Palliative Care: knowledge and feelings of the nurse working in internal medicine and infectious and contagious diseases units of a general hospital: a qualitative study

Cuidados paliativos: conhecimentos e sentimentos do enfermeiro que atua nas unidades de clínica médica e moléstia infecto-contagiosa de um hospital geral: um estudo qualitativo do tipo estudo de caso

 Marina Borges Teixeira1 , Loraine Martins Diamente1 

1Universidade Guarulhos 

ABSTRACT - This study originated from the author’s concern about providing care to patients at life’s end, as she observed that this care was not approached in a holistic manner. Regardless of the patients’ prognoses, the nurse is the health care professional who spends most of the day next to the patients and thus needs to be prepared to care for their bio-psycho-social-spiritual needs at any time of their lives. In order to meet the needs of terminally ill patients, palliative care emerged, aiming at comforting and relieving the pain of those who experience it. After assessing the knowledge on palliative care held by nurses working in internal medicine and infectious and contagious diseases units of a general hospital and providing assistance to terminally ill patients, the author verified that the care offered was predominantly based on a biomedical model. Therefore, this justifies the need to approach the issues of death and dying with more emphasis in nursing undergraduate education.

Keywords: nurse, palliative care, terminal care, death

RESUMO. O estudo nasceu a partir da preocupação da autora sobre o cuidar do paciente fora de possibilidades de cura, pois observava ser este não direcionado ao atendimento holístico. Seja qual for o prognóstico dos pacientes, o enfermeiro é o profissional que passa a maior parte do seu dia junto a eles e que precisa estar preparado para atender às suas necessidades biopsico-sócio-espirituais, em qualquer momento da vida. Para suprir as necessidades do paciente fora de possibilidades de cura surgiu o cuidado paliativo, voltado para o conforto e alívio da dor daqueles que o experienciam. Após verificar qual o conhecimento sobre cuidados paliativos dos enfermeiros das clínicas médica e de moléstias infecto-contagiosa, que cuidam de pacientes terminais, de um Hospital Geral, a autora verificou a predominância do cuidado oferecido baseado em um modelo biomédico, justificando a necessidade do tema sobre morte e morrer ser destacado com mais envolvimento na educação dos graduandos de enfermagem.

Palavras -chave:  enfermeiro, cuidado paliativo, cuidado terminal, morte

INTRODUÇÃO

 

O maior desejo do homem é a imortalidade, situação que ganhou força com as melhorias trazidas pela medicina, aumentando a expectativa de vida e trazendo esperanças para a cura de todas as doenças, afastando-o do tema morte, gerando desinteresse em discuti-lo.1,2

Porém, o desenvolvimento da medicina e também da farmacologia, trouxe um avanço não só na cura das doenças, mas também no prolongamento da vida e no processo de morrer dos pacientes gravemente enfermos, ocasionando a necessidade de uma nova demanda no cuidar, ainda não respaldada pela formação dos profissionais. Em alguns casos, ocorre o prolongamento da vida a qualquer custo, resultando em um profundo sofrimento não só físico, mas também psíquico, social e espiritual.3

A morte tornou-se presente no trabalho dos profissionais de saúde a partir do século XX, quando o morrer passou a ser nos hospitais e não mais no domicílio, na companhia de familiares e amigos. A morte que era um evento público, passou a ser solitária, na companhia de tubos, máquinas e profissionais atarefados.3

A morte tornou-se uma inimiga a ser combatida a qualquer preço, porque foi isso que se aprendeu a fazer. A morte precisa deixar de ser vista como inimiga e ser enxergada como um processo natural que pode surpreender em qualquer situação da vida em qualquer momento ou circunstância. Deve-se propor um cuidado humanizado sem se esquecer do holismo peculiar do ser humano.

