos universais3. Da mesma forma, saúde sexual é um direito humano básico, fundamental para todos independente de qualquer limitação2.

Contudo, a sociedade não percebe nos cegos as necessidades de vinculação afetiva e sexual. Isto limita suas chances de vida e cria uma relação de “não-pessoa” para o desenvolvimento da sexualidade4. Lembre-se, porém: a mulher com deficiência visual é, antes de tudo, uma mulher, com possibilidade de exercer sua sexualidade, e escolher se quer ter filhos ou não.

Ausência da visão não elimina nem reduz o desenvolvimento e interesse sexual, apenas torna a curiosidade do cego sobre esse assunto diferenciada, pois cerca de 80% das interações com o ambiente se dão por meio deste sentido5. Também não elimina a vontade de ser mãe. Nesse caso, é essencial o planejamento familiar.

Como um componente importante da assistência à saúde reprodutiva, o planejamento familiar tem como finalidade programar a gravidez, retardá-la ou evitá-la.  Seu enfoque principal é a seleção e discussão de um método contraceptivo adequado para a mulher e para o casal. Portanto, deve-se conhecer a sexualidade do casal, pois o método escolhido deverá responder às suas necessidades individuais, desejos e condições fisiológicas6.

Existem diversos métodos de planejamento familiar, entre eles os comportamentais. Estes dispensam o uso de medicamentos ou instrumentos, mas exigem que o casal se abstenha do sexo por certo período de tempo, quando se pode engravidar. Tais métodos se baseiam na identificação do período fértil da mulher, mediante a análise dos ciclos menstruais e dos hormônios.  Requerem conhecimento da mulher em relação ao próprio corpo, incluindo anatomia e fisiologia do sistema reprodutor feminino. São métodos contraceptivos naturais: tabela ou Ogino-Kanauss, método da temperatura corporal basal, método do muco cervical ou Billings e coito interrompido2.

Segundo se nota, estudos que relacionam sexualidade e cegueira são escassos na literatura, talvez pelo fato de ser uma temática cercada de tabus, preconceitos e exclusão, tanto por parte de profissionais de saúde como por educadores e responsáveis. Tratando-se de pessoas cegas, muitas vezes a sexualidade dos filhos é negada pelos pais, os quais negligenciam o diálogo e o fornecimento de informações7. Este comportamento gera consequências, ainda mais agravadas quando aliadas à carência de materiais de educação em saúde adaptados e acessíveis aos cegos5. Desse modo, como evidenciado e segundo se percebe, frequentemente  o cego é estigmatizado como alguém incapaz de exercer sua sexualidade de forma plena e irrestrita8.

Consoante definido, pessoa cega é aquela que atende a um dos critérios seguintes: a visão corrigida do melhor dos seus olhos é de 20/200 ou menos, isto é, se ela pode ver a 20 pés (6 metros) o que uma pessoa de visão normal pode ver a 200 pés (60 metros), ou se o diâmetro mais largo do seu campo visual subentende um arco não maior de 20 graus, ainda que sua acuidade visual nesse estreito campo possa ser superior a 20/200. Esse campo visual restrito é muitas vezes chamado "visão em túnel" ou "em ponta de alfinete", e a essas definições alguns denominam "cegueira legal" ou "cegueira econômica"9.

Diante do exposto, objetivou-se identificar os conhecimentos das mulheres cegas sobre métodos contraceptivos naturais.

 

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo exploratório descritivo. A pesquisa exploratória começa com algo de interesse; logo, não apenas observa, mas investiga a sua natureza complexa e os outros fatores com os quais está relacionada. Na pesquisa descritiva, os aspectos são observados, descritos e documentados10.

Adotou-se abordagem qualitativa, caracterizada pela preocupação maior com o aprofundamento e abrangência da compreensão do grupo social em discussão do que com a generalização dos conceitos teóricos testados. Portanto, não privilegia o critério numérico, mas sim a capacidade de refletir a totalidade nas suas múltiplas dimensões e deve privilegiar os sujeitos sociais que detêm os atributos a serem conhecidos pelo investigador. Contudo, o número de participantes deve ser suficiente para permitir certa reincidência das informações11.

A coleta de dados realizou-se em local estabelecido pelas mulheres, como: residência, ambiente de trabalho, shopping, escola. E, no período de julho de 2010, em dias agendados de acordo com a disponibilidade dos participantes. 

Como sujeitos do estudo contou-se com mulheres cegas, com vida sexualmente ativa ou não, maiores de 18 anos. Elas foram contatadas de forma aleatória através de um banco de dados de deficientes visuais organizado pelo Projeto Pessoa com Deficiência: investigação do cuidado de enfermagem. O número de sujeitos foi estabelecido durante a coleta de dados pelo critério de saturação, ou seja, quando os dados se tornam repetitivos, pode-se considerar a coleta suficiente12.

