PROTOCOLO DE REVISÃO
Risco de queda versus mobilidade segura em pessoas idosas: protocolo de revisão de escopo
Esther Mourão Nicoli1, Luciana Guimarães Assad1, Frances Valéria Costa e Silva1
1Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
RESUMO
Objetivo: Mapear, por meio de produções científicas, os elementos constitutivos do conceito de mobilidade segura presentes na assistência hospitalar a pessoas idosas. Método: Elaborou-se protocolo de scoping review fundamentado na metodologia proposta pelo Joanna Briggs Institute (JBI), que evidencia as etapas de estratégia de busca, seleção dos estudos, extração e sumarização dos dados, a partir de critérios delineados, de forma a responder à pergunta de pesquisa. Serão considerados os estudos que incluem indivíduos a partir de 60 anos, independente do sexo e das condições associadas, e excluídos os que não foram publicados na íntegra, ou cujo acesso não tenha sido possível. As evidências que expressam os elementos constitutivos do conceito de mobilidade segura aplicado ao contexto da assistência hospitalar a pessoas idosas podem auxiliar na tomada de decisão em saúde e na difusão de intervenções de enfermagem adequadas, bem como contribuir para o ensino, a extensão e a pesquisa.
Descritores: Acidentes por Quedas; Cuidado de Enfermagem ao Idoso Hospitalizado; Limitação da Mobilidade.
INTRODUÇÃO
A queda em pessoas idosas é um agravo que, apesar dos recorrentes esforços da equipe de enfermagem para mitigá-lo, ainda representa um dos eventos adversos de maior relevância em unidades hospitalares considerando frequência, impactos econômicos e desfechos(1).
Esse fato deve-se, em suma, aos programas e protocolos de prevenção de queda instituídos, que tendem a simplificá-la e enfatizar a prevenção do evento propriamente dito em detrimento da avaliação do risco de quedas em um plano de cuidados, o que culmina na valorização do somatório e documentação de escores obtidos pela aplicação de escalas específicas e no menor tempo de enfermagem destinado a intervenções propostas a fatores de risco modificáveis(2). Ao longo dos últimos 40 anos, não houve mudança significativa nas práticas de enfermagem no que tange à prevenção de quedas(3).
Em geral, os protocolos de prevenção de queda atêm-se a limitar a mobilidade do paciente ou melhorar a segurança do ambiente, sem considerar que os fatores intrínsecos são, na realidade, os maiores precursores(2). Entretanto, intervenções que limitam a mobilidade, como pulseiras com identificação de risco de queda, recomendações de repouso no leito ou banheiro cronometrado, além de propriamente não prevenirem a ocorrência de quedas, contribuem para o declínio funcional, aumentam o tempo de internação, o risco de re-hospitalização e predispõem à ocorrência de complicações que potencializam o risco de quedas futuras(4).
Metanálise recente evidenciou que pacientes passam de 87% a 100% do tempo de internação sentados ou deitados no leito(5). Outro estudo revelou que pessoas idosas saudáveis, em repouso no leito por 10 dias, apresentaram redução de 12% da capacidade aeróbica e quase 16% da força extensora do joelho, contribuindo para significativo declínio da capacidade funcional(2).
Assim, o termo “mobilidade segura” surge com a proposta de transição de perspectiva, avaliação e reconhecimento dos fatores de risco de quedas, destacando os intrínsecos, como de praxe em outras comorbidades e patologias sem, por sua vez, desconsiderar protocolos, escalas e fatores extrínsecos que também são relevantes, integrando estas preocupações ao plano de cuidados e à abordagem interprofissional(2). Essa abordagem implica maior pensamento crítico, mas não maior gasto de tempo: orientações de restrição ao leito devem ser pesadas e justificadas ou eliminadas, e deve-se compreender que a preservação da mobilidade envolve algum risco de queda, entretanto, um plano de mobilidade realista pode ser mais benéfico para o bem-estar da pessoa idosa do que o esforço para impedir quedas a qualquer custo(2).
Os enfermeiros, enquanto principais responsáveis pela gestão de cuidados hospitalares, dentre eles, a prevenção de quedas, devem ser influentes na introdução e disseminação de melhorias à qualidade da assistência, priorizando aquilo que é realmente importante para cada paciente, por meio de intervenções adequadas.
