Estressores ambientais em unidade cardiointensiva e o planejamento do cuidado de enfermagem: estudo descritivo 

 

 

Naiane Nery de Souza de Brito1, Samira Silva Santos Soares2, Eloá Carneiro Carvalho2, Daniel Gomes de Souza2, Andrezza Serpa Franco2, Luana Ferreira de Almeida2, Flávia Giron Camerini2, Karla Biancha Silva de Andrade2

 

1 State University of Rio de Janeiro School Hospital Pedro Ernesto, RJ, Brazil

2 State University of Rio de Janeiro, RJ, Brazil

 

RESUMO

Objetivo: avaliar os principais fatores estressores apontados pelos pacientes em uma unidade cardiointensiva. Método: pesquisa descritiva, quantitativa, realizada com 25 pacientes maiores de 18 anos, lúcidos, orientados, alfabetizados, com diagnóstico de síndrome coronariana aguda. Aplicou-se questionário relacionado às informações sociodemográficas e clínicas e a escala The Environmental Stressor Questionnaire. Os dados foram analisados através de estatística descritiva simples. Resultados: houve predominância do sexo masculino (16-64%), com idade de 60 a 70 anos (14-56%). O infarto agudo do miocárdio (14-56%%) foi a causa mais prevalente de internação. As afirmativas “sentir dor” (17-68%); seguido de “não conseguir mexer mãos ou braços devido às vias intravenosas” (13-52%); “não ter controle de si mesmo” (11-44%) e “não ter explicações sobre o tratamento” (10-40%) sobressaíram como extremamente estressantes. Conclusão: conhecer os estressores mais prevalentes contribui para o planejamento do cuidado de enfermagem com ênfase no acolhimento e atendimento às necessidades individualizadas.

 

Descritores: Acolhimento; Cuidados Intensivos; Enfermagem Cardiovascular; Estresse Psicológico; Planejamento de assistência ao paciente.

 

 

INTRODUÇÃO

As doenças crônicas não transmissíveis (DCTNs) incluem diabetes, câncer, doença respiratória crônica e doenças cardiovasculares, constituindo o principal grupo de causa de morte responsável por mortes prematuras, perda de qualidade de vida, além de impactos adversos econômicos e sociais, sendo responsáveis por 63% das mortes globais(1). Dentre essas doenças, destacam-se as doenças cardiovasculares (DCV), caracterizadas por um conjunto de problemas de saúde, em que os mais frequentes são a hipertensão arterial sistêmica, o acidente vascular encefálico, a insuficiência cardíaca, as arritmias, o aneurisma da aorta, as miocardites, e a síndrome coronariana aguda (SCA)(2).

A SCA abrange um grupo de patologias que incluem a angina instável (AI), o infarto agudo do miocárdio (IAM) com supra desnivelamento do segmento ST (IAMCST) e sem supra desnivelamento (IAMSST), e são causas comuns de atendimentos nos setores de emergência e de internações em unidades especializadas em cuidados cardiovasculares.Entre os anos de 2004 a 2014, a SCA foi responsável por 1.069.653 casos de morte no Brasil, acometendo principalmente adultos entre 35 e 59 anos, faixa etária considerada na fase da “maturidade profissional” e economicamente ativos(3)

Vários fatores contribuem para o desenvolvimento da SCA, dentre eles: a hereditariedade, a idade avançada, o diabetes mellitus, a dislipidemia, o sedentarismo, o tabagismo, a obesidade e o estresse, porém quando um indivíduo apresenta SCA com necessidade de hospitalização, há recomendação de internação em unidades de monitoramento contínuo, como a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e quando disponíveis, Unidades Cardiointensivas(3). Nesses ambientes, devido à alta complexidade do cuidado, o paciente se depara com tecnologias complexas e variadas, o que pode a médio e longo prazo, se constituir em um ambiente gerador de estresse. 

