MODO FISIOLÓGICO DO MODELO DE ADAPTAÇÃO DE SISTER CALLISTA ROY: ANÁLISE REFLEXIVA SEGUNDO MELEIS


Taciana Cavalcante de Oliveira, Marcos Venícios de Oliveira Lopes, Thelma Leite de Araujo


Resumo
Apesar da proclamada evolução da ciência e, conseqüentemente, da enfermagem, ainda hoje percebemos certa dificuldade por parte do enfermeiro em trabalhar com teorias, tanto no âmbito da assistência, quanto no do ensino ou pesquisa. Com vistas à superação desta dificuldade, destacamos a importância da aplicação de marcos teóricos para uma melhor construção do conhecimento em enfermagem, no intuito de aprofundar a assistência prestada. Objetivamos analisar a consistência e a clareza do modo fisiológico apresentado na teoria de adaptação de Sister Callista Roy em uma dissertação de mestrado. Para a análise crítica da teoria, optamos pelo modelo de análise de teoria de Meleis (1997) e trabalhamos com a crítica da teoria, considerando os critérios de clareza e consistência. A utilização do modelo de adaptação proposto por Sister Callista Roy mostrou validade e aplicabilidade no estudo em discussão, uma vez que possibilitou a determinação de aspectos relevantes para a assistência de enfermagem a mulheres com angina pectoris, e propiciou percebê-las como um ser biopsicossocial, adaptativo e holístico. De forma significativa, o modelo de análise de teorias de Meleis contribuiu para o objetivo proposto, ao possibilitar uma visão ampliada da teoria de Sister Callista Roy, e explicitou a importância desta para o desenvolvimento da enfermagem nos âmbitos do ensino, pesquisa e assistência.

Palavras-chave: enfermagem, teoria de enfermagem, adaptação.


INTRODUÇÃO

Apesar da proclamada evolução da ciência e, conseqüentemente, da enfermagem, ainda hoje percebemos certa dificuldade por parte do enfermeiro em trabalhar com teorias, tanto no âmbito da assistência, quanto no do ensino ou pesquisa. Com vistas à superação desta dificuldade, destacamos a importância da aplicação de marcos teóricos para uma melhor construção do conhecimento em enfermagem, no intuito de aprofundar a assistência prestada. Interessa-nos buscar a análise de paradigmas e construir um conhecimento de enfermagem mais sólido, crítico, reflexivo e científico. A nosso ver, o estudo de teorias poderá constituir decisivo passo para a evolução da enfermagem como ciência.

Para significativa parcela de profissionais inseridos na categoria de enfermagem, trabalhar com teorias pode provocar desgaste e cansaço, em virtude da ausência de desenvolvimento perceptivo ante o conhecimento real e a importância das certezas e incertezas que ele trará para a sistematização da assistência(1).

Além disso, para caminhar no mundo de incertezas do conhecimento, é necessário que a enfermagem saiba usar as vantagens das teorias na prática cotidiana, mediante o aprofundamento dos estudos das teorias subsidiadas pelos modelos de análise(1).

A adoção de teorias no cotidiano da enfermagem poderia contribuir para a construção do conhecimento técnico-científico e para a melhor definição do real papel do enfermeiro, com reflexo direto no processo do cuidar. Nesse sentido, algumas autoras, como Barnum, Chinn e Kramer corroboram esta idéia. Segundo afirmam, o uso da teoria apóia os enfermeiros na definição dos seus papéis, no melhor conhecimento da realidade e conseqüente adequação e qualidade do desempenho profissional, propiciando aos clientes submeter-se a procedimentos e cuidados com menos danos possíveis. As teorias desafiam as práticas existentes ao criar novas abordagens e remodelar a estrutura de normas e princípios vigentes(2-4).

Para o progresso da ciência é necessário analisar as teorias, criticá-las e até mesmo refutá-las. Assim, o conhecimento produzido deixará de ser tautológico e poderá contribuir para novos avanços.

Nesse sentido, elucidamos: o conhecimento científico avança por meio de sucessivas retificações das teorias anteriores. Não há verdade sem erro retificado: o espírito científico é a retificação do saber(5).

