ORIGINAL

 

Uso de tecnologias de informação e comunicação: estudo quantitativo com enfermeiros gestores hospitalares

 

Tania Maria Tacca Zunkowski1, Letícia de Lima Trindade1, Karen Cristina Kades Andrigue1, Maria Manuela Ferreira Pereira da Silva Martins2, Simone Coelho Amestoy3, Junir Antonio Lutinski1, Olga Maria Pimenta Lopes Ribeiro2

 

1 Universidade Comunitária da Região de Chapecó, Chapecó, SC, Brasil

2 Escola Superior de Enfermagem do Porto, Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde, Porto, Portugal

3 Universidade do Vale do São Francisco, Petrolina, PB, Brasil

 

RESUMO

Objetivo: analisar a percepção da utilidade das tecnologias de informação e comunicação na gestão hospitalar por enfermeiros. Método: estudo quantitativo, transversal e correlacional, com 91 enfermeiros gestores de três hospitais. Utilizaram-se um questionário e a Escala de Percepção do Trabalho do Gestor em Enfermagem, sendo os dados submetidos a análise descritiva e analítica. Resultados: sobre a percepção de utilidade das tecnologias de informação e comunicação, os gestores trouxeram o prontuário, a internet, os grupos de discussão, dentre outros, como muito úteis. Variáveis como sexo, idade, formação, tempo no serviço e na gestão mostram-se significativas para a utilização de ferramentas tecnológicas específicas. Conclusão: o uso das tecnologias de informação e comunicação entre enfermeiros gestores hospitalares requer observar o perfil, investir em sua formação e considerar as características do contexto de trabalho.

 

Descritores: Enfermagem; Gestão em Saúde; Tecnologia da Informação.

 

INTRODUÇÃO

No contexto hospitalar, o enfermeiro desponta como importante gestor, coordenador de pessoas e de serviços indispensáveis para o melhor cumprimento da missão e dos objetivos dessas instituições, que prestam serviços singulares no cuidado aos usuários(1).

Nesse cenário, a Enfermagem representa o maior percentual do quadro de pessoal, exigindo dos enfermeiros uma maior capacidade adaptativa e a aquisição de novas competências que consigam responder à demanda dos cuidados à saúde do indivíduo hospitalizado. Assim, esse profissional ocupa papel fundamental na gestão da assistência à saúde, com conhecimento, habilidades e atitudes adequadas para desempenhar as suas funções gerenciais com eficácia, desenvolvendo múltiplas tarefas com alto grau de exigência, o que pode interferir na qualidade do cuidado, a depender da forma como está organizado o seu trabalho e dos conhecimentos e práticas adotadas(2).

Contudo, a atuação do enfermeiro como gestor sofre interferências que podem comprometer seu desempenho, dentre as quais se destacam as seguintes: condições de trabalho insatisfatórias; tensão provocada pela pressão da demanda excessiva; falta de recursos materiais; qualidade insatisfatória e ausência de integralidade no Sistema de Saúde; precariedade dos sistemas de informação operacionais, dificultando a avaliação de resultados; falta de política de desenvolvimento integrado das pessoas; decisões políticas (ingerência política); interesses político-partidários externos à vida organizacional; falta de conhecimento técnico-científico sobre o Sistema de Saúde, como também sobre as leis, normas e diretrizes que regem a saúde(3).

Contrapondo o descrito, destaca-se que alguns elementos otimizam a gestão pela Enfermagem, dentre os quais se encontram as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). Estudo internacional apontou que as TIC têm um grande potencial para simplificar e agilizar o processo de gestão dos enfermeiros nos serviços de saúde, bem como para melhorar a coordenação da prestação de cuidados e liderar as equipes(1).

