Antecedentes de fragilidade no idoso: uma revisão sistemática

Antecedents of frailty in the elderly: a systematic revision

 

Maria das Graças Melo Fernandes1; Ankilma do Nascimento Andrade2; Maria Miriam Lima da Nóbrega1.

1Universidade Federal da Paraíba (UFPB) - Docente do Curso de Graduação em Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFPB; 2Mestranda no Programa de Pós–Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

 

ABSTRACT. Objects: this study has aimed to identify, from a systematic review of literature, determinants of frailty in the elderly. Methods: for this, we analyzed thirty scientific papers published between 2001 to 2009. The search for articles was undertaken by means of descriptors frail elderly and disability combined with the terms functional and elderly, in the database Scientific Electronic Library Online (SciELO), Latin-American and Caribbean Literature in Health Sciences (LACLHS) and International Literature in Health Sciences (MEDLINE). Results: the researched literature has identified that the precedents of frailty comprehend: advanced age, female sex, low income and low schooling, deficit of social support, negative auto-perception of health, decline in multiple organic systems, co morbidities, depression, low level of physical activity, cognitive deficit, anorexic, obesity, atherosclerosis, fall, and smoking. Conclusion: the results of the study indicate that frailty in the elderly is multi-determined, being involved in its occurrence, events experienced by the individual in all the course of life, which are affected by biological, psychological and social modifiers. Thus, it can be understood that frailty does not show itself in a uniform way in all the individuals.

Keywords: Elderly. Frail Elderly. Nursing. 

Resumo. Objetivo: este estudo objetivou identificar, a partir de uma revisão sistemática da literatura, determinantes de fragilidade no idoso. Métodos: para tal, foram analisados trinta artigos científicos publicados no período de 2001 a 2009. A busca dos artigos foi empreendida por meio dos descritores idoso fragilizado e incapacidade combinado com os termos funcional e idoso, nos bancos de dados Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Literatura Internacional em Ciências da saúde (MEDLINE). Resultados: a literatura pesquisada identificou que os antecedentes de fragilidade compreendem os seguintes aspectos: idade avançada, sexo feminino, baixo nível de renda e de escolaridade, déficit de suporte social, autopercepção negativa da saúde, declínio em múltiplos sistemas orgânicos, comorbidades, depressão, baixo nível de atividade física, déficit cognitivo, anorexia, obesidade, aterosclerose, queda e uso de fumo. Conclusão: os resultados do estudo indicam que a fragilidade no idoso é multideterminada, sendo envolvidos, na sua ocorrência, eventos experimentados pelo indivíduo em todo o seu curso de vida, os quais são afetados por modificadores biológicos, psicológicos, sociais e culturais. Assim sendo, pode-se inferir que a fragilidade não se apresenta uniforme em todos os indivíduos.

Palavras-Chave: Idoso. Idoso Fragilizado. Enfermagem. 

RESUMEN. Objetivo: este estudio objetivó identificar, a partir de una revisión sistemática de la literatura, determinantes de fragilidad en los ancianos. Métodos: para tal, fueron analizados treinta artículos científicos publicados entre 2001 y 2009. La búsqueda de los artículos fue emprendida por medio del descriptor ancianos fragilizado, incapacidad combinada con los términos funcionales y de anciano, en los bancos de datos Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Literatura Latinoamericana y del Caribe en Ciencias de la Salud (LILACS) y Literatura Internacional en Ciencias da salud (MEDLINE). Resultados: la literatura investigada identificó que los antecedentes de fragilidad comprenden: edad avanzada, sexo femenino, bajo nivel de renta y de escolaridad, déficit de soporte social, auto percepción negativa de salud, declinó en múltiplos sistemas orgánicos, comorbidades, depresión, bajo nivel de actividad física, déficit cognitivo, anorexia, obesidad, aterosclerosis, caídas y uso de tabaco. Conclusiones: los resultados del estudio indican que la fragilidad en anciano es multideterminada, siendo envueltos en su ocorrencia, eventos experimentados por el individuo en todo el curso de su vida, los cuales son afectados por modificadores biológicos, psicológicos y sociales. Siendo así, se puede inferir que la fragilidad no se presenta uniforme en todos los individuos.