Um estressor é qualquer estímulo presente no ambiente o qual é capaz de provocar variadas respostas na pessoa, tanto de caráter físico, quanto psicológico. Inicialmente, o principal objetivo dessas respostas é adaptar o indivíduo a uma situação que seja nova ou desconhecida. Porém, ao persistir o estímulo, pode-se deflagrar uma situação de estresse que está diretamente relacionada com a capacidade de resposta de adaptação ao fator estressor, que o indivíduo possui(4-5).

Entre os fatores que são considerados como desencadeantes do estresse em ambiente hospitalar, destaca-se a ausência de iluminação natural; a perturbação nos padrões de sono e a vigília; a privação e/ou restrição do tempo de contato com familiares e amigos; não ter controle do próprio corpo; os barulhos, como de alarmes e conversação da própria equipe; a falta de privacidade; além de ter que se submeter a diversos procedimentos clínicos que, apesar de necessários ao tratamento proposto, levam o paciente a vivenciar diferentes tipos de desconforto(4-5).

Nesta perspectiva, no ano de 2010 foi validada no Brasil a escala de avaliação de estresse ambiental Environmental Stressor Questionnaire, adaptado da escala Intensivecare Unit Environmental Stressor Scale (ICUESS), com 50 itens, destinado à avaliação e estratificação dos estressores em pacientes hospitalizados(6).

O ambiente da Unidade Cardiointensiva, por possuir um aparato tecnológico altamente complexo necessário ao restabelecimento do paciente cardiovascular, pode se tornar um ambiente frio e hostil, transformando a hospitalização em um período estressante, o quepode ocasionar uma quebra na homeostase do organismo e provocar nesses indivíduos efeitos desagradáveis e alterações fisiológicas como, elevação da pressão arterial, disfunção cardiovascular e alterações psicológicas(4).

Neste contexto, conhecer os fatores estressantes em uma unidade cardiointensiva, poderá auxiliar o enfermeiro (especialmente a equipe de enfermagem cardiovascular, que atua com cuidados intensivos) quanto ao planejamento de assistência ao paciente, norteando assim o cuidado dos pacientes com SCA. Nessa lógica, o enfermeiro que atua com essa clientela, poderá focar suas intervenções nas necessidades dos usuários, a fim de contribuir para o planejamento de uma assistência acolhedora e colaborar para que a experiência da hospitalização seja menos traumática(4-5). Assim, este estudo objetivou avaliar os principais fatores estressores apontados pelos pacientes durante a hospitalização em uma unidade cardiointensiva.

 

MÉTODO 

Pesquisa descritiva, quantitativa, realizada em uma unidade cardiointensiva de um hospital universitário do município do Rio de Janeiro, no período de março a agosto de 2019.

Participaram da pesquisa 25 pacientes selecionados de forma não probabilística, por conveniência. Teve como critérios de inclusão ser paciente maior de 18 anos; estar lúcido e orientado; alfabetizado; capaz de se comunicar verbalmente e internados por síndrome coronariana aguda. Foram excluídos os pacientes com internação prévia em unidade cardiointensiva; e os que no momento da coleta dos dados estivessem instáveis em sua condição clínica, apresentando, por exemplo, dor sem controle, dispneia, cansaço, sonolência, hipertensão arterial não controlada; ou em prótese ventilatória.

Após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, os participantes responderam a um questionário fechado e individual. O questionário foi aplicado pela pesquisadora principal, que não tem vínculo fixo com o setor, a fim de não caracterizar uma relação de poder frente ao paciente e minimizar viés de resposta, respeitando o anonimato do usuário. A coleta ocorreu entre os meses de março e abril de 2019. 

