The meaning of ecological care for students and health teachers: a qualitative study

 O significado do cuidado ecológico para estudantes e professores da área da saúde: estudo qualitativo 

1Magda Santos Koerich, 2Dirce Stein Backes, 3Lívia Crespo Drago, 4Marli Stein Backes, 5Alacoque Lorenzini Erdmann 

1Departamento de Patologia da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil;  2Curso de Enfermagem do Centro Universitário Franciscano, Santa Maria, RS, Brasil; 3Acadêmica do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil; 4Doutoranda de Enfermagem do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Santa Catariana, Florianópolis, SC, Brasil; 5Departamento de Enfermagem e Programa de Pós-Graduação em Enfermagem (PEN) da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolos, SC, Brasil. 

 

ABSTRACT: Objective: In this study it was intended to understand the meaning of the ecological care in the view of the students and teachers of undergraduate courses in the health area in a public institution of higher education and give to reflection moments on systemic environmental issues. Method: The Grounded Theory was used as methodological reference and an interview with students and teachers in a Public Institution of Florianópolis was conducted between April and September in 2009 as technique for gathering the data. Results: The codification process  resulted in the categories: Developing environmental awareness; Relating the ecological care to the different systems; Realizing the human interaction - environment - health; Developing an ecological awareness through new references and Feeling (de)motivation to understand the ecological care. Conclusion: It was concluded that it is necessary to train teachers in order to adopt new teaching methodologies able to raise and provide the development of ecological awareness of the academics. 

Keywords: Environmental Health. Nursing. Health Education.  

RESUMO: Objetivo: Estudo objetivou compreender o significado do cuidado ecológico na visão de discentes e docentes dos cursos de graduação da área da saúde de uma Instituição pública de Ensino Superior e oportunizar momentos de reflexão acerca das questões ambientais sistêmicas. Método: O estudo foi orientado pela metodologia Grounded Theory, com base na técnica de entrevista, realizada com discentes e docentes de uma Instituição Pública da Grande Florianópolis, entre abril e setembro de 2009. Resultados: O processo de codificação dos dados resultou nas categorias: Desenvolvendo uma consciência ambiental; Relacionando o cuidado ecológico aos diferentes sistemas; Percebendo a interação ser humano – meio ambiente – saúde; Desenvolvendo uma consciência ecológica por meio de novos referenciais e Sentindo (des)motivação para compreender o cuidado ecológico. Conclusão: Concluiu-se que é necessário capacitar os docentes, a fim de que adotem novas metodologias de ensino, capazes de sensibilizar e proporcionar o desenvolvimento da consciência ecológica dos acadêmicos. 

Descritores: Saúde Ambiental. Enfermagem. Educação em Saúde.  

Introdução

O Século XX foi considerado o século do conhecimento científico, no qual sedimentou-se uma nova percepção de mundo, passando a predominar a visão sistêmica em oposição à reducionista, fragmentária e simplista, assumida pela ciência dura. O fato é que desde Galileu, Descartes e Newton, nossa cultura tem estado tão obcecada com o conhecimento racional, a objetividade e a quantificação, que nos mostramos inseguros ao lidar com os valores que dizem respeito à sustentabilidade da experiência humana1.

Dissemina-se a partir de então um novo pensar que tem como pano de fundo a articulação dos fragmentos dispersos pelo saber tradicional reducionista e a compreensão das múltiplas relações, causalidades e interdependências entre os processos naturais e sociais. Esta nova lógica originou a Complexidade ou o Pensamento Complexo, que distingue e une ao invés de isolar, separar e reduzir o todo de suas partes2-4.

Nessa perspectiva, o cuidado assume proporções amplas e complexas, extrapolando do âmbito individual e comunitário para o ambiente, a natureza, o cosmos. Torna-se ecológico, um fenômeno complexo, articulado e de respeito à vida. Um fenômeno integral e integrador.

O cuidado ecológico se fundamenta no movimento ecológico, ou seja, nas relações, associações e interações entre todos os seres e com o ambiente e se manifesta como temática a ser abordada em todas as áreas, com especial atenção na saúde.

