1Michelly Kim de Oliveira Rosa, 2Maria Aparecida Munhoz Gaíva, 3Rossana Marchese Bittencourt
1Mestre em enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT - Brasil, Coordenadora de Atenção Secundária da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá - MT. E-mail: Kim_ufmt@yahoo.com.br; 2Doutora em Enfermagem. Docente do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT - Brasil, Coordenadora do Grupo de Pesquisa Argos e Pesquisadora do CNPq. E-mail: mamgaiva@yahoo.com.br; Orientadora. 3Mestranda em enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá-MT- Brasil. E-mail: rossana.mb@terra.com.br.
Abstract. The increase of survival period of newborn children is related, beyond other factors, to a well structured, of good quality and accessible to the population. Characterize the profile of institutions which give hospital assistance to the newborn child in Cuiabá-MT. Descriptive and transversal study, quantitative approach. The data were collected through a form and information analisis was made using the Epi-info 2000 program. Of all 12 researched institutions, 11 (91,66%) were general hospitals and only one (8,3%) was classified as a mother/ hospital, being that most of them were mid range and private practice not related with SUS. 257 neonatal beds, distributed into different environments of neonatal assistance. It was concluded the neonatal assistance service are distributed in na unproportional way in the city. Most of them are located in only one health region department, being there region departments that don`t have a neonatal hospital assistance unit.
Keywords: Quality of Health Care; Health Services Evaluation; Child Health Services.
Resumo. O aumento na sobrevida neonatal está relacionado, além de outros fatores, a uma assistência hospitalar estruturada, de qualidade e acessível à população. Caracterizar o perfil das instituições que prestam assistência hospitalar ao neonato no município de Cuiabá-MT. Estudo descritivo e transversal, de abordagem quantitativa. Os dados foram colhidos através de um questionário e a análise das informações foram realizadas utilizando o Programa Epi-info 2000. Das 12 instituições pesquisadas, 11 (91,66%) eram hospitais gerais e apenas um (8,3%) se classificava como hospital materno-infantil, sendo que a maioria era de médio porte e fonte privada não conveniada ao SUS. Encontrou-se 257 leitos neonatais, distribuídos em diferentes ambientes de atenção neonatal. Concluiu-se que os serviços de atenção ao neonato estão distribuídos de forma desproporcional no município. A maioria se localiza em uma única regional de saúde, existindo regional que não possui unidade de atendimento hospitalar ao recém-nascido.
Palavras-chave: Qualidade da assistência à saúde; Avaliação em saúde; Serviços saúde da criança.
Introdução
O período neonatal é para todo o recém-nascido uma etapa crítica a ser enfrentada. A adaptação ao ambiente extra-uterino é um processo contínuo que depende de múltiplos fatores. Para alguns recém-nascidos esse processo transcorre de forma natural, com necessidade mínima de assistência médica; enquanto, para outros, a sobrevivência requer intervenções mais complexas e ambientes assistenciais diferenciados (1).
Atualmente, a assistência hospitalar prestada ao recém-nascido envolve quatro principais espaços de cuidado: a Sala de Recepção do Recém-Nascido, o Alojamento Conjunto, as Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) e as Unidades de Cuidados Intermediários Neonatais (UCIN). Esses ambientes são organizados de forma diferenciada, dependendo do nível de atenção prestada em cada serviço.
No Brasil, nas últimas décadas do século XX, observou-se uma ampliação importante de leitos de terapia intensiva e cuidados intermediários neonatais no setor público, principalmente nas regiões metropolitanas. Paralelamente houve um incremento na tecnologia de assistência médica hospitalar e, em especial, na atenção ao neonato prematuro e de muito baixo peso ao nascer(2).
À medida que a medicina continua a desenvolver tecnologias para a manutenção da vida, muitos recém-nascidos de alto risco, que no passado teriam morrido algumas horas ou dias após o nascimento, hoje sobrevivem. Pode-se dizer que o aumento na sobrevida neonatal estaria relacionado também a uma assistência estruturada e de qualidade, sendo um estímulo para continuar investindo nessa direção.