O questionário foi composto de duas partes: a primeira direcionada às informações sociodemográficas e clínicas, contendo seis variáveis: idade, sexo, estado civil, escolaridade, vínculo empregatício, diagnóstico clínico; e a segunda, abrangendo a versão brasileira da escala The Environmental Stressor Questionnaire(6), que quantifica os estressores através de uma escala do tipo likert, com as categorias extremamente estressante (5), muito estressante (4), moderadamente estressante (3), não estressante (2), ou não se aplica (1).  Desse modo, foi atribuído pontuações para cada fator estressor ambiental, onde o que corresponde ser menos estressante possui o menor peso, aumentando a pontuação de forma crescente de acordo com o grau de estresse do indivíduo ao fator ambiental. Os fatores de estresse ambiental podem ser observados na Figura 1.

 

1

Estar preso por tubos

26

Assistir a tratamento administrado em outros pacientes

2

A enfermeira não se apresenta pelo nome

27

Ter que ficar olhando para os detalhes do teto

3

Sentir que a enfermeira está muito apressada

28

Não conseguir dormir

4

Ter sede

29

Não conseguir mexer as mãos ou os braços devido às vias intravenosas

5

Medir a pressão arterial muitas vezes ao dia

30

Sentir cheiros estranhos

6

Cama e/ou travesseiros desconfortáveis

31

Ter luzes acesas constantemente

7

Escutar o telefone tocar

32

Ter dor

8

Ser examinado por médicos e enfermeiras constantemente

33

Ver as bolsas de soro penduradas sobre a cabeça

9

Ter máquinas estranhas ao redor

34

Ser furado por agulhas

10

Sentir que a enfermagem está mais atenta aos equipamentos do que a você

35

Não saber onde está

11

Escutar o barulho e os alarmes dos equipamentos

36

Ter a equipe falando termos incompreensíveis

12

Enfermagem e médicos falando muito alto

37

Não ter controle de si mesmo

13

Ter que usar oxigênio

38

Não saber que dia é hoje

14

Sentir falta do marido ou da esposa

39

Ser incomodado

15

Não ter explicações sobre o tratamento

40

Não ter privacidade

16

Escutar alarmes do monitor cardíaco dispararem

41

Ser cuidado por médicos desconhecidos

17

Ter a enfermagem constantemente fazendo tarefas ao redor do leito

42

Estar em ambiente muito quente ou muito frio

18

Ter tubos no nariz e/ou na boca

43

Ouvir pessoas falando sobre você

19

Não saber que horas são

44

Estar incapacitado para se comunicar

20

Escutar o gemido de outros pacientes

45

Medo da morte

21

Ter homens e mulheres no mesmo quarto

46

Desconhecer o tempo de permanência na UTI

22

Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos

47

Estar incapacitado para exercer o seu papel

23

Não saber quando as coisas vão acontecer

48

Preocupações financeiras

24

Ser acordado pela enfermagem

49

Medo da AIDS

25

Sons e ruídos desconhecidos

50

Ser pressionado a concordar com o tratamento

Figura 1 - Fatores de estresse ambiental 

Fonte: Adaptado de Rosa et al, 2019.

 

Para a análise dos dados, os questionários foram codificados e os resultados lançados em uma planilha Excel®. Os dados foram analisados e apresentados através de estatística simples descritiva. 

O presente estudo respeitou as questões éticas e as exigências da resolução nº466 de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde. A pesquisa teve aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa, através do CAAE: 04651518.2.0000.

 

RESULTADOS 

A maioria dos participantes foi do sexo masculino (16-64%), com idade entre 60 e 70 anos (14-56%), e a causa mais prevalente de internação foi por IAMCSST (14- 56%). Quanto ao estado civil, 08 (32%) estavam casados e 08 (32%) solteiros no período do estudo. A média de escolaridade dos participantes da pesquisa foi de 7,56 anos de estudos e 14 (56%) possuíam alguma atividade laboral (Tabela 1).

