The instrumental domination
on the organisation of services - an analysis of communication with focus
habermaseano
A
dominação instrumental sobre a organização dos serviços – uma análise da
comunicação com enfoque habermaseano
La
dominación instrumental sobre la organización de los servicios – un análisis de la comunicación con enfoque habermaseano
Sílvio Eder Dias da Silva1, Lucia Nazareth Amante2,
Maria Itayra Padilha3, Lisneia
Fabiani Bok4, Denise Faucz Kletenberg5
1Universidade Federal do Pará, PA, Brasil; 2,3,4,5Universidade
Federal de Santa Catarina, SC, Brasil
Abstract: This a reflection on the communication process in
nursing emphasizing the domination by scientific knowledge and fragmentation of
shares between professionals that manifests itself during the interaction
between the subjects that are in health services for solutions for adversity.
The method is qualitative, with documentary research of 112 articles published
in Brazilian journals between 1990 and 2002. The content analysis of evidence:
the domination instrumental on the organisation of
services and the mechanization of nursing care. The results indicate the
domination by knowledge, normalized and controlled in health services. There is
a predominance of technological devices and technology in finding solutions to
health problems. The method of construction of knowledge of nursing re-conceptually means the Science, Technical and language with
a view to their practical application.
Keywords: Nursing; Communication; Knowledge; Health Services
Resumo: Trata de
uma reflexão sobre o processo comunicacional em enfermagem, enfatizando a
dominação pelo conhecimento científico e no parcelamento das ações entre os
profissionais que se manifesta durante a interação entre os sujeitos que se
encontram nos serviços de saúde para buscar soluções para as adversidades. O
método é qualitativo, com pesquisa documental de 112 artigos publicados em
periódicos brasileiros entre 1990 e
Descritores: Enfermagem; Comunicação; Conhecimento; Serviços de Saúde; Tecnologia
Resumen: Trata de
una reflexión sobre el proceso comunicacional en enfermería enfatizando la
dominación por el conocimiento científico y en la parcelación de las acciones
entre los profesionales que se manifiesta durante la interacción entre los
sujetos que se encuentran en los servicios de salud para buscar soluciones para
las adversidades. El método es cualitativo, con investigación documental de 112
artículos publicados en periódicos brasileños entre 1990 y 2002. La análisis de contenido evidencia: la dominación
instrumental sobre la organización de los servicios y la mecanización del
cuidado de enfermería. Los resultados indican la dominación por el
conocimiento, normatizada y controlada en los servicios de salud. Ocurre un
predominio de los aparatos tecnológicos y de la tecnología en búsqueda de
soluciones para problemas de salud. El modo de construcción del conocimiento de
enfermería re-significa conceitualmente la Ciencia, la Técnica y la Lenguaje
con vistas su aplicación práctica.
Descriptores: Enfermería; Comunicación; Conocimiento; Servicios de Salud; Tecnología
INTRODUÇÃO
No
discurso dos pesquisadores de enfermagem, o processo comunicacional pode ser
percebido como uma tentativa para “[...] diminuir conflitos, mal-entendidos e
atingir objetivos definidos para a solução de problemas detectados na interação
com os pacientes [...]”1. A comunicação
pode ser utilizada no processo ensino-aprendizagem e na prática de enfermagem e
“tem de ser considerada como capacidade ou ‘competência interpessoal’ a ser adquirida
pela enfermeira, não importando sua área de atuação” 2 15. A argumentação, sustentada na noção de que a realização
da emancipação humana se faz no resgate da subjetividade implícita no discurso,
revela conhecimentos teóricos, práticos e morais renovando a linguagem e
superando as dificuldades. Sendo assim, tem-se como objetivo identificar no
discurso dos Enfermeiros a dominação do conhecimento científico e no parcelamento das ações entre os profissionais, mostrando
que a comunicação entre eles é verticalizada e mediada por normas que orientam
a ação.