Conforme percebemos, a partir da idéia dos autores supracitados, a construção do conhecimento não é algo acabado. Requer, portanto, constantes reflexões. Precisamos, pois, incentivar discussões com vistas à sua análise crítica nos mais variados âmbitos.

Independentemente do espaço onde tenham sido gerados, os modelos conceituais de enfermagem devem ser aplicados, avaliados, criticados e reformulados, pois nenhum saber é definitivo(6).

Ainda em relação à construção do conhecimento crítico, a enfermagem, ao longo da sua história profissional, vem trilhando caminhos que têm possibilitado, mediante reflexão crítica, apoiar sua práxis em conhecimentos teórico-científicos(7). Na opinião de algumas autoras, as teorias de enfermagem são necessárias para um melhor embasamento da prática de enfermagem. Além disso, segundo destacam, tais teorias devem ser constantemente avaliadas e analisadas(1,8-9). Em consenso a estas concepções, refletimos a importância da análise de teorias para a revalidação do conhecimento na enfermagem.

Com vistas, portanto, ao processo de avaliação crítico-reflexiva, selecionamos a Teoria de Adaptação(10).

Segundo menciona Roy, a pessoa é um ser biopsicossocial em constante interação com o ambiente em mudança, podendo elaborar mecanismos de enfrentamento, que irão desencadear respostas, classificadas em adaptativas ou ineficazes.

A teoria em estudo poderá ser aplicada em diversas realidades, já que procura trabalhar com indivíduo, família, grupo ou comunidade dentro de uma abordagem holística. Portanto, o processo de enfermagem descrito por Roy permite melhor sistematização da assistência, e contribui para o processo adaptativo do indivíduo como um todo.

Diante do exposto, objetivamos analisar a consistência e a clareza do modo fisiológico apresentado na Teoria de Adaptação de Sister Callista Roy numa dissertação de mestrado desenvolvida junta a mulheres com angina pectoris e que tratou especificamente do modo fisiológico, sendo esta a única que abordou tal modo que compõe o arquivo do Programa de Pós-graduação no qual desenvolvemos o presente estudo.

Como modelo de análise de teorias, optamos por trabalhar com a proposta de Meleis(11). A autora, por sua vez, relata que a avaliação de teorias é um componente essencial para a prática de enfermagem, para o desenvolvimento do conhecimento, para decidir que teoria é mais apropriada na pesquisa, ensino e administração e prática de enfermagem.


PERCURSO METODOLÓGICO

O estudo caracterizou-se como teórico-reflexivo, realizado na Disciplina Análise Crítica das Teorias de Enfermagem, do Curso de Doutorado da Universidade Federal do Ceará (UFC), desenvolvido no período de abril a junho de 2005.

Para a análise crítica da teoria de adaptação, considerando a aplicação do modo fisiológico, decidimo-nos pelo modelo de análise de teorias de enfermagem de Meleis(11) . O modelo de análise de Meleis(11) é composto por cinco etapas: descrição, análise, crítica, teste e teoria de apoio. Cada etapa é formada por critérios e unidades de análise nos quais são explorados aspectos relacionados a determinada teoria, objetivando a análise reflexiva da sua importância e adequação à prática de enfermagem.

Entre as etapas supracitadas, optamos por trabalhar com a crítica da teoria. Crítica, segundo a teórica em destaque, é definida como o exame crítico ou estimativa de uma coisa ou situação, com a visão de determinar sua natureza e limitações ou sua conformidade aos padrões. Vários critérios são essenciais à crítica da teoria. Estes têm relações entre estrutura e função, diagrama da teoria, círculo de contágio, utilidade e componentes externos.

Em relação aos critérios essenciais à crítica da teoria, selecionamos como cerne da nossa análise a relação entre estrutura e função. Isto é realizado ao tecer uma avaliação crítica e julgamento das relações entre os diferentes componentes da teoria, tais como pressupostos, conceitos, proposições e domínio. Nesta avaliação, vários critérios podem ser considerados: clareza, consistência, simplicidade, complexidade e tautologia/teleologia(11). Optamos, pois, pelos critérios de clareza e consistência para realização da análise, descritos a seguir, de acordo com a concepção de Meleis.