Isso porque os profissionais da saúde e usuários dos serviços de saúde vivenciam uma realidade muito diferente de décadas passadas. Sofisticaram-se os locais e os equipamentos para a solução de problemas de saúde; os serviços de atendimento tornaram-se mecanizados a partir de aparelhos de alta tecnologia; contamos com os extraordinários avanços da engenharia genética, inseminações artificiais, transplantes, clonagens e outros5.

As necessidades da população mostram uma sensível mudança, tendo em vista que os terapeutas de saúde são solicitados a buscar preparo diferenciado em um mercado cada vez mais complexo e competitivo. São necessidades que requerem, além da segurança tecnológica, conhecimento e habilidades para cuidar sob novos paradigmas que contemplem a totalidade do indivíduo e sua inserção e inseparabilidade com o meio ambiente.

Uma abordagem ecológica na saúde só terá sentido se for acompanhada de profundas mudanças metodológicas e em nossas estruturas sociais e econômicas. A saúde é realmente um fenômeno multidimensional, que envolve aspectos físicos, psicológicos, sociais e ambientais, todos interdependentes1.

O problema ambiental do nosso planeta está sendo discutido em várias esferas e representa um dos maiores desafios a ser enfrentado pela humanidade. Nesse cenário, destaca-se a necessidade da educação ambiental embasada nos princípios da sustentabilidade, da complexidade e da interdisciplinaridade2,6. Princípios estes que se incorporam nos conceitos de educação e formação em saúde a partir da noção de complexidade das inter-relações sistêmicas da problemática ambiental, assim como a análise dos significados, valores e potencialidades sócio culturais e ambientais, visando à construção de novas e mais complexas interações dos homens entre si e com a natureza.

A partir do exposto e considerando as crescentes indagações relacionadas à formação dos profissionais da saúde/enfermagem, o estudo teve como objetivos: compreender o significado do cuidado ecológico na visão de discentes e docentes dos cursos de graduação da área da saúde de uma Instituição pública de Ensino Superior e oportunizar momentos de reflexão acerca das questões ambientais sistêmicas. 

Metodologia

Trata-se de um estudo qualitativo, orientado pelo método Grounded Theory7 ou também chamado Teoria Fundamentada nos Dados (TFD). 

A TFD é um método que permite explorar os dados, de forma ampla e criativa, tendo sempre presente que muitas coisas podem ser consideradas dados de pesquisa. Constituiu-se num processo em que os dados foram pesquisados e codificados simultaneamente, possibilitando explorar os significados e hipóteses, nesse caso, da prática do enfermeiro, sob diferentes ângulos e espaços7-8.

Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas, individuais, gravadas e transcritas, com a formação de dois grupos amostrais. O primeiro foi constituído por um total de 05 (cinco) estudantes do último ano de graduação dos cursos de Enfermagem, Farmácia, Medicina, Nutrição e Odontologia de uma Universidade pública do sul do Brasil. Os códigos e conceitos que emergiram nesse grupo levaram à formação do segundo grupo amostral, constituído por um docente de cada um dos cursos citados anteriormente, somando mais 05 (cinco) participantes. Assim, a amostra totalizou 10 (dez) participantes que foram entrevistados no período de setembro de 2008 a abril de 2009. Esses dois grupos amostrais foram suficientes para alcançar a saturação teórica e os objetivos do estudo, sendo desnecessária a formação de outros grupos.

A fim de garantir a eticidade do estudo, validar a proposta de trabalho e poder divulgar as informações, o projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFSC e aprovado sob o número 64/08. Foram consideradas e atendidas as recomendações da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que prescreve a ética na pesquisa envolvendo seres humanos9.

Para assegurar a privacidade, as falas dos sujeitos foram identificadas através da letra “A” para os acadêmicos e da letra “D” para os docentes, seguidas de um número correspondente à ordem de cada entrevista. 