MÉTODO
Este estudo é um recorte de uma tese de doutorado3
que considerou a documentação como fonte de pesquisa. Foram
selecionados para análise 112 artigos, publicados nos seguintes periódicos
Revista Brasileira de Enfermagem, Revista Latino-Americana de Enfermagem e da
Revista Texto e Contexto, entre janeiro de 1990 e dezembro de 2002. Durante
a exploração do material foram realizadas várias tentativas de categorização,
culminando com a construção de duas
categorias: a dominação instrumental sobre a organização dos serviços e a
mecanização do cuidado de enfermagem.
RESULTADOS
E DISCUSSÃO
A
dominação instrumental sobre a organização dos serviços
A relação entre profissional de enfermagem e
usuário/família envolve a comunicação verbal e não verbal, pois a linguagem é
um meio pelo qual os sujeitos falantes se orientam para alcançarem seu próprio
êxito, havendo possibilidade de influenciar uns aos outros com a intenção de
transformar o oponente em parceiro de seus propósitos3. Na reflexão
sobre as representações do usuário/família com relação ao cuidado com o corpo,
a partir do contexto sócio-cultural e da subjetividade do sujeito, percebe-se
que existe um campo de tensão entre o saber técnico e científico e
as representações que os sujeitos fazem são expressas em suas vivências,
apontada no seguinte relato: “a
relação com o cliente envolve jogos de linguagem e entre, nesse conjunto, a
multiplicidade das representações sociais. Forma-se um campo de tensão entre um
saber de cunho técnico e científico, prescritivo, que tem como objetivo
produzir mudanças nos hábitos dos sujeitos e, por outro lado, as representações
dos clientes que expressam suas vivências corporais”4:23
Observa-se
que o jogo de palavras, símbolos e gestos é utilizado para dominar o
usuário/família, concebido como alguém não capaz para assumir a liderança de
uma interação, pois o profissional é o líder e objetiva a obtenção de um fim: o
benefício do usuário/família. A ação revelada no texto mostra que a interação é
vertical e o profissional exerce o comando, “endereçada a realização de um
propósito, dirigido por máximas e apoiada em uma interpretação da ação”5:122. Na prática profissional, é comum serem
observadas cenas de total desinteresse e indiferença para com o
usuário/família, justificadas por uma compreensão limitada do campo de ação da
enfermagem.
Em muitas ocasiões pode-se observar que a conduta
dos profissionais de enfermagem remete para a discriminação e a negligência,
para a naturalização de atitudes preconceituosas que provocam no
usuário/família uma resposta passiva e submissa6, confirmado pelo
depoimento: “como trabalhadora em
serviços de saúde há mais de 15 anos, percebo e convivo continuamente com uma
flagrante assimetria nas inter-relações que acontecem. Essa assimetria,
traduzida aqui nesse texto como uma quase ausência de democracia, pode ser
vista tanto nas relações que ocorrem entre os diferentes grupos profissionais
que atuam na saúde, como entre esses últimos e a clientela que acorre aos
serviços”6 3.
Sendo assim, não é possível alcançar um acordo
obtido comunicativamente, pois o usuário/família não é percebido como capaz de
uma postura autônoma de assentimento ou negociação frente às pretensões de
validade susceptíveis de crítica5. Na
estrutura de perspectivas comunicacionais estão presentes a
expectativa de comportamento, da autoridade, do motivo da ação e da
capacidade de agir, cujo conjunto possibilita diferenciar mundo externo e mundo
interno de um sujeito, as intenções, as orientações diante das necessidades e a
distinção entre ação institucional e não institucional3.