Nessa direção, a contribuição da tecnologia na gestão tem influência na eficiência, eficácia e segurança dos cuidados. Entre as tecnologias, as TIC são consideradas meios técnicos usados para tratar a informação e auxiliar na comunicação(1). No contexto da gestão em saúde, o progresso das TIC permite a operacionalização de processos e a captação de dados de fontes altamente variadas de maneira mais ágil e fácil, moldando cada vez mais o domínio da saúde, de modo a oferecer oportunidades, bem como revelar novos e imprevistos cenários de aplicação. Como resultado, o setor de saúde em geral é potencialmente beneficiado, uma vez que se esperam melhoria da qualidade dos serviços médicos e redução dos custos de saúde, apesar do aumento da demanda devido ao envelhecimento da população(1,4).

Contudo, mesmo as tecnologias podendo ser úteis na resolução de problemas na prática do enfermeiro, sua eficácia depende do grau de senso crítico do profissional para saber em quais momentos essas ferramentas auxiliam(5). Dessa forma, reconhecer a percepção da utilidade das tecnologias poderá contribuir na compreensão dos processos de trabalho em enfermagem e ainda auxiliar na prática da gerência de enfermagem. Também cabe lembrar a importância da instituição em valorizar tais recursos gerenciais, atuando na aprendizagem constante dos enfermeiros gestores. Frente ao exposto, objetivou-se analisar a perpepção da utilidade das tecnologias de informação e comunicação na gestão hospitalar por enfermeiros.

 

MÉTODO

Realizou-se uma investigação quantitativa, transversal e correlacional em três instituições hospitalares localizadas em Santa Catarina, selecionadas por se destacarem como principais cenários de ensino e de assistência pública na região oeste do estado. Os cenários foram nomeados como hospitais 1, 2 e 3, onde trabalhavam, no conjunto, 105 enfermeiros em atividades gerenciais.

Com a finalidade de definir o quantitativo de participantes, foi adotado um nível de confiança de 95% e uma margem de erro de 5%. Desse modo, foi estabelecido o desenho amostral de 83 enfermeiros gestores. Para a seleção, utilizaram-se os seguintes critérios: atuar como enfermeiro gestor nos serviços de interesse, com no mínimo três meses de experiência profissional. Foram excluídos enfermeiros afastados dos serviços por qualquer motivo. O convite para o estudo foi dirigido a todos os enfermeiros que atenderam aos critérios de inclusão, totalizando, desse modo, uma amostra com 91 profissionais.

Para a coleta de dados, utilizaram-se um questionário sobre as características sociolaborais e a Escala de Percepção do Trabalho do Gestor em Enfermagem (EPTGE), que se trata de um instrumento autodirigido aos gestores de enfermagem, construído e validado em Portugal(6). A EPTGE organiza-se em grupos. O Grupo I contém 42 questões distribuídas em cinco domínios: Prática profissional, ética e legal; Gestão de cuidados; Gestão de pessoas; Intervenção política e assessoria; e Desenvolvimento profissional. O Grupo II foi analisado neste manuscrito para levantamento das TIC utilizadas pelos enfermeiros e sua utilidade. Para as respostas, tem-se uma escala do tipo Likert, sendo: valor um = inútil/nada fácil; valor dois = pouco útil/pouco fácil; valor três = útil/fácil; valor quatro = muito útil/muito fácil; e valor cinco = desconhece. Além disso, o instrumento possui um espaço para comentários dos participantes acerca do tema.

O instrumento passou por tradução transcultural durante um projeto de dissertação, sendo coorientado pela Autora. Para isso, contou-se também com um pré-teste de enfermeiros não participantes do estudo atuantes de outros cenários hospitalares. Seu uso nesta pesquisa obteve um Alfa de Cronback de 0,95. Os dados foram coletados entre os meses de outubro de 2019 e janeiro de 2020.

Mediante aceite prévio e agendamento, os participantes foram contactados e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias, bem como receberam o questionário físico, sendo agendada a data de entrega da cópia física autopreenchida.