 

Tabela 1 - Características sociodemográficas dos participantes da pesquisa. Rio de Janeiro. RJ, Brasil, 2019 (n=25)

Variáveis

n

%

Sexo

 

 

Masculino

16

64

Feminino

9

36

Idade

 

 

36-45

2

8

46-55

5

20

56-60

1

4

60-70

14

56

Acima de 70

3

12

Estado civil

 

 

Casado

8

32

Divorciado

6

24

Solteiro

8

32

Viúvo

3

12

Diagnóstico de Síndrome Coronariana Aguda

 

 

Angina

2

8

Angina Estável

2

8

Angina Instável

2

8

Infarto Agudo do Miocárdio

2

8

Infarto Agudo do Miocárdio com Supra de ST

14

56

Infarto Agudo do Miocárdio sem Supra de ST

3

12

Vínculo empregatício

 

 

Ativo

14

56

Aposentado

11

44

Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.

 

Com relação aos fatores estressores, as afirmativas “Ter dor” (17-68%), “Não conseguir mexer as mãos ou os braços devido às vias intravenosas” (13-52%), “Não ter controle de si mesmo” (11-44%), “Não ter explicações sobre o tratamento” (10-40%) foram consideradas como extremamente estressantes pelos pacientes internados na unidade cardiointensiva estudada. 

As afirmativas “Cama e/ou travesseiros desconfortáveis” (08-32%) e “Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos” (07-28%) foram consideradas como muito estressantes. E “Assistir o tratamento administrado em outros pacientes” (10-40%), bem como “Ouvir pessoas falando sobre você” (10-40%) foram relatadas como moderadamente estressante (Tabela 2). 

 

Tabela 2 - Fatores estressores apontados pelos pacientes, conforme escala de Likert. Rio de Janeiro. RJ, Brasil, 2019 (n=25)

Variáveis

n

%

Extremamente estressante

 

 

Sentir dor

17

68

Não conseguir mexer os membros, devido às vias intravenosas

13

52

Não ter controle de si mesmo

11

44

Não ter explicações sobre o tratamento

10

40

Não saber quando as coisas vão acontecer

10

40

Não conseguir dormir

10

40

Estar incapacitado para exercer o seu papel

10

40

Preocupações financeiras

9

36

Medo da AIDS

9

36

Ter que ficar olhando para os detalhes do teto

9

36

Medo da morte

9

36

Desconhecer o tempo de permanência na UTI

9

36

Estar incapacitado para se comunicar

8

32

Sentir falta do marido ou da esposa

7

28

Não saber que horas são

7

28

Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos

7

28

Muito estressante

 

 

Cama e/ou travesseiros desconfortáveis 

8

32

Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos 

7

28

Ter sede

6

24

Estar em ambiente muito quente ou muito frio 

6

24

Não ter controle de si mesmo 

5

20

Moderadamente estressante 

 

 

Assistir a tratamento administrado em outros pacientes

10

40

Ouvir pessoas falando sobre você

10

40

Sentir que a enfermagem está mais atenta aos equipamentos do que a você

9

36

Escutar alarmes do monitor cardíaco dispararem

9

36

Ter a enfermagem constantemente fazendo tarefas ao redor do leito

9

36

Não saber quando as coisas vão acontecer 

9

36

Não saber onde está

9

36

Escutar o barulho e os alarmes dos equipamentos

8

32

Escutar o gemido de outros pacientes 

8

32

Ser furado por agulhas

8

32

Estar em ambiente muito quente ou muito frio

8

32

Desconhecer o tempo de permanência na UTI

8

32

Medo da AIDS

8

32

Sentir que a enfermeira está muito apressada 

7

28

Ser pressionado a concordar com o tratamento

7

28

Fonte: Elaborado pelos autores, 2021.

 

DISCUSSÃO 

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS)(7), no Brasil e no mundo, a DCV é a principal causa de morte e incapacitação em adultos, se tornando um grande problema de saúde pública e vários fatores contribuem para o desenvolvimento dessa condição, dentre eles pode-se destacar o gênero e a idade. Nessa perspectiva, sabe-se que o envelhecimento populacional é o que mais favorece o aumento do número total de casos de DCV e de outras doenças crônicas, principalmente em cenários de países em desenvolvimento econômico, como o Brasil. 

