Convergence with the reality of the body image term in mastectomised woman: reflexive analysis according to Barnum.
Convergência com a realidade do termo imagem corporal na mulher mastectomizada: análise reflexiva segundo Barnum.
Francisco Stélio de Sousa1 Marcos Venícios de Oliveira Lopes2 Ana Fátima Carvalho Fernandes2
1 Universidade Estadual da Paraíba, PB, Brasil. 2 Universidade Federal do Ceará, CE, Brasil
Abstract: The nursing theories have an important role in understanding the Nursing practice as a professional tool which brings autonomy and visibility. According to this, the elaboration of a reflexive theoretical study and analysis was chosen based on Barnum (1988) and targeted to develop researches to the adaptation process in mastectomised women. The main objective was the verification of the term Body Image as a convergence criterion with reality, elaborated by Roy in the Adaptation Model and having as corpus the Rodrigues dissertation (1999). Its possible to identify concepts that fit to the term proposed by Roy and Andrews (1999) and that integrate the study analysis of the adaptation process of mastectomised woman through stimulus, answers and adaptation levels in the mentioned phenomenon. Experiences like this lead an important theoretical deepening in nursing theories, making it able to accurate sights for a practical application.
Key words: Body image, Mastectomy, Nursing theory.
Resumo: As teorias de enfermagem têm um papel importante na compreensão da práxis da Enfermagem como um instrumento da profissão que traz autonomia e dá visibilidade. Nesse sentido, optou-se por elaborar um estudo teórico reflexivo baseado no modelo de análise de teorias proposto por Barnum (1988), tendo como objeto para análise estudos desenvolvidos com mulheres mastectomizadas em seus processos adaptativos. Estabeleceu-se como objetivo a verificação do critério de convergência com a realidade para o termo imagem corporal elaborado por Roy em seu Modelo de Adaptação, tendo como corpus a dissertação de Rodrigues (1999). Podem-se identificar conceitos que se adequam ao termo proposto por Roy e Andrews (1999) e compõem o estudo da análise do processo adaptativo da mulher mastectomizada através dos estímulos, respostas e níveis de adaptação do fenômeno relatado. Experiências como essa, direcionam um aprofundamento teórico importante nas teorias de enfermagem, possibilitando um olhar mais acurado em sua aplicação prática.
Palavras-chave: Imagem corporal. Mastectomia. Teoria de Enfermagem.
Introdução
A ciência da enfermagem vem se desenvolvendo desde os primórdios de Florence Nightingale, que institui uma enfermagem mais organizada e mostra uma preocupação com o ambiente no qual esse paciente está inserido. Com o advento da enfermagem moderna, que necessita de projeção acadêmica para se firmar enquanto ciência, surgem trabalhos que embasam teórica e cientificamente uma assistência que se pretenda de qualidade. A Enfermagem busca, na ciência, fundamentos que possam estabelecer articulações entre os conceitos, de modo a permitir a elaboração das teorias de enfermagem.
Nem todos concordam com o significado da palavra teoria. Alguns a usam somente para um jogo complexo de princípios interrelacionados que descrevem ou explicam um fenômeno, usando outras palavras como construtos ou estrutura conceitual para jogos menos desenvolvidos ou aqueles com poucas ou nenhuma variáveis não relacionadas. A teoria é um construto que descreve para ou organiza alguns fenômenos. Uma teoria de Enfermagem descreve ou explica a enfermagem. É um modo para caracterizar um fenômeno, apontar aqueles componentes ou características que dão ao fenômeno sua identidade.1
Na Enfermagem, diversas teorias foram sendo elaboradas ao longo do desenvolvimento da disciplina, dentre elas podemos citar o Modelo de Adaptação de Roy, de autoria da Sister Callista Roy, enfermeira norte-americana, com atuação em Enfermagem pediátrica, cujo modelo teórico foi o estabelecido como fundamento teórico para o trabalho que ora apresentamos.