Com esse propósito, realizou-se busca preliminar nas bases de dados em saúde Medline (via Pubmed), CINAHL (via EBSCO) JBI Database of Systematic Reviews and Implementation Reports, resultando em escassez de estudos acerca da temática, o que motivou a proposta de elaboração de uma revisão de escopo, devido à possibilidade de mapeamento da literatura sobre o campo de interesse, sobretudo, considerando que revisões sobre o tema ainda não foram publicadas(6). Essa percepção motivou a proposta de redação de uma revisão de escopo, pela possibilidade de examinar a extensão, o alcance e a natureza das evidências, esclarecer conceitos, resumir descobertas e identificar as lacunas na literatura, além de sistematizar e disseminar achados que podem contribuir para as práticas, políticas e pesquisa(7).
As revisões de escopo podem, além de evidenciar como uma pesquisa em uma área é conduzida, subsidiar tomadores de decisões quanto à origem de um conceito e como este vem sendo estudado ao longo do tempo(8).
Por conseguinte, o objetivo desta revisão de escopo será mapear os elementos constitutivos do conceito de mobilidade segura presentes na assistência hospitalar a pessoas idosas.
MÉTODO
A presente revisão será conduzida pela metodologia scoping review (revisão de escopo) proposta pelo Joanna Briggs Institute (JBI) em seis etapas: 1) identificação da questão e objetivo da pesquisa; 2) identificação de estudos relevantes que viabilizem a amplitude e abrangência dos propósitos da revisão; 3) seleção de estudos, conforme critérios predefinidos; 4) mapeamento de dados; 5) sumarização dos resultados, por meio de análise temática qualitativa em relação ao objetivo e à pergunta; e 6) apresentação dos resultados, identificando as implicações para política, prática ou pesquisa.
Considerar-se-ão, ainda, as recomendações do checklist Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR) Checklist, composto por 22 itens(7).
O protocolo de revisão de escopo foi registrado no Open Science Framework (OSF), sob o DOI: 10.17605/OSF.IO/EDHF6.
Estratégia de pesquisa e identificação de estudos
A elaboração da pergunta de pesquisa será orientada pelo guia da JBI, na qual serão considerados os elementos do mnemônico PCC - P (população/participante), C (conceito) e C (contexto)(9). Para população/participante, serão contempladas as pessoas idosas – indivíduos com 60 anos ou mais, conforme classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para países em desenvolvimento, da Política Nacional do Idoso (Lei 8.842, de 1994) e denominado pelo Estatuto da Pessoa Idosa (Lei 14.423, de 2022) -, de ambos os sexos. Para o conceito, serão integrados estudos que definam, relatem ou disponham sobre a mobilidade segura – abordagens pertinentes que auxiliam ou encorajam as pessoas idosas a se movimentarem diariamente, com segurança, visando preservação da capacidade funcional - e os fatores associados à promoção desta (gerenciamento de dor, deficiências na força, equilíbrio ou marcha e medicamentos). Para o contexto, serão incorporados estudos que envolvam assistência à pessoa idosa hospitalizada, em diversas circunstâncias (clínica, cirúrgica, dentre outras), abrangendo hospitais públicos ou privados, de pequeno, médio ou grande porte, podendo ser de ensino, geral, especializado, urbano ou rural.
Essa estratégia será empregada para responder à questão: quais são as evidências científicas nacionais e internacionais acerca da definição e das características elencadas no conceito de mobilidade segura, no tocante às pessoas idosas hospitalizadas com risco de queda?
A estratégia de busca foi desenvolvida para identificar estudos publicados nos idiomas inglês, espanhol e português, em variadas fontes de evidências, abarcando pesquisas com abordagem quantitativa e qualitativa, estudos primários, revisões sistemáticas e/ou metassínteses, livros e guidelines publicados em fontes indexadas ou na literatura cinzenta, disponíveis on-line nas bases de dados consultadas. Adicionalmente, serão considerados documentos de opinião, relatórios, relatos de caso e textos institucionais com relevância na área da geriatria/gerontologia.
Nenhuma restrição de data de publicação será imposta nas buscas. Serão considerados os estudos que incluem indivíduos com 60 anos ou mais, independente do sexo e das condições associadas e que tenham definido/relatado a mobilidade segura. Por sua vez, serão excluídos os artigos que não foram totalmente publicados nos idiomas selecionados descritos acima, que foram publicados apenas como resumo, que não estejam disponíveis para acesso na íntegra mesmo após tentativa de contato com os autores, e, ainda, as cartas ao editor e os comentários.
Seguindo orientações da JBI, uma estratégia de busca em três etapas será utilizada. Inicialmente, para a identificação dos termos de busca, consultaram-se os vocábulos controlados da área da saúde DeCs (Descritores em Ciências da Saúde), MeSH (Medical Subject Headings) e Emtree (Embase Subject Headings) e utilizou-se uma estratégia preliminar nas bases PUBMED e CINAHL, em janeiro de 2022, conforme Figura 1.