Para a coleta de dados trabalhou-se com de entrevistas individuais de acordo com roteiro no qual se identificou o perfil das entrevistadas em relação à idade, estado civil, escolaridade, vida sexual ativa. Iniciou-se o diálogo com a pergunta norteadora: “Fale sobre seus conhecimentos/experiências sobre métodos contraconceptivos naturais”. As respostas foram gravadas e transcritas na íntegra.

Os dados foram analisados qualitativamente pelo método de análise de conteúdo. Este é composto de três fases: 1. Organização e sistematização das ideias; 2. Exploração do material, correspondente à transformação sistemática dos dados brutos do texto, por recorte, agregação e enumeração, com vistas a atingir uma representação do conteúdo ou da sua expressão e, consequentemente, a compreensão do texto, e 3. Tratamento dos resultados, inferência e interpretação13.

Em cumprimento às normas, o projeto foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa (COMEPE), da Universidade Federal do Ceará conforme protocolo nº 123/10. Após aprovado, abordaram-se os sujeitos do estudo que receberam explicação dos objetivos e métodos da coleta de dados, sendo respeitados os princípios éticos da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, inerente à pesquisa envolvendo seres humanos. Preservaram-se todos os direitos dos participantes, entre estes, a garantia do sigilo da identidade dos sujeitos, a não maleficência, e o direito de abandonar o estudo sem prejuízos pessoais. Ademais, os sujeitos que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido na presença de testemunha vidente.

 

RESULTADOS

Participaram do estudo oito mulheres na faixa etária entre 19 e 45 anos. Destas, três são casadas, uma é divorciada e quatro são solteiras. A escolaridade variou do ensino médio incompleto ao superior incompleto. Todas possuíam cegueira total. Cinco têm a deficiência visual desde o nascimento e três se tornaram cegas já na vida adulta. Apenas uma das participantes é mãe. Para preservar-lhe a identidade atribuiu-se a elas a letra M (de mulheres), seguida de número (1 a 8). Assim, M1, M2..., M8.

 

Falas que expõe o desconhecimento dessas mulheres sobre os métodos contraceptivos naturais.

 

As falas selecionadas nesta categoria evidenciam o desconhecimento das mulheres cegas sobre o assunto.

                                       

Se já estudei sobre eles, não me lembro de nada. M1

Não tenho nem noção, sério mesmo. M1

Para ser sincera nunca ouvi falar sobre os naturais, sei que existe, mas nunca usei. M3

[...] alguma coisa que auxilia esse processo para não ser tão químico. M4

Eu nunca estudei métodos naturais. M4

Nunca ouvi nada sobre isso M5

Nem sabia que existia.  M5

Nunca estudei nada sobre isso e nem ouvi falar. M6

Eu não tenho nem ideia. Não sei nada sobre esse assunto.  M8

Nunca ouvi falar. M8

 

Falas incorretas em relação aos conhecimentos das mulheres sobre os métodos contraceptivos naturais

Nessa categoria selecionaram-se as principais falas das mulheres diante da percepção delas sobre os métodos naturais. Com base em consultas à literatura, percebeu-se que as afirmações a seguir abaixo estavam incorretas.

 

Só ouvi falar da tabela, que eu saiba não existem outros. M1

[método contraceptivo natural...] Não é muito eficaz, por ter a mudança hormonal. M2

Até onde já ouvi falar acredito que não dá segurança. M2

Queria saber se é chá. M3

Já ouvi falar de um gel que você usa. M4

Esses métodos naturais são à base de ervas. M6

Eu já ouvi falar da tabelinha que é natural, mas não é contraceptivo. M6 

Acho que existem poucos métodos naturais. M6

Já ouvi falar de adesivos que você cola, mas não sei se é natural. M6

Acho que é um método importante, mas não muito garantido.  M7

 

Falas corretas em relação aos conhecimentos das mulheres sobre os métodos contraceptivos naturais

Essa categoria revela a opinião das mulheres sobre os métodos naturais. Avaliadas com base na literatura, tais conceitos são corretos. Ressalta-se: a maioria das frases está incompleta ou requer pequenas alterações para torná-las totalmente corretas.

