Acquired Immunodeficiency Syndrome (AIDS) and race/color in Brazil from 2000 to 2007: a cross-sectional and ecological analysis

Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids) e raça/cor no Brasil no período de 2000 a 2007: uma análise transversal e ecológica

Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida (SIDA) y la raza/color en Brasil desde 2000 hasta 2007): un análisis transversal y ecológico.

Maria Jacirema Ferreira Gonçalves 1. Jacqueline Furtado Vital 2.

1 Escola de Enfermagem de Manaus. Universidade Federal do Amazonas, Brazil. 2 Instituto de Medicina Social. Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brazil

Abstract. Problem: Is associated the Acquired Immunodeficiency Syndrome (AIDS) to ethnic groups? Objective: This study describes the AIDS distribution in Metropolitan Region (MR) in Brazil, by race/color, sex, category of exposure, and analyses its temporal evolution (2000-2007). Methods: The data of Aids in persons of 20 to 69 years were collected in the Information Department of the Brazilian Ministry of Health (DATASUS). The distribution and temporal evolution in each MR is analyzed by race/color, sex, category of exposure, as well as the annual incidence rate of Aids in each MR. The contingence of table allowed the X2 test and the residual analysis, which points out the Aids excess in the MR according to the race or color. The correspondence analysis presents the relationship among the categories. Results: Of the totality of the AIDS registers 42% were of whites, 10% of blacks, 21% of brown and 26% of ignored race information. The two dimensions (race and MR) explain 95% of the total variation. The associations between race and MR are the following: White is associated to Florianópolis, Campinas e São Paulo; the brown is associated to Belo Horizonte, Rio de Janeiro and Recife; and, the ignored information of race is associated to Entorno de Brasília (DF), Goiânia and Fortaleza. The black race has not MR associated. Conclusion: The race analysis should be used in appropriated context, and this way enabling their proper interpretation. Health professionals should be careful and do not associate race and AIDS in a pejorative way, but it is necessary to study deeply the social factors associated with AIDS.

Key-words: Acquired Immunodeficiency Syndrome (Aids), ethnic group, information systems

Resumo: Problema: A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) está associada a grupos étnicos? Objetivo: Este estudo objetiva descrever a distribuição da Aids por Região Metropolitana (RM) do Brasil e associação segundo raça ou cor (cor), sexo e categorias de exposição, e analisa a sua evolução temporal (2000-2007). Métodos: Os casos de Aids (20-69 anos) foram colhidos no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). A distribuição e evolução temporal por RM foi analisada por sexo, cor e categoria de exposição, bem como a taxa de incidência anual de Aids nas RM. A tabela de contingência permitiu, além do teste qui-quadrado (X2), a análise de resíduo, que aponta o excesso de Aids nas RM conforme cor e a análise de correspondência apresenta as relações entre as categorias. Resultados: Dos casos registrados 42% eram brancos, 10% pretos, 21% pardos e 26% ignorados. As duas dimensões (cor e RM) explicaram 95% da variação total existente. A cor branca foi associada à Florianópolis, Campinas e São Paulo; a parda à Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Recife; e, a cor ignorada ao Entorno de Brasília (DF), Goiânia e Fortaleza. A cor preta não está associada a RM. Conclusão: O uso da raça deve ser contextualizado, a fim de permitir adequada interpretação, e não atribuir de forma pejorativa a associação cor ou raça com Aids, mas aprofundar estudos que identifiquem os fatores sociais atrelados à doença

Palavras-chave: Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Aids), grupo étnico, sistemas de informação

Resumen. Problema:  Está La Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida (SIDA) asociada con grupos étnicos? Objetivo: Este estudio describe la distribución del Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida (SIDA) de acuerdo con las Regiones Metropolitanas (RM) en Brasil y su asociación con raza o etnia, sexo y categorías de exposición, y analiza su evolución temporal (2000-2007). Métodos: Los casos de SIDA (20-69 años) fueron colectados en el Departamento de Información del Sistema Unificado de Salud (DATASUS). La distribución y evolución temporal por RM fue analizada por sexo, etnia y categoría de exposición, así como la tasa de incidencia anual de SIDA en las RM. La tabla de contingencia posibilitó, además del teste qui-quadrado (X2), el análisis del residuo, que muestra el exceso de SIDA en las RM de acuerdo con la etnia e el análisis de correspondencia presenta las relaciones entre las categorías. Resultados: A partir de los casos notificados, 42% eran blancos, 10% negros, 21% pardos y 26% ignorados. Las dos dimensiones (etnia y RM) explicaron 95% de la variación total existente. De acuerdo con las asociaciones entre etnia y RM fue observado que: la etnia blanca fue asociada con las regiones de Florianopolis, Campinas y São Paulo; la etnia parda con Belo Horizonte, Rio de Janeiro y Recife y, la etnia ignorada con el Entorno de Brasília (DF), Goiânia y Fortaleza. La etnia negra no fue asociada con ninguna RM. Conclusión: El uso de la etnia debe ser usada por los profesionales de acuerdo con el contexto, para que pueda permitir la adecuada interpretación, para evitar atribuir de manera peyorativa la asociación con etnia o raza con SIDA, pero es necesario profundizar estudios que identifiquen los factores sociales asociados a la enfermedad.