Porém, existe a necessidade de um cuidado diferenciado, o cuidado paliativo que alivia os sintomas, respeita a vontade do paciente e não interfere no processo natural do morrer.4

Os cuidados paliativos devem ser prestados por uma equipe multiprofissional, formada por médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e assistentes espirituais, envolvidos nos objetivos concretos desses cuidados, respeitando o paciente como um ser único, bem como suas crenças e culturas.5

O enfermeiro é um profissional sempre muito presente no atendimento ao doente terminal, mesmo que pareça ainda ignorar suas ações no cuidar paliativo,  porém sua responsabilidade deve ser centrada no cuidado aos pacientes, nas possibilidades e probabilidades relacionadas às suas doenças e sobre suas vidas do início ao final respeitando sua perspectiva.6

A dificuldade do enfermeiro em assistir paliativamente parece prejudicada pela sua falta de preparo no cuidar do morrer do outro, por uma tomada de decisão tardia, do início deste cuidado e também pela ausência de um ambiente hospitalar favorável que permita um cuidado individualizado na companhia de parentes e amigos.5

O conceito de cuidados paliativos está centrado no cuidar, que envolve  postura ético/ filosófica por parte do enfermeiro, mesmo que ainda pouco “desperto” para isto. O cuidar do paciente terminal exige do enfermeiro um modelo assistencial com dimensão técnica e outras dimensões como a emocional, espiritual e ainda a de suporte familiar para compreender as várias formas de expressão de sentimentos e apoiar no enfrentamento da terminalidade.7

O cuidar no contexto da assistência paliativa envolve terminalidade/morte; um momento difícil e pouco comentado na educação profissional.8

Ensinar a lidar com a morte é algo difícil, diferente do aprendizado de um procedimento técnico, pois envolve aspectos pessoais de quem cuida como: valores, crenças, espiritualidade, religião, cultura, experiências prévias, mitos e medos, sendo necessária leitura e reflexão de temas sobre terminalidade e morte, além de discussão sobre o assunto com outros ligados ao cuidar do ser humano, como por exemplo, religiosos e psicólogos.6,9

A proximidade da equipe de enfermagem com o doente, permite a formação de vínculos que lhe confere poderes através dos quais pode conduzir o cliente ao exercício de sua autonomia. Autonomia dá ao paciente a capacidade de tomar suas próprias decisões, assumindo uma posição de sujeito que, junto com o médico e enfermeiro, opina sobre seu tratamento. Os profissionais de saúde, compromissados com a vida, estão empenhados em salvar e possibilitar uma chance de vida aos pacientes, considerando os grandes conhecimentos técnicos científicos (a beneficência) e esquecendo que estes têm valores que pertencem ao seu tempo vivido, à sua história e, que isso poderá influenciar no tipo de tratamento (autonomia).5,10

Compete ao enfermeiro auxiliar o paciente a ter uma morte autenticamente humana, seja em casa ou no ambiente hospitalar. No hospital, tem se assistido mais ao corpo, mas pouco ao espírito, cuida-se da enfermidade e não do enfermo. O enfrentar a morte é um processo de amadurecimento pessoal importante. Os profissionais devem tomar cuidado com condutas paternalistas e autoritárias.10

OBJETIVOS: Identificar o conhecimento que o enfermeiro assistencial julga necessário para prestar cuidados paliativos; verificar como o enfermeiro assistencial cuida e orienta os membros da equipe de enfermagem, os pacientes e seus familiares, sobre o cuidado paliativo e, descrever os sentimentos do enfermeiro assistencial com relação ao cuidado paliativo prestado ao paciente internado nas unidades de clínica médica (CM) e moléstia infecto contagiosa (MI). 

MATERIAL E MÉTODOS 

 Tendo em vista o levantamento bibliográfico e os objetivos do presente estudo, foi realizada uma pesquisa qualitativa, tipo estudo de caso, em um Hospital Geral, público da Cidade de São Paulo. Como cenário, foram escolhidas as unidades de CM e MI pois, nesses ambientes, a maioria dos pacientes apresentam doença crônico-degenerativa e síndrome de imunodeficiência adquirida (AIDS), muitas vezes com quadros irreversíveis e dependentes parciais ou totais da assistência de enfermagem. Isso gera a exposição diária dos profissionais ao sofrimento dos pacientes e familiares no enfrentamento do processo de morrer. 

A pesquisa só teve seu início após todas as recomendações da Resolução-CONEP 196/96 terem sido cumpridas e o projeto ter sido  aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Autarquia Hospitalar Municipal Regional Norte, Hospital Municipal "Dr. Carmino Caricchio", Tatuapé no dia 14/09/2006.

