ORIGINAL
Mães de recém-nascidos prematuros no contexto da pandemia do COVID-19: uma abordagem qualitativa
Rebeca Silveira Rocha1, Roberta Stephanie Souza Bandeira1, Denise Maia Alves da Silva1, Claudiana Sousa Santos1, Samuel Melo de Andrade2, Bruna Kely Oliveira Santos2, Mônica Oliveira Batista Oriá3, Anne Fayma Lopes Chaves4
1 Maternidade Escola Assis Chateaubriand, Unidade de Neonatologia, CE, Brasil
2 Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Instituto de Ciências da Saúde, CE, Brasil
3 Universidade Federal do Ceará, Departamento de Enfermagem, CE, Brasil
4 Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, Instituto de Ciências da Saúde, CE, Brasil
RESUMO
Objetivo: Conhecer as percepções das mães de recém-nascidos prematuros internados na Unidade Neonatal diante da pandemia do COVID-19. Método: Pesquisa qualitativa realizada entre junho e julho de 2020, envolvendo 12 mães de recém-nascidos prematuros internados nas unidades neonatais de uma maternidade no estado do Ceará durante a pandemia do Coronavírus. As mães foram contactadas via aplicativo WhatsApp. Para a análise textual foi utilizada a classificação hierárquica descendente realizada pelo software IRAMUTEQ. Resultados: A percepção das mães estava centrada nas dificuldades enfrentadas neste período de pandemia. A palavra “não” foi fortemente apresentada no corpus do texto, evidenciando o impacto do impedimento da visita, da permanência das mães nas unidades e o fato de não poder amamentar. Conclusão: A prestação de uma assistência humanizada nas unidades neonatais não deve se limitar ao recém-nascido, sendo fundamental o apoio emocional às mães por parte da equipe de saúde.
Descritores: Unidade de terapia intensiva neonatal; Recém-nascido prematuro; Infecções por coronavírus.
INTRODUÇÃO
O mundo está vivenciando uma Emergência de Saúde Pública causada pelo vírus Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2 (SARS-CoV-2), que ocasiona a doença respiratória Coronavírus 2019 (COVID-19). A pandemia já é responsável por mais de 3,5 milhões de mortes e possui 170 milhões de infectados em todo o mundo. No Brasil, são mais de 23 milhões de casos confirmados e mais de 621 mil óbitos por COVID-19(1,2).
Não há evidências suficientes sobre a transmissão vertical do vírus da COVID-19. Estudo realizado em Wuhan na China apontou ausência do vírus em amostras de líquido amniótico, swab da garganta de neonatos, cordão umbilical e leite materno humano(3). No entanto, pesquisa que envolveu crianças chinesas evidenciou que todas as crianças são susceptíveis ao vírus, sendo os bebês a classe mais vulnerável à infecção(4).
No contexto brasileiro, devido à rápida disseminação do vírus, foram decretadas várias medidas para enfrentamento da COVID-19. O Ministério da Saúde recomenda que as unidades neonatais não devem ser fechadas nem reduzidas. No entanto, devem adotar cuidados com a prevenção de aglomerações, garantia do acesso às pessoas assintomáticas e que não tenham contatos domiciliares de pessoas portadoras do vírus(5).
O processo de separação entre mãe e recém-nascido (RN) diante da prematuridade já é difícil, portanto o seguimento de tais medidas mais restritivas para a contenção da infecção humana provocada pelo COVID-19 pode tornar o momento ainda mais delicado para o binômio. Evidências internacionais, envolvendo mães de bebês internados em unidade neonatal apontam a presença de medo e solidão diante do distanciamento e despreparo e, do contrário, o sentimento de prazer e competência quando recebem apoio da equipe de saúde, deixando-as mais confiantes e empoderadas(6).
A pandemia causada pelo Coronavírus tem gerado consequências graves na saúde mental. Pesquisa que envolveu 1.041 gestantes evidenciou que 45,7% apresentaram transtornos mentais no período de distanciamento social, os quais eram agravados por sentimentos negativos diante da exposição ao COVID-19(7).