No entanto, pouco se conhece a respeito da distribuição dos serviços de atenção neonatal no país e pouco se estuda sobre o acesso de qualidade dos pacientes aos esses serviços. Dessa forma, a avaliação da qualidade da atenção prestada ao neonato no âmbito hospitalar se faz necessária, quando se pretende diminuir o índice de mortalidade neonatal, alcançando também níveis satisfatórios de assistência. Assim, o nosso objetivo foi caracterizar o perfil das instituições que prestam assistência hospitalar ao neonato no município de Cuiabá-MT, através da identificação, descrição e distribuição geográfica.
Metodologia
Trata-se de pesquisa descritiva e transversal, de abordagem quantitativa. Fizeram parte do estudo todas as instituições hospitalares, públicas e privadas, que prestam atendimento ao neonato no município de Cuiabá-MT e que concordaram em participar da pesquisa. A identificação inicial dos hospitais foi realizada a partir das informações do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), disponível no site do DATASUS, contendo todos os serviços de saúde do território brasileiro. No que se refere às instituições hospitalares que atendiam ao recém-nascido em Cuiabá, foram encontrados, no primeiro levantamento, 14 hospitais.
Após esse levantamento inicial foram realizadas visitas aos hospitais, para detectar quais realizavam atendimento ao recém-nascido ou prestavam assistência à mulher em trabalho de parto. Além disso, confrontaram-se as informações do CNES com as da Secretaria Municipal de Saúde e de planos de saúde localmente conhecidos. Dessa maneira, foi identificado que, até dezembro de 2007, existiam 13 instituições que prestavam assistência hospitalar ao neonato no município de Cuiabá.
Foram incluídas as instituições que possuíam unidades/serviços de atendimento ao recém-nascido no processo de nascimento, ou seja, com sala de recepção do recém-nascido, serviços que tinham leitos de alojamento conjunto para atender aos neonatos de baixo risco e instituições com leitos de UTIN e UCIN.
Depois de levantado as instituições, foi realizado contato pessoal com os diretores dos estabelecimentos de saúde, com o intuito de explicar os objetivos do estudo e solicitar autorização para participação na pesquisa. Dos 13 hospitais, 12 concordaram em participar, representando 92,3% das instituições hospitalares do município de Cuiabá que prestam assistência ao neonato. A instituição hospitalar que recusou participar do estudo é do tipo filantrópica e presta assistência neonatal apenas em UTI, não dispondo de sala de parto e alojamento conjunto.
Após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa e de posse da autorização dos diretores de cada instituição, os responsáveis pelas unidades que atendem ao recém-nascido foram contatados via telefone, a fim de agendar um horário para a aplicação do questionário de coleta de dados. Como a maioria dos diretores responsáveis pelos serviços não tinham disponibilidade de tempo, nem possuíam conhecimento das informações solicitadas, foi delegada ao enfermeiro a responsabilidade de prestar as informações para a pesquisa, sendo que, dos respondentes, sete (58,30%) eram enfermeiros-chefe das unidades neonatais, e cinco (41,70%) enfermeiros assistenciais dos serviços.
Os dados foram colhidos através de um instrumento que continha uma série de informações referentes à identificação/distribuição, caracterização da instituição hospitalar e suas respectivas unidades neonatais. Este foi elaborado pelas pesquisadoras a partir da adaptação de um questionário aplicado em pesquisa realizada em São Paulo (3).
O questionário foi preenchido pelo pesquisador de forma conjunta com os enfermeiros dos serviços. Os dados foram coletados no período de maio a julho de 2008.
Os dados foram processados pelo Programa Epi-info 2000. Para o estudo em questão foram também elaboradas planilhas especificas para confecção de gráficos e tabelas, utilizando os programas de computador Word e Excel. Na análise dos dados utilizou-se estatística descritiva, com cálculo de proporções e médias.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Müller, conforme as diretrizes da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta as pesquisas com seres humanos, sob o número de protocolo 478/CEP-HUJM/2008, aprovado no dia 12/03/2008. É importante destacar que foi garantido o anonimato dos profissionais participantes e das instituições de saúde investigadas.