A clareza é demonstrada em pressupostos, conceitos e proposições, bem como em conceitos de domínio. Para se obter a clareza nos conceitos deve-se ter definições teóricas e operacionais que sejam consistentes por meio da teoria, apresentados em formato parcimonioso e baseados nos pressupostos e proposições da teoria. Algumas questões ajudam a determinar o conceito de clareza. Por exemplo: os conceitos são operacionalmente definidos? Eles parecem ter validade de conteúdo e construto? A clareza proposicional é manifestada em uma apresentação coerente e lógica de proposições e elos sistemáticos entre os conceitos da teoria.

Entretanto, os limites entre clareza e consistência não são facilmente determinados. O grau de congruência existente entre os diferentes componentes de uma teoria descreve sua consistência, bem como o ajuste entre os diferentes componentes de uma teoria. Além disso, o ajuste entre pressupostos e definições de conceitos, entre conceitos como definição e seu uso em proposições, e entre conceitos e exemplos clínicos, pode ser considerado determinante de consistência.

Na realização do estudo percorremos as seguintes etapas: 1ª- levantamento de estudos que contemplassem o modelo de adaptação de Roy como referencial teórico disponíveis para consulta no arquivo do Programa de Pós-graduação em enfermagem da Universidade Federal do Ceará e seleção da dissertação que foi analisada; 2ª- leitura da teoria em discussão e do modelo de análise; 3ª- listagem dos pressupostos, conceitos e proposições do modelo de adaptação de Roy, com ênfase no modo fisiológico, considerando os estímulos focais, contextuais e residuais e analisando a congruência entre pressupostos, conceitos, proposições e componentes do referido modo; 4ª- leitura da dissertação selecionada visando a análise crítica da aplicação da teoria mencionada, a partir da identificação dos estímulos focais, contextuais e residuais dentro do modo fisiológico; 5ª- análise reflexiva da aplicação da teoria, tendo em vista clareza e consistência inseridas dentro da crítica da teoria, descrita pelo modelo de análise referido; 6ª- análise da congruência entre os estímulos identificados no material bibliográfico e os pressupostos, proposições e componentes do modo fisiológico.

Para a análise crítico-reflexiva utilizamos uma dissertação fundamentada no referencial teórico de Roy, intitulada Adaptação física e diagnósticos de enfermagem em mulheres com angina pectoris, cujo objetivo geral foi investigar, à luz dos componentes do modo fisiológico de adaptação de Roy, que Diagnósticos de Enfermagem da taxonomia da NANDA estiveram presentes em mulheres com angina pectoris(11).


ANÁLISE CRÍTICO-REFLEXIVA

Aspectos Gerais da Teoria de Sister Callista Roy

O mencionado modelo de adaptação contempla quatro conceitos principais: a pessoa, o ambiente, a saúde e a meta de enfermagem(10).

A pessoa alvo do cuidado de enfermagem é referida como um indivíduo, uma família, um grupo ou uma comunidade. É descrita como um sistema adaptativo e holístico. O termo adaptativo é usado pelo fato das pessoas terem a capacidade de se ajustar às mudanças do meio ambiente, mantendo, assim, a integridade; o termo holístico tem o seu emprego em razão do sistema funcionar como um todo e representar muito mais que a soma de suas partes(10).

Quanto ao ambiente, este é definido como todas as condições, circunstâncias e influências que circundam e afetam o desenvolvimento e o comportamento de pessoas e grupos. Já a saúde é um estado e um processo de ser e de tornar-se uma pessoa total e integrada. A integridade da pessoa é expressa como a capacidade de preencher as metas de sobrevivência, crescimento, reprodução e controle. Por fim, a meta de enfermagem é definida como a promoção de respostas adaptativas em relação aos quatro modos adaptativos, contribuindo para a saúde, a qualidade de vida ou a morte com dignidade.

De acordo com a teorista, a visão da pessoa, como sistema adaptativo, possui quatro elementos: o input, os controles, o output e o feedback ou retroalimentação(10).

Input ou estímulos são elementos provenientes do ambiente interno ou externo que confrontam a pessoa e exigem uma resposta. São assim classificados: focais, estímulos internos ou externos, que confrontam imediatamente a pessoa;  contextuais, todos os outros estímulos presentes na situação e que contribuem para o efeito do estímulo focal; e residuais, estímulos presentes ou não na pessoa, relevantes na situação, mas cujos efeitos são indefinidos(10).