Palabras-clave: Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida, grupo étnico, sistemas de información.

Introdução

                Estudos recentes apontam a escassez de pesquisas desenvolvidas no Brasil na área de saúde pública com recorte étnico-racial1-3.  Segundo Chor e Lima1, algumas suposições como aceitar o “mito da democracia racial”, as dificuldades de classificar raça/etnia e a oposição entre os termos “classe ou raça” contribuem para a falta de estudos epidemiológicos étnico-raciais, assim como sua associação com desfechos de saúde no Brasil.

Vários autores denominam raça como um construto social1, com fortes componentes culturais podendo refletir valores e determinar acessos diferentes aos recursos da sociedade, bem como demarcar identidades3. Chor & Lima1, destacam que a interação com diferentes marcadores de posição social como, por exemplo, gênero, educação e renda, podem afetar a saúde e contribuir para maior ou menor exposição a diferentes riscos à saúde.

No caso da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids), por se tratar de uma doença cujos determinantes sociais são relatados, a raça é um dos fatores que merece ser contemplado, pois conforme Laguardia4, o caráter polissêmico da variável raça deve levar ao entendimento para além do fator genético, mas incluir a carga social que a raça pode expressar.

                 Entretanto, são escassos os estudos brasileiros que avaliem a epidemia de Aids segundo a variável raça ou cor5-8, a qual é importante para se conhecer a distribuição dos doentes conforme raça ou cor, e assim determinar se há diferenças, bem como elaborar políticas e estudos adicionais que contemplem a questão. Há que se considerar a falta de estudos abordando a distribuição de Aids e raça ou cor nas regiões metropolitanas do Brasil, e que estudos enfocam que a Aids nas regiões metropolitanas é um tema que merece aprofundamento 9-10.

Fry et al.6 examinam o contexto sóciopolítico envolvido na definição de políticas públicas de recorte racial no campo da saúde, usando a AIDS como um estudo de caso. Para tanto, utilizaram o banco de dados do PN-DST/AIDS, no período entre 2000-2005.  No ano de 2000 apenas 3,9% dos registros no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) apresentavam classificação racial. A análise específica da categoria raça/cor mostra um aumento proporcional do número de casos de AIDS entre casos definidos como pardos e uma estabilidade entre os casos definidos como pretos.

                O objetivo deste trabalho é descrever a distribuição das taxas de incidência de Aids nas regiões metropolitanas do Brasil, segundo cor, sexo e categorias de exposição, e analisar a evolução temporal desses casos no período de 2000 a 2007. 

Métodos

                Trata-se de um estudo ecológico, adotando as regiões metropolitanas como unidades de observação. Foram considerados os casos de Aids registrados em adultos de 20 a 69 anos de idade, por ser a faixa etária mais representativa de ocorrëncia da doença, os quais foram notificados ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), obtidos no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) do Ministério da Saúde no período de 2000 a 2007, colhidos em 02/04/2009, considerando-se que a informação de cor da pele ocorreu somente a partir do ano 2000.

O Censo Brasileiro usa os termos preta, parda, branca, amarela e indígena para classificar a cor ou raça das pessoas, sem a distinção entre os conceitos de cor de pele ou origem étnica. Essas mesmas categorias são utilizadas pelo SINAN, e, portanto, neste texto, utilizamso os termos raça ou cor, sem distinção conceitual. O SINAN por sua vez, utiliza o mesmo critério do Censo Brasileiro, que é a raça ou cor auto-referida.