 

Já ouvi falar da tabelinha. M2

Conheço o DIU, diafragma e a tabela, mas deles só a tabela é natural. M2

Já ouvi falar que existe a tabela, mas eu não consigo entender. M4

Eu acho que dependendo do usuário ele deve ser seguro. M4

Já ouvi das minhas amigas sobre a tabela, mas nós temos dúvidas, ainda não sei usar. M1

Já ouvi mesmo foi a tabela, que minhas amigas fazem, na verdade os maridos delas que fazem a marcação. M4

Já ouvi falar da tabelinha, mas não sei nada sobre ela. M7

Coito interrompido pode ser considerado um método natural? M7

 

DISCUSSÃO

Como evidenciado as mulheres tinham conhecimento superficial sobre métodos contraceptivos naturais. Talvez esta desinformação derive da falta de acesso a material sobre o assunto para que elas possam ler, estudar e aprender.

De modo geral, conforme se depreende, as mulheres pouco sabem sobre o próprio corpo, fecundação, ovulação, período fértil. Confirma-se, assim, um déficit no conhecimento sexual e reprodutivo. A maioria delas não conhece detalhes da anatomia e fisiologia da reprodução, citam algumas estruturas, como útero e ovários. Como ressalta a literatura esse desconhecimento intervém na sexualidade e na eleição dos métodos contraceptivos14.

Os meios de comunicação de massa a exemplo da televisão, jornais, revistas e cartazes, não estão adaptados para atender a população cega. Consequentemente, inexistem programas de educação sexual acessíveis aos deficientes visuais. Isto compromete o aprendizado sobre esse assunto15. Diante dessa escassez, materiais e métodos adaptados aos deficientes, assim como conceitos de educação especial devem estar incluídos na educação em saúde oferecida nos serviços de saúde16.

Consoante se percebe pelos resultados encontrados nas entrevistas os cegos possuem acesso restrito às informações, pois muito do que está em tinta não é reproduzido em Braille ou em áudio. De acordo com a literatura os recursos necessários para uma educação dos deficientes visuais, e também para sua autoeducação, não estão sendo disponibilizados em formatos acessíveis a essa população17.

Entretanto, a despeito dessas limitações, o apoio familiar e social pode contribuir para os cegos desenvolverem suas potencialidades e adquirirem autonomia e conhecimento15.   Conforme observado, o diálogo na família incentiva a troca de experiência e aprendizado. Além disso, a educação e formação dos filhos é responsabilidade principal da família que juntamente com a escola constitui o alicerce para o desenvolvimento e aprendizado5. Nota-se que parte da falta de conhecimento das pessoas cegas tem origem na família, sobretudo por superprotegê-las, impedindo-as de aprenderem. Se houvesse diálogo sobre esse assunto dentro dos lares, as cegas não teriam tantas dúvidas.

O convívio familiar e social é importante para que as pessoas possam aprender, discutir e aplicar novos conhecimentos.  Quando essa relação não acontece, quando não há comunicação entre as pessoas, percebe-se a ausência de informações aptas a levar a comportamentos sexuais arriscados, tais como ter vários parceiros ou não fazer uso de contraceptivos18.

No tocante às mulheres com deficiência, fortaleceu-se o estereótipo segundo o qual elas não têm sexualidade. Tende-se a vê-las de forma infantilizada, a protegê-las e cuidá-las.  Outro equívoco é as pessoas considerá-las assexuadas, incluindo seus pais19. No entanto, a mulher com deficiência visual é, antes de tudo, uma mulher, com possibilidades de exercer sua sexualidade, e de escolher se quer ter filhos ou não. Segundo se observa, muitas mulheres com deficiência namoram, casam, têm filhos, trabalham, enfim, exercem plenamente sua condição feminina, pois entendem e vivem a sexualidade e a sensualidade sem preconceitos.

Nessa perspectiva histórico-cultural, a família costuma a imprimir, geralmente, aos portadores de deficiência visual a ideia de que são incapazes, inábeis, inseguros. Desse modo, eles vão sendo "educados" para serem indefesos e dependentes, e até mesmo vistos como assexuados e desinteressantes20. Quando a família, a escola ou a sociedade vê o cego como um ser desprovido de sexualidade, não se interessa por instruí-lo sobre o assunto. Assim, o cego cresce leigo nessa temática, e daí a uma gravidez não desejada é um passo.

Quer seja cega ou vidente, a pessoa é cidadã. Para exercer plena cidadania, cada um deve tomar as próprias decisões com base em conhecimentos sobre sua saúde, incluindo-se os portadores de necessidades especiais, nesse caso, os deficientes visuais15. Vale salientar a importância de a família buscar conhecimentos, informações e orientações acerca da sexualidade dos seus filhos. Nesse âmbito, os profissionais podem realizar atividades envolvendo os pais e os deficientes nas quais abordam assuntos referentes à sexualidade para assim promover uma vivência da temática com mais segurança, autonomia e prazer, alicerçando em informações sólidas e atualizadas19. Conhecimentos inadequados ou incorretos podem surgir de diálogos entre amigos, vizinhos, colegas, familiares, materiais não científicos, dentre outros.