Resultados

O processo de codificação dos dados resultou na teoria: Vislumbrando o cuidado ecológico como um fenômeno amplo e complexo, a qual foi desenvolvida e formulada a partir das conexões, inter-relações e associações das seguintes categorias: O cuidado ecológico resultante das relações, interações e associações com o ambiente global; Desenvolvendo uma consciência ambiental; Relacionando o cuidado ecológico aos diferentes sistemas; Percebendo a interação ser humano – meio ambiente – saúde; Desenvolvendo uma consciência ecológica por meio de novos referenciais e Sentindo (des)motivação para compreender o cuidado ecológico.

Ao refletir sobre o cuidado ecológico, os participantes sinalizaram para as constantes relações, interações e associações entre os seres vivos (humanos e não humanos) com o ambiente global e sobre a necessidade de: Desenvolver uma Consciência Ambiental. A categoria emergiu a partir das seguintes subcategorias: Ampliando a consciência ecológica a partir da consciência de si e do cuidado de si; Desenvolvendo a consciência ambiental a partir do convívio, do cuidado do outro e da prática do dia-a-dia; Desenvolvendo a consciência ambiental através do cuidado com o meio ambiente; A falta do suprimento das necessidades humanas básicas dificulta o cuidado/consciência ecológica/ambiental e, Aprendendo com a natureza.

Esse movimento em busca da consciência ecológica e ambiental passa pela consciência e cuidado de si para, a partir do convívio, se estender até o outro e, como conseqüência, ao meio ambiente, conforme sinaliza o depoimento:

 

Eu vejo esta questão ecológica envolvida também com o nosso autoconhecimento! Claro que se a pessoa não tem o conhecimento adequado, não tem auto-estima, a pessoa não tem aquela vontade de viver, então é de se imaginar que ela não vai estar preocupada com o bem-estar das outras pessoas ou com o que sua ação pode representar de prejuízo para as outras pessoas ou mesmo para gerações futuras (D5).

 

Relacionando o Cuidado Ecológico aos Diferentes Sistemas, possibilita aos graduandos a conscientização acerca da visão sistêmica, global, ecológica e dos múltiplos fatores que fazem parte desse contexto. Originou-se a partir das seguintes subcategorias: O sistema capitalista em contra partida com o cuidado ecológico; Compreendendo que o cuidado ecológico está relacionado à má utilização ou desperdício dos bens naturais e de consumo; A fragmentação do conhecimento decorrente do mercado capitalista; O sistema capitalista desestimulando investir em prevenção/promoção da saúde; Vendo as profissões da saúde de modo hierarquizado; Predominando o antropocentrismo; A mídia influenciando pouco a consciência ecológica e incentivando o consumismo.

A fala a seguir exemplifica como o sistema capitalista, o sistema de comunicação de massa (mídia), os sistemas da vida urbana, o sistema educacional e de saúde, contextualizam um modo de vida em que predomina o antropocentrismo em detrimento da visão ecológica de relações e interações:

 

Mas é realmente a parte do desperdício, trabalhar com sobra. Fazer um trabalho com a sobra para não jogar isso no meio ambiente, para não consumir mais energia, mais água! Por algo que não vai ser rentável, que não vai ter alguma serventia, eu penso nisso (A2).

 

Percebendo a interação Ser Humano - Meio Ambiente – Saúde, se caracteriza como fator interveniente e foi estabelecida a partir das seguintes subcategorias: Existindo uma relação direta e estreita entre o meio ambiente e a saúde; A interação dos agentes patológicos com o meio ambiente e o ser humano; Fazendo um link do manejo inadequado do meio ambiente com as doenças; Cuidado ecológico associado aos danos ambientais; Necessitando interagir com pessoas, com os animais e as plantas; Tirando da natureza o que tem de melhor; Agredindo menos a natureza para diminuir as consequências maléficas na sociedade; Entendendo que a natureza e o meio ambiente devem ser apreendidos como parte da nossa vida e não como objeto; Resgatando valores; Melhorando o saneamento básico; Relacionando o cuidado ecológico às condições de vida, moradia e saúde local. Este processo pode ser percebido nas falas:

 

O cuidado ecológico seria o cuidado com o meio ambiente e como isso se reflete na saúde dos indivíduos que estão inseridos nesse meio (A3).