Os estímulos ativam mecanismos de enfrentamento (controles) definidos como inatos ou adquiridos, para responder às mudanças do ambiente. De acordo com a teorista, os mecanismos de enfrentamento são categorizados em dois subsistemas maiores: o regulador (recebe estímulos provenientes do meio interno da pessoa, e automaticamente processa respostas por meio dos sistemas químico, neuronal e endócrino); e o cognoscente (recebe estímulos, tanto do ambiente interno quanto do externo, e a eles responde por meio de quatro canais cognitivo-emocionais: perceptual/processamento de informações; aprendizagem; julgamento; e emoção). Tais mecanismos irão desencadear respostas (output), classificadas em adaptativas e ineficazes. As respostas adaptativas são todas aquelas que promovem a integridade da pessoa, em termos de metas de sobrevivência, crescimento, reprodução e controle; e as ineficazes são as que interrompem esta integridade ou não contribuem para ela(10).

Os comportamentos resultantes dos subsistemas regulador e cognoscente podem ser observados em quatro categorias ou modos adaptativos: fisiológico, autoconceito, desempenho de  papéis e interdependência(10).

Destacamos, aqui, o modo fisiológico, foco do nosso estudo, definido como o modo da pessoa responder, como um ser físico, aos incentivos ambientais.

O modo fisiológico é associado com processos físicos e químicos envolvidos nas funções e atividades de organismos vivos. Para uma boa compreensão do componente fisiológico exige-se conhecimento de anatomia e fisiologia do corpo humano, bem como da fisiopatologia básica dos processos das doenças(10).

A enfermeira deverá ter conhecimento e ser capaz de reconhecer processos normais do corpo para, a partir daí, reconhecer processos compensatórios e comprometidos da adaptação fisiológica.

No modo fisiológico, a necessidade básica é a integridade fisiológica. Comportamento, nesse modo, é a manifestação de atividades fisiológicas de todas as células, tecidos, organismos e sistemas, incluído o corpo humano.

Cinco necessidades são identificadas no modo fisiológico: oxigenação, nutrição, eliminação, atividade/repouso e proteção, descritas a seguir(10).

1.Oxigenação.
Esta necessidade envolve os requerimentos do corpo para oxigênio e processos básicos de vida: ventilação, troca e transporte de gases.

2.Nutrição.
A nutrição abrange uma série de processos integrados, associados com digestão e metabolismo.

3. Eliminação.

A necessidade de eliminação inclui processos fisiológicos, responsáveis pela excreção de resíduos metabólicos, primariamente, por meio dos intestinos e rins.

4. Atividade e Repouso.

Destinada a equilibrar o processo básico de vida, de mobilidade e sono, esta necessidade, quando atendida, produz função fisiológica ótima de todos os componentes do corpo e períodos de restauração e restabelecimento.

5.Proteção.
A necessidade de proteção compreende dois processos vitais básicos, quais sejam: processo de defesa não específico e processo de vida específico.

 

Ainda inerente à discussão da adaptação fisiológica, mencionam-se alguns processos complexos, como os seguintes: sensitivo, fluido, eletrólito e equilíbrio ácido-básico, e função neurológica e endócrina(10).

1. Sensitivo.

Formado pelos processos sensórios da visão, audição, tato, paladar e olfato, habilita as pessoas para interação com o meio.

2. Fluido, eletrólito e equilíbrio ácido-básico.

Processo complexo associado com fluido, eletrólito e equilíbrio ácido-básico, é requerido pelas funções celular, extracelular e sistêmica.

3. Função neurológica.

Canais neurológicos são uma parte integral dos mecanismos de enfrentamento regulador de uma pessoa. Eles funcionam para controlar e coordenar os movimentos do corpo, consciência e processo cognitivo-emocional, bem como para regular a atividade dos órgãos do corpo.

4. Função endócrina.

Processos endócrinos por meio de secreção hormonal trabalham juntamente com a função neurológica para integrar e coordenar o funcionamento do corpo. A atividade endócrina “disputa” um importante papel na resposta ao estresse e também é parte do enfrentamento regulador.

 

Com estas explicações, nos deteremos na apresentação dos pressupostos, conceitos e proposições da teoria em estudo, mediante um paralelo entre os componentes da teoria e os encontrados no texto analisado.