Em seu modelo, Roy descreve a pessoa como um sistema adaptativo. Para ela, como com qualquer tipo de sistema, a pessoa tem processos internos que atuam para manter a sua integridade. Estes processos têm sido categorizados como um subsistema regulador e um subsistema cognitivo. O Regulador envolve processos fisiológicos tais como químicos, neurológicos, e respostas endócrinas que levam o corpo a enfrentar a mudança no ambiente. O subsistema cognitivo envolve os processos cognitivos e emocionais de interação com o ambiente. As percepções de situação são também processadas e algumas novas decisões podem ser tomadas. As atividades cognitivas e reguladoras são manifestadas em quatro modos particulares em cada pessoa: em comportamentos indicando função físico-fisiológica, identidade de auto-conceito de grupo, papel funcional e interdependência. Estes são os quatro modos adaptativos descritos no modelo de Roy.2
Introduzir os conceitos e as teorias no cuidado cotidiano tem sido um trabalho necessário. Acredita-se que o desenvolvimento profissional esteja atrelado às teorias de enfermagem, que necessitam ser testadas, utilizadas e adequadas à prática. O desafio contemporâneo da enfermagem está em consolidar-se como disciplina por meio da construção de um corpo de conhecimento próprio para o desenvolvimento profissional.3
Entendemos as teorias de enfermagem como um instrumento da profissão que traz autonomia e dá visibilidade à Enfermagem, uma vez que os próprios fundamentos que devem estruturar a prática surgem no âmbito da própria disciplina, dispensando, desse modo, a dependência completa de outras áreas da ciência. Nesse sentido, as teorias têm um papel importante na compreensão da práxis da Enfermagem, o que nos levou a elaborar este estudo baseado no modelo de análise de teorias proposto por Barnum, tendo como objeto para análise estudos desenvolvidos com mulheres mastectomizadas e familiares em seus processos adaptativos.
Nesse contexto, estabeleceu-se como objetivo a verificação do critério de convergência com a realidade para o termo imagem corporal elaborado por Roy em seu Modelo de Adaptação.
Metodologia
Trata-se de um estudo teórico e reflexivo, onde se utilizou o modelo de análise de teorias proposto por Bárbara Stevens Barnum. A reflexão foi desenvolvida nos meses de outubro e novembro de 2007, na disciplina Análise Crítica das Teorias da Enfermagem, do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, nível doutorado, da Universidade Federal do Ceará.
A crítica externa avalia como a teoria de enfermagem se relaciona com o mundo real do homem, enfermagem e saúde. Para a autora, quando trata do modelo de análise de teorias, a crítica externa compreende o atendimento aos critérios de convergência com a realidade, utilidade, significância, discriminação, alcance da teoria, complexidade. A convergência com a realidade é considerada como relacionada ao princípio, interpretação e método, mecanismos analíticos adicionais para a compreensão de teorias.1
Para esse estudo, estabeleceu-se a verificação desses três mecanismos analíticos descritos por Barnum, que complementam o critério convergência com a realidade, considerando também o termo imagem corporal proposto no Modelo de adaptação de Sister Callista Roy.