 

O cuidado ecológico tem a ver com o equilíbrio dessa relação entre seres humanos, seres vivos e o meio ambiente. Não dá pra entender saúde se não entender ambiente saudável (D4).

 

Os dados apontaram para a necessária conscientização acerca da interação existente entre seres humanos, outros seres vivos e meio o ambiente e a influência dessa interação sobre a saúde. A compreensão da integralidade na área da saúde apontou para o cuidado ecológico como possibilidade de sua concretização.

Outro aspecto relevante que emergiu dos dados destaca a necessidade de resgatar valores como a solidariedade, a mudança de hábitos, a convivência, a fim de ampliar a consciência/cuidado ecológico/ambiental, como exemplificado no depoimento:

 

Conscientização ambiental entra nesse resgate de valores de como realmente tratar as pessoas (D5).

 

Desenvolvendo uma consciência ecológica por meio de novos referenciais se caracterizou como estratégia e emergiu a partir das seguintes subcategorias: Dificuldade de implantar efetivamente a educação ecológica na graduação e na prática; Necessitando novos referenciais/paradigmas de intervenção ecológica capazes de potencializar a saúde; Necessitando direcionar a grade curricular para a saúde coletiva/comunitária com foco na promoção da saúde; Necessitando trabalhar de forma interdisciplinar e transdisciplinar na saúde; Percebendo que métodos lineares e reducionistas estão sendo ineficazes na educação ecológica; Relacionando a teoria à prática; Desenvolvendo a consciência ecológica/ambiental a partir da família, da educação básica, do cotidiano da universidade, da mídia e outros; Percebendo a importância da universidade no desenvolvimento de uma consciência ecológica; Relacionando o cuidado ecológico com o reaproveitamento, reciclagem e separação adequada do lixo; Aprendendo a partir de punições e prejuízos; Adotando uma linguagem direta e acessível; Formando cidadãos responsáveis; Utilizando a internet e outros meio acessíveis para a conscientização.

 

Deveria ser promovido mais debates, mais palestras porque a minha formação foi muito fraca em relação a universidade! Talvez não tenha nem mudado a minha opinião! Os professores têm que começar a se reciclar, para que comecem a gerar discussões! Essas mudanças estão ocorrendo por pressão do pessoal que acredita que é mudando o hoje que a gente vai conseguir melhorar o amanhã (A2).

 

A ecologia para mim, é na verdade o centro gerador, ela devia ser o campo integrativo de todos os conhecimentos, que todos os setores se interessassem centralmente para a ecologia (D2).

 

Tais afirmações apontam para a ampliação do cuidado ecológico e sua interligação com as relações familiares, a educação escolar, a vida diária, a formação profissional, os meios de comunicação e outros. Revelam ainda que a universidade, além de formar profissionais em suas diversas áreas de conhecimento, deve formar cidadãos comprometidos com as causas sociais e ambientais.

Sentindo (Des)motivação para compreender o cuidado ecológico se originou a partir das seguintes subcategorias: Enfatizando a inter-relação dos problemas ambientais locais e globais; Necessitando ampliar a compreensão da temática (envolve rede de interações); Trabalhando a educação ecológica com todos os segmentos sociais; Pensando nas diferentes ecologias; Profissão voltada para o cuidado ecológico; Capacidade de compreender a vida.

Os participantes expressaram-se com depoimentos que exemplificam o tema dessa categoria:

 

Se um país europeu ou os Estados Unidos estão poluindo o meio ambiente, essas consequências não vão ficar restritas a essas populações! Esse tipo de atitude traz consequências a nível mundial (D5).

 

 Eu acho que tem que chegar em todo mundo, porque todo mundo vive neste mundo, independente de ter curso superior ou não! Todo o mundo vai sofrer as conseqüências! Quando tiver pouca água, vai ser pouca água independente se tem dinheiro ou não (A2).