Antes de iniciarmos a análise reflexiva a respeito dos componentes da teoria e sua relação com o estudo em discussão, faremos uma correlação entre os pressupostos, conceitos e proposições da teoria de adaptação, na tentativa de facilitarmos seu processo de análise e compreensão.

A partir daí, tecemos as seguintes considerações:

- O modelo de adaptação proposto por Sister Callista Roy conceitua a pessoa como sistema aberto, que mantém interação contínua com o ambiente em mudança;

- Constantemente, as pessoas recebem estímulos. Estes exigem respostas, que podem ser adaptativas ou ineficazes;

- Conforme sabemos, as ações de enfermagem promovem respostas adaptativas ou são capazes de diminuir as ineficazes;

- Para enfrentamento da mudança ambiental, a pessoa, descrita como um sistema adaptativo e holístico, utiliza mecanismos inatos ou adquiridos. Ações de enfermagem, por sua vez, melhoram a interação das pessoas com o ambiente, promovendo adaptação;

- A visão da pessoa como um sistema adaptativo apresenta quatro elementos: estímulos, mecanismos de enfrentamento, respostas e feedback ou retroalimentação;

- O modelo teórico é formado por quatro efetores, ou modos adaptativos: fisiológico, autoconceito, desempenho de papéis e interdependência. Portanto, o sistema adaptativo funciona como um todo e representa muito mais que a soma de suas partes.

 

Concluída essa etapa de correlação entre os componentes da teoria, podemos inferir que houve congruência entre eles. Consideraremos, agora, a avaliação da aplicação do referencial teórico de Roy com a questão da adaptação física e diagnósticos de enfermagem em mulheres com angina pectoris. Partimos, então, das seguintes indagações: Que pressupostos da teoria o estudo contemplou? Quais os conceitos utilizados? Que proposições o estudo apresenta?


Análise dos Pressupostos


Pressupostos – Roy


Pressupostos do Estudo

1. A pessoa é um ser biopsicossocial, holístico e adaptativo, podendo ser representada por um indivíduo, família, grupo ou comunidade

2. A pessoa está em constante interação com o ambiente em mudança

3. Para enfrentamento da mudança ambiental a pessoa utiliza mecanismos inatos e adquiridos, quais sejam: biológico, psicológico e social 

4. Saúde e doença estão em uma dimensão inevitável da vida da pessoa 

5. Para responder positivamente às mudanças ambientais, a pessoa deverá se adaptar

6. A pessoa tem quatro modos de adaptação: fisiológico, autoconceito, desempenho de papéis e interdependência 

7. A enfermagem exerce uma abordagem humanística na valorização das opiniões e visões de outras pessoas. Relações interpessoais são uma parte integral de enfermagem

8. Há um objetivo dinâmico para a existência humana que é ativado por metas de integridade e dignidade

1. A pessoa foi representada por um grupo de 24 mulheres com angina pectoris 

2. O ambiente foi representado por uma unidade coronariana de um hospital da rede privada da cidade de Fortaleza-CE 

3. Não houve menção de mecanismos de enfrentamento utilizados pela clientela (não contemplado de forma explícita) 

4. A angina pectoris foi considerada dimensão inevitável na vida da mulher 

5. Pressuposto não contemplado de forma explícita no estudo 

6. O estudo focalizou a atenção às mulheres com angina pectoris como um todo, mas houve maior ênfase no modo fisiológico 

7. Esse pressuposto foi abordado no decorrer da análise do estudo de forma sutil

8. Não houve estabelecimento de metas no estudo, uma vez que apenas foi descrita uma proposta de intervenção (estudo exploratório e descritivo)

Quadro 1 - Comparação entre os pressupostos de Roy e os explícitos no estudo. Fortaleza, CE, 2005.

Fonte: Roy e Andrews(10); Meleis(11), Lopes(12).

 

No caso do primeiro pressuposto, o estudo enfocou a mulher com angina pectoris como um ser biopsicossocial, holístico e adaptativo, considerando não apenas a abordagem fisiológica, foco maior do mesmo. Conforme percebemos, o comportamento da pessoa não poderá ser visto de forma isolada, inserido apenas em um modo adaptativo.