                A distribuição dos casos (número e percentual) por região metropolitana é analisada por: sexo; cor - “Branca”, “Preta”, “Parda” e “Ignorada”, excluindo-se indígena e amarela, pois ambos não chegam a 1% dos registros, e não se considera adequado somar com as categorias escolhidas para análise; e categoria de exposição - “Homossexual/Bissexual”, “Heterossexual”, “Usuário de Drogas Injetáveis (UDI)”, “Transfusão sanguínea” e “Ignorado”, categorias essas utilizadas pois assim estão denominadas no DATASUS.

Foram feitas análises para cada sexo da evolução temporal das proporções dos casos por cor, categoria de exposição11, e 12 regiões metropolitanas: Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Baixada Santista, Campinas, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre e Entorno de Brasília (DF). Estas foram escolhidas por apresentar acima de 2% dos casos de Aids no Brasil, e juntas somarem 80% de todos os casos notificados no país.

Foram calculadas taxas de incidência anual de AIDS (por 100.000) em homens e mulheres de 20 a 69 anos de idade por Região Metropolitana no Brasil de 2000 a 2007. Os denominadores das taxas foram constituídos por meio das informações sobre população residente do Censo Demográfico de 2000 e respectivas estimativas populacionais para os anos subseqüentes, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) obtidas no DATASUS.

A análise de associação entre Aids por região metropolitana e as categorias de cor foi realizada por meio do teste qui-quadrado (X2) e a respectiva análise dos resíduos padronizados12-13.

A análise das relações entre a ocorrência de Aids por região metropolitana e as categorias de cor foi avaliada pela análise de correspondência. Nesta, busca-se identificar as proximidades das categorias analisadas, destacando descritivamente o efeito de uma sobre outra.

O estudo utilizou o banco de dados de livre acesso disponível no DATASUS, no qual não constam dados de identificação das notificações, não havendo necessidade de submissão à apreciação e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), bastando apenas citar a fonte governamental dos dados. 

Resultados

                As Regiões metropolitanas que compõem este trabalho concentram 80% dos registros de AIDS no país. Não foi possível obter o coeficiente de incidência por raça pela falta desta informação categorizada no Datasus, fonte desta pesquisa. Entretanto, considera-se que a análise das proporções que compõem estas categorias pode dar conta do objetivo que este trabalho se propõe. Também foram excluídas as raças/cor declaradas como indígena e amarela, pois as duas juntas não chegam a 1% dos casos de AIDS registrados. Pelo mesmo motivo foram removidas as categorias de exposição hemofílico e transmissão vertical.

A tabela 1 apresenta os casos notificados de AIDS (Número e Percentual) por sexo, segundo cor e ano de diagnóstico nas regiões metropolitanas, onde se observa diferenças entre os sexos no início da série temporal, a qual foi decrescendo ao longo dos anos, não se observando tais diferenças no final da série, ressaltando-se que esta informação somente é melhor a partir de 2003. 

Tabela 1 – Distribuição do número e percentual de casos de AIDS por sexo e ano de diagnóstico segundo raça/cor nas regiões metropolitanas do Brasil, 2000 a 2007.

Ano

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Raça

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

Masculino

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Branca

1625

27,1

2484

30,4

3482

38,8

4527

48,6

4572

49,9

4742

49,2

4737

49,7

3669

51,4

Preta

307

5,1

485

5,9

673

7,5

918

9,8

1062

11,6

1050

10,9

975

10,2

720

10,1

Parda

726

12,1

1109

13,6

1419

15,8

1842

19,7

2016

22,0

2506

26,0

2489

26,1

1809

25,3

Ignorado

3345

55,7

4090

50,1

3400

37,9

2037

21,9

1498

16,3

1341

13,9

1328

13,9

941

13,2

Total

6003

100,0

8168

100,0

8974

100,0

9324

100,0

9148

100,0

9639

100,0

9529

100,0

7139

100,0

Feminino

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Branca

756

24,1

1245

27,2

1874

37,4

2704

46,8

2694

47,1

2691

45,1

2638

45,9

2007

48,5

Preta

172

5,5

361

7,9

458

9,1

693

12,0

799

14,0

808

13,5

719

12,5

544

13,1

Parda

431

13,7

580

10,6

815

16,7

1230

21,3

1346

23,5

1640

27,5

1617

28,1

1030

24,9

Ignorado

1775

56,6

2391

52,2

1865

13,4

1147

19,7

876

15,3

829

13,9

775

13,5

552

13,4

Total

3134

100,0

4577

100,0

5012

100,0

5774

100,0

5715

100,0

5968

100,0

5749

100,0

4133

100,0

            Fonte: SINAN/DATASUS 

Entre os casos com informações sobre cor, tanto para o sexo masculino quanto feminino observa-se maior número de casos na cor branca, com elevada distância do número de casos para a cor preta e parda. Em todas as categorias observa-se tendência de aumento, mas a partir de 2003 observa-se estabilização, sempre com a preta apresentando menor número de casos.