Palabras claves: Anciano. Anciano Fragilizado. Enfermería. 

Introdução

            Estudos demográficos demonstram que o crescimento da população mundial de idosos ocorre rapidamente, em especial nos países em desenvolvimento, a exemplo do Brasil. Isto é observado pela diminuição das taxas de fecundidade e de mortalidade, e pelo aumento da expectativa de vida. Esse aumento do número de idosos na população brasileira também coincide com taxas mais elevadas de doenças crônicas, incapacidade física, déficit cognitivo, quedas, hospitalização, dentre outros problemas, pois uma parcela substancial dessa população é portadora de condições de saúde favorecedoras de vulnerabilidade para um grande número de eventos.1

Vale ressaltar que variações nas alterações fisiológicas relacionadas à idade tornam o envelhecimento uma experiência heterogênea e subjetiva. Assim sendo, a interação de fatores pessoais, psicossociais e ambientais no curso de vida individual dificultam a delimitação de conceitos como envelhecimento saudável e envelhecimento patológico ou com fragilidade.Cabe destacar que a fragilidade pode se manifestar em indivíduos de todas as idades, incluindo os idosos. Porém, não deve ser entendida como sinônimo de velhice.3

Embora não seja considerado um conceito novo, a fragilidade em idosos não possui definição consensual. Apenas recentemente, pesquisadores tentam elaborar uma definição conceitual e operacional para fragilidade, considerando tal conceito uma síndrome clínica relacionada, multidimensional, porém, distinta de incapacidade e de comorbidade.

Na perspectiva biológica, a maioria dos estudos define fragilidade em idosos como uma síndrome caracterizada por diminuição da capacidade de reserva homeostática do organismo e da resistência aos estressores, que resultam em declínios cumulativos em múltiplos sistemas fisiológicos, causando vulnerabilidade e desfechos clínicos adversos, tais como, alterações na massa corporal magra, da força, da resistência, do equilíbrio, da capacidade de marcha e do nível de atividade física.4,5

Outros pesquisadores concebem a fragilidade como uma condição multidimensional, salientando a etiologia complexa da fragilidade, relacionando-a à história de vida das pessoas idosas e considerando que essa trajetória pode ser modificada por fatores biológicos, psicológicos, sociais e culturais, cujas interações resultam em recursos e/ou déficits individuais em determinados contextos.6

Diferentes estudos apontam que a prevalência de fragilidade em idosos é elevada e se intensifica nos “idosos mais idosos” em todos os contextos geográficos e socioculturais.7-8  No contexto brasileiro, existe escassez de estudos sobre fragilidade em idosos, especialmente se considerarmos análises que tenham como foco sua dimensão conceitual e epidemiológica. Na nossa realidade, apenas em 2006, como resposta a uma convocação do Conselho Nacional de Pesquisa – CNPq, através do Edital 17/06, foi constituída uma rede de pesquisa – REDE FIBRA – de natureza multidisciplinar, com o objetivo de investigar, a partir de um estudo de base populacional, a prevalência e os fatores de riscos biológicos e ambientais da fragilidade entre os idosos.9

Um dos subprojetos de pesquisa da rede FIBRA, ao investigar a prevalência e perfis de risco para a fragilidade em idosos numa amostra de conveniência composta por 113 idosos comunitários de ambos os sexos, 76 selecionados em unidades básicas de saúde, e 37, em serviços de média complexidade, na cidade de Belo Horizonte, identificou que 13,27% desses idosos eram frágeis, sendo esta condição mais incidente nas mulheres, nos mais velhos e naqueles com menor renda, menor nível educacional e maior número de doenças.10

A despeito disso, se considerarmos que nossa população idosa, sobretudo a mais idosa (85 anos e mais), é a que mais cresce na atualidade, havendo, ainda, como noutros contextos, um incremento do número de mulheres nessa população – grupo mais susceptível a fragilidade – e, ainda, que a maioria de nossos idosos vivencia carência de recursos sociais e financeiros, é possível inferirmos a relevância desse fenômeno nas diferentes regiões do nosso país, sobretudo naquelas menos desenvolvidas.