De maneira geral, o comportamento da pessoa é visto relacionado aos quatro modos adaptativos. Estes delineiam as manifestações do subsistema cognoscente e as atividades do regulador dentro de um processo adaptativo(12).

No segundo pressuposto, a teórica elucida a constante interação da pessoa com o ambiente em mudança. A mudança ambiental, configurada pela internação hospitalar, funcionou como estímulo focal, no estudo, em um dos componentes do modo fisiológico, e permitiu a identificação de alguns estímulos contextuais e residuais. Entre os contextuais, podemos citar: mudança de papel, sentimento de solidão, tensão emocional, afastamento das práticas religiosas e diminuição do autoconceito. No referente aos estímulos residuais, temos: conceitos pessoais associados ao binômio vida/morte e valores pessoais associados ao relacionamento conjugal.

Percebemos, então, que a mudança ambiental pode gerar respostas ineficazes, as quais exigem maior intervenção por parte da enfermagem para um melhor processo adaptativo.

No modelo adaptativo proposto por Roy, a vantagem principal é a consideração do ser que recebe o cuidado de enfermagem, em interação constante com o seu meio, enfocando a necessidade de ajuste a estas mudanças(13).

Para enfrentamento da mudança ambiental a pessoa utiliza mecanismos de enfrentamento (terceiro pressuposto). Este, por sua vez, não foi explicitado no estudo. Não houve indicação de mecanismos de enfrentamento utilizados pela clientela para superação dos problemas advindos da presença do quadro clínico de angina pectoris. A mesma linha de raciocínio deverá ser usada para o quinto pressuposto. Estes dois pressupostos, entretanto, estão implícitos no decorrer do estudo.

Quanto ao quarto pressuposto, isto é, a questão do binômio saúde e doença, podemos destacar na clientela do estudo que a tensão emocional, insegurança e medo iminente da morte fizeram parte do cotidiano de boa parte das mulheres hospitalizadas com angina pectoris.

Dos quatro modos adaptativos propostos por Roy, o estudo apresentou maior ênfase no modo fisiológico. Isto, porém, não impediu que a mulher fosse abordada de forma holística, considerando-se, também, aspectos relativos aos modos psicossociais.

O sétimo pressuposto foi abordado no decorrer da análise de forma sutil. Destacamos, então, a importância das relações interpessoais na assistência de enfermagem.

O dinamismo na forma de perceber a enfermagem como profissão interativa e em constante mutação possibilita uma análise aprofundada do trabalho desenvolvido. Tal análise não se esgota no cliente. Ao contrário, ela se estende no âmbito das relações e atitudes profissionais. Uma revisão constante da prática de enfermagem é necessária, pois o avançar da profissão exige a análise do seu desempenho diário(13).

No estudo, percebemos ampla variedade de estímulos focais, contextuais e residuais que influenciaram na manutenção de um estado de dependência da assistência de enfermagem.

O último pressuposto de Roy refere-se à meta de enfermagem, cujo objetivo é promover a integridade da pessoa e/ou a morte com dignidade, aumentando as respostas adaptativas e minimizando as respostas ineficazes. No relacionado a este pressuposto, o estudo apresentou intervenções como proposta para ser implementada. As intervenções sugeridas foram baseadas nos diagnósticos de enfermagem levantados e objetivaram levar a clientela a respostas adaptativas, sistematizando a assistência de enfermagem.


Análise dos Conceitos


Conceitos – Roy


Conceitos do Estudo


1. Adaptação

 

 

2. Holismo

  

 

3. Pessoa

 

 

4. Ambiente


 


5. Saúde

 


6. Meta de Enfermagem


 


7. Estímulos

 


8. Mecanismos de
Enfrentamento

 

9. Respostas
Adaptativas                    


10. Respostas Ineficazes


 
 


11. Modo Fisiológico

 


1. O conceito de adaptação foi utilizado no desenvolvimento de todo o estudo e se evidenciou em indicadores de adaptação positiva. 

2. Apesar de ser um estudo de cunho mais fisiológico, o autor no decorrer da sua análise teve a preocupação de destacar os modos psicossociais. 