Fizeram parte da população, todos os enfermeiros (12) que estavam atuando nessas unidades, que mantinham contato direto com o paciente terminal e concordaram em participar, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Todos foram entrevistados pela pesquisadora, em dias e horários agendados de comum acordo.

As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas e analisadas. Para a coleta de dados, foi utilizado como instrumento, um formulário construído com duas partes distintas: parte I caracterização da população e parte II com cinco questões abertas específicas sobre a temática. Os dados referentes à caracterização foram analisados quantitativamente em número e porcentagem e os das questões abertas foram analisados qualitativamente seguindo os passos da análise temática de Minayo.11 

RESULTADOS E DISCUSSÃO 

Dos 12 enfermeiros entrevistados, somente 2 (16,6%) eram do sexo masculino, confirmando ser a profissão da enfermagem mais praticada pelo sexo feminino. A maioria, 7 (58,33%) tem mais de 6 anos de formado e refere ter feito especialização em diversas áreas (Saúde Pública, Administração Hospitalar, Clínica Médica e Cirúrgica, Centro Cirúrgico), sendo que alguns afirmaram ter mais de uma especialização. Como era de se esperar, não encontramos nenhum enfermeiro com especialização em Cuidados Paliativos, pois conforme relatado anteriormente, o tema é pouco abordado na graduação em enfermagem, fato que não ajuda despertar no estudante o interesse por este e também por existirem aparentemente poucas universidades que o oferecem como especialização.12,13 A grande maioria dos enfermeiros , mais de 60%, é atuante na profissão desde que se formou, são católicos praticantes, o que ao nosso ver,  poderia representar um fator positivo no cuidar uma vez que todas as religiões cristãs realçam o aspecto de humanidade para com os que sofrem. Solicitados a definirem com suas próprias palavras o que são cuidados paliativos, os enfermeiros deram respostas de cuja leitura apreendemos as seguintes unidades de significado: proporcionar conforto; obter a participação do acompanhante familiar; tirar a dor; proporcionar conforto espiritual e dar qualidade de vida, agrupadas sob o tema: conforto.

Nos conceitos de cuidados paliativos citados anteriormente encontramos sempre presentes dois temas: proporcionar conforto e aliviar a dor. Estranhamos que no cuidado ao paciente, independente do termo paliativo, o proporcionar conforto espiritual só tenha sido salientado por um respondente uma vez que cuidar em enfermagem engloba: “proporcionar bem estar bio-psico-sócio- espiritual”.

Sabemos que na maioria dos cursos de graduação o tema cuidado espiritual é muito diluído confundindo-se com cuidados psicológicos. A literatura do espírito parece pouco abordada no dia-a-dia do enfermeiro fato que não ajuda nos cuidados que antecedem a morte, impedindo que o enfermeiro conheça a história espiritual do paciente terminal e assim possa ajudá-lo em seu ritual de morte.

O proporcionar conforto e tirar a dor, aparece na fala dos entrevistados, porém é esclarecido que se trata de conforto técnico do tipo mudança de decúbito, massagem com hidratante para evitar o surgimento de feridas de decúbito e tirar a dor como preparo e administração da medicação:

“......seria alívio da dor, ajudar a se alimentar, a higienização....também pode ser conforto espiritual.....conversando....se integrando com a família.....”(E11)

“......seriam procedimentos para minimizar o sofrimento do paciente...uma medicação para dor......massagem.....conforto no leito....seria...prevenção de úlcera....”.(E7)

“......acho que é você estar dando qualidade de vida naqueles últimos momentos.....você dá atenção, você diminui a dor.....você faz higiene corporal....você faz mudança de decúbito....os curativos.....”.(E9)

Salientamos a necessidade de valorizar os cuidados técnicos, não deixando de enxergar o aspecto psicológico e emocional, pois o proporcionar conforto também é executado na escuta e no toque, por exemplo. O cuidar do paciente terminal, requer do enfermeiro conhecimentos técnicos para proporcionar conforto físico, mas também necessita de conhecimentos para suprir necessidades psico emocionais do paciente e familiares; que sem estes, não haverá o envolvimento emocional, um estar-junto-com, um comprometimento com o outro. Chamou-nos a atenção que em apenas uma resposta houve a preocupação com o familiar acompanhante, por ser este também alvo do cuidar do enfermeiro, ao mesmo tempo em que, se bem orientado, é importante colaborador no atendimento das necessidades psicobiológicas do doente.