Resultados
A organização dos serviços de saúde no município de Cuiabá está dividida em quatro Regionais de Saúde - Norte, Sul, Leste e Oeste.
Conforme a distribuição dos hospitais que prestam atendimento ao recém-nascido nas quatro regionais de saúde, constata-se que a maior parte (58,3%) dos hospitais se localiza na região Oeste, e em menor número, encontrou-se a regional Leste, que dispõe de quatro (33,3%) hospitais que prestam assistência ao recém-nascido e a Sul com apenas um (8,3%). A região Norte não dispõe de serviço neonatal hospitalar algum, refletindo numa oferta desproporcional de número de leitos obstétricos e neonatais por região no município estudado.
De acordo com informações obtidas na Diretoria de Planejamento (DIPLAN) da Secretaria Municipal de Saúde, Cuiabá apresentava uma estimativa populacional, para o ano de 2008, em torno de 525.413 habitantes na área urbana, com uma população média de mulheres em idade fértil (15-39 anos) de 30.867 por região (4).
Tabela 1 – Distribuição dos leitos obstétricos pela população de mulheres (15-39 anos) nas quatro regionais de saúde. Cuiabá, 2008.
REGIÕES |
POPULAÇÃO GERAL |
POPULAÇÃO MULHERES 15-39 ANOS |
LEITOS OBSTÉTRICOS DE ALOJAMENTO CONJUNTO* |
RELAÇÃO LEITOS/ POPULAÇÃO MULHERES |
Leste |
154.690 |
30.033 |
52 |
1: 578 |
Oeste |
122.685 |
32.451 |
164 |
1: 198 |
Norte |
117.351 |
28.852 |
- |
- |
Sul |
130.687 |
32.131 |
8 |
1: 4016 |
Total |
525.413 |
123.467 |
224 |
1: 551 |
Fonte: pesquisa realizada pela autora.
Nota: *Os leitos obstétricos foram considerados de acordo com o número total de leitos da unidade obstétrica, independente de serem leitos destinados a gestante de médio risco ou de alojamento conjunto, isso porque as instituições não dispunham de número separado de leitos para cada situação, sendo estes adequados diante da demanda hospitalar. Não se incluíram leitos de alto risco.
Verifica-se que há uma diferença no número de leitos obstétricos pela população de mulheres de cada região, sendo que a região com maior quantidade de leitos obstétricos é a Oeste, apresentando uma razão de um leito para 198 mulheres em idade fértil, enquanto que a região Norte não dispõe de nenhum leito obstétrico, levando essa população a buscar atendimento em serviços obstétricos hospitalares de outras regiões. Ao se considerar a relação de leitos obstétricos pela população de mulheres em idade fértil de Cuiabá, tem-se, então, a proporção de um leito para 551 mulheres (TABELA 1).
O Sistema de Informações de Nascidos Vivos (SINASC) do referido município não dispunha, no momento da análise dessa pesquisa, de dados atualizados sobre a população neonatal do município por regional, nem informações atualizadas sobre o número de nascidos vivos por região. Dessa maneira, calculou-se uma estimativa baseada nas informações da Diretoria de Planejamento da Secretaria Municipal de Saúde, resultando na proporção apresentada na Tabela 2.
Tabela 2– Distribuição dos leitos neonatais pelo número de nascidos vivos das quatro regionais de saúde. Cuiabá, 2008.
REGIÕES |
ESTIMATIVA DE NASCIDOS VIVOS POR REGIÃO* |
LEITOS NEONATAIS EM ALOJAMENTO CONJUNTO POR NV** |
LEITOS NEONATAIS EM UTIN POR NV** |
LEITOS NEONATAIS EM UCIN POR NV** |
Leste |
2649 |
1: 51 |
1: 98 |
- |
Oeste |
2100 |
1: 21 |
1: 43 |
1: 105 |
Norte |
2010 |
- |
- |
- |
Sul |
2244 |
1: 281 |
- |
- |
Total |
9003 |
1: 56 |
1: 118 |
1: 450 |
Fonte: pesquisa realizada pela autora.