3. Pessoa foi um conceito frequentemente mencionado.             

4. O ambiente foi evidenciado, principalmente pela unidade de internação. Contudo, outros aspectos emocionais, culturais e espirituais foram levados em consideração durante o processo de análise do estudo. 

5. Conceito evidenciado de forma explícita, principalmente quando o autor fez a distribuição dos estímulos residuais associados aos problemas comuns de adaptação em cada componente do modo fisiológico.

6. A meta de enfermagem foi mencionada no capítulo dos resultados ao tecer considerações sobre o cuidado de enfermagem. O autor, por sua vez, trabalhou com uma proposta de atuação. 

7. Definição explicitada. Os estímulos foram descritos e identificados a partir dos problemas comuns de adaptação do modo fisiológico. 

8. Os mecanismos de enfrentamento não foram contemplados no estudo de forma explícita

9. Conceito trabalhado em associação com o conceito de adaptação, a partir dos indicadores de adaptação positiva

 

10. Conceito evidenciado de forma clara, a partir da identificação dos problemas comuns de adaptação do modo fisiológico, considerando as necessidades básicas e os processos complexos deste modo 

 

11. Conceito explorado com freqüência 

Quadro 2 - Comparação entre os conceitos propostos por Roy e os apresentados no estudo. Fortaleza, CE, 2005.

Fonte: Roy e Andrews(10); Meleis(11), Lopes(12)

 

Com base nos conceitos anteriormente enunciados, observamos no decorrer da discussão do estudo uma preocupação do pesquisador em contemplá-los, seja de forma explícita ou implícita.

O conceito de adaptação foi observado, particularmente no capítulo de discussão dos achados. Desse modo, o pesquisador evidenciou alguns indicadores de adaptação positiva: processo de atenção e vigília efetivos; processo de formação urinária estável; processo de eliminação intestinal estável; sais nos fluídos corpóreos estáveis; status ácido-base equilibrado e padrão de ritmo cíclico estável.

Destacou, ainda, que o componente de líquidos e eletrólitos foi, de fato, o menos afetado e, conseqüentemente, aquele que apresentou o maior número de indicadores de adaptação positiva.

Todavia, entre os conceitos, os mecanismos de enfrentamento não foram apresentados de forma explícita. Na nossa opinião, isso se explica pelo desenho proposto pelo pesquisador e pelos objetivos delimitados para o estudo.  Outro conceito pouco desenvolvido foi a meta de enfermagem, descrita no capítulo dos resultados, no qual constam considerações sobre o cuidado de enfermagem. Como já comentado, o estudo apresenta uma proposta de atuação não implementada.

Quanto ao conceito estímulo, foi frequentemente explorado no estudo, e esteve presente em dois dos seus objetivos específicos, quais sejam: avaliar que estímulos focais, contextuais e/ou residuais estão presentes e contribuem para a existência de problemas de adaptação nos nove componentes do modo fisiológico de Roy em mulheres com angina pectoris e estabelecer diagnósticos de enfermagem da taxonomia da NANDA, a partir dos indicadores de problemas de adaptação nos nove componentes do modo fisiológico de Roy e dos estímulos focais, contextuais e/ou residuais identificados. Embora a determinação dos estímulos focais e contextuais tenha sido bastante enfatizada, percebemos certa dificuldade na determinação dos estímulos residuais. O próprio autor relata essa realidade em suas considerações finais.

Ante a complexidade do modelo de adaptação de Roy, conforme percebemos, um mesmo estímulo poderá ter várias classificações, de acordo com o contexto, a situação e os mecanismos de enfrentamento utilizados pela pessoa que os recebe.

Em concordância com a concepção da teórica em estudo, um comportamento observado num determinado modo adaptativo pode atuar como estímulo focal em outro; um mesmo estímulo focal pode afetar mais de um modo adaptativo; um estímulo considerado contextual num determinado momento pode tornar-se focal em outro e um estímulo residual pode tornar-se contextual a partir da validação pela própria pessoa(10).

Quanto às respostas adaptativas, estas não foram trabalhadas de forma clara/explícita, pois não houve aplicação de todo o processo de enfermagem proposto por Roy. Diante disto, o estudo destacou principalmente as três primeiras etapas do processo: avaliação de comportamentos, avaliação de estímulos e diagnóstico de enfermagem. O estabelecimento de metas e intervenções foi apenas descrito como proposta.