“.....a gente procura chamar a família para vir...a gente deixa acompanhante....”(E4)

Em relação aos conhecimentos necessários para prestar cuidados ao paciente terminal, emergiram as seguintes unidades de significado: conhecimento técnico, conhecimento da patologia, conhecimento psicológico, conhecimento do paciente, conhecimento da medicação e conhecimento espiritual, agregados sobre o tema: conhecimento.

Nas respostas a esta questão observamos que a maioria dos entrevistados responde que acha necessário o conhecimento técnico e científico como podemos ver nas falas a seguir:

“.....conhecimento sobre a doença, sobre a anatomia corporal...conhecimento da atuação da medicação.....só”.(E9)

.....você tem que ter a técnica para prestar esta assistência e um pouco de conhecimento...um mínimo de conhecimento de gente....”.(E1)

Somente dois enfermeiros valorizam a necessidade do conhecimento espiritual e psicológico para prestar uma boa assistência.

“.....tem que ter vivência por que não adianta só aplicar o medicamento, eu diria que você tem que ter um psicológico voltado para o paciente....”.(E5)

“.....a gente precisa saber tudo, anatomia, fármaco...o conforto...a fisiologia...um conhecimento espiritual...eu sou espírita e acredito na vida após a morte...”.(E11)

Estas respostas nos mostram que estes enfermeiros parecem não conhecer e realizar um cuidado paliativo integral que, conforme conceitua a OMS, objetiva também o apoio psicológico, social e espiritual, exigindo do profissional que o aplica, além do modelo assistencial com dimensão técnica, um modelo de dimensões que atendem o paciente também em suas necessidades psico emocionais ou  holisticamente.7

Para atender as necessidades psico emocionais do paciente em fase terminal, o enfermeiro observa-o de modo a entender suas mensagens e comportamentos permitindo reconhecer, entender e reagir à consciência da aproximação da morte.14

O atender as necessidades psico emocionais principalmente as relacionadas com a terminalidade, exige que o enfermeiro reflita sobre sua vida, o significado de sua morte e a do próximo, algo difícil de fazer quando o tema é pouco discutido, mas necessário para poder prestar ao paciente uma assistência que lhe permita uma morte digna.6

Nas respostas a questão: “Quais os cuidados que você presta a estes pacientes?”, identificamos as seguintes unidades de significado: preparo da medicação; realizar técnicas de enfermagem, chamar o médico, conversar com o paciente e ficar observando, que geraram o tema : habilidade profissional.

“Chamar o médico” e “ficar observando”, não corresponde a um cuidar em enfermagem; a realização de técnicas de enfermagem é a mais presente nas respostas dos cuidados prestados, porém o cuidado espiritual continua não aparecendo neste momento, o que é congruente com as respostas da questão anterior.

“.....faço o melhor que eu posso...é dar qualidade de vida...trocar a roupa de acordo...socorrer chamando o médico...”(E9)

“.....atendo como outro paciente...mais de observação....”.(E7)

Conversar com o paciente foi salientado como cuidado que o enfermeiro presta ao paciente terminal por 4 (33,3%) entrevistados e dois também incluíram o escutar como cuidado.Estes elementos são considerados básicos para o cuidado humano pois a comunicação aberta permite expressão de sentimentos e pensamentos que podem e devem ser partilhados durante o cuidar. A escuta é essencial para que a comunicação seja completa. Escutar para nós enfermeiros é “ouvir usando todos os órgãos dos sentidos”.3,15,16

.....”eu acho assim....eu profissional.....o que vale de tudo é a palavra que você dá ao paciente...sempre...porque...eu converso...eu escuto o paciente, eu dou muita atenção; se ele vai falar meia hora eu fico meia hora escutando o paciente...isso ele não vai ter na casa dele.....”(E5)

.....”a princípio a gente tem diálogo com quem está consciente....a gente tem um trabalho para proporcionar conforto e deixa ele mais tranqüilo com diálogo”.(E8)

.....”normalmente a medida que a gente mais toma é a analgesia...a gente tenta conversar um pouco com ele mas....não tem muito tempo para isso....quando o paciente quer falar a gente procura ouvir...”(E10)

Nestas falas o cuidado aparece somente com dimensão técnica e ainda como “o melhor que se possa fazer”. Será que não ficou claro o conceito de cuidar, aquele que dá essência à enfermagem?