Os achados foram tabulados em um banco de dados construído na plataforma do software Excel for Windows (2019), sendo analisados com auxílio do Programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 21.0. As variáveis quantitativas foram descritas por média e desvio padrão ou mediana e amplitude interquartílica, enquanto as variáveis categóricas foram descritas por frequências absolutas e relativas. Para testar a associação entre variáveis categóricas, foi utilizado o teste qui-quadrado de Pearson ou exato de Fisher. Foram testadas diferenças entre grupos formados a partir das variáveis quantitativas. Nesse caso, a distribuição dos dados foi testada por meio do teste de normalidade de Shapiro-Wilk, sendo utilizados os testes não paramétricos de Mann-Whitney (U) e Kruskal-Wallis (Hc). O nível de significância adotado foi de 5% (p<0,05).

O estudo respeitou os cuidados éticos preconizados pelas Resoluções 466/CNS/2012 e 510/2016, visando preservar dignidade, direitos, segurança e bem-estar do participante. O projeto foi aprovado em Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, via Plataforma Brasil (parecer n. 3.649.424/2019).

 

RESULTADOS

Participaram 91 enfermeiros, distribuídos em três hospitais, dentre os quais predominaram mulheres (n=82/90,1%), com companheiro (n=66/72,5%), com média de idade dos profissionais de 34,6 anos (±7,6), sendo o mais jovem com 24 anos e o mais experiente com 61 anos, com tempo de atuação profissional de sete anos (amplitude entre 4 a 15 anos). Na área da gestão, apresentaram em média um ano de atuação (amplitude menos de um ano a sete anos) e em média cinco anos atuando no serviço atual (amplitude entre 4 a 15 anos), no qual exercem uma jornada de 44 horas semanais. Dentre os enfermeiros, 16 gestores atuavam em outros serviços (17,6%) e 33 (36,3%) atuaram como técnicos de enfermagem.

Sobre a formação, 63,7% (n=58) obtiveram o título de enfermeiro em uma universidade privada, 74,7% (n=68) dos enfermeiros possuíam formação específica na área de gestão e 83,5% (n=76) com especialização, com destaque para aquelas em Unidade de Tratamento Intensivo (n=26/28,6%), Urgência e Emergência (n=14/15,4%), Cardiologia (n=11/12,1%) e Oncologia (n=10/11%). Dentre as formas de modalidade para aprimoramento profissional mais mencionadas pelos participantes da pesquisa, emergiram a internet (n=62/68,1%), os eventos científicos (n=60/65,9%), a pós-graduação (n=58/63,7%), os grupos de estudo (n=19/20,9%) e os cursos de curta duração (n=6/6,6%).

A Tabela 1 apresenta a percepção do enfermeiro sobre a disponibilidade das tecnologias na gestão em enfermagem.

 

Tabela 1 – Disponibilidade das tecnologias de informação e comunicação para o trabalho na gestão dos serviços de saúde (n=91). Chapecó, SC, Brasil, 2020

Variáveis Utilidade dos recursos tecnológicos para a prática de gestão do enfermeiro

Inútil

Pouco Útil

Útil/Muito Útil

Desconheço

n (%)

n (%)

n (%)

n (%)

Correio eletrônico e outras formas de comunicação virtual

1 (1,1)

12 (13,2)

55(60,5)

3 (3,3)

Anos de experiência

U = 347,5; p= 0,045

Anos no serviço

U = 340; p = 0,036

Escore dos domínios

U = 338; p = 0,035

Sexo

X2 = 11,7; p = 0,39

Prontuário do paciente

1 (1,1)

1 (1,1)

89(97,8)

0 (0,0)

Sexo

X2 = 13,3; p = 0,01

Outros dispositivos de informação de dados do usuário (Ex.: E-SUS)

2 (2,2)

10 (11,0)

55(60,5)

24 (26,4)

Formação específica

X2 = 15,02; p = 0,02

Tempo de experiência na gestão

Hc = 11,8; p = 0,19

Grupos de discussão/estudo de caso/reunião de equipe

1 (1,1)

6 (6,6)

84(92,4)

0 (0,0)

Anos de serviço

U = 383,5; p = 0,031

Escore dos domínios

U = 351,5; p = 0,013

Sexo

X2 = 10,9; p = 0,028

Internet/Intranet

1 (1,1)