Também compromete a abordagem da fragilidade no idoso em nosso contexto, o fato de alguns profissionais de saúde considerá-la condição inerente ao envelhecimento, atitude que pode ocasionar intervenções tardias, com potencial mínimo de reversão das consequências adversas oriundas do problema. A observância de que a fragilidade não está presente em todas as pessoas idosas sugere que ela está associada ao envelhecimento, porém não é um processo inevitável do envelhecimento, podendo ser prevenida e tratada.7

Considerando o exposto, faz-se necessário o desenvolvimento de estudos que favoreçam a ampliação do conhecimento sobre fragilidade em idosos, esclarecendo, em especial, seus determinantes, pois estes compreendem fatores fundamentais a serem utilizados pelos profissionais de saúde, nos diferentes cenários de prática, com vistas a identificar idosos sob risco de tornarem-se frágeis, possibilitando, dessa forma, sua prevenção. Assim sendo, objetivamos neste estudo delimitar, a partir de uma revisão sistemática da literatura, fatores antecedentes de fragilidade no idoso. 

Métodos

Trata-se de um estudo de revisão sistemática da literatura. Este tipo de estudo constitui uma forma de síntese das informações disponíveis em dado momento, sobre um problema específico, de forma objetiva e reproduzível, por meio de método científico. Tem como regras gerais, dentre outras, a exaustão na busca dos estudos analisados, a seleção justificada dos estudos por critérios de inclusão e exclusão explícitos e a avaliação da qualidade metodológica do material revisado.11 A efetividade desta revisão obedeceu ao seguinte protocolo: delimitação da pergunta norteadora; estabelecimento de critérios de inclusão e exclusão dos estudos; avaliação crítica dos escritos; coleta de dados e síntese dos resultados12.

A questão de pesquisa compreendeu: quais os determinantes de fragilidade em idosos apontados pela literatura pertinente?  As estratégias de busca do corpus literário tiveram a finalidade de localizar, através do site da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), estudos publicados nas bases de dados Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências da saúde (LILACS), Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDILINE), no período de 2001 a 2009, que abordavam, mediante diferentes métodos e abordagens, determinantes de fragilidade em idosos e que fossem disponibilizados na íntegra gratuitamente na Internet. Para isso, utilizou-se o descritor idoso fragilizado e seus termos correlatos em inglês (fraill elderly) e em espanhol (anciano frágil), bem como o descritor incapacidade, considerando, também, sua tradução em inglês (disability) e em espanhol (incapacidad) combinado com os termos funcional e idoso. O uso do descritor incapacidade teve como intenção ampliar a possibilidade de aquisição de artigos, uma vez que este tem sido usado, indevidamente, como sinônimo de fragilidade.

Tal busca, permitiu identificar que dentre os artigos apreendidos por meio do descritor incapacidade, utilizando-se as combinações de termos já mencionadas (292, na MEDILINE, 51 na LILACS e 27 na SciELO), apenas quinze se referiam ao tema investigado, sendo que apenas dois estavam disponibilizados na íntegra. Já na busca em que utilizou-se o descritor idoso fragilizado foi possível a identificação de 121 artigos na base de dados LILACS, oito na base de dados SciELO e 126 na MEDILINE, dos quais 67 eram duplicados (encontrados concomitantemente em mais de uma base de dados ), totalizando 190 publicações nas fontes descritas.  Após a leitura criteriosa dos títulos e resumos destes artigos, considerando os critérios de pertinência e consistência do conteúdo, 129 foram excluídos da amostra pela inadequação à questão norteadora, pois não abordavam o conceito de fragilidade no idoso, mas outros conceitos relacionados, como incapacidade funcional, comorbidade e vulnerabilidade. Além disso, 41 artigos não puderam ser acessados na íntegra pela via eletrônica do acervo do Sistema de Bibliotecas da Universidade, resultando na seleção de trinta artigos que atendiam aos critérios do estudo.