A partir do conhecimento da percepção das mães de bebês prematuros diante da pandemia do COVID-19, é relevante que os profissionais de saúde tenham subsídios para o desenvolvimento de estratégias efetivas e viáveis no que se refere à promoção da saúde materno-infantil durante esse momento específico, proporcionando uma atenção qualificada, que envolva todo o apoio emocional necessário. No entanto, há uma lacuna do conhecimento voltado a ações que possam ser realizadas com essas mães, por ainda não haver muitas evidências científicas sobre a temática.
No âmbito da saúde materno-infantil, percebe-se que esses sentimentos negativos estão ainda mais presentes(8). Logo, reflete-se que essas mães podem ser afetadas negativamente no atual contexto da pandemia por COVID-19. Assim, o objetivo da pesquisa foi conhecer as percepções das mães de recém-nascidos prematuros internados na Unidade Neonatal diante da pandemia do Coronavírus.
MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa exploratória com abordagem qualitativa entre junho e julho de 2020 na Unidade Neonatal de uma maternidade de referência em atenção à saúde do recém-nascido no estado do Ceará. Esta Unidade Neonatal é composta por quatro unidades, sendo duas Unidades de Cuidados Convencionais (UCINCo), com 15 leitos cada uma, e duas Unidades de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), com 12 e 9 leitos, totalizando 51 leitos na Unidade Neonatal.
A instituição é um dos seis Centros de Apoio às Boas Práticas na atenção obstétrica e neonatal da Rede Cegonha no Brasil e, por esse motivo, foi escolhida para integrar o QualiNEO, uma estratégia que visa diminuir a mortalidade neonatal e qualificar o atendimento ao recém-nascido nas maternidades das regiões Norte e Nordeste.
A coleta de dados foi realizada por enfermeiros das unidades da instituição de saúde e por doutores docentes da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira.
As participantes da pesquisa foram mães de bebês prematuros (nascimento que ocorre após 20 semanas e antes de completadas 37 semanas de gestação) internados na Unidade Neonatal da instituição citada anteriormente. Foi considerado critério de inclusão possuir o aplicativo WhatsApp Messenger® utilizado na coleta de dados. E como critério de exclusão: não atender as ligações telefônicas após três tentativas em dias e horários diferentes.
A amostragem foi por conveniência, a qual não se baseia em critério numérico para garantir sua representatividade. A coleta de dados foi concluída quando houve a saturação dos dados durante as entrevistas. Devido as pesquisadoras serem enfermeiras da unidade, facilitou o vínculo entre as mães, sendo explicado o objetivo e os benefícios da pesquisa.
Inicialmente, os dados cadastrais das mães foram identificados no formulário de cadastro do setor da instituição de saúde. As pesquisadoras realizaram ligações telefônicas para as puérperas de um número telefônico novo destinado somente para a pesquisa, sendo as mesmas convidadas a participar do estudo. Após o aceite, as mães foram contactadas via WhatsApp Messenger®, aplicativo de mensagens gratuito para Android e outras plataformas. Optou-se por esse meio, devido à melhor acessibilidade, visto que as mídias sociais fornecem uma ponte entre pesquisadores e usuários de saúde e são eficazes para novas evidências na prática clínica.
Assim, foi enviado um link via aplicativo para que elas tivessem acesso ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual foi elaborado no aplicativo Google Forms®. Posteriormente, foi realizada uma nova ligação telefônica com a utilização de um roteiro adaptado de Chaves et al.(9), para aplicação do formulário desenvolvido pelos pesquisadores contendo duas partes: 1- Dados sociodemográficos e obstétricos; 2- Perguntas norteadoras sobre a percepção das mães de recém-nascidos prematuros internados em unidades neonatais diante da pandemia do Coronavírus. Ressalta-se que todas as ligações foram gravadas por meio do aplicativo Automatic Call Recorder, sendo transcritas as entrevistas para um banco de dados.