3 (3,3)

84(92,3)

3 (3,3)

Sexo

X2 = 14,7; p = 0,012

Mídias virtuais (blog, facebook, instagram)

 

25(27,5)

 

30(33,0)

 

26 (45,1)

 

10 (11,0)

Hospital de atuação

X2 = 18,8; p = 0,044

Fórum/Simpósio/Vídeo Conferências

3 (3,3)

9 (9,9)

76 (83,6)

3 (3,3)

Idade

Hc = 9,8; p = 0,044

Sexo

X2 = 13,9; p = 0,016

Protocolos/ Procedimento Operacional Padrão (POP), Fluxogramas

2 (2,2)

1 (1,1)

88(96,7)

0 (0,0)

Planilhas (Registro de passagem de plantão/controle de alta/Indicadores da assistência

4 (4,4)

1 (1,1)

86(94,5)

0 (0,0)

Idade

U = 181,5; p = 0,41

Sistematização da Assistência ou Processo de Enfermagem

4 (4,4)

5 (5,5)

82(90,1)

0 (0,0)

Hospital de atuação

X2 = 15,8; p = 0,045

Materiais Informativos (Cartilhas/Folder/Boletim informativos)

6 (6,6)

13 (14,3)

68 (74,8)

4 (4,4)

Ramais de comunicação/telefonia fixa/WhatsApp

4 (4,4)

8 (8,8)

56(61,5)

2 (2,2)

Hospital de atuação

X2 = 18,6; p = 0,045

n= quantitativo; %= frequência; U= Mann Whitney; p= nível de significância; X2= coeficiente qui-quadrado de Pearson; Hc= Kruskal-Wallis

Fonte: Elaborado pelos autores, 2020.

 

Evidenciou-se que 83,5% dos enfermeiros referem como muito útil a utilização do prontuário eletrônico na gestão do setor. Além disso, 74,7% afirmam ser muito útil a presença de protocolos, Protocolos Operacionais Padrão e fluxogramas para sua prática diária. Por outro lado, 26,4% dos entrevistados relatam desconhecer o software E-SUS, assim como 11% o consideram pouco útil para a gestão hospitalar. A maioria apontou ser de grande relevância a utilização de planilhas (63,7%), o processo de enfermagem (58,2%) e o uso de Internet (56%).

A Tabela 2 apresenta a percepção do enfermeiro sobre a adesão aos recursos tecnológicos na gestão. Evidenciou-se que percebem como útil a utilização de protocolos, fluxogramas e POP (64,8%), assim como as planilhas (53,8%) e o processo de enfermagem (57,1%). No quesito dificuldade, o E-SUS é citado por 27,5% dos participantes como pouco fácil ou nada fácil, seguido pela menção às reuniões de equipe (23,1%) e videoconferências (36,3%).

 

Tabela 2 Adesão das tecnologias na gestão (n=91). Chapecó, SC, Brasil, 2020

Classificação segundo a utilidade dos recursos tecnológicos na prática de gestão do enfermeiro

Inútil

Pouco Útil

Útil/Muito Útil

Desconheço

n (%)

n (%)

n (%)

n (%)

Correio eletrônico e outras formas de comunicação virtual

1 (1,1)

9 (9,9)

75(82,4)

6 (6,6)

Escore dos domínios

Hc = 8,66; p = 0,047

Prontuário do paciente

0 (0,0)

7 (7,7)

84(92,3)

0 (0,0)

Anos de experiência

Hc = 8,54; p = 0,014

Outros dispositivos de informação de dados do usuário (Ex.: E-SUS)

6 (6,6)

19 (20,9)

36 (39,6)

30 (33,0)

 

Grupos de discussão/estudo de caso/reunião de equipe

1 (1,1)

20 (22,0)

67(73,6)

3 (3,3)

Hospital de atuação

X2 = 23,8; p = 0,008

Internet/Intranet

2 (2,2)

7 (7,7)

76(83,5)

6 (6,6)