As teorias de enfermagem estão baseadas em um ou mais princípios dominantes. O Princípio é a cruz de uma teoria, uma idéia que é essencial para indicar ou explicá-la. Dependendo do modo de pensar do autor, um princípio pode ser apresentado como ponto inicial ou como um ponto final. A Teoria de Roy utiliza princípios simples, explicando o homem na base de estímulos, respostas, e níveis de adaptação. Os estímulos e respostas são partes do fenômeno sendo explicado; eles não se constituem como maiores que o ser humano.1
Em se tratando da interpretação, parte-se do questionamento do que é realidade, ou a realidade do fenômeno em consideração, para o autor. É idêntico ao que temos chamado de contexto. Examinando os significados dados aos termos principais da teoria fornece a melhor definição. A essência da matéria sujeito da teoria tanto cai dentro da experiência humana (fenomenal) ou além da experiência humana (transcendental). Uma teoria de enfermagem é válida até ao ponto em que representa o que é mais verdadeiramente real ao teorista. A Teoria de Roy não será aceita se o enfermeiro não comprar os padrões de estímulo - resposta como mais representativos do mundo da enfermagem.1
No que se refere ao método como mecanismo analítico de teorias, uma teorista não pode somente ser caracterizada por seus princípios e interpretação, mas ela pode ser classificada pelo modo como raciocina. Examinando como várias teoristas se movem a partir de seus princípios a suas conclusões, emergiram diferentes padrões de pensamento. Estes podem ser denominados como dialético, logístico, problemático e operacional.
No modo logístico de pensar, o todo não é utilizado para organizar as partes, mas as partes são usadas para explicar e organizar o todo. Um sistema, um evento é descrito pela referência a suas partes e interrelacionamentos. Teoristas logísticos aspiram reduzir suas teorias como fórmulas matemáticas.
O modelo de adaptação de Roy, que utiliza o método logístico, pode ser visto primariamente como um modelo de sistemas embora ele também contenha níveis de análise interacionista. A pessoa como paciente é vista como tendo partes ou elementos ligados juntos de tal modo que a força das ligações podem ser aumentadas ou diminuídas. O sistema da pessoa e sua interação com o ambiente são, portanto, as unidades de análises de avaliação de enfermagem, enquanto manipulação de partes de um sistema ou o ambiente é o modo de intervenção da enfermagem. A pessoa, para Roy, tem quatro subsistemas: necessidades fisiológicas, auto-conceito, papel funcional, e interdependência.1
Por esse motivo, procurou-se verificar no estudo que compôs o corpus para essa investigação, se o termo imagem corporal coaduna de modo fidedigno com o termo utilizado na teoria de Roy, utilizando-se do próprio questionamento de Barnum sobre a existência de conformidade entre as percepções da teórica e dos leitores, nesse caso, o autor da dissertação.
A dissertação é intitulada: Mulher mastectomizada - análise do processo adaptativo.4 A escolha desse trabalho se deu por ser um estudo que envolve a temática do câncer de mama, e conseqüente mastectomia, que pode possivelmente afetar a imagem corporal da mulher, dada à natureza mutiladora da intervenção cirúrgica para ablação da(s) tumoração(ões) maligna(s) da(s) mama(s) afetada(s). O estudo foi defendido no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, da Universidade Federal do Ceará e, se encontra publicado.
A análise será realizada após leitura flutuante e exaustiva da dissertação objeto desse estudo, permitindo detectar a utilização do termo imagem corporal e verificar quando existe a convergência com o termo proposto pela autora.
