Desenvolvimento e validação de conteúdo do Resultado de Enfermagem “Satisfação da cliente: processo de parto”

 

Fernanda de Souza Freitas Abbud1, Luiza Hassad Pedrosa Rafful1, Suellen Cristina Dias Emidio2, Antonieta Keiko Kakuda Shimo1, Elenice Valentim Carmona1

 

1 Universidade Estadual de Campinas, SP, Brasil

2 Universidade Federal do Tocantins, Palma, TO, Brasil

 

 

RESUMO 

Objetivo: Desenvolver e validar o conteúdo do Resultado de Enfermagem (RE) "Satisfação da Cliente: Processo de Parto”. Método: Estudo metodológico de validação de conteúdo do RE por nove especialistas, utilizando-se o Índice de Validade de Conteúdo (IVC) em 33 puérperas.  Resultados: A versão final do RE foi composta por 25 indicadores. O IVC foi maior ou igual a 0,8 para todos os critérios avaliados para a maioria dos indicadores após a segunda avaliação das especialistas. Discussão: O RE “Satisfação da cliente: Processo de Parto” foi definido como “extensão da percepção positiva das mulheres quanto aos cuidados prestados pela equipe de saúde durante o processo do parto”. Conclusão: Considera-se que o uso dos RE da Nursing Outcomes Classification embora recente na nossa prática assistencial, representa uma possibilidade para avaliar cuidados relacionados ao processo de parto.

 

Descritores: Parto. Satisfação do paciente. Classificação. Processo de enfermagem. Enfermagem Obstétrica.

 

 

INTRODUÇÃO

A avaliação da satisfação dos usuários das instituições de saúde é uma das medidas mais importantes para melhorar os indicadores de excelência assistencial(1). A satisfação do usuário pode ser definida como o alinhamento entre as experiências vividas e as expectativas do indivíduo durante o uso dos serviços de saúde. Esta avaliação é subjetiva e baseia-se em aspectos cognitivos, emocionais, sociais, bem como, em experiências anteriores. Medir as percepções e vivências dos usuários quanto a satisfação da assistência prestada ainda é um desafio, pois não existe consenso nas propostas de avaliação(2) . 

Quanto à assistência obstétrica, várias nuances têm modificado a satisfação das usuárias. O resgaste ao parto natural sem intervenções, o estímulo à diminuição do número de cesarianas, novos protocolos clínicos baseados em evidências científicas e a concepção de violência obstétrica podem interferir na aferição da satisfação das mulheres, especialmente durante o trabalho de parto(3)

Os estudos brasileiros com abordagem quantitativa sobre a satisfação das mulheres relacionados ao processo de parturição são escassos. A maioria destas pesquisas retratou a realidade de uma determinada instituição e não utilizou instrumentos validados para a coleta de dados, porém, possibilitaram identificar que a presença do acompanhante, agilidade em implementar procedimentos técnicos que minimizem o desconforto, relacionado à dor, respeito às decisões e participação no processo decisório estavam relacionados à maior satisfação das mulheres com o processo de parto(4)

Avaliar a satisfação no processo de parturição é um desafio para os profissionais de saúde, já que o conceito de satisfação é multidimensional e, em relação ao trabalho de parto e parto está intimamente associado ao controle pessoal e expectativas atendidas(4)

Assim, vislumbra-se no âmbito da enfermagem um caminho a ser percorrido, capaz de preencher essa lacuna, utilizando a Nursing Outcome Classification (NOC)(5) para avaliar a satisfação da mulher neste contexto, pois a referida classificação de enfermagem apresenta vários Resultados de Enfermagem (RE) voltados para a satisfação do cliente. Esta Classificação viabiliza uma linguagem profissional padronizada que pode ser usada por enfermeiros para avaliar os resultados das intervenções de enfermagem, mas não apenas esses profissionais. 

A descrição dos resultados evidencia a participação dos enfermeiros como membros de uma equipe multiprofissional, dando suporte ao desenvolvimento da base do conhecimento de enfermagem, necessário ao avanço da prática(5). Diante disso, o presente estudo teve como objetivo desenvolver e validar o conteúdo do resultado de enfermagem "Satisfação da Cliente:  Processo de Parto”.

 

 

MÉTODO

Tratou-se de um estudo metodológico de abordagem quantitativa executado em duas etapas. A primeira delas, ocorrida entre março e junho de 2016, foi o desenvolvimento do RE “Satisfação da Cliente: Processo de Parto”, o que se compõe do título, sua definição e indicadores. Assim, foi realizada uma revisão integrativa da literatura dos indicadores do RE estudado e construção das definições conceituais, operacionais e de magnitude. Essas definições são importantes para oferecerem sustentação ao RE proposto, bem como auxiliar os especialistas a avaliarem seu conteúdo. 

A segunda etapa, ocorrida entre março a junho de 2017, foi a validação do conteúdo por consenso dos indicadores propostos para o RE estudado, considerando suas definições conceituais, operacionais e de magnitude construídas anteriormente. Foi utilizado o método de validação de conteúdo por consenso, que foi medido pelo Índice de Validação de Conteúdo (IVC). Segundo essa técnica, obtêm-se um constructo após a opinião de especialistas na temática escolhida, o que subsidia a qualificação do processo de cuidar e aprofunda o conhecimento acerca das taxonomias de enfermagem na prática clínica em diferentes especialidades. A proporção de concordância entre os especialistas foi mensurada pelo IVC. 