Mídias virtuais (blog, facebook, instagram)

7 (7,7)

14 (15,4)

41(45,1)

29 (31,9)

 

Hospital de atuação

X2 = 21,9; p = 0,016

Fórum/Simpósio/Vídeo Conferências

4 (4,4)

29 (31,9)

51 (56,1)

7 (7,7)

Protocolos/Procedimento Operacional Padrão (POP)/fluxogramas

0 (0,0)

8 (8,8)

82(90,1)

1 (1,1)

Planilhas (Registro de passagem de plantão/controle de alta/Indicadores da assistência)

0 (0,0)

4 (4,4)

49 (53,8)

1 (1,1)

Sistematização da Assistência ou Processo de Enfermagem

2 (2,2)

19 (20,9)

86(73,6)

3 (3,3)

Materiais Informativos (Cartilhas/Folder/Boletim informativos)

0 (0,0)

11 (12,1)

75 (82,4)

5 (5,5)

Anos no serviço

Hc = 12,8; p = 0,005

Ramais de comunicação/telefonia fixa/Whatsapp

1 (1,1)

4 (4,4)

82(90,1)

4 (4,4)

Hospital de atuação

X2 = 20,8; p = 0,022

Calendário online, dispositivos de agenda coletiva

2 (2,2)

11 (12,1)

40(44)

38(41,8)

Anos no serviço

Hc = 11,35; p = 0,023

n= quantitativo; %= frequência; U= Mann Whitney; p= nível de significância; X2= coeficiente qui-quadrado de Pearson; Hc= Kruskal-Wallis

Fonte: Elaborado pelos autores, 2020.

 

DISCUSSÃO

Quanto ao perfil sociolaboral dos enfermeiros, merece destaque o predomínio de enfermeiras jovens e com companheiros, achado similar ao registrado pela literatura nacional e internacional, que aponta a enfermagem como predominantemente feminina, adulta jovem, na faixa etária dos 30 anos de idade, apresentando vínculo com companheiros(1,7-9).

Contudo, merecem destaque estudos que discutem a faixa etária sob o prisma das exigências inerentes à profissão, as quais se refletem no mercado de trabalho, pois somente 2,1% dos profissionais em atuação no Brasil têm mais de 60 anos. Nessa seara, a exposição a atividades laborais de intenso desgaste físico e psicológico, além dos riscos biológicos, gera os afastamentos profissionais precoces, sendo que seis em cada dez profissionais têm menos de 40 anos(8-9).

Além disso, outros estudos reforçam que, embora as novas gerações de mulheres se tornem usuárias muito precoces da tecnologia, mesmo em porcentagens que excedem as dos homens, sua presença no estudo, projeto e desenvolvimento de tecnologias e TIC continua sendo minoritária. Autores retomam ainda que a inovação e a gestão do conhecimento digital são principalmente masculinas, sendo importante a educação tecnológica das mulheres para reduzir o hiato tecnológico de gênero(1,10).

Referente ao perfil acadêmico, destaca-se que os achados vão ao encontro dos dados em nível nacional, os quais apontam que a formação profissional de enfermeiros se dá em sua maioria (57,4%) em instituições privadas de ensino superior, sendo as públicas responsáveis pela formação de 35,6% do contingente e as filantrópicas por menos de 5%(10). Ressalta-se ainda que esse perfil tende a se manter, considerando-se a distribuição geográfica das instituições superiores de ensino, o incremento dos cursos na modalidade Educação a Distância (EAD), como também o funcionamento de cursos noturnos(11).

Convém mencionar que um número expressivo de enfermeiros possui formação específica na área de gestão, refletindo interesse dos participantes em desenvolver competências e habilidades gerenciais, de modo a respaldar suas ações em conhecimentos científicos. Nesse sentido, a formação promove o desenvolvimento de habilidades importantes para o uso das tecnologias nas atividades(1).