Notas: *Estimativa de nascidos vivos em 2007 por regional, considerando a proporção da população de 0-1 ano de idade nas quatro regionais de saúde e o total de nascidos vivos no município de Cuiabá - Modificado DIPLAN (6).
** NV (Nascidos Vivos).
Da mesma maneira, a proporção de leitos neonatais disponíveis nas quatro regionais é diferente, tendo a região Oeste a menor relação de leitos por nascidos vivos da região, enquanto a Norte é desprovida de leitos desse tipo. Os leitos de UTIN se encontram disponíveis em apenas duas regiões, Leste e Oeste, enquanto os de UCIN se concentram na região Oeste.
Essa distribuição de nascidos vivos e de serviços hospitalares neonatais pode ser melhor observada na Figura 1.
Figura 1– Distribuição de nascidos vivos e de leitos neonatais nas quatro regionais de saúde. Cuiabá, 2008.
Fonte: Adaptado do mapa impresso do município de Cuiabá disponibilizado pelo Instituto de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Cuiabá.
No que se refere ao tempo de funcionamento das instituições estudadas, duas (16,6%) funcionavam há menos de dez anos e a maioria dos hospitais (83,3%) está em funcionamento há mais de 10 anos.
Os hospitais participantes da pesquisa foram classificados segundo a fonte mantenedora, o vínculo educacional, especialidades oferecidas e porte. Na amostra (n=12), dois (16,7%) hospitais eram públicos, seis (50%) privados e não conveniados ao SUS e quatro (33,3%) privados e conveniados ao SUS.
Os dois hospitais públicos foram ainda classificados de acordo com o gestor governamental, sendo um municipal e outro federal. Apenas duas (16,7%) instituições hospitalares possuem vínculo educacional universitário, sendo uma pública e outra privada e conveniada ao SUS.
De acordo com a portaria GM/MS no2224/2002, no que tange ao número de leitos hospitalares, o Ministério da Saúde atribui uma classificação diferente aos hospitais, com 20 a 49 leitos, 50 a 149 leitos, 150 a 299 leitos e aqueles maiores, com mais de 300 leitos. No caso dos hospitais com 05 a 19 leitos e que apresentarem serviços médicos especializados com cadastro no CNES poderão receber a classificação de menor porte (5).
Considerando que a Portaria GM/MS no2224/2002 não explicita uma classificação específica de acordo com o número de leitos totais da instituição, foi adotada na análise dos dados da pesquisa, uma adequação da classificação hospitalar apresentada pelo Ministério da Saúde, resultando, então, na seguinte distribuição: pequeno porte, <50 leitos; médio porte, 50-149 leitos; grande porte, 150-299 leitos e porte especial, ≥ 300 leitos.
Do total de hospitais pesquisados, três (25%) são de pequeno porte, sete (58%) de médio e apenas dois (17%) de grande porte. Entre os hospitais de grande porte (n=2), um é do tipo público, e outro, privado e conveniado ao SUS. De acordo com a classificação das instituições segundo as especialidades, onze (91,66%) são hospitais gerais, e apenas um (8,3%) se classificou como hospital materno-infantil. É importante destacar que não existe, no município estudado, um hospital exclusivamente pediátrico/neonatal.
Quanto à média de leitos gerais, os hospitais de pequeno porte apresentaram a média de 19,7 leitos no total, os de médio porte, 101,3, e os de grande porte, em média, 162,5 leitos. No que se refere aos leitos obstétricos, a média de leitos em hospitais públicos foi de 18 (DP 0,00), enquanto que os privados não conveniados ao SUS apresentaram a média de 18,75 (DP 14,93), e os privados e conveniados ao SUS, a média de 13,17 (DP 6,88).