Para a avaliação crítica dos artigos utilizou-se instrumento contendo as variáveis: abordagem metodológica utilizada, ano de publicação, idioma, tipo de periódico, nível de evidência dos estudos. Para a definição do nível de evidência dos artigos, foi utilizada a seguinte classificação13: nível um: evidências resultantes de metanálise de estudos clínicos controlados e randonizados; nível dois: obtidos em estudos de delineamento experimental; nível três: evidências dos estudos quase experimentais; nível quatro: evidências oriundas de estudos descritivos ou com abordagem qualitativa; nível cinco: evidências provenientes de relatórios de casos ou relatos de experiência; nível seis: evidências baseadas em opiniões de especialista da área.

Assim sendo, dos trinta artigos analisados, dezessete (57%) compreendiam artigos originais, os quais tiveram como população estudada idosos com idade superior a 65 anos. Quanto aos demais, sete (23%) correspondeu artigos de revisão/atualização e seis (20%) constituíram revisões sistemáticas. No tocante a abordagem dos dados 23 (77%) foram analisados quantitativamente, um (3%) teve abordagem qualitativa e seis (20%) eram de natureza descritiva. Quanto ao idioma, 23 (77%) eram escritos na língua inglesa, por ser no contexto dos Estados Unidos e do Canadá onde se dá o maior número de publicações relativas ao assunto; quatro (13%) foram escritos em espanhol e três (10%) em português. Considerando o ano de publicação, houve predomínio do ano de 2008 (30%) seguido do ano de 2005 (17%) e dos anos de 2004 e 2009, ambos com quatro (13%) estudos publicados.  Quanto à natureza dos periódicos que publicaram os artigos, observou-se que tais periódicos pertenciam às seguintes áreas: Gerontologia (37%), Geriatria (20%), Medicina (20%), Enfermagem (13%), Nutrição (3%), Fisioterapia (3%), Multidisciplinar (3%).

Quanto ao nível de evidência dos artigos, verificou-se que dezesseis estudos (53%) tinham nível de evidência quatro; seis (20%) possuía nível de evidência um; seis (20%) apresentavam nível de evidência seis; um (3%) apresentava evidência dois; e, por último, também um artigo (3%) possuía nível de evidência três. Esses dados revelam que a maioria das pesquisas analisadas se caracterizava como estudo descritivo.

Após essa avaliação dos estudos, efetivou-se a coleta de dados, a qual foi precedida de uma leitura aprofundada dos artigos e, a posteriori, elaborou-se quadros sinópticos com as informações relevantes que respondiam à questão de pesquisa. Tais informações foram analisadas individualmente, buscando-se, num processo indutivo, identificar categorias de determinantes de fragilidade no idoso. Esse processo permitiu averiguar que o fenômeno sob análise possui determinantes demográficos e psicossociais, bem como físicos/biológicos, os quais serão apresentados e discutidos nos tópicos que se seguem.

Resultados

A análise da literatura ora descrita nos permitiu identificar como antecedentes da fragilidade no idoso, os eventos apontados na figura 1.

Figura 1- Determinantes de fragilidade no idoso. Fonte: Pesquisa Direta, 2010.

Determinantes demográficos e psicossociais

Autores

Baixo nível de renda

2,15,17, 19, 25, 27, 28, 29, 32, 35.

Baixo nível de escolaridade

2, 4, 17, 19, 25, 27, 28, 32, 35.

Ausência/deficit de suporte social

17, 23, 25, 27, 32, 34.