Estratégia de busca |
Bases de dados |
Resultados |
(((aged OR elderly OR old people) AND (fall risk)) AND (safe mobility)) AND (hospital) |
PubMed (Medline) |
Filtros: - Resultados: 18 |
(aged OR elderly OR senior OR older people) AND (safe mobility) AND (hospital) |
CINAHL |
Filtros: - Resultados: 9 |
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Figura 1 – Estratégia de busca inicial em base de dados. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2022
A busca inicial foi seguida pela análise das palavras do texto contidas no título e resumo dos artigos recuperados e dos termos de indexação usados para descrever os estudos.
Na segunda etapa, será realizada a revisão de literatura nas bases de dados Medline (via Pubmed), CINAHL (via EBSCO), Embase, Web of Science, LILACS e Scopus. A estratégia de busca será adaptada a cada base de dados e incluirá as seguintes palavras-chave:
P (população/participante) – middle aged (pessoa de meia-idade) / aged (idoso) / old people (pessoa idosa) / old person (pessoa idosa) / elderly (idoso) / Elder (mais velho) / sênior (mais velho) / geriatric (geriátrico) / gerontologic (gerontológico) / older people (pessoa mais velha) / older person (pessoa mais velha) / fall risk (risco de queda) / fall (queda) / fall reduction (redução de queda) / fall prevention (prevenção de queda). É importante notar que o termo “idoso”, geralmente, refere-se a pessoas de 65 a 79 anos de idade, portanto, a fim de não limitar as buscas a idosos jovens, também serão incluídos termos de indexação que abranjam indivíduos de 80 anos ou mais. Para elencar indivíduos entre 60 e 65 anos, será incluído o termo “pessoa de meia-idade”, que se refere a indivíduos com idades entre 45 e 64 anos.
C (conceito) – Mobilidade segura / Safe mobility
C (contexto) - Hospital Care (Assistência hospitalar) / Hospitals (hospitais)
Essa busca objetiva encontrar evidências científicas para responder à pergunta de pesquisa proposta nesta revisão de escopo. Não serão aplicados filtros de idiomas, data e desenho de estudo.
Na terceira etapa, a pesquisa terciária será realizada para identificar estudos adicionais, a partir do exame das listas de referências dos materiais que serão objetos de estudo na pesquisa. Na impossibilidade de extração ou dúvidas com relação a algum texto completo de interesse, os revisores entrarão em contato com os autores dos estudos primários para obter mais informações. As fontes de informação serão: Medline (via Pubmed), CINAHL (via EBSCO), Embase, Web of Science, LILACS e Scopus. A busca por literatura cinzenta não publicada incluirá: sites de sociedades e instituições envolvidos com cuidado ao idoso e à prevenção de quedas, além da Biblioteca Digital em Rede de Teses e Dissertações da CAPES.
Seleção dos estudos
Para gestão dos resultados da pesquisa, será utilizado o software Rayyan QCRI, de acesso livre e gratuito. Os estudos recuperados das bases de dados serão importados para o referido software, no qual serão agrupados e excluídos os duplicados. Os títulos e resumos serão selecionados por dois revisores independentes, com cegamento por meio do mesmo aplicativo, a fim de avaliarem a pertinência, de acordo com os critérios para inclusão nesta revisão de escopo. As discordâncias serão resolvidas por consenso entre eles ou terceiro pesquisador, que resolverá os conflitos. Em caso de persistência de dúvida, a referência será encaminhada para leitura na íntegra. Os resultados da pesquisa serão descritos e representados no diagrama de fluxo Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and meta-analysis for scoping reviews (PRISMA-ScR)(7).
Extração e apresentação dos dados
Os dados serão extraídos por dois revisores, que preencherão formulário eletrônico sobre as características de cada estudo (título, ano de publicação, base de dados, autores, país de origem, objetivos, desenho do estudo e trechos com os principais resultados de interesse desta revisão), elaborado com base em referências prévias, conforme Figura 2. Os referidos dados serão organizados e armazenados em planilha no programa Excel e apresentados de forma narrativa, com recursos de quadros e tabelas, mediante consenso dos revisores, sendo quaisquer divergências resolvidas pelo terceiro revisor.
Risco de queda versus mobilidade segura em pessoas idosas: protocolo de revisão de escopo |
|
Instrumento de extração de dados |
|
Título |
|
Ano de publicação |
|
Base de dados |
|
País de origem |
|
Objetivos |
|
Desenho de estudo |
|
População |
|
Local de estudo |
|
Conceitos de mobilidade |
|
Resultados encontrados |
|
Referências encontradas |
|
Fonte: Elaborado pelos autores, 2022.