Para o sexo masculino, as categorias de exposição “Homo/bissexual”, “Heterossexual” e “Usuários de Drogas Injetáveis” (UDI) apresentaram comportamento semelhante ao longo do período estudado, revelando estabilidade nestas categorias, entretanto houve proporcionalmente grande crescimento a partir de 2003 na categoria de transfusão sanguínea.  No sexo feminino também se observa maior proporção de casos de transfusão sanguínea, e comportamento semelhante nos casos de heterossexual e UDI, mas importante aumento se observa na categoria ignorado (Tabela 2). Os valores absolutos mostram que, no sexo masculino, a primeira categoria de exposição em ocorrência é de heterossexual, seguido de homo/bissexual. Já para mulheres, a categoria heterossexual é a classificação de quase todos os casos (Tabela 2).

Na primeira parte da Tabela 3 são apresentadas as taxas de incidência de AIDS ao longo do tempo por região metropolitana por sexo. Em relação ao sexo masculino em todos os anos, notam-se taxas de incidência superiores a 100 casos por 100.000 habitantes nas regiões metropolitanas de Fortaleza, Baixada Santista, Florianópolis e Goiânia. Por outro lado, as mulheres apresentaram taxas bem menores, destacando-se somente as seguintes regiões metropolitanas acima de 50 casos por 100.000 habitantes: Baixada Santista (2005), Florianópolis (2006) e Porto Alegre (2001-2007).

A segunda parte da Tabela 3 apresenta a distribuição dos casos de AIDS por razão de sexo (masculino/feminino) e região metropolitana. Para todos os anos e regiões metropolitanas a razão de sexos é maior para o masculino. Entretanto, as regiões metropolitanas de Fortaleza e Entorno de Brasília (DF) são as que apresentam os maiores valores, ao mesmo tempo em a participação proporcional dos casos femininos aumentou ao longo do período com exceção das regiões metropolitanas de Fortaleza, São Paulo, Baixada Santista, Goiânia e Entorno de Brasília (DF). 

Tabela 2 – Distribuição anual dos casos de AIDS e percentual de acordo com sexo e categoria de exposição, 2000-2007

Ano Notificação

2000

 

2001

 

2002

 

2003

 

2004

 

2005

 

2006

 

2007

 

Categoria de exposição

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

N

%

Masculino

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Homo/Bissexual

1939

32,2

2281

27,8

2625

29,1

2944

31,4

2847

31,0

3192

33,0

2959

30,9

2352

32,6

Heterossexual

2066

34,3

2689

32,8

2972

33,0

3465

37,0

3300

35,9

3449

35,6

3313

34,6

2589

35,9

UDI

975

16,2

1031

12,6

1154

12,8

1102

11,8

960

10,4

841

8,7

936

9,8

555

7,7

Transfusão

3

0,0

2

0,0

3

0,0

0

0,0

11

0,1

20

0,2

21

0,2

5

0,1

Ignorado

1043

17,3

2194

26,8

2262

25,1

1857

19,8

2074

22,6

2182

22,5

2345

24,5

1706

23,7

Total

6026

100,0

8197

100,0

9016

100,0

9368

100,0

9192

100,0

9684

100,0

9574

100,0

7207

100,0

Feminino

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Homo/Bissexual

-

-

-

-

-

 

-

 

-

 

-

 

-

 

-

 

Heterossexual

2948

93,7

4324

94,1

4756

94,4

5506

94,8

5450

94,9

5750

95,8

5562

96,2

3980

95,7

UDI

195

6,2

257

5,6

277

5,5

295

5,1

275

4,8

239

4,0

207

3,6

140

3,4

Transfusão

1

0,0

4

0,1

2

0,0

1

0,0

12

0,2

10

0,2

9

0,2

7

0,2

Ignorado

3

0,1

11

0,2

2

0,0

3

0,1

7

0,1

1

0,0

4

0,1

34

0,8

Total

3147

100,0

4596

100,0

5037

100,0

5805

100,0

5744

100,0

6000

100,0

5782

100,0

4161

100,0

Fonte: SINAN/DATASUS

Tabela 3 - Taxa de incidência anual de AIDS (por 100.000) em homens e mulheres de 20 a 69 anos de idade e Razão de Sexo (Masculino/Feminino) por Região Metropolitana. Brasil, 2000-2007.