Resultados e discussão
Em se tratando de verificar a convergência para a realidade do termo imagem corporal no estudo que serviu de amostra para a investigação, fundamentamos a análise a partir da definição estabelecida por Roy, em seu modelo de adaptação, para o termo imagem corporal, que trata de comportamentos da imagem corporal. O olhar do corpo sobre si mesmo e os sentimentos de como o corpo parece e funciona. A identificação do papel sexual é discutida como relacionada ao componente imagem corporal do auto-conceito físico. São feitas perguntas abertas para identificar comportamentos de imagem corporal, cujas respostas bem como as observações do enfermeiro são notadas como comportamentos de imagem corporal. Os comportamentos identificados podem ser julgados como adaptativos, que contribuem para a integridade física e espiritual da pessoa, ou ineficazes, quando diminuem ou dificultam a formação e manutenção da integridade da pessoa.2
De acordo ainda com o modelo de adaptação, algumas características podem ser observadas no conceito de imagem corporal, a exemplo do sentimento da pessoa sobre o próprio corpo e como o corpo influencia no self. Tais questionamentos permitem obter comportamentos que descrevam como a pessoa percebe a si mesma fisicamente. Uma outra característica importante é o nível de satisfação com a aparência, que busca entender quais os aspectos da aparência física que satisfazem a pessoa, o que ela gostaria de mudar na aparência e como essa pessoa se sente sobre a sua aparência.2
A dissertação investigada apresenta o processo adaptativo a partir das respostas das mulheres às entrevistas, de onde emergiram as seguintes categorias: autoconceito e sexualidade após a mastectomia, mudanças no desempenho de papéis, relações de interdependência.4
No que concerne à categoria autoconceito e realidade após a mastectomia, aborda-se a repercussão da mastectomia na sexualidade e no autoconceito da mulher, tendo também, segundo a autora, emergidos depoimentos que se associaram aos conceitos de imagem corporal e auto-estima, bem como sentimentos relativos ao self. O estudo faz referência à dependência da imagem que se tem do corpo ao conceito que a mulher faz de si mesma, envolvendo ainda, a habilidade de amar e ser amada e os sentimentos manifestados pelo self, os quais são elementos essenciais para compor a sexualidade.4
Alterações na auto-imagem,5 perda funcional, alterações psíquicas, emocionais e sociais podem ser vividas por mulheres com câncer de mama, e durante o tratamento, muitas vezes mutilador.6
A verbalização de sentimentos relativos à aparência e como as mulheres experimentavam o ser mulher após a mastectomia, permitiu a expressão de pensamentos e comportamentos vinculados à imagem corporal e auto-estima.
Tais resultados estão de acordo com a definição do termo imagem corporal proposto por Roy quando aborda o olhar da mulher sobre si mesma, traçando a dependência entre a imagem corporal e o conceito de self estabelecido nesse processo. Sentimentos emergem dando corpo a uma nova aparência que se mostra após a mastectomia, que permite pensamentos e comportamentos a respeito do nível de satisfação com a aparência. Há o relato de mulheres que afirmam não haver mudanças significativas em suas vidas após o procedimento cirúrgico, enquanto para outras, há a representação de comportamentos de medo, nervosismo e surpresa quando da detecção do câncer de mama.
Podem ser observados, ainda, sentimentos de indiferença pela perda da mama, desde o momento do recebimento da notícia de possível tratamento cirúrgico. A participante relata que não houve mudanças em sua vida, que continua sendo a mesma e até parece que a sua mama não foi retirada. Para a autora da dissertação, o depoimento em destaque nega mudanças na percepção de sua imagem corporal com a perda da mama, o que pode ser identificado como um comportamento adaptativo, uma vez que proporciona à mulher à manutenção de sua integridade física. A mastectomia, nesse contexto, atuou como um estímulo na manifestação de comportamentos adaptativos, sendo também decisiva para manter a imagem corporal e ativar o self-consistência, culminando com a elevação do autoconceito dessa mulher.4
Cabe ressaltar alguns questionamentos relevantes ao entendimento dessa temática. Como pode, uma cirurgia essencialmente de caráter mutilador, atuar na manifestação de comportamentos adaptativos que elevam o autoconceito da mulher? Acredita-se ser necessário contextualizar que a fala que deu origem a análise realizada por aquela investigadora é de uma mulher que passou por um longo processo de doença do marido e foi mastectomizada há 1 ano e 9 meses,4 e que por esse motivo, ainda pode estar atravessando um momento de sentir-se livre da doença, que trazia riscos à sua integridade física e à manutenção da vida. Importante perceber que esse momento de vida dificilmente será configurado como um fato positivo, dadas às mudanças que se processam na vida das mulheres, no que se refere à própria imagem corporal, a ausência da mama como um órgão que confere feminilidade e também nas possíveis mudanças que podem ocorrer na vida sexual desses sujeitos. Desse modo, mesmo encarando esse aspecto dito como sendo positivo, reconhecendo nele a ablação do tumor e conseqüente cura do câncer, é preciso reorientar a análise sob o ponto de vista dos processos adaptativos na vida dessa mulher, e que não se restringem ao momento de cura da doença.