Idade avançada

2, 3, 4, 7, 14, 15, 16, 19, 20, 24, 28, 34, 35.

Sexo feminino

3,8, 16, 19, 21, 25, 28, 31, 34, 35.

Autopercepção negativa do estado de saúde

32, 34.

Determinantes físicos/biológicos

Autores

Declínio cumulativo em múltiplos sistemas orgânicos

2, 5,7,8, 14, 15, 17, 20, 26, 28, 29, 30, 31.

Comorbidades crônicas

2, 4, 7, 8, 9, 16, 20, 22, 25, 28, 30, 32, 34.

Depressão/sintomas depressivos

2, 4, 7, 21, 27, 31, 33, 35.

Baixo nível de atividade física

7, 16, 17, 20, 25, 27, 29, 30, 33, 34.

Déficit cognitivo

2, 3, 5, 17, 20, 23, 24, 26, 27, 30, 32, 35.

Ingestão nutricional inadequada: “anorexia do envelhecimento”

5, 7, 24, 27, 29, 30, 32.

Aterosclerose

4, 5, 7, 19, 27

Obesidade

4, 18, 22, 23, 33.

História de queda

4, 23, 27, 32.

Uso de fumo

4, 22, 32.

Discussão

Os dados ora apresentados, referentes aos determinantes de fragilidade em idosos, demonstram que o fenômeno é determinado por fatores múltiplos, inter-relacionados e variáveis de indivíduo para indivíduo. Nem todos os sujeitos são frágeis na mesma medida32. Considerando isso, a discussão relativa a esses determinantes, efetivada nos tópicos que se seguem, será apresentada de forma associada quando for pertinente.

As variáveis sociais são citadas como preditoras da velhice fragilizada.  Diversos estudos apontam que a incidência da fragilidade em idosos está relacionada com baixo nível socioeconômico e com pouca escolaridade, por afetar, especialmente, seu estilo de vida, aumentando sua exposição a riscos para a saúde.2,17,19 Do mesmo modo, a ausência ou déficit de suporte social (abandono dos familiares, dos amigos, e da sociedade em geral) pode favorecer a ocorrência do evento por tornar o idoso menos ativo socialmente.17,23 Assim sendo, pode-se inferir que a participação ativa do idoso na sociedade contribui para a prevenção ou para o retardo da fragilidade.

A literatura pesquisada evidencia que indivíduos com idade avançada estão mais propensos à velhice fragilizada.19,20,28,33 Pesquisa realizada no âmbito dos Estados Unidos verificou que 3% a 7% das pessoas com mais de 65 anos de idade eram frágeis. Este percentual aumenta de 20% a 26% em pessoas com mais de oitenta anos. Naqueles idosos com mais de noventa anos, o índice alcança 32%.7 Isso decorre do fato de os idosos mais idosos, no geral, apresentarem maior possibilidade de descompensação de sua homeostase quando da ocorrência de eventos agudos, físicos ou psicológicos.28

Do mesmo modo, o sexo feminino é aquele afetado em maior grau pela síndrome da fragilidade. Estudo realizado na Espanha, onde 17% da sua população é idosa, com expectativa de vida de 83,5 anos para mulheres e de 77 anos para homens, identificou que a prevalência de fragilidade é significativamente mais elevada em mulheres (30,9%) do que em homens idosos (9,3%).8 As mulheres envolvidas nesta investigação demonstraram elevada prevalência de exaustão e de redução da marcha.