                                             Anos

 

 

 

 

 

 

 

 

Regiões Metropolitanas

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

Masculino

 

 

 

 

 

 

 

 

Fortaleza

264,82

259,61

254,64

250,20

245,91

236,59

232,16

211,24

Recife

19,47

28,78

27,04

32,97

35,03

30,50

40,55

16,70

Belo Horizonte

21,24

26,33

36,34

33,50

27,67

34,29

34,29

23,42

Rio de Janeiro

7,89

9,97

13,40

16,37

16,19

14,77

14,22

15,77

São Paulo

22,78

30,27

27,30

23,97

30,24

39,19

25,39

14,36

Baixada Santista

463,15

574,75

742,77

771,65

649,55

615,72

571,86

514,43

Campinas

32,60

38,71

39,07

40,22

34,63

42,75

31,00

22,27

Curitiba

25,06

29,49

32,85

46,56

47,07

41,73

50,29

30,10

Florianópolis

202,33

161,56

215,90

198,05

212,84

189,75

226,57

135,63

Porto Alegre

11,78

25,02

14,99

14,79

14,34

14,53

31,62

13,93

Goiânia

140,19

256,99

229,53

250,08

220,40

174,06

206,41

169,90

Entorno de Brasília (DF)

16,43

27,69

24,16

20,81

24,48

30,70

33,66

4,65

Feminino

 

 

 

 

 

 

 

 

Fortaleza

7,06

13,29

9,09

15,49

19,55

13,01

18,65

7,36

Recife

10,12

15,05

21,40

21,15

17,64

28,97

22,83

17,35

Belo Horizonte

9,43

10,61

12,56

22,31

21,46

16,26

15,25

16,45

Rio de Janeiro

17,38

27,29

24,01

21,94

27,14

37,02

24,43

13,84

São Paulo

18,39

23,80

29,68

36,64

28,98

27,27

24,65

19,30

Baixada Santista

33,53

34,20

40,36

46,95

48,07

52,97

32,61

17,18

Campinas

12,12

12,94

17,58

34,00

35,05

25,85

28,46

20,18

Curitiba

24,75

23,61

27,52

30,78

36,92

29,91

33,35

21,65

Florianópolis

31,71

61,17

46,03

41,62

54,26

37,57

95,88

39,45

Porto Alegre

29,87

58,90

68,04

67,91

66,09

54,35

62,66

59,04

Goiânia

14,95

27,77

18,65

15,53

21,03

29,65

30,61

4,04

Entorno de Brasília (DF)

10,01

7,85

9,48

9,68

10,38

13,56

20,26

9,45

Razão de sexo (masculino/Feminino)

 

 

 

 

 

 

 

 

Fortaleza

2,81

2,19

2,99

2,13

1,78

2,30

2,12

2,19

Recife

2,48

2,08

2,03

1,91

1,90

1,45

1,85

1,66

Belo Horizonte

1,90

2,11

2,38

1,62

1,65

1,96

2,00

1,98

Rio de Janeiro

1,92

1,63

1,68

1,62

1,66

1,59

1,57

1,59

São Paulo

1,89

1,83

1,90

1,60

1,71

1,74

1,79

2,03

Baixada Santista

1,48

1,73

1,48

1,32

1,11

1,25

1,48

2,01

Campinas

2,26

2,51

2,06

1,52

1,49

1,81

1,98

1,66

Curitiba

2,00

1,68

1,93

1,59

1,42

1,57

1,68

1,58

Florianópolis

1,80

1,96

1,54

1,67

1,23

1,76

1,49

1,55

Porto Alegre

1,87

1,76

1,37

1,51

1,38

1,36

1,41

1,26

Goiânia

1,71

1,56

2,03

2,10

1,83

1,64

1,74

1,78

Entorno de Brasília (DF)

1,94

1,83

2,26

2,36

2,36

2,00

1,86

2,35

Fonte: SINAN/DATASUS

Nota: no sexo masculino são marcados em negrito as taxas de incidência maiores que 100 casos por 100 mil habitantes. No sexo feminino estão em negrito as taxas acima de 50 casos por 100 mil habitantes. Na Razão de sexo (Masculino/Feminino) estão marcados os valores ³2,0. 