Urasaki17 define o cuidar como atitude que abrange mais que um momento de atenção. Uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.

O cuidado permite cada vez mais ao enfermeiro, capacidade para envolvimento e habilidades para uma nova ação. O simples ato de trocar a roupa do paciente reúne fatos que ajudam o enfermeiro nas suas próximas ações do cuidar, certo que isto depende da forma de como o enfermeiro desenvolve estas ações; se usa comunicação eficaz, empatia, etc.

A comunicação deve ser usada para: implementar todas as medidas terapêuticas de enfermagem com o paciente que necessita de cuidados paliativos, ajudando no envolvimento de ambos, permitindo assistência individualizada e com qualidade.18

Uma comunicação sincera sempre respeitando o paciente nas suas formas de manifestação do entendimento do diagnóstico, facilita o envolvimento do enfermeiro/paciente, proporciona confiança e segurança, itens necessários e que contribuem para ajudar no período de tratamento.19

Outro fato que também pode estar impedindo o enfermeiro de atender o paciente nas suas necessidades psico-emocionais é que não consegue entender o que ele demonstra ao se expressar, sem ser o diálogo. Muitas vezes os pacientes não conseguem expressar verbalmente o que estão sentindo e querem dizer, usam de sinais corporais, faciais e para linguísticos; formas de comunicação desconhecidas pelo enfermeiro, o que pode impossibilitar um cuidar holístico.20

As respostas à questão: “Como você orienta a equipe de enfermagem, sobre estes cuidados?” deram origem as seguintes unidades de significado: técnicas gerais de enfermagem; paciência; respeitar com educação; não orienta; agrupadas sob o tema: atuação profissional.

O fato de existirem poucos enfermeiros que orientam a equipe a ouvir a família, incluindo-a no cuidar, vem reforçar o fato de que esse tema é pouco trabalhado nos cursos de graduação.

.....”a gente orienta...troca idéias...eu ouço a equipe...oriento a seguir a prescrição médica...prestar atenção nas reações das medicações...ouvir a família porque o familiar é muito importante....”(E9)

Ter paciência e respeito foram valorizados no cuidado do paciente terminal, porém não nos pareceu algo exclusivo do cuidar paliativo e sim algo comum ao cuidar de qualquer paciente.

.....”então eu procuro sempre falar para respeitar a integridade do paciente...atender na hora que ele quer...procurar deixar não sofrer muito e sempre estar atendendo as queixas dele...procurar deixar ele sempre limpo...priorizar os cuidados destes pacientes....”(E3).

O não orientar a equipe em como atuar para atender o item “proporcionar conforto” tem origem na formação dos enfermeiros, ainda centrada no modelo biomédico que visa à cura e recuperação do cliente, considerando a morte como uma forma de derrota, impedindo a vivência da terminalidade como momento importante e levando o paciente terminal ao isolamento social.

.....”não oriento diferente...os cuidados são os mesmos...o cuidado para eles é o cuidado pra todos...”.(E6)

.....”sinceramente é difícil orientar à equipe....eu procuro falar quando dá....avisar quando tiver dor ou precisar do colchão caixa de ovo....”.(E11)

As respostas à questão: “Como você orienta o paciente sobre esse cuidado?” deram origem as seguintes unidades de significado: pensar em Deus, encorajar e dizer que vão melhorar, na realização de uma técnica e não orienta; agrupadas sobre o tema: orientação ineficaz.

A metade dos entrevistados, responderam não orientar o paciente e, quando o fazem, são palavras soltas, sem envolvimento, mostrando pouca importância dada à “comunicação interpessoal” ou ao “relacionamento interpessoal”, tão necessário ao ser humano.

As respostas de orientação quando vai realizar uma técnica, mais uma vez nos mostra ser tratado o cuidado paliativo como outro, não especializado.