Em 2017, foram registrados 17,79 milhões de mortes por doenças cardiovasculares, correspondendo a 31,8% do total de mortes. Destes óbitos, estima-se que 85% acontecem devido a ataques cardíacos e acidente vascular cerebral. Mais de três quartos das mortes por doenças cardiovasculares ocorrem em países de baixa e média renda(8).  

Dentre as características sociodemográficas, observou-se que o sexo masculino prevaleceu com 64% (16 participantes). Outros estudos comprovam esses achados quando discutem que existe maior risco para evento cardiovascular no homem, visto que o gênero masculino é um fator de risco importante, ao passo que nas mulheres o risco aumenta no período da menopausa. Isso se deve ao fato de que o gênero feminino, associado à idade avançada e a outros fatores de risco como o diabetes e a dislipidemia, contribui para o aumento do risco de doenças cardiovasculares nessa população, principalmente, após o climatério. No entanto, as razões fisiológicas para tanto, ainda não estão totalmente esclarecidas(9).

A faixa etária que prevaleceu entre os participantes foi de 60 a 80 anos, com maior predominância nos homens, ao passo que as mulheres se apresentavam mais idosas ao diagnóstico, diminuindo a diferença da ocorrência desse evento entre os gêneros a partir dos 70 anos de idade(10).  De acordo com as Diretrizes de Cardiogeriatria(11), entre os idosos brasileiros, em 2013, 48,6% apresentavam uma ou duas doenças crônicas e 29,1%, três ou mais. E as mulheres idosas possuem uma proporção mais elevada de contraírem alguma doença em relação aos homens, 81,2% e 73,1%, respectivamente. 

Esses dados se justificam quando se compreende que muitas DCNTs acometem mais a saúde da população idosa, levando esses indivíduos a uma maior fragilidade para o adoecimento. Outro ponto que também influencia esses achados é o incremento da proporção dessa faixa etária na população brasileira, devido ao crescimento da expectativa de vida nas últimas décadas. 

Os achados desse estudo corroboram com os descritos na literatura, visto que o IAM possui maior ocorrência a partir da sexta década de vida, constituindo a principal causa de morte da população idosa, o que corresponde a 34,2% e 35,2% dos óbitos masculinos e femininos, respectivamente. Isso aponta para a maior necessidade de prevenção, a fim de conscientizar que mudanças no estilo de vida, controle do tabaco e do álcool, melhor dieta alimentar e exercícios físicos possuem impacto relevante na redução das DCVs, e contribuem para uma longevidade com autonomia e qualidade de vida(12) 

A média de escolaridade dos participantes da pesquisa foi de 7,56 anos de estudos, indo ao encontro de como a questão do ensino formal no Brasil possui déficit e é fruto de diversos anos de atraso em políticas públicas severas.  Apenas 41,8% das pessoas de 25 anos em diante alcançaram 11 anos de estudo e, considerando os indivíduos entre 18 e 24 anos, 16,3% frequentam o ensino superior. As DCNTs acometem principalmente os países de baixa renda e com menor escolaridade, como o Brasil, já que o acesso à saúde preventiva e aos tratamentos necessários são limitados, contribuindo para uma menor expectativa de vida nessa população(13).  

A escolaridade pode favorecer significativamente as condições de saúde da população, pois o nível educacional dos indivíduos é capaz de revelar diferenças quanto à renda e à condição de saúde, mostrando que quanto mais anos de estudo, mais chances de alcançar melhor renda salarial e menor a chance de adoecer, haja vista a diferença na percepção da saúde(14).

Dos participantes desta pesquisa, 56% (14 participantes) possuíam alguma atividade laboral. Sabe-se que o trabalho pode promover ora saúde ora doença e situações de desequilíbrio entre a organização do trabalho prescrito e do trabalho real pode resultar em estresse, promovendo assim um aumento para risco de DCVs.