Na tabela 4 apresenta-se a distribuição do número de casos de Aids nas regiões metropolitanas segundo a raça, testada pelo c2, indicando associação significante entre essas categorias (p<0,01). Também são apresentados os resíduos padronizados do c2, cujos valores positivos acima de 1,96 são marcados em negrito, indicando as categorias com associações significantes. De acordo com a cor, as regiões metropolitanas que se destacam em ordem decrescente de importância são:

- Branca: Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Campinas, São Paulo e Belo Horizonte;

- Preta: Rio de Janeiro, Porto Alegre e Belo Horizonte;

- Parda: Recife, Fortaleza, Goiânia, Entorno de Brasília (DF), Belo Horizonte e Rio de Janeiro;

- Ignorada: Fortaleza, Goiânia, Baixada Santista, Entorno de Brasília (DF) e Rio de Janeiro.

A análise de correspondência (Figura 1) mostra que as duas dimensões (cor e região metropolitana) explicam 95,11% da variação total existente. A figura mostra que a cor branca está mais associada à Florianópolis, Campinas e São Paulo; a cor parda está mais associada à Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Recife; e, a cor ignorada está mais associada ao Entorno de Brasília (DF), Goiânia e Fortaleza. A cor preta não está associada a qualquer uma das regiões metropolitanas. As regiões metropolitanas de Curitiba, Baixada Santista e Porto Alegre aparentemente não estão associadas às categorias de cor.   

Tabela 4 – Número de casos e de resíduos padronizados de ocorrências de AIDS segundo Regiões Metropolitanas e Raça/Cor, Brasil, 2000-2007

Região Metropolitana

Branca

 

Preta

 

Parda

 

Ignorado

 

Total

 

N

RP

N

RP

N

RP

N

RP

 

Fortaleza

313

-47,0

80

-17,5

1.869

39,1

1.864

28,8

4.126

Recife

1.325

-33,5

494

-4,4

2.531

41,9

1.605

1,9

5.955

Belo Horizonte

1.943

15,0

701

5,7

1.580

12,2

1.550

1,7

5.774

Rio de Janeiro

5.915

-35,7

2.772

24,0

4.417

9,2

5.711

15,4

18.815

São Paulo

16.969

18,9

3.125

-9,7

6.858

-10,8

8.981

-4,7

35.933

Baixada Santista

1.275

-9,0

205

-8,5

621

-5,3

1.456

20,8

3.557

Campinas

2.603

22,1

383

-2,7

629

-11,0

768

-12,9

4.383

Curitiba

3.567

28,0

199

-17,3

522

-23,4

1.583

1,9

5.871

Florianópolis

2.136

34,9

279

-0,2

129

-21,8

298

-19,0

2.842

Porto Alegre

9.856

59,0

2.316

23.8

1.302

-10,2

1.627

-45,6

15.101

Goiânia

582

-36,9

165

-12,4

1.541

28,1

1.677

24,0

3.965

Entorno de Brasília (DF)

906

-20,4

208

-7,8

1.045

13,6

1.291

15,7

3.450

Total

47390

 

10927

 

23044

 

28411

 

109.772

c2= 17000

GL= 33

 

 

 

p<0,01

 

 

 

 

GL: Graus de liberdade;  p: Significância estatística; RP=Resíduo Padronizado. 
Em negrito estão os resíduos com valor positivo superior a 1,96, que corresponde ao nível de significância para o excesso de ocorrências. 

 

A análise de correspondência (Figura 1) mostra que as duas dimensões (cor e região metropolitana) explicam 95,11% da variação total existente. A figura mostra que a cor branca está mais associada à Florianópolis, Campinas e São Paulo; a cor parda está mais associada à Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Recife; e, a cor ignorada está mais associada ao Entorno de Brasília (DF), Goiânia e Fortaleza. A cor preta não está associada a qualquer uma das regiões metropolitanas. As regiões metropolitanas de Curitiba, Baixada Santista e Porto Alegre aparentemente não estão associadas às categorias de cor. 

Figura 1

Figura 1 – Mapa das relações entre os casos de AIDS por categorias de cor/raça e Regiões Metropolitanas. Brasil, 2000-2007.
RM= Região Metropolitana

 Discussão

As questões raciais têm sido apresentadas como uma aproximação de nível socioeconômico14, mas estudos recentes têm apontado que não necessariamente, pois outras variáveis podem expressá-lo melhor, e também questionam a classificação de raça, haja vista a miscigenação da população brasileira4, 6.