Para análise dos dados sociodemográficos e reprodutivos, adotou-se o pacote estatístico IBM - SPSS 22.0 para estatística descritiva, sendo utilizado as frequências percentuais absolutas e mediana.
As entrevistas duraram cerca de 15 minutos, as quais foram transcritas por dois pesquisadores. Para a análise, os dados foram submetidos à análise de conteúdo, a qual utilizada procedimentos sistemáticos para compreender as falas do discurso. Dentre as modalidades da análise de conteúdo, optou pela análise de temática, por ser classificada por meio de uma palavra ou frase, o que permite “descobri os núcleos do sentido” na comunicação(10).
Posteriormente, os dados foram organizados e tabulados em software de bloco de notas do Windows, onde foram codificados com asteriscos e salvos no formato UTF8, o que viabilizou o processamento no software escolhido. Ressalta-se que não foi possível o retorno das transcrições aos participantes devido ao isolamento social.
Para favorecer a análise textual, optou-se pelo processamento por meio do Interface de R pourles Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ), versão 07 alpha 2, sendo adotada a Classificação Hierárquica Descendente (CHD). Esta favoreceu a classificação dos segmentos textuais tendo como base o vocabulário que foi empregado.
Com a CHD, foi possível dividir os segmentos textuais em blocos menores, para que, baseado corpus textual total, fossem feitas associações entre esses segmentos, permitindo assim o agrupamento por correlação das palavras que possuíam significância estatística. Desse modo, cada entrevista é correspondente a uma Unidade de Contexto Inicial (UCI), no qual cada Unidade de Contexto Elementar (UCE), que são os segmentos textuais de cada classe, foram extraídos da UCI baseado nas similaridades entre si e nas discrepâncias entre as UCE das demais classes.
A pesquisa obedeceu a Resolução 466/2021 que dispõe sobre pesquisas envolvendo seres humanos, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira sob número do parecer 4.205.958. Os riscos envolvidos estavam relacionados a constrangimento social, constrangimento por envolver assuntos referentes à saúde reprodutiva e relacionado a sentimentos e tempo disponibilizado para responder ao questionário. No entanto, os pesquisadores buscaram amenizar esses riscos com condutas de liberdade para não responder questões que deixasse a participante constrangida, assegurou a confidencialidade e privacidade e garantiu a não utilização das informações em prejuízo das pessoas.
As mulheres foram instruídas sobre o quão benéfica era a pesquisa, ao conhecer sobre a saúde mental das mães de bebês prematuros durante esse período de pandemia, visando contribuir para o desenvolvimento de intervenções efetivas para a promoção da saúde materno-infantil. Ao final da pesquisa, os resultados foram apresentados à instituição de saúde.
RESULTADOS
Foram abordadas 16 mães, porém duas não possuíam o aplicativo de WhatsApp Messenger® e duas não atenderam as ligações telefônicas após três tentativas de contato em dias e horários distintos. Logo, foram realizadas 12 entrevistas com mães de recém-nascidos prematuros internados nas unidades neonatais durante a pandemia COVID-19. O perfil dessas mães era de mulheres entre 15 e 33 anos de idade (M=25 anos), a maioria era casada ou em união consensual com o pai do recém-nascido (n=7; 58,3%) e com ensino fundamental completo (n=10; 83,3%). Eram primíparas (n=6; 50%) ou multíparas (n=6; 50%) em igual proporção, e a maior parte delas planejou a gestação (n=8; 66,7%).
Os recém-nascidos nasceram entre 24 e 34 semanas de gestação (M= 28,2 semanas de idade gestacional), estavam pesando entre 590g e 2580g (M= 1300g). No momento das entrevistas, os recém-nascidos estavam entre sete e 206 dias de vida, ou seja, uma permanência mediana de 60,2 dias, o que corresponde a um período prolongado de internação.