A
ação dentro dos ambientes dos serviços de atenção à saúde, independente de sua
complexidade, atende limites impostos pela organização rígida
e hierarquizada das relações entre os sujeitos que aí se encontram,
produzindo o engessamento das diversas categorias profissionais e, embora
necessárias, uma vez que orientam, uniformizam, normalizam e rotinizam as
condutas, tolhem a criatividade, produzindo sujeitos desprovidos de
pessoalidade, cuja atitude e comportamento estão reduzidos ao mero cumprimento
de um papel profissional. Um dos aspectos que ampliam as dificuldades de
interação verbal e não verbal entre usuário/família internado em uma unidade
hospitalar e sua expectativa como relação a interação
com a equipe de enfermagem, é o fato de que os Enfermeiros têm como prioridade
o cumprimento das atividades gerenciais7,8, evidencia destacada pela
seguinte afirmação: “Conclui-se que o
processo de interação enfermeira-cliente dado durante a formação profissional
não são efetivados na prática devido à própria situação organizacional dos
hospitais que, com maior freqüência, dirige a enfermeira a atuar em atividades
gerenciais em detrimento de todas as outras atividades para as quais houve um
processo formal de ensino-aprendizagem”9 194.
No modelo burocrático, o exercício do poder é
racional e o serviço de enfermagem possui hierarquia definida formalmente,
normas escritas definidoras de padrões de comportamento da equipe de
enfermagem. Por outro lado, em determinados locais a racionalização da
organização do serviço está associada à presença de produtos tecnológicos que
prometem, com o seu uso, recuperar e manter a vida. Neste mundo vivido, embora
não esteja escrito como rotina, padrão ou técnica, é normatizada e legitimada,
pela equipe de enfermagem, uma postura de indiferença, de não envolvimento com
o usuário/família cuja finalidade é de proteção emocional para os profissionais9.
O avanço tecnológico proporciona diagnósticos de
alta complexidade, exigindo dos profissionais de enfermagem constante
atualização para o seu manuseio, embora seja normatizado o uso de aparelhos,
observa-se ainda uma ação previsível, conduzida pela repetição de tarefas10.
Além deste preparo, é necessário que os profissionais de enfermagem saibam
interagir com o usuário/família a fim de diminuir as tensões e conseguir maior
colaboração do mesmo, pois assim reconhecem a ansiedade e respeitam a
privacidade do outro.
“No nosso entendimento,
estes exames se tornam desagradáveis e constrangedores pelo fato de que a
maioria dos funcionários, durante as ações que já se tornaram rotineiras, não
observa a ansiedade gerada pela intrusão no espaço pessoal do cliente”10
59.
A autoridade, no modelo burocrático, é legalmente
vinculada às atribuições de cada cargo, não havendo possibilidade de ser
discutida. A impessoalidade é marcante e decorre da hierarquia e da autoridade
inquestionável a ela atribuída, confere rapidez da intervenção associada a redução dos conflitos grupais. Em análise sobre os motivos
da alta rotatividade de pessoal em uma instituição de saúde privada, os
Enfermeiros são reconhecidos como sujeitos com criatividade bloqueada, pois
estão em função de atividades burocráticas que comprometem a qualidade e a
quantidade dos serviços realizados11 ,
conforme o relato: “em
especial, o desequilíbrio no quadro dos enfermeiros tem sido motivo de queixas
da supervisão das áreas, e provoca sobrecarga de trabalho para aqueles que
continuam no serviço, gerando dificuldades no atendimento das atividades se
assistência aos pacientes, e como conseqüência compromete a quantidade e
qualidade dos serviços prestados, no caso a assistência de enfermagem. [...]
Talvez esses enfermeiros, para atender às normas e rotinas da instituição,
tenham priorizado atividades burocráticas, bloqueando assim o seu potencial de
criatividade”11 109-117.
A atitude do Enfermeiro em
uma instituição de saúde pode ser analisada sob dois aspectos: o primeiro se
refere a atitude científica, que permite associar o
conhecimento teórico à sua realidade prática. O segundo se refere ao fato de
ser sujeito cuja vida se desenrola no mundo vivido dos valores, das crenças, da
cultura, em constante interação com os demais sujeitos. Em decorrência deste
segundo aspecto, a atitude do Enfermeiro pode ser compreendida como o exercício
de uma postura política no sentido de envolver o usuário/família no atendimento
de saúde e favorecer as condições para a recriação de uma nova possibilidade de
viver. A tradição sustenta teoricamente a concepção de comunicação que admita
uma atitude profissional entendida como possibilidade para adaptação e
intervenção nos estados de saúde12, é evidenciada no relato a
seguir: “não se pode esquecer que a
maioria das instituições formadoras e prestadoras de assistência se alinham aos pressupostos teóricos do modelo tradicional,
onde o processo de trabalho e o processo de comunicação têm como finalidade a
adaptabilidade e controle social e o objeto de intervenção é a doença, pressupondo
que a concepção do projeto terapêutico é especificidade dos profissionai”12 68
A atitude científica leva o Enfermeiro à valorização
das coisas como fatos da natureza pertencentes à esfera da heteronomia, regidos
por leis que estão fora do alcance da vontade humana11. Neste
sentido, suas ações têm por fundamento os fins e os objetivos a serem
alcançados, os valores perdem seu significado, uma vez que a ação se faz sob os
critérios da racionalidade formal, da técnica, de meios ajustados aos fins.
