EDITORIAL

 

A busca do ambiente terapêutico: desafios contemporâneos na era da tecnologia

 

Ana Carla Dantas Cavalcanti1

 

1Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil

 

Às 05:53, dei início à redação deste editorial enquanto me encontrava em um hospital privado, acompanhando minha mãe, diagnosticada com demência e pneumonia. Perplexa diante da perda do tão prezado "ambiente terapêutico" defendido por Florence Nightingale, senti a urgência de abordar este tema antes mesmo do amanhecer, temendo perder o ímpeto motivacional que me impulsionava.

Esta temática já me inquietava antes mesmo de assumir a posição de editora deste periódico científico. Desde 2019, quando fui hospitalizada por 72 horas para realizar uma cesariana, pude observar como a hospitalização em instituições privadas havia se transformado em algo semelhante a uma estadia em hotel, com a introdução de diversos serviços terceirizados. Lamentavelmente, alguns desses serviços estavam vinculados a empresas que aproveitavam o contexto hospitalar para promover e vender seus produtos. Em meio à experiência do parto, em uma situação tão vulnerável, percebi-me confusa por não sentir que estava passando por um processo reparativo. Refleti sobre conceitos básicos, como o controle da iluminação e ruídos, e parecia-me evidente que o que eu mais necessitava era de descanso, especialmente quando minha filha cessava seu choro, confrontada com a dificuldade de adaptação ao mundo exterior ao útero. Contudo, esta preocupação não era compartilhada pela equipe de saúde... Nem pelos profissionais de limpeza, de vacinação e assim por diante... Todos entravam no quarto, acendiam as luzes, gentilmente me acordavam, cumprimentavam-me e questionavam sobre a limpeza realizada no dia anterior, além de outros assuntos relacionados ao controle de qualidade. A cada trinta minutos, alguém diferente entrava. Com perguntas diferentes, sempre acompanhados de muita luz e ruído. Todos acreditavam que estavam cuidando de mim, porém, estavam, na verdade, obstruindo meu processo de recuperação.

Posteriormente, vivenciei outra experiência de internação hospitalar com minha filha, com apenas dois meses de vida, na mesma instituição. As visitas eram menos frequentes, mas as interrupções noturnas eram constantes. Percebi que a prioridade da equipe de saúde era manter os horários padronizados. Recordando os agendamentos para a verificação de sinais vitais, muitas vezes realizados por mim e ensinados aos estudantes de Fundamentos de Enfermagem em aulas teórico-práticas, questionei a real necessidade desse procedimento desvinculado dos diagnósticos de enfermagem. Todos verificavam os sinais vitais a cada seis horas, como uma rotina estabelecida. Os pacientes eram acordados pelo menos uma vez durante o sono noturno, período crucial para o processo de reparação. Será que isso era realmente necessário para todos os pacientes? Será que, para alguns, a manutenção de um ambiente terapêutico não deveria ser priorizada?

Ao contemplar o ambiente ideal para o processo reparativo, descrito por Florence Nightingale(1) em 1898, tema central deste editorial, não posso deixar de evocar os ensinamentos de Wanda de Aguiar Horta sobre as necessidades humanas básicas, baseados na famosa pirâmide de Maslow(2). Refletindo sobre a prática e o ensino de enfermagem, questiono a preocupação excessiva com o monitoramento do estado hemodinâmico, considerando o impacto desse cuidado no sono e no repouso. Minha crítica, aqui apresentada, está relacionada às situações em que o paciente está hemodinamicamente estável e poderia ter seu sono preservado e priorizado para garantir o processo de recuperação por meio de um ambiente terapêutico. Parece óbvio que isso ocorreria na prática, se o processo de enfermagem fosse individualizado. Entretanto, observo que, mesmo em instituições reconhecidas pela qualidade do cuidado prestado, com bons indicadores de saúde, isso não ocorre. Mesmo diante da implementação do cuidado individualizado, a rotina de verificação de sinais vitais permanece inalterada.

Em um contexto de adaptação ao ambiente hospitalar e da necessidade de preservar energia para a reparação ou mesmo a recuperação diante do processo saúde-doença, o sono é frequentemente interrompido diversas vezes para a "verificação rotineira dos sinais vitais". Mas será essa a prioridade? Neste mesmo ano, minha filha de dois anos foi internada em outra instituição, também privada. Sem entrar em outras questões sobre o cuidado pediátrico, os horários para a verificação de sinais vitais eram os mesmos. Apenas a pressão arterial não era verificada, mas a saturação de oxigênio e outros parâmetros hemodinâmicos eram medidos a cada seis horas. Será que acordar uma criança assustada com a internação para verificar esses sinais era reparador? Questiono isso, pois ela não apresentava sinais ou sintomas respiratórios. Sua saturação oscilava entre 98% e 100% em todas as vezes que foi acordada e chorou assustada.

Quero deixar claro que não questiono a necessidade de verificar periodicamente os sinais vitais, mas sugiro uma reflexão sobre a manutenção de um ambiente terapêutico, o primeiro ensinamento da Enfermagem Moderna. Como professora de Fundamentos de Enfermagem há 20 anos, discutindo o pensamento crítico do enfermeiro como componente indispensável na prática, trago essa reflexão não só para os enfermeiros em exercício, mas também para os gestores, educadores e pesquisadores da área de enfermagem.

Estamos vivenciando a Era Digital, onde a inteligência artificial (IA) domina cada aspecto do cotidiano. Rotinizar a prática de enfermagem é o caminho mais curto para robotizá-la. É imperativo ponderar sobre seus possíveis benefícios e malefícios neste contexto. Por um lado, a IA pode oferecer ferramentas e sistemas que otimizem a gestão de cuidados de saúde, permitindo a coleta e análise de dados em tempo real para identificar padrões e tendências, além de auxiliar na tomada de decisões clínicas. No entanto, há o risco de que a aplicação indiscriminada da IA leve à padronização excessiva e à perda da individualização do cuidado, como já observamos com a rotinização da verificação de sinais vitais. Ademais, a crescente dependência da tecnologia pode afetar negativamente a relação entre profissionais de saúde e pacientes, reduzindo a empatia e a sensibilidade no cuidado. Além disso, a privacidade e segurança dos dados de saúde dos pacientes podem estar sujeitas a vulnerabilidades e ataques cibernéticos, levantando questões éticas e legais.

Portanto, ao abordar questões relacionadas ao ambiente terapêutico e à prática de enfermagem, é fundamental considerar o papel da inteligência artificial e seu impacto na humanização dos cuidados de saúde. Devemos buscar um equilíbrio entre a utilização de tecnologias inovadoras e a preservação da essência humanística da enfermagem, garantindo que o cuidado centrado no paciente permaneça como prioridade.

Convido os leitores e autores deste periódico a responderem a este editorial por meio de uma "Carta ao Editor", além de sugerir que futuros editoriais abordem a prática assistencial de enfermagem, promovendo o diálogo e o aprofundamento do tema sob a perspectiva da inteligência artificial e sua interação com o cuidado humano.

 

REFERÊNCIAS

1. Nightingale F. Notes on Nursing by Florence Nightingale. [local desconhecido]: Carol David and PG Distributed Proofreaders, 1898.

 

2. Horta WA. Processo de Enfermagem. Porto Alegre: EPU, 1979.

 

Imagem 1