Com relação aos fatores estressores, as afirmativas “Ter dor” (17-68%), “Não conseguir mexer as mãos ou os braços devido às vias intravenosas” (13-52%), “Não ter controle de si mesmo” (11-44%), “Não ter explicações sobre o tratamento” (10-40%) foram consideradas como extremamente estressantes pelos pacientes internados na unidade cardiointensiva estudada. “Cama e/ou travesseiros desconfortáveis” (8-32%) e “Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos” (7-28%) foram considerados como muito estressantes e “Assistir a tratamento administrado em outros pacientes” (10-40%) e “Ouvir pessoas falando sobre você” (10-40%) foram relatados como moderadamente estressante. 

A afirmativa “Ter dor” apresentou-se como o primeiro fator considerado extremamente estressante.  A dor constitui-se como uma experiência sensorial e emocional desagradável e é uma das principais causas de sofrimento humano, gerando inúmeras incapacidades, comprometimento da qualidade de vida, repercussões psicossociais e econômicas, e pode ser expressa de formas variadas pelos indivíduos. A presença de dor contribui para inquietação, ansiedade, insônia, irritabilidade, taquicardia, taquipneia e hipertensão. Cabe ao profissional de saúde a responsabilidade da avaliação, controle e alívio da dor. Desta forma, o enfermeiro deve estar capacitado e ter embasamento teórico quanto as estratégias eficazes para o manejo da dor, bem como as técnicas de analgesias disponíveis, tempo de ação dos fármacos e suas complicações(15).

A afirmativa “Não conseguir mexer as mãos ou os braços devido às vias intravenosas” (13-52%) apareceu como o segundo fator extremamente estressante. Estar preso ou limitado ao leito pela necessidade de estar conectado aos circuitos para terapia intravenosa pode contribuir para experiências negativas no cotidiano do paciente, visto que sensações de medo e preocupação em manter a integridade do acesso são constantes. Afinal, pensamentos como a possibilidade da realização de procedimentos invasivos e potencialmente dolorosos, como uma nova punção do acesso vascular periférico, podem ser altamente estressantes para o indivíduo durante sua permanecia na Unidade Cardiointensiva(16-17)

A terapia intravenosa é uma atividade amplamente realizada pela equipe de enfermagem nos cenários hospitalares e é de elevada complexidade, exigindo treinamento adequado dos profissionais, a fim de desenvolver habilidades como destreza manual e domínio da anatomia vascular, para que o procedimento seja realizado de forma segura e com maior conforto para o paciente(18).

Outra afirmativa apontada pelos pacientes como extremamente estressante foi “não ter controle de si mesmo” (11-44%). Estar hospitalizado pode gerar nos indivíduos sensações inerentes da condição de estar “enfermo”, tais como medo e angústia, e pensamentos de incapacidade, dependência do outro e perda da capacidade do controle de si próprio. Momentos como a higiene corporal no leito, por exemplo, pode provocar exposição física e emocional, acarretando sentimentos de invasão da privacidade e da intimidade, que contribuem para aumentar o estresse durante o processo de hospitalização. Desta maneira, apresentar-se ao paciente, informar o que será realizado e pedir permissão para a realização dos procedimentos são condições essenciais para cumprimento dos preceitos éticos da profissão e manter o respeito com quem está sendo cuidado, pois cuidar é uma atitude que abrange mais que um momento de atenção, zelo e desvelo. Representa uma atitude de responsabilização e de envolvimento respeitoso com o outro(18). Isso pode justificar a afirmativa dos pacientes de “não ter explicações sobre o tratamento” (10-40%), como extremamente estressante também.

A comunicação com o paciente é essencial para que a equipe de saúde desempenhe suas atividades assistenciais de forma segura e transparente para quem recebe o cuidado, bem como estreita as relações interpessoais. Várias necessidades humanas dependem da comunicação efetiva entre paciente e equipe de enfermagem, tais como conforto, alimentação e alívio da dor. Assim, compreende-se que a comunicação deve ser utilizada com o propósito de que o paciente precisa considerar que ela é um elemento de ajuda, capaz e efetivo, no qual ele pode interagir, partilhar ideias, anseios, sentimentos e expressar suas necessidades de ajuda(19).