A ação regulada por normas supõe que os sujeitos
para quem as normas correspondem pertencem ao mesmo
mundo social5. Neste sentido, as normas são válidas para um círculo
de destinatários quando emitida, com a pretensão de retitude normativa e goza
de validade social quando é reconhecida pelos destinatários como válidas ou
justificadas. Os mundos sociais do Enfermeiro e do usuário/família são
diferentes e têm como limites a linguagem, as imagens do mundo e as formas de
vida, e se referem as totalidades de culturas
diferentes. Ao permanecer cada um em seu mundo social a oportunidade para
argumentar em uma situação ideal de fala não acontece, impedindo que ocorra a
aprendizagem esperada a partir da interação. A aprendizagem não ocorre porque
não existe a troca de informações entre Enfermeiro e usuário/família. Como não
aprende, este permanece em seu estado de expectativa transferindo para o
profissional a decisão sobre como agir para modificar seu estado de saúde.
Para controlar a doença, entendida como fenômeno
coletivo, as intervenções são organizadas, instrumentalizadas e aplicadas para
atender a necessidade de recuperação da força de trabalho, essencial para
produzir e reproduzir a sociedade capitalista. É nesta área que o potencial
transformador se reafirma sobre a coerência de um modelo assistencial que
determine e condicione as diretrizes e os métodos para a implementação
de uma política que promova o diálogo, compartilhando a diversidade e as
diferentes potencialidades dos sujeitos para a recriação de um serviço
organizado de saúde voltado para a coletividade. Para evidenciar a necessidade
de uma forma de relacionamento entre os profissionais de enfermagem da Unidade
Básica de Saúde e a população, há um destaque para a presença marcante da ação
estratégica quando descreve o cenário desta unidade: “o trabalho de enfermagem, diríamos, está inserido em um complicado
processo de trabalho na saúde, ligado diretamente às características da
organização dos serviços de saúde, ao caráter hegemônico do saber na saúde e às
concepções teórico-filosóficas que têm norteado as práticas de saúde. [...]
Assim, o processo de trabalho na saúde tem sido dirigido ao homem parcelado,
quer dizer, a finalidade assistencial dirigida à parte corporal doente, não
importando qual o homem ou mulher se está se tratando; o que importa é
devolvê-lo ao processo produtivo, reafirmando a lógica do capital [...] De
outra parte, a permanência dessa forma só foi e continua possível, a partir da
construção e solidificação de um saber hegemônico na saúde, necessário ao
sistema, que tem cabido ao profissional médico até os dias atuais, o qual,
também historicamente, sempre esteve articulado às classes no poder,
perpetuando e proporcionando uma gama de problemas, dentre eles, os mais
importantes – a geração de conflitos intercategoriais e propiciando condições
de trabalho desiguais”13 48 e 52.