 

Os docentes que participaram do estudo apontaram para a necessidade de despertar uma consciência para o cuidado ecológico, uma vez que o descuidado está crescente e precisa de intervenções comprometidas.  

Resultados

Os resultados apontam para a perspectiva sistêmica de olhar e analisar a vida em toda sua extensão e nuanças. Denotam a necessidade indispensável do conhecimento de si mesmo para se desenvolver uma visão ecológica profunda e nos tornarmos cientes (conscientes) do outro, ou seja, de que todas as nossas ações implicam em conseqüências imediatas ou futuras tanto para os que estão próximos, quanto para os demais seres envolvidos nas redes de relações que mantemos no decorrer da vida10-12.

Essa conscientização ecológica aponta para o cuidado ecológico e está ligada à ampliação da aprendizagem e do conhecimento. Essa ampliação do domínio cognitivo reflexivo implica em experiências novas, em sair do que até esse momento era invisível ou inamovível e permitir-se ver que, como seres humanos, só temos o mundo que criamos com os outros, fundamento biológico do fenômeno social12. A ampliação do conhecimento torna-se assim, fator sine qua non para desenvolver a consciência ambiental.

O modo de vida contemporâneo é consumista, impera o desperdício e o uso indevido dos recursos naturais e por mais que se busquem formas de recuperação da natureza, o comportamento ecológico ainda está longe de acontecer.

Na saúde, o avanço tecnológico é acompanhado de perto por sua obsolescência. Os recursos em saúde são escassos enquanto é perceptível o mau uso e desperdício de materiais. Tal situação se faz acompanhar da falta de integração entre as várias profissões, levando a diferentes abordagens, iniciando pelo próprio conceito de saúde e doença, no qual os aspectos subjetivos muitas vezes não são considerados1,10.

Este novo olhar – sistêmico – que se almeja, está inserido no conceito ampliado de cuidado e saúde, fazendo-se necessário aguçar os sentidos e ampliar o pensamento, tendo em vista que o mundo globalizado e tecnificado têm como características a redução e a fragmentação dos pensamentos tornando cegos aqueles que poderiam ver13.

O cuidado ecológico compreende um cuidado ampliado, apontando para o necessário investimento na promoção e proteção da saúde, passando pelas questões de sustentabilidade e conservação ambiental e de políticas públicas saudáveis para alcançar tal finalidade.

Dessa maneira, a interação entre os atores do cuidar e ser cuidado visa estabelecer relações e trocas, sendo estas de várias naturezas e com várias finalidades, porém, invariavelmente desenvolvidas em um ambiente. Visualizar a importância deste ambiente demanda reconhecer sua capacidade de interagir, influenciar e oferecer a estrutura ao cuidado, sendo este estruturar dinâmico, contínuo e mutável13.

Ao refletir sobre o cuidado ecológico os participantes ampliaram o conceito de cuidado e apontaram para uma visão sistêmica onde as inter-relações, associações e interações caracterizam o cuidado como organização complexa e interdependente. Na visão do pensamento complexo11, o termo organização comporta a conjunção de uma série de outros termos, tais como: interação, transação, retroação e reação, todos articulados. Possui ainda, conjunções habitualmente consideradas contraditórias ou paradoxais, sincrônicas (eco-organização) e diacrônicas (re-organização), resumidas pela auto-eco-re-organização comum a todos os sistemas vivos11.

Essa noção de organização e complexidade caracteriza o quanto nossas ações sobre/no meio ambiente interferem, modificam e retroagem sobre nós mesmos tornando-nos culpados e vítimas das nossas próprias ações.

A ação de inter-relação requer, no entanto, a compreensão sobre aquilo que se faz e sobre as consequências dessas ações. Uma comunidade humana sustentável está ciente das múltiplas relações entre seus membros10. Relações que se colocam como parcerias, como a aceitação do outro junto a nós na convivência - uma socialização que confirma nossa humanidade10-12.