Os leitos neonatais se encontram distribuídos nas instituições hospitalares de acordo com os ambientes assistenciais. Cada ambiente tem uma característica, com estrutura e recursos diferenciados para atender os neonatos de acordo com a gravidade do quadro clínico e necessidade de assistência especializada e suporte tecnológico. Dessa maneira, verificou-se que 11 (91,6%) hospitais têm sala de parto e alojamento conjunto, enquanto sete (58,3%) possuem UTIN, e dois (16,6%) hospitais apresentam UCIN. Inexiste em Cuiabá hospital ou maternidade com berçário em sua estrutura.
A distribuição dos serviços neonatais se apresenta de maneira diferenciada segundo a fonte mantenedora da instituição. Dentre os hospitais públicos (n=2), apenas um apresenta sala de parto e alojamento conjunto, enquanto os hospitais privados, sejam conveniados (n=6) ou não ao SUS (n=4), contam, em sua totalidade, com esses serviços neonatais.
No município há sete UTIN, sendo que 100% (2) dos hospitais públicos têm esse serviço especializado. Dentre os hospitais privados conveniados e não conveniados ao SUS, apenas 50,0% (3) possuem UTIN; entretanto, as UCIN se encontravam instaladas apenas nos hospitais privados conveniados ao SUS.
No período da pesquisa, o município de Cuiabá contava com treze hospitais atendendo à população neonatal. Na amostra de hospitais da pesquisa (n=12) foi levantado um total de 257 leitos neonatais, distribuídos em diferentes ambientes de atenção neonatal. Desse total, 41 leitos estavam em hospitais públicos, 106 em serviços privados não conveniados ao SUS e 110 leitos neonatais em instituições privadas conveniadas ao SUS (TABELA 3).
Tabela 3 – Distribuição dos leitos neonatais segundo a fonte mantenedora da instituição hospitalar e tipo de serviço neonatal. Cuiabá, 2008.
Serviço Neonatal |
Público |
Privado não conveniado ao SUS |
Privado conveniado ao SUS |
Total de leitos |
Nº Leitos |
Nº Leitos |
Nº Leitos |
||
Alojamento conjunto |
18 |
79 |
64 |
161 |
UTIN |
23 |
27 |
26 |
76 |
UCIN |
- |
- |
20 |
20 |
Total |
41 |
106 |
110 |
257 |
Fonte: pesquisa realizada pela autora.
De acordo com as recomendações do Ministério da Saúde, todo hospital com mais de 100 leitos totais devem apresentar, em sua estrutura, pelo menos, 6% do total de leitos gerais destinados ao atendimento do recém-nascido de risco, ou seja, leitos de UTIN (6). Entre os hospitais pesquisados, seis (50%) instituições têm mais de 100 leitos totais, sendo dois do tipo privado e não conveniado ao SUS, dois privados conveniados ao SUS e dois públicos, apresentando então proporções iguais entre as diferentes fontes mantenedoras.
Faz-se necessário esclarecer que, um dos hospitais classificado como privado e não conveniado ao SUS tem, em sua estrutura, uma UTIN que oferece leitos conveniados ao sistema público de saúde. Isso ocorre porque o serviço de terapia intensiva neonatal e o restante dos serviços de saúde deste hospital têm proprietários diferentes; logo, a gestão é separada. Contudo, o número de leitos intensivos, conforme a fonte mantenedora desse setor especificamente, e não do hospital, é diferente da tabela 3, sendo 23 leitos públicos, 21 privados não conveniados ao SUS e 32 leitos privados conveniados ao SUS.
Pode-se afirmar, através dos dados levantados, que os seis hospitais da pesquisa que possuíam acima de 100 leitos totais, apresentam UTIN. Por outro lado, apenas cinco (83,3%) deles possuem mais que 6,0% de leitos gerais em leitos de UTIN. Dessa maneira, apenas um (16,7%) hospital não atende à recomendação do Ministério da Saúde, sendo este hospital classificado como privado e não conveniado ao SUS, mas a sua UTIN é conveniada ao SUS.