A ação do Enfermeiro, sob o modelo burocrático,
admite duas situações: a primeira relaciona-se ao seu reconhecimento como
intervencionista, e sua execução, mesmo rotineira, como obrigatória; a segunda
está relacionada ao usuário/família que aceita a atividade determinada como
legitima, pois está ancorada na supremacia técnica, independentemente de sua
percepção e expectativa como sujeito que necessita de atendimento de saúde. É
interessante destacar que as reflexões sobre a organização do trabalho,
presentes nos textos estudados, em sua maioria, voltam-se para o ambiente
hospitalar. Tal fato pode ser justificado tendo em vista que a enfermagem
moderna nasceu da organização de um espaço voltado ao atendimento das vítimas
militares da guerra, onde as relações entre Enfermeiro e usuário/família são
diárias, sucessivas e contínuas. Em uma unidade básica de saúde, ao contrário,
os contatos são de acordo com a demanda do usuário/família. Assim o Enfermeiro
mantém o mesmo contato diário, sucessivo e contínuo, mas o usuário é diferente.
Neste sentido, as relações podem ser mais flexíveis e amplas e a ação do
Enfermeiro mais centrada no diálogo. O processo comunicacional entre usuário/família
e Enfermeiro, tendo como cenário a unidade básica de saúde, é essencial para
que ocorra uma mudança de atitude com relação ao processo de saúde, em seus
diferentes níveis de prevenção.
Sendo assim, tanto no âmbito hospitalar quanto no de
saúde coletiva, existe um corpo de conhecimento formal cuja aplicabilidade se
faz por meio de técnicas. Além do princípio de divisão de trabalho conforme
competências ligadas a normas positivas, racionalizarem as atividades, as novas
tecnologias e estratégias modificam estas estruturas pela sua legalidade
efetiva e representam a dominação no meio interno das instituições e a
afirmação de poder diante da realidade externa14. A próxima
categoria objetiva apresentar que esta dominação está presente no cuidado de
enfermagem e promove a “mecanização do
ato de cuidar”.
Mecanização
do ato de cuidar
A tecnologia e seus produtos se inserem na vida dos
Enfermeiros e dos usuários/família e desperta a preocupação das autoras de
enfermagem quando estas relatam que a expressividade dos sujeitos precisa ser
reconhecida durante a ação de assistir. É o conhecimento científico
transformado em técnica que por sua vez amplia a produção de novos avanços por
meio do conhecimento científico. O objetivo é aumentar a eficiência em todas as
esferas, congregando diversos conhecimentos, sejam científicos, empíricos ou
intuitivos, aplicáveis na produção e comercialização de bens e serviços.
As
atitudes apoiadas em uma razão técnica resultam na desintegração do cuidado,
mecanizando-o e com isto tornando-o impessoal e ritualista. A distância entre o
ideal estabelecido para o cuidado e as reais condições para a sua realização,
podem ser verificadas quando não são reconhecidos valores, crenças e
expectativas dos envolvidos em uma interação que desfavorecem o cuidado como
significado de mais-ser e do bem viver. Observa-se que a ação de
enfermagem se faz em nome da técnica e toma para si a responsabilidade, sob a
luz do conhecimento científico, trabalhar em prol de um mundo melhor com
valores novos, gerados e reconhecidos como verdadeiros, pois traduzem o
desenvolvimento humano.
Notadamente a decisão, tendo como referência a
técnica, se faz pautada no juízo do Enfermeiro sobre a necessidade do outro.
Para atender esta necessidade ele utiliza a tecnologia disponível para
promover, recuperar ou manter o estado saudável dos sujeitos. A
institucionalização do progresso técnico-científico para produção civil de bens
se tornou autônoma e independente, embora o interesse social determine a
direção, a função e a velocidade do progresso bem como mantenha o sistema
econômico. Em meio a esta situação, a eficácia do papel da técnica é legitimada
pelo atendimento às questões práticas e pela consciência despolitizada dos
sujeitos14.
A
comunicação, assim como a linguagem, é inseparável do sujeito e por meio delas
a relação com o mundo e com os outros acontece; a linguagem pode ser
compreendida como um sistema de sinais com função indicativa, comunicativa,
expressiva e conotativa que traduzem as imagens corporais, mentais e verbais.