A maior prevalência de fragilidade em mulheres decorre, especialmente, do fato de estas sobreviverem mais e manifestarem menor índice de massa muscular, o qual pode estar relacionado à redução dos níveis de testosterona.35  A secreção de hormônio do crescimento parece ser mais alta em mulheres com maior massa corporal.5 Além disso, a literatura aponta que a maior prevalência de fragilidade em mulheres idosas é influenciada por condições, marcadas por diferenças sexuais, experimentadas por elas ao longo de suas vidas, como o desempenho de atividades domésticas, vida social restrita e pouca independência econômica.8

Tão importante quanto o estado de saúde, mensurado por avaliações objetivas, como determinante de fragilidade, é o estado de saúde percebido. Idosos que avaliam negativamente seu estado de saúde apresentam risco aumentado de morbidade e de mortalidade, em comparação com aqueles que classificam sua saúde como boa ou excelente.32,34

No que tange aos antecedentes físicos/biológicos, a literatura investigada destaca declínio cumulativo em múltiplos sistemas orgânicos, comorbidades crônicas, depressão/sintomas depressivos, baixo nível de atividade física, déficit cognitivo, ingestão nutricional inadequada – “anorexia do envelhecimento”, aterosclerose, obesidade, história de queda e uso de fumo.

O declínio cumulativo em múltiplos sistemas orgânicos é a principal característica do processo fisiológico de envelhecimento, bem como evento estreitamente relacionado com fragilidade, destacando-se a redução fisiológica do controle neuroendócrino, da função imunológica, do metabolismo energético e perda de músculo esquelético – sarcopenia.5

A comorbidade, presença de duas ou mais doenças identificadas a partir de um diagnóstico médico,9,,28 constitui um antecedente de fragilidade bastante referenciado pela literatura. As morbidades crônicas que mais frequentemente se somam nos idosos e que, por sua vez, estão mais comumente envolvidas com a ocorrência da fragilidade, compreendem hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, câncer, diabetes mellitus, artrite, doença pulmonar obstrutiva crônica.8,16 Por exemplo, a insuficiência cardíaca congestiva severa pode levar à diminuição da atividade, a diminuição da ingestão nutricional e ao aumento da inflamação e das citotoxinas circulantes. A combinação desses fatores, eventualmente, produz caquexia cardíaca e fragilidade.

Ainda considerando a presença de morbidade como importante antecedente de fragilidade, estudos apontam uma forte relação entre sintomas depressivos/depressão com a ocorrência do fenômeno, sugerindo um possível componente psicossocial ou psicológico da síndrome.4

Muitos autores7,17 enfatizam que o baixo nível de atividade física no idoso, tanto produz a diminuição da força muscular, como resulta nela, favorecendo a baixa tolerância ao exercício e reduzindo, igualmente, a velocidade da marcha, o que lhe confere maior risco para quedas, fraturas, fragilidade e incapacidade. Por exemplo, um idoso que tem baixo nível de atividade física irá sair menos lá fora e, portanto, desenvolverá nível reduzido de vitamina D. Isto, por sua vez, desencadeará fraqueza muscular e aumento do risco para quedas. Entre os fatores associados ao baixo nível de atividade física no idoso, verifica-se o deficit cognitivo, o qual também pode afetar a dieta alimentar e favorecer a ocorrência de anorexia. A anorexia fisiológica leva à redução de força muscular, afetando a capacidade funcional.5

Outras condições tais como saúde oral prejudicada, dor crônica, uso variado de medicações, dificuldades com a deglutição, diminuição do paladar, comprometimento visual e limitações no desempenho das atividades de vida diária, depressão, demência, podem contribuir para a ocorrência da “anorexia do envelhecimento.” 30 A ingestão calórica inferior às necessidades energéticas pode levar a um estado crônico de subnutrição ou desnutrição proteicocalórica, com balanço nitrogenado negativo.5 Isso, isoladamente,  pode levar à perda de massa magra corporal, bem como à perda de gordura nos casos de desnutrição.27

A aterosclerose produz fragilidade por reduzir o nível de oxigenação tecidual do organismo. A obstrução das artérias também pode causar pequenas injúrias e, consequentemente, incapacidade cognitiva e decréscimo na capacidade física. Por sua vez, doença vascular causada pela aterosclerose pode resultar em privação de nutrientes para os músculos e sarcopenia (redução da massa muscular).19

A obesidade, especialmente aquela associada à redução da massa muscular (sarcopênica), também constitui fator predisponente de fragilidade. Estudo22 que examinou a relação entre composição corporal, função física e qualidade de vida de idosos obesos comunitários, usando testes de capacidade aeróbica, performance física e desempenho nas atividades da vida diária, identificou que 96% dos idosos investigados eram moderadamente frágeis.