Por outro lado, existem processos adaptativos compensatórios baseados na riqueza e na flexibilidade da força pessoal dentro de cada indivíduo e o compartilhar dessas potencialidades dentro do grupo. A finitude da vida, o processo através do qual uma pessoa resolve a questão do sentido da vida e aceita a realidade da morte eventual, é uma parte normal do ciclo de vida. Começar o processo de finitude é frequentemente uma resposta ao envelhecimento e à morte dos pais. Interagir com os pais nos últimos meses de suas vidas força a pessoa a confrontar sentimentos pessoais sobre o envelhecimento e a morte. Os pais são uma ligação forte com o passado do indivíduo. A morte dos irmãos, do esposo, ou dos pares pode também estimular enfrentar a própria morte, bem como as mudanças físicas do envelhecimento também servem como estímulos para o processo de fechamento da vida.2 A morte não pode ser esquecida com facilidade. Trata-se de um golpe violento e de uma ameaça ao grupo humano, exigindo alterações substanciais na organização da vida, principalmente quando é inesperada, chegando a por em risco a vida social.7
Outras vivências foram sendo experimentadas pela mulher no processo de adoecimento e tratamento. A remoção cirúrgica da mama estimulou o desencadeamento de sentimentos como medo, nervosismo e surpresa, que com a utilização de mecanismos de enfrentamento foram minimizados e ocasionaram uma resposta adaptativa, que foi a aceitação da condição de ser mastectomizada.4
Em se tratando das respostas ineficazes à mastectomia, estas foram manifestadas por comportamentos não adaptativos que configuram alterações na maneira de se ver e perceber como mulher.
No tocante à convivência em grupo há relato que mostra claramente os temores relativos às reações de rejeição e preconceito que podem ser experimentadas segundo as participantes. Através da adoção de mecanismos de resolução de conflitos, a mulher pode conviver bem com o seu problema. No entanto, sentimentos de constrangimento e vergonha de expor a mama afetada são verbalizados, mesmo quando da utilização de próteses mamárias, que é uma alternativa viável de salvaguarda da imagem corporal da mulher, e tem sido referida como um dos mecanismos de enfrentamento importantes para a preservação ou resgate da auto-imagem feminina, bem como sendo um meio de afastar os olhares da sociedade. Trata-se da valorização das mamas no contexto social em que se vive e da importância da aceitação da imagem percebida pelo outro (cônjuge ou outras pessoas) nessa nova condição de ser mastectomizada.
Desse modo, nas relações com os outros, os membros da família têm um impacto significante na formação e confirmação do auto conceito. O foco do processo do self é influenciado pela confirmação através da interação social, e particularmente pela observação da reação dos outros.2
Em estudo realizado com companheiros de pacientes com diagnósticos de câncer de mama, não há registros que abordem diretamente a vida conjugal. Contudo, existem alguns maridos de mulheres que não retiraram a mama que mencionaram o transtorno que seria para a mulher essa retirada. Há o relato de que ficaria muito feio sem a mama, o que acarretaria em vergonha para a mulher.8 Desse modo, depreende-se que a família, especialmente os parceiros, deve ser trabalhada na tentativa de dar suporte à mulher, no período de adoecimento e tratamento do câncer de mama, nos processos adaptativos, como também no resgate de sua imagem corporal, caso a mastectomia seja o tratamento eleito.