Na área da saúde, o encontro entre estas duas possibilidades, favorece um
crescente distanciamento entre Enfermeiro e usuário/família criando um vazio de
entendimento e não emancipação. A linguagem, reconhecida pelos participantes de
uma interação, ressoa do mesmo modo nas consciências e seu conteúdo se torna
verdadeiro e válido intersubjetivamente de modo que, na ação comunicativa, suas
significações orientam reciprocamente as expectativas complementares de
comportamento e na ação instrumental, ao identificar objetos e sua utilização,
passa a ser monológica. Neste sentido, a linguagem técnica nada tem em comum
com a linguagem da interação e já no ensino de Enfermagem a preocupação maior
volta-se para a técnica, cuja linguagem é a científica, não havendo, na maioria
das vezes, espaço para a interação entre os sujeitos, assim é afirmado: “como durante as interações os alunos
desenvolveram procedimentos com horário determinado, esses momentos de
comunicação unilateral parecem-nos corresponder às situações citadas. A
preocupação do aluno com os próprios objetivos muitas vezes leva a esta
modalidade de comunicação, bem como ao não saber ouvir que associamos à
ansiedade dos alunos com a execução dos procedimentos nesta fase” 15 28.
A autora destacou uma situação de ensino na qual o
acadêmico já aprende a ação instrumental como apropriada e a incorpora, pois se
preocupa com a rotina do horário para o cumprimento de suas atividades. Sendo
assim, ele só vê sua necessidade para ser atendida: a execução da técnica e,
como tal, não percebe quem recebe o seu cuidado, o usuário/família. a ansiedade de estar começando seu estágio curricular,
contextualizado pela autora durante a descrição de seu estudo, reforça sua
atitude e comportamento instrumentais. O processo comunicacional restrito ao
discurso unilateral e técnico encobre a comunicação não verbal. A percepção dos
gestos, da expressão facial, dos sons não é valorizada, perpetuando o contexto
de indiferença que permeia as interações em uma instituição de saúde. Os
movimentos do corpo são indissociáveis do ato de falar e de cuidar, mas diante
dos produtos tecnológicos que massificam comportamentos, os sujeitos realizam
suas atividades sem reflexão, repetindo rotinas, procedimentos e atendimentos
padrões.
A ação estratégica orienta, influencia o sujeito de
modo que o fim seja alcançado, reduzindo-o a mero executor de tarefas
rotineiras, robotizando sua presença nas instituições de saúde. A perda da
identidade profissional, advinda da robotização, inibe a potencialidade e
capacidade do sujeito recriar, a si mesmo e ao próximo, a partir da interação e
ultrapassar os limites impostos pelo paradigma da tecnologia. É fato
reconhecido a supremacia da tecnologia sobre as ações e atitudes do Enfermeiro,
sendo verdadeiro que o conhecimento da situação existe, porém a busca para o
entendimento mútuo e transformação da realidade não acontece, permanecendo
externamente justificativas que alguns autores17, 18, apontam em seu
estudo sobre assistência à famílias com sujeitos em tratamento
quimioterápico: “na prática o fazer da enfermagem se mostra muito mais técnico,
centrando sua atuação no preparo e aplicação dos medicamentos, e, desse modo a
dimensão humanística da prática fica obscurecida16.
A
tecnologia e seus produtos viabilizam sujeitos, que ancorados nos saberes e
habilidades dela decorrentes, deixam-se guiar pela promessa de um mundo melhor
a partir dos recursos tecnológicos, ignorando que a ação deve ser pautada em
juízos morais guiados por princípios universais.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
O processo comunicacional perde sua espontaneidade e
vincula-se ao mundo da técnica, onde é movido pela máxima de buscar o bem-estar
e tanto profissional quanto usuário/família submetem-se à sua lógica. A
compreensão moderna do mundo está subjugada a estruturas universais de
racionalidade entendida pela sociedade ocidental moderna como particular e
centrada nos aspectos cognitivos-instrumentais4. O sistema de
referência que delimita o mundo objetivo e o mundo social frente ao mundo
objetivo refere-se ao conteúdo normativo das proposições que interpretam as
situações com vistas ao alcance dos objetivos.