Com o aumento da quantidade de tecido adiposo no idoso, vários fenômenos podem ocorrer: primeiro, a massa de tecido adiposo está aumentando num período da vida em que a massa muscular está diminuindo, o que pode levar à fraqueza muscular; o segundo fenômeno é que, em idosos obesos, pode ocorrer uma aceleração da depleção muscular relacionada ao aumento de proteínas inflamatórias liberadas pelo tecido adiposo, as quais também estão associadas com doença crônica e com resistência à insulina; por fim, níveis elevados de citotoxinas inflamatórias, também produzidas pelo tecido adiposo, podem acelerar o índice de fadiga muscular, reduzindo, consequentemente, a força muscular e contribuindo para o desenvolvimento e progressão da sarcopenia.22

Dentre os comportamentos relacionados ao estilo de vida, o uso do fumo também está envolvido na determinação de fragilidade.22 Estudo prospectivo – The Women’s Health Initiative Observational Study4 verificou que mulheres idosas fumantes apresentavam probabilidade 2,9 vezes maior de tornarem-se mais frágeis que as não fumantes. 

Conclusão

Vale ressaltar que a abordagem relativa à fragilidade efetivada neste estudo permite sinalizar que tal fenômeno corresponde ao envelhecimento malsucedido, o qual é produto dos eventos experimentados pelo indivíduo em todo o seu curso de vida. Esses eventos são afetados por modificadores biológicos, psicológicos, sociais e societais. Da interação produzida entre estes resultam os recursos e os déficits de uma pessoa na sua senescência. Assim sendo, a fragilidade não se apresenta uniforme em todos os indivíduos.

O estudo permitiu, também, apresentar determinantes de fragilidade no idoso, o que pode ajudar aos profissionais da saúde a direcionar os cuidados e tratamentos necessários para indivíduos susceptíveis a esse fenômeno, bem como a criar oportunidades que possam gerar e estabelecer protocolos unificados de avaliação para idosos que procuram os serviços de saúde. Esses instrumentos poderão oferecer uma base para a avaliação clínica e, por sua vez, melhorar a assistência prestada àqueles sob risco ou com evidência de fragilidade nos diferentes níveis de atenção à saúde, especialmente, no contexto da atenção primária.

Considerando, sobretudo, as implicações para o cuidado de enfermagem, vale salientar, ainda, que a fragilidade é possível de ser prevenida, sendo de responsabilidade dos enfermeiros o engajamento dos idosos e de suas famílias num processo de educação em saúde que venha favorecer o reconhecimento por parte destes da dinâmica dessa condição clínica, bem como das estratégias de cuidado envolvidas na sua prevenção.

            A partir do estudo foi possível identificar a necessidade de desenvolvimento de novas pesquisas sobre a temática em foco, que levem a um aumento da produção científica, sobretudo em nível nacional, que favoreça a análise do conceito fragilidade em idosos, e consequentemente, a ampliação de subsídios teóricos para a prática sistematizada da Enfermagem. 

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Contribuição dos autores: Concepção e o desenho, Pesquisa bibliográfica, Escrita do artigo, Revisão Crítica do artigo, Aprovação final do artigo: Maria das Graças Melo Fernandes, Ankilma do Nascimento Andrade e Maria Miriam Lima da Nóbrega. 

Endereço para correspondência: Maria das Graças Melo Fernandes. Endereço para correspondência: Rua Engenheiro Normando Gomes de Araújo, 132 – Bessa. CEP: 58037-125 João Pessoa – PB. Fone: (83) 3245-9447 e 9996-1797. E-mail: graacafernandes@hotmail.com.