O processo de análise, discussão e interpretação dos dados foi orientado pela técnica de Análise de Conteúdo.
As 12 entrevistas compuseram o corpus geral na análise, sendo 936 ocorrências de palavras, nas quais foram identificadas 230 formas distintas e 29 segmentos textuais (ST). Do total de ST processados, 22 deles foram classificados, o que corresponde a retenção de 75,86% de aproveitamento. Do total de palavras, 337 delas são distintas e, destas, 186 aparecem apenas uma vez (hapax).
Por meio do processamento, foi obtido o total de cinco classes: Classe 1, com 4 ST (18,2%); Classe 2, com 4 ST (18,2%); Classe 3, com 4 ST (18,2%); Classe 4, com 5 ST (22,7%); e Classe 5 com 5 ST (22,7%). Para viabilizar o entendimento e a discussão, as classes foram respectivamente nomeadas: Dificuldades enfrentadas; Medidas adotadas; Sentimentos emergentes; Enfrentamento situacional e Interrupção do binômio mãe-filho.
A Figura 1 apresenta o dendograma da Classificação Hierárquica Descendente, demonstrando a inter-relação entre as classes e as palavras que se sobressaíram em cada uma delas.
Figura 1 - Dendograma da Classificação Hierárquica Descendente. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2021
Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.
A Figura 2 descreve a operacionalização e exemplificação das classes, com a apresentação de um dicionário de palavras criado pelo IRAMUTEQ a partir da utilização do teste qui-quadrado, revelando as palavras que fortemente se associam a cada uma das cinco classes, considerando um p<0,05 para inclusão da palavra.
Figura 2 - Operacionalização e exemplificação das classes da Classificação Hierárquica Descendente. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2021
Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.
A fim de ilustrar a predominância das palavras no corpus do texto como um todo, a Figura 3 apresenta a nuvem de palavras, demonstrando a forte presença da palavra “não”, que aparece 26 vezes no corpus textual, bem como “estar”, com frequência de 19 vezes, “ficar” e “visita”, com 15 repetições cada. Estes dados representam o impacto do impedimento da visita e da permanência das mães nas unidades neonatais nos sentimentos vivenciados pelas mães de recém-nascidos prematuros na pandemia.
Figura 3 - Nuvem de palavras. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2021
Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.
Para permitir identificar a ocorrência entre as palavras e facilitar a visualização através dos grafos, analisou-se a similitude do corpus textual como um todo e criando uma relação entre as palavras, como apresentado na Figura 4.
Figura 4 - Similitude do corpus textual. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2021
Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.
Observa-se que, nesta pesquisa, a raiz do conhecimento é a palavra “não”, ressaltando que os sentimentos das mães durante essa pandemia emergem do fato de “não poder ficar”, “não visitar”, “não sentir-se bem”, “não cuidar” e “não amamentar”, por exemplo. Apesar de ser indicado a manutenção da amamentação em casos de mães com COVID-19 pelas autoridades de saúde, não foi possível essa prática nessas unidades neonatais no contexto atual devido à crescente disseminação do vírus no Estado do Ceará, sendo decretado medidas rigorosas para enfrentamento da COVID-19, como o isolamento social.
DISCUSSÃO
O enfrentamento a situações difíceis, como a pandemia COVID-19, requer das mães um apoio emocional, sendo comum entre as mulheres entrevistadas a presença de um companheiro, o qual é essencial no exercício da paternidade, principalmente quando envolvido precocemente, podendo ser benéfico para a saúde materno-infantil(11).
Embora a maternidade possa ter sido experimentada por algumas entrevistadas, o desafio de estar longe do seu filho RN durante uma pandemia foi inédito para todas. A distância física que a pandemia impôs proporcionou um agravamento do medo entre os pais ao vivenciar a presença de um novo vírus potencialmente grave, bem como da prematuridade, que deixa seu filho mais vulnerável à doença(12).