No estudo, as respostas ineficazes foram percebidas a partir dos problemas comuns de adaptação em cada componente do modo fisiológico.

Quanto aos problemas comuns de adaptação constataram-se os seguintes: estresse, diminuição do processo cognitivo, risco para dano cerebral secundário, déficit de memória, hipocalemia, hiponatremia, edema, deficiência de sentido primário (audição), dor aguda, potencial para injúria, diminuição na capacidade para o autocuidado, deficiência de sentido primário (visão), dificuldade para deambular, privação de sono, intolerância à atividade, risco para distúrbio no padrão de sono, processo de mobilidade restrito, diarréia, incontinência urinária, incontinência intestinal, retenção urinária, flatulência, constipação, vômitos, excesso de peso, anorexia, náuseas e transporte de gases inadequado.

Entretanto, segundo ressaltado pelo pesquisador, nenhum destes problemas deve ser considerado como particular ou isolado da situação clínica, já que o problema da angina, no grupo estudado, foi associado diretamente à idade avançada e à necessidade específica de tratamento. Paralelo a isto, outros problemas parecem ser bem característicos dos indivíduos com angina, tais como: intolerância à atividade, transporte de gases inadequado, dor aguda e diminuição na capacidade para o autocuidado, oriundos do mau funcionamento cardíaco(10).

No decorrer de todo o desenvolvimento do estudo, o conceito do modo fisiológico e de seus componentes foi bastante explorado. Portanto, desse modo, cumpriu seu objetivo geral. É interessante destacarmos que não foram encontrados problemas de adaptação relacionados ao componente proteção, não sendo, pois, mencionado no decorrer da análise do capítulo intitulado “O modo fisiológico: problemas comuns de adaptação e seus respectivos estímulos”.


Análise das Proposições


Proposições – Roy


Proposições do Estudo

 

1. Ações de enfermagem promovem respostas adaptativas

2. Ações de enfermagem podem diminuir respostas ineficazes

3. Pessoas interagem com o ambiente em mudança na tentativa de conseguir adaptação e saúde

4. Ações de enfermagem melhoram a interação das pessoas com o meio ambiente

5. Interações melhoradas das pessoas com o ambiente promovem adaptação


Estas proposições foram contempladas de forma sutil.

Quadro 3- Comparação entre as proposições de Roy e as apresentados no estudo. Fortaleza, CE, 2005.

Fonte: Roy e Andrews(10); Meleis(11), Lopes(12).


De maneira geral e de forma sutil, essas proposições foram destacadas no estudo, principalmente no capítulo sobre a assistência de enfermagem. Contudo, não foram avaliadas, já que o autor apresentou apenas um guia para auxiliar e agilizar o processo de atendimento às mulheres com angina pectoris. Como referido anteriormente, o estudo não abordou o desenvolvimento de todas as etapas do processo de enfermagem proposto por Roy, em especial por se tratar de estudo do tipo exploratório e descritivo, o qual não tinha objetivo de intervenção imediata.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A utilização do modelo de adaptação proposto por Sister Callista Roy apresentou validade e aplicabilidade no estudo em discussão, uma vez que possibilitou a determinação de aspectos relevantes para a assistência de enfermagem a mulheres com angina pectoris, considerando-as como um ser biopsicossocial, adaptativo e holístico.

Conforme percebemos, a partir da análise reflexiva, houve, de maneira geral, congruência entre os pressupostos, conceitos e proposições do modelo de adaptação de Roy e o estudo.

O modelo de análise de teorias de Meleis contribuiu de forma significativa para o objetivo proposto, e possibilitou uma visão ampliada da teoria de Sister Callista Roy, ao explicar a importância desta teoria para o desenvolvimento da enfermagem nos âmbitos do ensino, pesquisa e assistência.

Ressaltamos, mais uma vez, a importância de estudarmos teorias de enfermagem para maior aprofundamento da nossa práxis. O estudo ora desenvolvido permitiu-nos um olhar mais reflexivo e crítico sobre a utilização de teorias, e contribuiu para o desvelar de realidades pouco conhecidas.

Diante dessas considerações, é possível destacar que este estudo aponta novos desafios relacionados ao conhecimento e análise de teorias de enfermagem.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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