Discussão
Um dos requisitos importantes para alcançar a equidade é garantir o acesso da população aos serviços de saúde. O acesso pode dar-se de diversas maneiras, com implicações diferenciadas, que podem determinar ou influenciar na transposição ou não de barreiras até a chegada dos usuários nos diversos serviços de saúde. Além do mais, frente à demanda do novo modelo de saúde proposto pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o conceito de saúde como direito do cidadão deve ser garantido e legitimado por meio de políticas que visem reduzir exclusões sociais e que assegurem o acesso universal e igualitário às ações e serviços(7).
Dessa forma, o acesso abrange quatro dimensões, a geográfica, a econômica, a cultural e, por último, a funcional. A geográfica refere-se às barreiras físicas a serem transpostas e à distância a ser percorrida, associada à oferta de transportes. A dimensão econômica relaciona-se aos custos que o usuário possa ter com serviços ou insumos não disponíveis no sistema. A cultural diz respeito à adequação do serviço aos hábitos e costumes da população. O aspecto funcional é relativo à oferta dos serviços em relação às necessidades da população, como, por exemplo, horário de funcionamento e qualidade do atendimento (8).
Quando se pensa em acesso logo se remete à questão espacial, ou seja, possibilitar o alcance geográfico a um determinado serviço. Este tipo de condição é fundamental, pois dificilmente é possível obter outros tipos de acesso, quando não existe, pelo menos, um serviço de saúde disponível na região, atendendo às necessidades dessa população. A assistência hospitalar ao neonato em Cuiabá está presente em uma parcela importante dos hospitais da cidade. Por ser a capital do Estado de Mato Grosso, a cidade é referência para diversos serviços especializados em saúde, incluindo a assistência ao neonato de alto risco.
Considerando que a assistência ao parto e ao recém-nascido, na maioria das situações é realizada em nível hospitalar, constatou-se, através da pesquisa, que nem todas as regiões dispõem desse tipo de assistência, fator que dificulta o acesso geográfico aos serviços hospitalares neonatais.
Sabe-se que os problemas de planejamento urbano influenciam a disponibilidade de leitos, apresentando hospitais localizados geralmente na área central das cidades, dificultando cada vez mais o acesso geográfico a eles. Além disso, parcela importante dos hospitais brasileiros oferece leitos de baixa capacidade resolutiva, frente ao padrão de financiamento da saúde, que não tem proposta adequada para aprimorar este subatendimento (9).
Entre os leitos de UTI (31.197) cadastrados no país, 7.156 leitos se referem à UTIN e 3.846 leitos de UCIN. É importante destacar que, dos leitos de UTIN, 39,3% são leitos públicos, 24,4% filantrópicos e 36,4% privados. A maioria dos leitos das UCIN (57%) é de serviços públicos do SUS, sendo 24,9% de unidades filantrópicas e apenas 18% de instituições privadas (10). Observa-se que a maior parcela de leitos de UTIN e UCIN, no Brasil, são públicos; o que se torna necessário, pois a maioria da população não dispõe de planos de saúde, utilizando os leitos do SUS. Em Cuiabá, o setor público dispõe de menor quantidade de leitos de UTIN, quando comparado aos hospitais privados conveniados ou não ao SUS. Há uma tendência em utilizar leitos conveniados ou filantrópicos para se compensar os poucos leitos públicos que se tem na região.
No que se refere ao número de leitos intensivos neonatais e à regionalização dos serviços de UTIN, a sua distribuição variou entre 1:43 nascidos vivos na região Oeste e 1:98 na Leste, não apresentando leitos intensivos para essa população nas regionais Norte e Sul, sendo essas regiões extremas do município. Logo, existe uma concentração desse tipo de leito nas regiões centrais de Cuiabá. De acordo com o estudo realizado no município de São Paulo, também verificou-se uma distribuição desproporcional de Unidades de Terapia Pediátricas e Neonatais, com grande concentração nas regiões centrais da cidade (61,7%) e menor nas regiões periféricas do município (9,3%) (3).
Nas últimas décadas no Brasil, houve um aumento do número de leitos intensivos neonatais e pediátricos, porém sem planejamento estratégico adequado, e o resultado, há muito percebido pelos usuários do sistema, é a não eqüidade na distribuição dos leitos, havendo desigualdades nacionais e regionais e o acesso limitado, penalizando quase sempre a parcela mais carente da população (2).