Figura 2 – Instrumento de extração de dados. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2022
Sumarização dos dados
Para etapa de sumarização dos elementos essenciais de cada estudo, será empregada a estrutura analítica-descritiva para análise do texto de cada artigo. Para isso, será procedida análise qualitativa do conteúdo e extração de características-chave presentes nos conceitos de mobilidade segura, com a finalidade de identificar semelhanças, diferenças e complementaridades.
Apresentação e interpretação
O mapeamento dos elementos constitutivos do conceito de mobilidade segura na atenção hospitalar com idosos identificados com risco de queda possibilitará a elucidação do conceito e o respectivo emprego, de forma a contribuir com a gestão de cuidados e as políticas de saúde gerontológicas, atendendo aos objetivos de uma scoping review.
Resultados esperados
As evidências que expressam os elementos constitutivos do conceito de mobilidade segura aplicado ao contexto da assistência hospitalar às pessoas idosas podem auxiliar na tomada de decisões em saúde e na difusão de intervenções de enfermagem que visam prevenção de quedas, considerando a manutenção da funcionalidade do idoso e promoção da qualidade de vida, bem como a prestação de assistência adequada e qualificada, utilizando-se do cuidado colaborativo.
As contribuições poderão abranger, ainda, a área de ensino e extensão, considerando os subsídios inovadores para discussão e incorporação de cuidados de enfermagem a pessoas idosas, além de gerar referencial temático para novas pesquisas, ampliando o número de estudos com impacto e relevância científica.
CONFLITO DE INTERESSES
Os autores declaram não haver conflito de interesses.
1. Keuseman R, Miller D. A hospitalist’s role in preventing patient falls. Clinical Focus: Geriatric Medicine. 2020;48(1):63-67. https://doi.org/10.1080/21548331.2020.1724473
2. Hendrich A. Reimagining injurious falls and safe mobility. American Journal of Nursing. 2021;121(9):34-44. https://doi.org/10.1097/01.NAJ.0000790188.10474.10
3. Resnick BF. Falls: do we know anything more than we did 40 years ago?. Geriatr Nurs. 2020;41(2):67-8. https://doi.org/10.1016/j.gerinurse.2020.03.009
4. Wald HL, Ramaswamy R, Perskin MH, Roberts L, Bogaisky M, Suen W, et al. The case for mobility assessment in hospitalized older adults: American Geriatrics Society white paper executive summary. J AM Geriatric Soc. 2019;67(1):11-16. https://doi.org/10.1111/jgs.15595
5. Fazio S, Strocking J, Kuhn B, Doroy A, Blackmon E, Young HM, et al. How much do hospitalized aldults move? A systematic review and meta-analysis. Appl Nurs Res. 2020;51:151-189. https://doi.org/10.1016/j.apnr.2019.151189
6. Cordeiro L, Soares CB. Revisão de escopo: potencialidades para a síntese de metodologias utilizadas em pesquisa primária qualitativa. Síntese de evidências qualitativas para informar políticas de saúde. BIS, Bol Inst Saúde [Internet]. 2019 [citado 2022 Mar 04];20(2):1-7. Disponível em: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2019/10/1021863/bis-v20n2-sintese-de-evidencias-qualitativas-37-43.pdf
7. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O’Brien KK, Colquhoun H, Levac D, et al. PRISMA extension for scoping reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467-473. https://doi.org/10.7326/M18-0850
8. Peters MDJ, Godfrey C, Mclnerney P, Munn Z, Tricco AC, Khalil H. Chapter 11: Scoping Reviews (2020 version). In: Aromataris E, Munn Z, editors. JBI Manual for Evidence Synthesis [Internet]. Adelaide: JBI; 2020 [citado 2022 Mar 09]. Disponível em: https://synthesismanual.jbi.global/. https://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12
9. Peters MDJ, Marnie C, Tricco AC, Pollock D, Munn Z, Alexander L, et al. Updated methodological guidance for the conduct of scoping reviews. JBI Evidence Synthesis. 2020;18(10):2119-2126. https://doi.org/10.11124/JBIES-20-00167
Submissão: 01/05/2022
Aprovado: 14/11/2022
CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA |
Concepção do projeto: Nicoli EM, Silva FVC Obtenção de dados: Nicoli EM Análise e interpretação dos dados: Nicoli EM Redação textual e/ou revisão crítica do conteúdo intelectual: Nicoli EM, Assad LG, Silva FVC Aprovação final do texto a ser publicada: Assad LG, Silva FVC Responsabilidade pelo texto na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Nicoli EM |