Todavia, há que se considerar que para alguns eventos de saúde são detectados diferenciais de raça13, levando ao questionamento se para o caso da Aids existem diferenças na distribuição por raça no Brasil.

O presente estudo mostrou um aumento da proporção cor “Parda” e redução da “Branca” em ambos os sexos, e não identificou associação entre Aids nas regiões metropolitanas e a cor “Preta”, o que corrobora  a discussão de Fry et al.6 ao identificar o que vem ocorrendo no Brasil, ou seja, o aumento da ocorrência na doença nos pardos. Outra questão a se considerar é a composição étnica no Brasil, a qual por sua diversidade traz consigo mascarada a desigualdade social15.

A cor “Branca” é a que tem a maior proporção de casos de Aids em todos os anos 4, 6, mas a cor “Preta” e “Parda” apresentaram comportamento crescente similar das proporções de casos em relação às categorias de exposição. Para ambos os sexos, os casos com categoria de exposição “Heterossexual” foram os que apresentaram maiores proporções de cor “Branca”, “Preta” e “Parda”.

Para os homens a categoria de exposição mais freqüente e com valores semelhantes é “Homo/Bissexual” e “Heterossexual”, fato que difere do início da epidemia11 levando ao conceito já superado de que homossexual compõe o grupo de risco. Acredita-se que as abordagens preventivas e de estímulo às mudanças de comportamento sexual de risco, a educação de pares e atividades preventivas coletivas, executadas pelo programa de prevenção e controle de Aids  contribuem para a adoção de práticas de sexo seguro. Neste contexto, a elaboração de programas de qualificação aos profissionais de saúde, principalmente de enfermagem, que em geral são aqueles que realizam educação em saúde, para que estejam aptos a atuar neste campo16.

A participação proporcional dos casos femininos aumentou ao longo do período em todas as regiões metropolitanas, para as quais se observava em média 2 casos de homens para cada mulher. Entretanto, nos anos subseqüentes a razão de sexo muda principalmente nas regiões metropolitanas de Porto Alegre, Florianópolis, Rio de Janeiro e Recife. Já as taxas de incidência mostram-se estáveis com ligeira tendência de queda, sendo as regiões metropolitanas de maior taxa de incidência destacadas para Baixada Santista, Porto Alegre e Florianópolis.

A evolução das taxas de incidência, para homens, apresenta nos primeiros anos tendência mais elevada de casos cor “Branca”, principalmente nas regiões do Rio de Janeiro, São Paulo, Baixada Santista e Campinas. Nos anos seguintes, elevação dos casos com cor “Preta”. Este resultado, entretanto, deve ser interpretado com cautela, já que nos primeiros anos da série estudada a proporção de cor ignorada é muito elevada, só apresentando melhora dos dados a partir de 2003, o que requer a sensibilização de gestores e trabalhadores da saúde para a importância do preenchimento adequado do sistema de informação7. Tal fragilidade do sistema de informação também são apontados como elemento que dificulta a adequada análise epidemiológica17.

A taxa de incidência entre os homens é maior que para as mulheres, e apresenta tendência de estabilidade. A região metropolitana com maior taxa é a Baixada Santista, que em todos os anos apresentou taxa de incidência de Aids maior que 400 casos por 100 mil habitantes; as regiões metropolitanas com taxas intermediárias, mas ainda assim elevadas (entre 100 e 300 casos por 100 mil habitantes) são Fortaleza, Goiânia e Florianópolis.

A análise de associação entre as regiões metropolitanas e raça indica que o problema da Aids está mais associado à cor “Parda”, que ao contrário do que se advogava, inclusive com campanhas preventivas dirigidas à população de cor “Preta”6, e que uma análise publicada em 2007 já apontava os pardos com maior proporção dos casos. O fato é discutido por Batista et al.13 ao afirmarem que a etnia em si não é um fator de risco, mas a inserção social adversa de um grupo racial/étnico é que se constitui em característica de vulnerabilidade.

Entre as limitações do presente estudo destaca-se o uso de dados secundários, que podem dar origem a erros devidos aos critérios de definição de caso ao longo da série temporal e pela má qualidade do preenchimento das informações17-18. Bem como não se tem uma forma de mensuração acurada da categoria e adequada confiabilidade no preenchimento, já que um profissional pode perguntar ao doente de que cor o indivíduo se considera, e outro profissional pode decidir registrar o seu julgamento a partir do fenótipo do doente.