Relatando a experiência do adoecer, mulheres participantes de grupo de pós-mastectomizadas apresentam narrativas convergentes e divergentes. As suas reações, frente ao diagnóstico de câncer de mama, eram contraditórias. Ao relatarem uma força enorme de viver, são citadas, simultaneamente, reações de desespero, de briga com o profissional por acreditar em um diagnóstico incorreto, sensação de finitude da vida e depressão.9
Sentimentos ambivalentes são expressos ao longo das falas dos sujeitos, que ao não perceber mudanças na sua imagem corporal, e mantendo alguns hábitos anteriores à cirurgia, que evidenciam a feminilidade, parecem expressar comportamentos adaptativos. Contudo, concomitantemente, é identificada alteração na percepção corporal, que desencadeia na mulher a vergonha de se expor às outras pessoas e, principalmente, ao cônjuge, mesmo quando essa mulher tem a sua mama reconstruída. Depreende-se desse comportamento a evidência de uma resposta ineficaz.
À medida que surgem mudanças desfavoráveis à adaptação da mulher, revelam-se aspirações para resgatar a imagem corporal, como a reconstrução mamária, que favorece uma rápida reabilitação física e mental e reintegração social, afetiva e sexual.4
As mudanças experimentadas no corpo após a cirurgia, sejam pela retirada da mama, da perda de peso conseqüente aos tratamentos medicamentosos, trazem certa repulsa ao simples hábito de se olhar no espelho, bem como refletem de forma negativa, chegando a alterar os estilos de vida, principalmente na forma de se vestir, segundo os relatos. A autora discute os fatores geradores da alteração na auto-percepção, e nas respostas comportamentais consideradas ineficazes à cirurgia.4
A imagem corporal é formada de conceitos que o indivíduo tem de seu próprio corpo, não se restringindo apenas à imagem física, mas também psicológica, social e cultural.10 As reações expressas pela mulher mastectomizada têm uma relação íntima com a sua subjetividade, pois são determinadas pela maneira como ela vive e convive com o seu corpo. A atitude da mulher frente à doença e à perda da mama dependerá da qualidade dessas experiências.11 Importante se faz destacar que a vergonha de se expor não está presente em outros períodos vivenciados pela mulher, a exemplo da gravidez, do parto e do aleitamento, mesmo que essas experiências tenham deixado marcas inscritas no corpo, pois se trata de uma função social considerada ideal no universo simbólico da mulher. Nessa ocasião, as estrias no abdome e nas mamas, a línea nigra, a incisão cirúrgica da cesariana, costumam ser mostradas sem maiores constrangimentos uma vez que revelam sinais deixados pela experiência da maternidade.12
Desse modo, entende-se que o aspecto sociocultural influencia fortemente no olhar sobre as marcas deixadas no corpo ao longo das experiências de vida, valorizando positivamente àquelas ligadas ao papel da maternidade. Por outro lado, percebe-se que as cicatrizes deixadas no corpo após a mastectomia adquirem uma significação negativa, pois se traduzem em sinais que atingem a sexualidade e o sentir-se mulher.
Em se tratando da convergência com a realidade do termo imagem corporal utilizado no trabalho objeto de estudo, pode-se identificar conceitos que se adequam ao termo proposto pelas autoras do modelo de adaptação, e compõem o estudo da análise do processo adaptativo da mulher mastectomizada. Os estímulos, respostas e níveis de adaptação fazem parte do fenômeno relatado constituindo o princípio da teoria. No que se refere à interpretação, há uma realidade descrita em que o fenômeno se encontra inserido. Os padrões de estímulos-respostas dizem respeito ao contexto que autoras da teoria estabelecem como válidos. E finalmente, o método logístico, onde as partes tentam explicar o fenômeno, pode ser observado como estrutura de análise da teoria.
Considerações Finais
O estudo das teorias de enfermagem tem garantido um avanço conceitual à disciplina, na medida em que fornece fundamentos teóricos que proporcionam o entendimento da prática, e melhoram a qualidade do ensino e das pesquisas em enfermagem. Desse modo, compreende-se que seja adequado verificar, sistematicamente, o uso das teorias a partir de referenciais metodológicos de análise, como o proposto por Bárbara Barnum e utilizado nesse estudo.