Além disso, profissionais de saúde sem treinamento adequado ou formação podem promover orientações ou palestras ficadas apenas nos aspectos biológicos da sexualidade e em temas técnicos e metodológicos14. Então surgem mitos, percepções errôneas e equívocadas sobre os métodos anticoncepcionais21. Ressalta-se: a capacitação da equipe técnica, no intuito de promoção de ações voltadas à saúde reprodutiva é de responsabilidade do Sistema Único de Saúde mediante treinamento22.

De modo geral, a formação do profissional de saúde sobre o tema da sexualidade ainda é incipiente. Verifica-se a ausência de disciplina sobre o tema sexualidade humana no currículo, o que leva à formação de profissionais com carências na abordagem do assunto sexualidade com seus pacientes. Essa temática mostra-se como desafio para os cidadãos interessados no futuro da humanidade23.

Dos diversos métodos analisados, a tabela ou método Ogino-Knaus foi o mais citado pelas entrevistadas. Porém, para sua utilização, demonstraram-se confusas. Por exemplo, a literatura aponta o risco de falha no uso da tabela na faixa de 20%24. Tal falha advém dos seguintes motivos: uma possível baixa eficácia da tabela, orientação inadequada sobre o uso do método, taxa hormonal que alterou o ciclo ou dificuldade do casal em manter a abstinência nos períodos férteis25. Como a eficácia da tabela depende do conhecimento do ciclo menstrual pela mulher e da compreensão dos dias férteis, caso o ciclo não seja regular, o método não é indicado26.

Contudo para obtenção de conhecimentos corretos se requer orientações por pessoas treinadas. Há registros segundo os quais as mulheres referem que a escolha do método contraceptivo se baseia na própria experiência, nos conselhos de amigas, familiares, vizinhos ou pela determinação do parceiro. Dessa maneira, desprezam os critérios de confiabilidade e inocuidade14. Conforme previsto pela legislação, nas consultas de planejamento familiar, devem ser ofertados pelos profissionais da saúde todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção, cientificamente aceitos, e que não coloquem em risco a vida e a saúde da população. Garante-se, assim, a liberdade de escolher o mais adequado às necessidades, valores e modos de vida22.

Como se percebe, as mulheres estão mais presentes em consultas de planejamento familiar, talvez por atitude ou valores culturais que lhe atribuem o controle da concepção. Mas isso não significa autonomia na escolha do método contraceptivo, pois elas continuam dependentes dos parceiros sexuais14. Tal como as demais, a mulher cega tem direito à informação sobre métodos contraceptivos, porém, quando uma delas afirma que outra mulher cega usa o método da tabela, mas que quem faz o registro é seu companheiro, fica evidente a dependência. Nesta ótica, a criação de tecnologias assistivas que possibilitem ao cego compreender e dominar o método em toda sua extensão traz independência e autonomia a essa clientela. Para homens e para mulheres, vale o direito da universalidade sexual e reprodutiva. O atendimento à saúde é integral e global e visa visando também um planejamento familiar extensivo à mulher, ao homem ou ao casal22.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Segundo se conclui as mulheres do estudo possuem conhecimento superficial sobre os métodos contraceptivos naturais, mas demonstraram interesse em ampliá-lo. Registra-se, no entanto, a falta de materiais e recursos de educação em saúde acessíveis aos cegos. Abordar o assunto sobre métodos contraceptivos naturais é raro para essa população. Todavia, a difusão dessas informações é necessária para que as pessoas possam escolher o método contraceptivo mais apropriado se adéqua ao seu estilo de vida, aos seus objetivos e ao seu corpo.

No Brasil, a assistência à saúde sexual e reprodutiva é inadequada ou insuficiente, e as informações sobre todos os métodos contraceptivos ainda não estão disponíveis para a população em geral. As entrevistas mostraram o desconhecimento das mulheres diante desses métodos contraceptivos naturais.

Cabe aos profissionais de saúde, principalmente os enfermeiros, promover ações de educação sexual que integrem a mulher, o homem, o casal, a família, escola e comunidade, despertando na população o interesse pelo conhecimento do seu corpo, pelos métodos contraceptivos. Dessa forma, contribuirão para uma sexualidade mais segura e responsável.

As autoras reconhecem as limitações deste estudo, com número reduzido de sujeitos e em uma única realidade. Mas fica o alerta para o problema que exige novas investigações, e, principalmente, soluções. Espera-se, no entanto, sensibilizar os profissionais da saúde para ações inclusivas acompanhadas da devida capacitação. Esta responsabilidade é do poder público e de cada profissional com vistas à escolha consciente e eficiente do método contraceptivo pela pessoa cega.

 

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