O prolongado período de internação foi evidenciado entre os RN das mães entrevistadas. A hospitalização do prematuro promove diversas reações nos pais, como o desejo de conhecer o filho, compreender o quadro clínico, a possibilidade de sobrevivência e a ocorrência de sentimentos negativos. Logo, sugere-se que sejam ampliados encontros com os pais a fim de esclarecer possíveis dúvidas e reforçar o apoio emocional(13), encontros estes restritos em decorrência do COVID-19.
Foi possível compreender que a percepção das mães de RN prematuros internados nas unidades neonatais durante a pandemia do Coronavírus está centrada nas dificuldades enfrentadas nesse período, o qual veio permeado de sentimentos negativos diante do distanciamento do filho. Pesquisa qualitativa que envolveu um grupo focal de onze mães de bebês prematuros extremos apontou que as mesmas vivenciam o sentimento de vazio e de crise emocional, diante da complexidade do ambiente e da dificuldade de formar vínculo com a hospitalização. A presença de uma equipe de saúde que promova vínculo, que incentive a participação das mães no cuidado e que facilite a comunicação pode contribuir de forma efetiva para melhorar esse aspecto psicológico das mães(14).
Apesar de respeitarem as condições estabelecidas pela instituição de saúde, as mães relataram bastante as palavras “vez”, “deixar” e “semana” (classe 1), almejando a possibilidade de deixar a visita ser liberada pelo menos uma vez por semana. Em tempos de visitação reduzida devido a pandemia COVID-19, é responsabilidade dos profissionais a manutenção do apoio psicossocial da Unidade Neonatal aos familiares, sendo buscado métodos alternativos e evidenciado que o uso de tecnologias pode favorecer o estado emocional dos pais que estão distantes dos seus filhos(15).
Observou-se, a partir das palavras do dendrograma, o quão importante foi a utilização das tecnologias com uso do telefone, sendo realizadas ligações e chamadas de vídeo, as quais ajudaram a manter o vínculo entre mãe e filho nesse período. Apesar das lacunas apresentadas por essas tecnologias quanto à fragilidade no relacionamento interpessoal, as intervenções digitais de saúde estão desempenhando papel significativo na assistência à saúde diante da pandemia da COVID-19. No Brasil, um grupo de profissionais de São Paulo implantaram a proposta da visita virtual, a qual visa manter o vínculo e o apoio psicológico ao paciente e à família durante sua internação, sendo importante a presença de um profissional de psicologia ou serviço social para acompanhamento(16).
Apesar de vivenciar um período conturbado de internamento de seus filhos, foi possível perceber a esperança das mães no retorno das visitas presenciais e no encontro do seu filho, como foi visto na prevalência das palavras “quando”, “colocar”, “sentir”. A hospitalização do RN prematuro na UTIN traz diversos sentimentos às mães e, no contexto da pandemia da COVID-19, acrescenta-se as restrições dos pais nas unidades neonatais visando prevenir a disseminação do vírus, que limitou a interação com o bebê prematuro e com os profissionais de saúde, levando à carência de informações sobre o estado do filho e o aumento da ansiedade destes pais(12).
A presença da palavra “não” como raiz do conhecimento deixou evidente o quão impactadas as mães estavam em não poder visitar seus filhos, não estar colocando-o no colo e não vivenciar a amamentação. A permanência dos pais com seu filho nas unidades neonatais foi estimulada pelo Ministério da Saúde (MS), sendo preconizada a garantia do leite materno. No entanto, reitera-se que as entrevistas foram realizadas em momento crítico da pandemia vivida no estado do Ceará, no qual foi imposto o isolamento social pelo governo. Considerando-se a alta média de permanência dos recém-nascidos na Unidade Neonatal já mencionados, a grande maioria não tinha mais suas mães internadas e, com as regras de isolamento social, não tinham como se deslocar até a maternidade, inclusive por escassez de transporte público. Além disso, a instituição de saúde avaliou e instituiu a suspensão das visitas nas unidades neonatais visando a segurança dos profissionais e pacientes internados, inclusive os próprios recém-nascidos, estimulando a extração do leite e envio ao banco de leite e utilizando recursos tecnológicos (visita virtual) para minimizar os danos emocionais e favorecer a saúde mental dos familiares e RN(5, 17).