Acredita-se que adesão e habilidades no uso das TIC potencializam a gestão de tempo e da comunicação entre membros da equipe, bem como entre a equipe e os pacientes. Além disso, favorece a tomada decisões gerenciais e clínicas, especialmente entre os enfermeiros, pois ocupam posições de gerenciamento em diferentes serviços de saúde e em todos os níveis assistenciais.

Nessa seara, quanto à disponibilidade de TIC, cumpre destacar que o prontuário eletrônico demostrou resultados positivos tanto na utilidade quanto na adesão pelos enfermeiros. Destaca-se que os cuidados de saúde estão evoluindo rapidamente para atender às necessidades de mudança de nossos pacientes cada vez mais complexos. As TIC emergentes, como os registros eletrônicos de saúde, desafiam a prática de enfermagem a redesenhar o fluxo de trabalho, incluindo as tecnologias nas práticas de gestão(12).

Estudos apontam que o Prontuário Eletrônico contribui para o cuidado integral, pois seu acesso pode ser realizado em diversos locais da rede assistencial de saúde, o que promove agilidade no diagnóstico clínico, na conduta e no tratamento, otimizando assim o tempo do paciente e dos profissionais da saúde(12).

Emergem, ainda, como tecnologia disponível e de fácil adesão, os Protocolos Operacionais Padrão, os quais configuram tecnologias gerenciais que o profissional enfermeiro pode utilizar para melhorar a qualidade da assistência prestada e recurso para padronização das intervenções de enfermagem(13). Esses protocolos devem ser construídos em equipe, levando em consideração a realidade do serviço e estimulando o alcance de melhorias em suas atividades(13).

Sobre a utilização de planilhas (registro de passagem de plantão/controle de alta/indicadores da assistência) e outros métodos manuais de tecnologia na gestão hospitalar, durante o estudo, foi identificada uma quantidade expressiva de profissionais que utilizam e têm boa adesão a essas tecnologias. A exemplo disso, outro estudo, com a utilização de tais tecnologias, demostrou que estas, além da contribuição no planejamento, na organização e na otimização dos serviços de enfermagem, identificam os problemas relacionados a assistência, dimensionamento e gerenciamento de enfermagem, a fim de modificar e influenciar positivamente o cuidado prestado ao paciente. Nesse sentido, é uma das ferramentas gerenciais para o monitoramento e a avaliação da produtividade e qualidade assistencial prestada ao paciente em ambientes hospitalares(14).

Entretanto, a utilização dessas tecnologias é alvo de muitas críticas, pois são consideradas burocratizantes, visto que, atualmente, existem outras tecnologias digitais (a exemplo das Web aplicações, aplicativos para telefone móveis ou tabletes de gestão, softwares de planejamento, entre outros) que fornecem os mesmos recursos de forma mais organizada, de fácil acesso e democrática, auxiliando no planejamento, na tomada de decisão, no controle gerencial, na qualidade da assistência e na comunicação entre os profissionais(15). Destaca-se, ainda, que, em uma investigação realizada em Portugal sobre a utilidade das TIC na prática de enfermagem, os fatores que condicionaram a valorização do SClínico®, que nesse país é a tecnologia que incorpora itens tradutores do processo de enfermagem e do plano de trabalho dos enfermeiros, se referiram à complexidade e inadequação da tecnologia a alguns contextos de trabalho, à falta de conhecimento sobre a tecnologia, bem como ao tempo necessário para a realização dos registros(16).

Embora as tecnologias de informação e comunicação constituam, quando bem utilizadas, excelentes instrumentos de trabalho, a falta de conhecimento sobre elas condiciona a utilização, bem como a exploração de todas as suas potencialidades(17). Diante do exposto, destaca-se que a utilização de tecnologias voltadas para a comunicação é indispensável nos dias atuais nos serviços de saúde. Por meio desses recursos, os profissionais da área da saúde no geral têm a possibilidade de tomarem a decisão em conjunto de forma remota, sendo importante para o cuidado adequado ao paciente, com vistas à detecção de erros, resolução de dúvidas, de modo a facilitar a reunião das equipes do setor(18).