Empregar os termos de acordo com o que foi estabelecido pelo autor é condição essencial para a aplicação da teoria. Nesse sentido, é importante verificar que os padrões estímulos-respostas que favorecem o aparecimento de comportamentos adaptativos e/ou ineficazes, estejam contextualizados e, suas diversas partes possam explicar o fenômeno dos processos adaptativos. Sendo assim, pode-se configurar como um trabalho que possui uma convergência com a realidade da teoria. No caso do estudo apresentado, a convergência com a realidade para o termo imagem corporal.
Vale ressaltar que essas experiências direcionam um aprofundamento teórico importante nas teorias de enfermagem, seus conceitos, métodos de aplicação, análise e avaliação, bem como possibilita um olhar mais acurado em se tratando de se proceder a um exame de materiais que se utilizam das teorias de enfermagem. Trata-se de uma possibilidade real de estar próximo dos elementos que compõem a Enfermagem e, desse modo, garantir autonomia e embasamento científico aos seus exercentes.
Referências
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2 Roy C, Andrews HA. The Roy adaptation model. 2nd ed. Connecticut: Appleton & Lange; 1999.
3 Thofehrn MB, Leopardi MT. Teorias de enfermagem, trabalho e conhecimento contemporâneo. Texto Contexto Enferm. 2002 Jan-Abr; 11 (1): 86-104.
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5 Silva RM, Melo EM, Rodrigues MSP. Família como suporte para a mulher em tratamento quimioterápico. Rev Fam Saúde Desenv 1999 Jan-Dez; 1(1/2): 87-96.
6 Makluf ASD, Dias RC, Barra AA. Avaliação da qualidade de vida em mulheres com câncer da mama. Revista Brasileira de Cancerologia 2006 Jan-Mar; 52(1): 49-58.
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8 Santos AM, Koch HA. A participação dos companheiros no diagnóstico e no tratamento do câncer de mama de suas mulheres. Rev bras Mastol 2006 Out-Dez; 4: 150-155
9 Backes VMS. A experiência do processo de viver e adoecer para mulheres pós-mastectomizadas. Texto Contexto Enferm. 1997 Jan-Abr; 6 (1): 305-316.
10 Fernandes AFC, Araújo IMA. Enfrentando o diagnóstico de câncer de mama – depoimentos de mulheres mastectomizadas. Fortaleza: Editora UFC; 2005.
11 Azevedo R, Lopes R. Experience of breast cancer diagnosis and radical mastectomy: a phenomenological study. Online Braz J of Nurs. 2006; 5(1) [Acesso em: 20 de agosto de 2008] Available from http://www.uff.br/objnursing/index.php/nursing/article/view/137/38
12 Paim HHS. Marcas no corpo: gravidez e maternidade em grupos populares. In: Duarte LFD, Leal OF, organizadores. Doença, sofrimento, perturbação: perspectivas etnográficas. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1998. p.31-47.
Contribuição dos autores: Concepção e desenho: Francisco Stélio de Sousa, Marcos Venícios de Oliveira Lopes, Ana Fátima Carvalho Fernandes; Análise e interpretação: Francisco Stélio de Sousa, Marcos Venícios de Oliveira Lopes, Ana Fátima Carvalho Fernandes; Escrita do artigo: Francisco Stélio de Sousa; Revisão crítica do artigo: Francisco Stélio de Sousa, Marcos Venícios de Oliveira Lopes, Ana Fátima Carvalho Fernandes; Aprovação final do artigo: Francisco Stélio de Sousa, Marcos Venícios de Oliveira Lopes, Ana Fátima Carvalho Fernandes; Colheita de dados: Francisco Stélio de Sousa; Pesquisa bibliográfica: Francisco Stélio de Sousa, Marcos Venícios de Oliveira Lopes, Ana Fátima Carvalho Fernandes.
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