Cada vez mais têm sido estimuladas intervenções de cuidados centrados na família, como o contato pele a pele. Pesquisa desenvolvida na Austrália, a qual investigou o efeito que o contato pele a pele entre pais e RN tem na frequência cardíaca (FC) e na pressão arterial (PA) dos pais, evidenciou redução na FC e PA dos pais (p<0,05), diminuição da depressão e ansiedade dos pais, bem como aumento da sensação de vínculo entre os pais e o RN. Logo, sugere-se que o contato pele a pele seja implementado nas unidades neonatais como um modo de favorecer a lacuna da fragilidade do vínculo entre esse binômio(18).
Embora o contato pele a pele seja uma estratégia já adotada na instituição da pesquisa, tal prática foi reprimida em decorrência das restrições causadas pela pandemia da COVID-19. Segundo as orientações para unidade neonatal do MS, ainda era possível o contato pele a pele exclusivamente pela mãe assintomática e que não seja contato domiciliar de pessoa com síndrome gripal ou infecção respiratória comprovada por SARS-CoV-2(5).
Nesse cenário de incertezas e fragilidades as mães relataram a importância das redes de apoio, como seus familiares, em especial a mãe e o esposo. A ausência de rede de apoio durante a pandemia foi um aspecto relatado em outra pesquisa, sendo uma questão preocupante, haja vista que a presença física da família ocupa a primeira posição no conceito das mulheres, as quais relatam como positivo os cuidados ministrados por eles ao RN e o apoio a ela própria, gerando sensação de apoio e melhora na autoestima(19,20).
A limitação da pesquisa consistiu na realização da entrevista de forma não presencial, o que possivelmente dificultou na coleta dos dados em relação aos relatos, ao vínculo entre pesquisador-participante e à observação do pesquisador. No entanto, optou-se por essa modalidade devido à recomendação de distanciamento durante a pandemia. Acredita-se que esses achados fortaleçam as pesquisas no âmbito da neonatologia, no intuito de humanizar a prática assistencial dos profissionais de saúde, em especial o enfermeiro, no atendimento às mães de RN prematuros que estão vivendo a pandemia da COVID-19.
CONCLUSÃO
Conclui-se que a percepção das mães de RN prematuros internados nas unidades neonatais durante a pandemia COVID-19 está centrada nas dificuldades enfrentadas nesse período, permeado de sentimentos negativos decorrentes do distanciamento do filho. A palavra “não” foi fortemente apresentada no corpus do texto, evidenciando o impacto do impedimento da visita, da permanência das mães nas unidades e o fato de não poder amamentar.
A prestação de uma assistência humanizada nas unidades neonatais não deve se limitar ao RN, sendo fundamental o apoio emocional às mães por parte da equipe de saúde diante desse período crítico. Sugere-se o desenvolvimento de pesquisas que evidenciem a eficácia de tecnologias que possibilitem a aproximação dos RN internados nas unidades neonatais com seus pais no contexto da pandemia COVID-19, sendo uma oportunidade de promover o vínculo entre mãe e filho, favorecendo a saúde materno-infantil.
A pesquisa vislumbra subsidiar outros profissionais dessa área no atendimento às mães de RN prematuro na pandemia da COVID-19, ao conhecer as demandas e dificuldades, visando aprimorar o cuidado prestado a essa clientela nesse contexto de fragilidade.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos às mães dos recém-nascidos pela participação na pesquisa mesmo diante de um contexto de fragilidade emocional.
CONFLITO DE INTERESSE
Os autores declaram não haver conflito de interesse.
FONTE DE FINANCIAMENTO
Sem financiamento.
REFERÊNCIAS
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Submissão: 01/06/2021
Aprovado: 22/01/2022
CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA |
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