Quando se discute a atenção ao prematuro em nosso meio, observa-se então a falta de uniformidade na cobertura e utilização de serviços, além de se encontrar dificuldades de acesso em função da oferta insuficiente de serviços, especialmente os de maior complexidade (2).
Conclusões
Apesar do progresso tecnológico e do crescimento da rede de atenção neonatal no Brasil, ainda são poucos os estudos que analisam os serviços neonatais, especialmente a rede hospitalar. Muitas maternidades e UTIN são construídas nas cidades brasileiras, mas o aumento de leitos não é sinônimo de uma assistência equânime e de qualidade. Os serviços de atenção ao neonato estão distribuídos de forma desproporcional no município estudado. A maioria se localiza em uma única regional de saúde, e existe regional que não possui unidade de atendimento hospitalar ao recém-nascido. Houve uma distribuição desproporcional entre leitos públicos e privados, com déficit no setor público.
Implicações e contribuições para prática
Ao traçar o panorama da assistência hospitalar ao neonato no município de Cuiabá-MT este estudo ofereceu informações aos gestores para subsidiar a eleboraçaõ de políticas locais para a organização da rede de atenção perinatal e neonatal na realidade estudada. Por se tratar de um estudo avaliativo poderá auxiliar no uso adequado de recursos tecnológicos nas instituições hospitalares que prestam assistência o neonato. Além disso, os resultados trazem contribuições para a área de enfermagem, uma vez que estudos que analisam a estrutura de serviços, permite, de maneira indireta, conhecer os locais de atuação de trabalhadores de enfermagem.
REFERÊNCIAS
1. Macdonald MG, Mullett MD, Seshia MMK. Avery Neonatologia: fisiopatologia e tratamento do recém-nascido. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2007.
2 Barbosa AP. Terapia intensiva neonatal e pediátrica no Brasil: o ideal, o real e o possível. J Pediatr, 2004; 80(6): 437-438.
3. Souza DC de. Avaliação da estrutura das unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo - Faculdade de Medicina; 2003.
4. Cuiabá. Secretaria Municipal de Saúde. Estimativa populacional do município de Cuiabá. Secretaria Municipal de Saúde, Diretoria de Planejamento, Cuiabá, 2008.
5. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.224 em 5 de dezembro de 2002. Estabelecer o sistema de classificação hospitalar do Sistema Único de Saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde, 2002.
6. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 3432, de 12 de agosto de 1998. Estabelece critérios de classificação entre as diferentes Unidades de Tratamento Intensivo - UTI. Brasília (DF): Ministério da Saúde, 1998.
7. Pedro ENR, Cabral FB, Colomé JS, Cocco M, Soder RM, Crossetti MGO. Ethics of care in public health educative actions - a literature review. Online Brazilian Journal of Nursing [Internet]. 2006;5(1). [Cited 2010 June 15]; Available from:http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/112
8. Prado SRLA, Fujimori E, Cianciarullo TI. A prática da integralidade em modelos assistenciais distintos: estudo de caso a partir da saúde da criança. Texto Contexto Enferm. 2007; 16 (3): 399-407.
9. Vecina GN, Malik AM. Tendências na assistência hospitalar. Ciênc. Saúde Coletiva, 2007; 12(4): 825-839.
10. Brasil. Secretaria de Atenção à Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde: indicadores/leitos [internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde, 2008. [citado 2008 nov 30]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?cnes/cnv/leiintbr.def.
Nota: Artigo extraído da Dissertação "Avaliação Estrutural da Atenção Hospitalar ao Neonato no Município de Cuiabá, MT" Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, 2010, Cuiabá. Data da aprovação: 18/12/2008. Banca examinadora: Drª Maria Aparecida Munhoz Gaíva (Orientadora); Drª Carmem Gracinda Silvan Scochi (Membro Efetivo); Drª Aurea Christina de Paula Corrêa (Membro Efetivo); Drª Maria Magda Ferreira Gomes (Membro Suplente); Drª Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo (Membro Suplente).