Nesse cenário, também é imperativo mencionar a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), vigente no Brasil desde 14 de agosto de 2018, como marco regulatório que deve ser observado pelas instituições e profissionais nos processos internos de coleta e armazenamento de dados dos pacientes, além de exigências singulares na gestão em segurança da informação. Autores retomam que escassos recursos tecnológicos são um limitador para adequação à lei, assim como o desconhecimento das melhores práticas em segurança da informação, recomentando estudos que observem o desenvolvimento e a adequação das organizações brasileiras às regulamentações(19).

De modo a aproveitar ao máximo os benefícios das TIC, os enfermeiros gestores precisam promover a participação dos profissionais de enfermagem em atividades de educação continuada e permanente, com o escopo de desenvolver habilidades e competências relacionadas ao domínio dos recursos de informação e comunicação. Além disso, devem ainda considerar a necessidade de investimentos financeiros em redes, equipamentos e pessoal(20).

 

CONCLUSÃO

Os resultados apontaram que os enfermeiros gestores possuem um perfil similar ao descrito em estudos nacionais e internacionais, observando-se enfermeiras gestoras como feminina e jovem. Essas características são importantes para definir as estratégias de formação para utilização das TIC.

Ainda quanto à percepção de utilidade e adesão às TIC, observou-se a valorização ao prontuário eletrônico e aos protocolos, os quais emergem como tecnologias aptas a contribuir para a assistência do paciente, por otimizar os registros de enfermagem, sistematizar a assistência e potencializar a gestão do cuidado. Por outro lado, insurgiu a percepção de utilidade e adesão às TIC manuais (planilhas, registro de passagem de plantão/controle de alta), apontando que mesmo diante do aumento dos equipamentos eletrônicos essas tecnologias ainda são utilizadas na prática diária. Nesse ínterim, destaca-se a importante adesão de tecnologias mobile (para celular) para atendimento do paciente junto ao leito hospitalar, que otimizam o tempo e a precisão dos registros, mas ainda são timidamente utilizadas.

Cabe salientar como limites a abordagem de uma parcela da enfermagem, uma vez que técnicos e auxiliares de enfermagem também manejam essas tecnologias e enfrentam desafios na sua utilização.

Ressalta-se ainda que, nesse sentido, a otimização e a capacitação das ferramentas de gestão, a exemplo das TIC, por enfermeiros devem ser aprimoradas, visando melhor atendimento, organização do ambiente de trabalho e dos serviços, sem perder a valorização das relações interpessoais e o potencial de outros recursos tecnológicos de diferentes naturezas.

 

*Artigo extraído da dissertação de mestrado “Planejamento em saúde como tecnologia de trabalho dos enfermeiros na gestão hospitalar”, apresentada à Universidade Comunitária da Região de Chapecó, Chapecó, Santa Catarina, Brasil.

 

AGRADECIMENTOS

Agradecemos à Maria da Silva pela colaboração na fase de análise e interpretação dos dados.

 

CONFLITO DE INTERESSES

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

 

REFERÊNCIAS

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Submissão: 18/06/2021

Aprovado: 28/03/2022

 

CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA

Concepção do projeto: Zunkowski TMT, Trindade LL, Martins MMFPS,

Obtenção de dados: Zunkowski TMT, Trindade LL,

Análise e interpretação dos dados: Zunkowski TMT, Trindade LL, Andrigue KCK, Martins MMFPS, Lutinski JA, Ribeiro OMPL

Redação textual e/ou revisão crítica do conteúdo intelectual: Zunkowski TMT, Trindade LL, Andrigue KCK, Martins MMFPS, Lutinski JA, Ribeiro OMPL

Aprovação final do texto a ser publicada: Zunkowski TMT, Trindade LL, Andrigue KCK, Martins MMFPS, Lutinski JA, Ribeiro OMPL

Responsabilidade pelo texto na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra: Zunkowski TMT, Trindade LL, Andrigue KCK, Martins MMFPS, Lutinski JA, Ribeiro OMPL

 

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