Quanto à qualidade do preenchimento das informações a respeito dos casos em estudo, observa-se elevada proporção de informação “Ignorada” no campo cor e categoria de exposição, podendo acarretar vícios nas análises de tendências temporais, comprometendo os resultados. Para o sexo masculino, a categoria de exposição Heterossexual apresentou a maior proporção (31.2%) em relação ao total de casos com cor “Ignorada” no período estudado, seguida da categoria “Homo/bissexual” com 29.8%, “UDI” com 19.8% e “Ignorado” com 18.9%. No caso feminino, a categoria de exposição “Heterossexual” também apresentou a maior proporção (90.6%) em relação ao total de casos com cor “Ignorada” no período analisado.

Outra limitação foi a exclusão dos casos com cor “Amarela” e “Indígena” das análises, que embora se justifique pela baixa proporção, mas não se pode afirmar se de fato ocorre a baixa proporção dessas raças ou se decorre do preenchimento da informação.  No caso do cálculo da taxa específica de incidência excluiu-se ainda cor “Ignorada”.

Diante desta análise se questiona o quão os enfermeiros e demais profissionais de saúde estão sensibilizados para o problema da raça no Brasil, e sobre a importância do adequado preenchimento desta informação nos sistemas de informação, permitindo assim a adequada análise desta variável. Neste sentido, estamos de acordo com Cruz 15, a qual defende uma estratégia de consolidação do registro do item Cor/Raça/Etnia nos impressos do Sistema Único de Saúde (SUS).

Sabe-se que a discussão do conceito de raça/cor e sua aproximação com as desigualdades em saúde é necessária, e carece ser ampliada e, principalmente, considerada quando da assistência de enfermagem. 

Conclusão

Considera-se que os estudos incluindo a variável cor são muito importantes do ponto de vista epidemiológico. Esta análise permitiu discutir a questão apontando que seu uso deve ser contextualizado, a fim de permitir adequada interpretação, e não atribuir de forma pejorativa a determinada raça a associação com a Aids, mas sim aprofundar estudos que identifiquem os fatores sociais atrelados à doença.

No início da epidemia havia rótulos de grupos de risco, e é necessário o cuidado para não ocorrer a mesma falha atribuindo ao componente racial a associação com a Aids. Este estudo identificou associação de ocorrência de Aids na cor “Branca” e “Parda” e Regiões Metropolitanas, cuja interpretação pode ser mais adequada decorrente da cor da população que predomina nas Regiões Metropolitanas, e não um elemento focado na etnia em si. Por outro lado, é necessário ter atenção ao se tentar impor à raça a associação com alguns fenômenos, quando na realidade, este componente está permeado por valores, atitudes e reflexos da composição da sociedade, de como se comporta e seu acesso aos serviços de saúde.

Quanto à cor “Preta”, pode-se questionar se essa população está tendo acesso aos serviços de saúde, permitindo o diagnóstico e tratamento, e assim a sua figuração nos sistemas de informação, ou se seria decorrente de campanhas preventivas, que como apresentadas por Fry et al.6, foram adotadas pelo sistema de saúde brasileiro em 2004 e 2005. Entretanto, assume-se que não haveria tempo para esta análise detectar tal impacto em tão pouco tempo, levando a considerar que de fato, a racialização da Aids para pessoas de cor “Preta” não é apropriada. Necessitamos sim, de políticas públicas que permitam o acesso equitativo e universal ao sistema de saúde em seus amplos aspectos: preventivos, de diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos casos. 

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Contribuição dos autores:

Concepção e desenho: Jacqueline Furtado Vital; Análise e interpretação: Maria Jacirema Ferreira Gonçalves; Redação do Artigo: Jacqueline Furtado Vital e Maria Jacirema Ferreira Gonçalves; Revisão bibliográfica: Jacqueline Furtado Vital e Maria Jacirema Ferreira Gonçalves.

 

Endereço para Correspondência: Maria Jacirema Ferreira Gonçalves. Escola de Enfermagem de Manaus. Rua Teresina, 495, Adrianópolis. CEP 59057-070. Manaus-Amazonas – Brasil. Telefone (92) 3305 5100. E-mail: jaciremagoncalves@ufam.edu.br