Encorajar e dizer que vai melhorar, nesse caso, não mostra um relacionamento franco entre enfermeiro e paciente terminal, não ajudando na formação de vínculos e não permitindo autonomia necessária para o paciente tomar suas próprias decisões e opinar sobre seu tratamento.21

As respostas à questão: “Como você orienta a família sobre esse cuidado?” Deram origem as seguintes unidades de significado: sobre medicação, a não esperar melhora, sobre técnicas de enfermagem, sobre a patologia e os cuidados prestados, encoraja e não orienta; agrupadas sobre o tema: comunicação ineficaz.

Conforme visto na introdução, a clientela da enfermagem compreende o “doente e sua família”. Em cuidados paliativos, a presença e participação da família ao lado do paciente são de extrema importância, portanto a família deve ser informada sobre quais os cuidados prestados para que não cobrem do enfermeiro condutas não condizentes com a proposta dos cuidados paliativos.

“.....eu percebo a família cobrando conduta médica...quando isso acontece a família está orientada...eu mostro a prescrição médica...”(E1)

“.....não oriento porque geralmente a gente deixa ao cargo do médico...é uma questão de tempo mesmo...”(E7)

Apesar de um participante ter referido orientar a família a não esperar por melhora, percebemos que chegou próximo à comunicação efetiva mas não deu continuidade ao relacionamento, não se mostrou  acolhedor.

“.....chego a orientar...chamo a pessoa do lado de fora...não falo na frente do paciente...eu falo...não espere muito...falo que eles procurem fazer o melhor que podem enquanto a pessoa está viva...dar carinho...atenção...depois não adianta ficar chorando em cima do corpo...”(E9)

As respostas à questão: “Quais seus sentimentos em relação ao assistir esse paciente?” Deram origem as seguintes unidades de significado: gratidão, dever cumprido, tristeza, impotência, angústia e depressão; agrupadas sobre o tema: sofrimento.

Nas respostas, surgiram os sentimentos já esperados, que poderiam ser os responsáveis pelo aparente afastamento do enfermeiro do cuidar dos pacientes e seus familiares. Tristeza, impotência, angústia e depressão representam sofrimento, sentimento desagradável de ser experienciado pela maioria das pessoas que, como mecanismo de defesa, afastam-se ou ignoram os seus pacientes.22

“.....eu cuido porque tem que cuidar mas ...eu fico triste...porque você não pode fazer muito mais do que está fazendo....não tem tanto material...cama adequada com grades para evitar quedas...fico triste mas é uma escolha de vida deles (pacientes da clínica de MI)”. (E9)

“.....essa minha passagem pela clínica médica ta mexendo muito comigo...eu fico sentida mesmo....eu faço porque sou profissional....”.(E3)

“.....ah! eu me sinto mal....eu tenho tendência à depressão...tem horas que eu me sinto mal....eu me apego e sofro junto com a pessoa....eu já admiti isso....estou me tratando e estou melhorando....”.(E11)

O afastamento do enfermeiro, do paciente que vive sua terminalidade, pode decorrer de algo não resolvido ainda na sua formação como ser humano, pois, como sugere Watson, para conseguir auxiliar os outros a enfrentarem suas condições humanas, o enfermeiro precisa olhar para o seu interior e encarar suas próprias questões existenciais.5 

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Após analisarmos as respostas desta população, evidenciamos a predominância do cuidar embasado no modelo biomédico, onde a execução de técnicas e conhecimento de patologias, predominam em relação ao cuidar psicológico-espiritual.

Percebemos a dificuldade do enfermeiro em lidar com a morte e o morrer, que pode ser explicada devido aos sentimentos de sofrimento e impotência experienciados no momento em que se aproxima do paciente terminal, relacionada ao pouco envolvimento deste tema ainda na sua formação.

Verificamos a necessidade do tema morte e morrer ser abordado mais frequentemente nos cursos de graduação em enfermagem, inclusive o cuidar paliativo, não “solto” no meio de disciplinas, mas sim de forma pontual, como uma disciplina voltada para a assistência intra e extra-muros.

Acreditamos que os cuidados paliativos deverão ser desenvolvidos no ensino teórico/prático do curso de graduação em enfermagem, aliados aos aspectos do cuidado psicológico e espiritual, unidos ao cuidado físico. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Nota: Este estudo é parte da Dissertação de Mestrado apresentada ao Curso de Mestrado Acadêmico em Enfermagem da Universidade Guarulhos em 2007.