O desenvolvimento da consciência ecológica prescinde, portanto, de novos referenciais, isto é, de um olhar mais amplo que se afaste da linearidade dos esquemas mentais fragmentários. Torna-se necessário uma reforma do pensamento, uma cabeça bem feita3, ou seja, o desenvolvimento de aptidões para a organização dos conhecimentos, da contextualização e globalização dos saberes. Em outras palavras, é preciso fazer emergir um pensamento ecologizante, no sentido de perceber a inseparabilidade entre o conhecimento e o meio ambiente (cultural, social, econômico, político e natural)6. Somente assim será possível a emergência de uma cultura ecológica, levando em  conta as relações e inter-retro-ações entre os fenômenos e seus contextos, a orquestração de múltiplas disciplinas (ciências), a interdisciplinaridade que, somente uma cabeça bem feita é capaz de compreender.

Os profissionais da saúde necessitam compreender, crescentemente, que a educação ambiental pertence à educação em saúde, uma vez que há uma estreita relação entre meio ambiente e questões de saúde14. Nesse sentido, os docentes salientaram a importância da universidade trabalhar com as questões ambientais, que outros setores da vida do indivíduo têm que agregar valores para estas questões, indo ao encontro das colocações dos acadêmicos.

A educação ambiental precisa ser crítica e inovadora, tanto num nível formal quanto informal, porém visando sempre a transformação de hábitos e práticas sociais e a formação da cidadania15. Seu olhar deve estar voltado para a integralidade das relações do homem com a natureza e com o cosmos16.  O enfoque da educação ambiental formal deve ser aprofundado e trabalhado de forma transdisciplinar, de modo que a verdadeira compreensão da relação homem-ambiente-saúde possa a se concretizar através da observação na prática e relacionando com a teoria acadêmica17.

As condições de vida e saúde das populações e a formação de profissionais comprometidos, principalmente na área da saúde, devem ser consideradas. Pois, cabe aos enfermeiros a concretização da prática com ética e na perspectiva da sustentabilidade18. É preciso um novo olhar para a Terra e à vida existente nela e é necessário fortalecer as estratégias de promoção à saúde, a fim de promover uma cidade saudável e a possibilidade de viver em um planeta habitável19. 

Conclusões

Os dados apontaram uma inquietação em torno da problemática ambiental, por ambas as partes, tanto para os acadêmicos, quanto para os docentes. Porém, ainda bastante incipiente e, por vezes, contraditória. O curso de enfermagem destacou-se nas discussões, por ter no cerne da sua prática o cuidar nas diferentes dimensões.

A produção de conhecimento deve necessariamente contemplar as inter-relações do meio natural com o social, incluindo a discussão e reflexão acerca dos determinantes do processo, sobre o papel dos diversos atores e as formas de organização social.

Perante a ameaça do colapso ambiental, o modelo de progresso utilizado pelo homem tornou-se insustentável. Busca-se agora o desenvolvimento sustentável, ou seja, o desenvolvimento econômico com preservação dos recursos ambientais, uma vez que são limitados e considerados imprescindíveis para as demandas presentes e futuras.

É urgente que o homem/seres humanos assumam sua responsabilidade frente à natureza, resgatando valores como a solidariedade, a cooperação, a parceria e a reverência pelas coisas da terra. É tempo de mudanças, de pensar em uma ruptura epistemológica e paradigmática para olharmos o cuidado a partir dessa visão ecológica, ampla, sistêmica e complexa, a partir de uma rede de interdependências.

O estudo aponta a Universidade como sendo responsável pela inserção da reflexão ecológica em seus currículos, com destaque para os cursos da área da saúde e enfermagem, pois, mesmo não conseguindo cuidar de seus próprios córregos e, às vezes, não proporcionando um ambiente saudável, nas palavras dos participantes, é preciso incentivar a consciência de si de cada membro da comunidade universitária para, juntos, desenvolvermos a consciência do outro e do todo.