Os fatores “Cama e/ou travesseiros desconfortáveis” (8-32%) e “Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos” (7-28%) foram considerados como muito estressantes. O primeiro pode estar relacionado a falta de conforto e de estrutura no serviço de saúde, devido à falta de investimentos do governo, o que torna precário há décadas o sistema público de saúde. E não se pode deixar de pensar, também, na falta de zelo de alguns profissionais que atuam neste cenário(19).

Com relação a “Ver a família e os amigos apenas por alguns minutos” (7-28%) ser da mesma forma considerada como muito estressante, pode-se correlacionar ao fato de que, quando uma pessoa está hospitalizada, ela deve seguir as regras e rotinas estabelecidas pelo hospital, devendo afastar-se dos seus entes queridos e cumprir o horário preestabelecidos para as visitas diárias dos familiares. Para pacientes e familiares a hospitalização na unidade cardiointensiva é um acontecimento estressante e singular, provocado por fatores como o risco de morte, a incerteza quanto ao tratamento e recuperação, o medo do desconhecido e a grande limitação pelo afastamento dos familiares desse cenário, levando a sensações de ansiedade, tristeza, sofrimento e impotência. O ambiente de unidade intensiva leva a uma quebra dos vínculos afetivos dos pacientes em um momento em que estes se encontram fragilizados pela situação de adoecimento(20). Desta forma, planejar o cuidado a fim de tornar esse ambiente mais acolhedor, como flexibilizar os horários de visitas, virtualizar os contatos com os familiares diminuindo a distância entre o paciente e os entes queridos, aumentar a comunicação com o paciente, ouvir atentamente as necessidades de cuidado, melhorar o barulho e iluminação noturna do ambiente, têm se constituído um desafio para a equipe de saúde que atua nessas unidades(19).

O estudo apresentou limitações, uma vez que foi aplicado em um único cenário e não realizou a correlação dos achados com as variáveis sociodemográficas, o que aponta para a necessidade de novos estudos.  

 

CONCLUSÃO

Foi possível evidenciar como fatores mais estressantes: “Sentir dor”; “Não conseguir se mover por conta de dispositivos acoplados ao corpo”; “Sentir que não tem controle de si mesmo” e “Não ter explicações sobre o tratamento”. Portanto, o planejamento do cuidado de enfermagem direcionado a essa população, com o intuito de resolver ou minimizar esses estressores perpassa por barreiras que vão desde a capacitação dos profissionais à estruturação do ambiente.

Estratégias simples como intensificar os protocolos de gerenciamento de dor na unidade, aumentar a escuta qualificada, esclarecer a necessidade de tecnologias, discutir com paciente o plano terapêutico e desenvolver autonomia para promover o autocuidado, deverão fazer parte do roll de prioridades do enfermeiro no planejamento rotineiro de sua assistência em uma unidade cardiointensiva com pacientes portadores de Síndrome Coronariana Aguda. 

Estima-se que esta pesquisa possa contribuir para o entendimento de que o ambiente hospitalar é um cenário bastante estressante e, assim, os enfermeiros e equipe de saúde devem estar atentos para  a identificação dos principais fatores ambientais capazes de gerar estresse nos pacientes internados na unidade cardiointensiva, de forma singular e individual, ratificando que planejar a assistência de enfermagem com intervenções que possam minimizar esses fatores, é primordial para estreitar as relações e solidificar o cuidado seguro e com qualidade.

 

REFERÊNCIAS

1. Organização Pan-Americana de Saúde. Cardiovascular diseases [Internet]. 2021 [Cited 2021 feb 25]. Available from: https://www.paho.org/pt/topicos/doencas-cardiovasculares 

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CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA 

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Submission: 05/11/2021

Approved: 07/06/2021

 

 

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