O modo de agir em saúde provém de um saber
especializado, racionalizado pela organização burocrática, regulada segundo as
competências e normas positivas, modificadas cada vez mais pelas novas
tecnologias e estratégias que dominam todo espaço das instituições, seja físico
ou relacional. Cria-se uma relação de dependência entre o sujeito e a
concretização material das técnicas e estratégias de otimização
e controle. Romper com este ciclo significa refletir continuamente sobre o
processo comunicacional como uma das esferas que permite a incorporação e
renovação do conhecimento. É o modo de construção do conhecimento de enfermagem
que pode re-significar conceitualmente a Ciência, a
Técnica e a Linguagem com vistas a sua aplicação prática, no campo da
enfermagem e devolver ao sujeito sua capacidade para agir comunicativamente.
REFERÊNCIAS
1.
Silva
MJP. Comunicação tem remédio: a comunicação nas relações interpessoais
2.
Stefanelli M. Comunicação com o paciente, teoria e ensino. 2 ed. São Paulo: Robe
Editorial; 1993.
3.
Souza
LNA. Perspectivas do agir comunicativo implícitas no discurso
da enfermagem [tese]. Florianópolis (SC): Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem/UFSC; 2005.
4.
Teixeira
ER. A subjetividade na enfermagem – o discurso do sujeito no cuidado. Rev Bras Enferm
2000;53(2):233-9.
5.
Habermas J. Teoría de la acción
comunicativa, I. 3 ed. Santanfé de Bogotá: Taurus
Humanidades; 2001.
6.
Pereira WR. Algumas
contribuições da análise institucional para estudar as relações entre os
serviços públicos de saúde e a sua clientela. Rev Bras Enferm 2000;53(1):31-8.
7.
Ordahi LFB, Padilha MISC, Souza LNA.
Comunicação entre a Enfermagem e os Clientes Impossibilitados de Comunicação
Verbal. Rev Lat-amer Enferm 2007;15(5): 965-72.
8.
Lopes
CLR, Barbosa MA, Teixeira MEM, Coelho RB. A comunicação profissional de saúde x
cliente diante das novas tecnologias. Rev
Bras Enferm 1998;51(1):53-62.
9.
Miranda
Lopes MS, Teixeira RBS, Teles RM. Expectativas dos
clientes hospitalizados frente ao relacionamento com a equipe de enfermagem. Rev Bras Enferm
1997;50(2): 183-96.
10.
Lopes CLR et al. A comunicação profissional de saúde x cliente diante
das novas tecnologias. Rev Bras
Enferm 1998;51(1):53-62.
11.
Freitag B. Itinerários de Antígona: a questão da
moralidade. 2 ed. Campinas: Papirus; 1997.
12.
Silva
LMG, Brasil VV, Guimarães HCQCP, Savonitti BHRA,
Silva MJP. Comunicação não-verbal: reflexões acerca da
linguagem corporal. Rev
Lat-amer Enferm 2000;8(4):52–8.
13.
Faria
EM. Comunicação e informação “instrumentos para a transformação da prática dos
serviços de saúde”. Texto e Contexto Enferm. 1995;4(1):47-59.
14.
Habermas
J. Técnica e ciência como “ideologia”. Lisboa: Edições 70; 1968.
15.
Sadala MLA. Estudo da ansiedade como variável no
relacionamento aluno-paciente. Rev
Lat-amer Enferm 1994;2(2):21-35.
16.
Azevedo
NA, Kantorki LP, Ornellas
CP. Prática assistencial às famílias de pacientes em tratamento quimioterápico
baseada na teoria humanística de Paterson & Zderad.
Texto e Contexto Enferm. 2000;9(2):17-27.
17. Souza
ML, Sartor VVB, Padilha MICS, Prado ML. O cuidado em
enfermagem - uma aproximação teórica. Texto e Contexto
Enferm
2005;14:266-7.
18.
Oliveira T, Simões
S. Communication faces in the practice of nursing: a bibliographic research Online Brazilian Journal of Nursing. Brazilian Journal
of Nursing [periódico
online]. 2010 [capturado em 2011 abril 26]; 9(2).
Disponível em: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/3116