Nessa perspectiva, torna-se fundamental e necessário capacitar os professores a adotarem novas metodologias de ensino e trabalharem o cuidado ecológico de forma transdisciplinar durante toda a graduação. É imprescindível que a Universidade abra espaços para discussão dessa temática também com os outros segmentos da sociedade, pois, todos devem estar cientes da importância do equilíbrio dinâmico das relações e inter-relações entre os seres humanos e os demais seres integrantes da natureza, com ética, amor e respeito à ordem cósmica. 

Referências

1. Capra F. O ponto de mutação: A ciência, a sociedade e a cultura emergente. 25ª ed. São Paulo: Cultrix; 2005.

2. Morin E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 5ª ed. São Paulo: Cortez; 2002.

3. Morin E. A cabeça bem feita: repensar a reforma reformar o pensamento. 10ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2004. 

4. Morin E. Ciência com consciência. 9a ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2005. 

5. Waldow VR. O cuidado na saúde: as relações entre o eu, o outro e o cosmos. 2a ed. Petrópolis: Vozes; 2004.

6. Leff E. A complexidade ambiental. São Paulo: Cortez; 2003.

7. Strauss A, Corbin J. Bases de la investigación cualitativa. Técnicas y procedimientos para desarrollar la teoría fundamentada. Medelin: Universidad de Antioquia; 2002.

8. Glaser BG, Strauss AL. The discovery of grounded theory: strategies for qualitative research. Chicago: Aldine de Gruyter; 1967.

9. Brasil. Conselho Nacional de Saúde.  Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa em seres humanos. Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996.

10. Capra F. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. 10ª ed. São Paulo: Cultrix; 2006.

11. Morin E, Moigne JL. A Inteligência da Complexidade. 2ª ed. São Paulo: Peirópolis; 2001.

12. Maturana HR, Varela FJ. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. São Paulo: Palas Athena; 2001.

13. Lessmann J, Ribeiro J, Sousa FGM, Marcelino G, Nascimento K, Erdmann AL. A nursing academic perspective concerning the care environment within the complexity paradigm: a descriptive study. Online Braz J Nurs 2006 [cited 2010-10-20]; 5(1): Available from: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/174.

14. Backes DS. Vislumbrando o cuidado de enfermagem como prática social empreendedora [tese]. Santa Catarina: Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina; 2008. 245p.

15. Jacobi P. Educação Ambiental: o desafio da construção de um pensamento crítico, complexo e reflexivo. Educação e Pesquisa 2009; 31(2):233-50.

16. Jacobi P. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa 2003; 118(3):189-205.

17. Schmidt RAC. A questão ambiental na promoção da saúde: uma oportunidade de ação multiprofissional sobre doenças emergentes. Rev Saúde Colet 2007; 17(2):373-92.

18. Camponogara S, Ramos F, Kirchhof A. The ecologic reflexivity in the context of hospital work. Online Braz J Nurs 2007 [cited 2007-2-11]; 6(3): Available from:http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/1185 .

19. Monteiro EMLM, Rolim KMC, Machado MFAS, Moreira RVO. A visão ecológica: uma teia na enfermagem. Rev Bras Enferm 2005; 58(3):341-4.

Contribuição dos autores: Concepção e desenho: Marli Stein Backes e Alacoque Lorenzini Erdmann; Análise e interpretação: Marli Stein Backes e Lívia Crespo Drago; Escrita do artigo: Magda Santos Koerich e Dirce Stein Backes; Revisão crítica do artigo: Magda Santos Koerich e Dirce Stein Backes; Aprovação final do artigo: Alacoque Lorenzini Erdmann; Coleta de dados: Marli Stein Backes e Lívia Crespo Drago; Pesquisa bibliográfica: Marli Stein Backes; Suporte administrativo, logístico e técnico: Universidade Federal de Santa Catariana. 

Endereço para correspondência: Dirce Stein Backes. Rua Duque de Caxias 938, CEP: 97010-200, Santa Maria, RS, Brasil. E-mail: backesdirce@ig.com.br