A seleção dos especialistas ocorreu a partir do currículo acadêmico e profissional obtido pela Plataforma Lattes, sendo selecionados nove especialistas. Os especialistas foram definidos por meio da presença de pelo menos dois dos seguintes critérios: experiência clínica em enfermagem obstétrica por pelo menos cinco anos; curso de especialização em enfermagem obstétrica; mestrado e/ou doutorado relacionados à enfermagem obstétrica; mestrado e/ou doutorado relacionados a NOC; publicação de estudos sobre a satisfação da mulher com o processo de parto; publicação de estudos sobre Classificações de Enfermagem; publicação de estudos sobre Satisfação do Cliente. Não há consenso na literatura sobre a quantidade especialistas necessários para realizar a validação de conteúdo, contudo, recomenda-se que seja um número ímpar especialistas e que, preferencialmente, sejam entre 5 e 10 juízes (6).

Quando o especialista aceitou participar da pesquisa, após contato prévio por e-mail, enviou-se o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)bem como o formulário contendo o conteúdo proposto para o RE em estudo, solicitando-se avaliação do título, definição, indicadores, definições conceituais, operacionais e de magnitude e possíveis sugestões para cada indicador proposto. 

Foi solicitado aos especialistas que fizessem o julgamento das definições conceituais, operacionais e de magnitude, considerando os critérios de simplicidade, clareza e relevância(6). Assim, eles atribuíram as seguintes notas: -1 (critério não atendido, ou seja, definição/indicador não adequado); 0 (indecisão quanto à adequação do critério, ou seja, definição/indicador de algum modo adequado) ou +1 (critério atendido, ou seja, definição/indicador adequado). Para as notas 0 ou -1, pediu-se sugestões para os especialistas. 

A partir desses valores, calculou-se o IVC, que indicou em que medida as opiniões dos especialistas são congruentes. Tal cálculo foi dado pela soma dos pontos +1 atribuídos pelos especialistas para cada um dos critérios relacionados às definições conceituais, operacionais e de magnitude, sendo o resultado dividido pelo total máximo de pontos possível (equivalente ao número de especialistas). 

O IVC desejável foi maior ou igual a 0,8(7) nesse estudo. Quando o IVC foi menor que 0,8 para qualquer critério analisado, os conteúdos foram revisados e reenviados aos especialistas. Para os indicadores que apresentaram IVC inferiores a 0,70, foi solicitada a recomendação dos especialistas quanto à pertinência desse indicador. 

Após a validação de conteúdo do RE pelos especialistas, foi realizado um teste aplicando-o às puérperas em setembro de 2017. O teste do RE foi realizado em uma unidade de Alojamento Conjunto de um hospital público de ensino que possui 32 leitos, referência para assistência de gestações de alto-risco. 

A amostra prevista para o teste do resultado foi de 30 puérperas. Visto que não há consenso na literatura sobre o tamanho amostral ideal para esse teste, utilizou-se as recomendações de pré-teste para o processo de construção de instrumentos de medidas na área da saúde(7)

Foram sujeitos desse estudo: mulheres que estiveram internadas no referido local, idade igual ou maior a 18 anos; tempo de internação igual ou superior a 24h; puérperas alfabetizadas, orientadas no tempo e espaço. A amostra prevista para o teste do resultado foi de 30 puérperas(8)

Os indicadores foram apresentados às mulheres e para cada um deles elas deveriam dizer se sentiam: “insatisfeita”; “pouco satisfeita”, moderadamente satisfeita”, “muito satisfeita”, “incompletamente satisfeita” ou ainda “não se aplica”, quando a mulher não vivenciou a situação. Tanto o conteúdo dos indicadores quanto as opções de respostas estavam disponíveis para a consulta das mulheres, ao longo da sua aplicação. 

As mulheres foram convidadas pessoalmente a participar, oportunidade em que a pesquisadora apresentou brevemente o estudo e o que significava participar dele. Após o aceite, a mulher leu e assinou o TCLE. A pesquisadora após o teste do RE junto às mulheres, fez uma avaliação da praticabilidade que consistiu em investigar junto a elas se foi fácil compreender os indicadores e assinalar as respostas.

Os dados foram armazenados em planilha do Excel for Windows®, sendo posteriormente analisados com auxílio do software estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0. Realizou-se análise por meio de estatística descritiva. 

O estudo seguiu as recomendações da Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas, sob Parecer n º1.873.714, com CAAE: 59371816.7.0000.

 

 

RESULTADOS

Após a revisão dos 17 RE propostos pela NOC para avaliar a satisfação do cliente em diferentes contextos, verificou-se que aquele que teria conteúdo mais relacionado ao RE que se planejou desenvolver seria o “Satisfação do Cliente”, embora ele seja geral e não contemple as especificidades do processo de parto. Ainda que outros RE sobre satisfação do cliente também apresentem indicadores importantes para avaliar a satisfação no contexto de trabalho de parto e parto. 

Assim, o RE desenvolvido foi nomeado como “Satisfação da Cliente: processo de parto” e composto por título, definição do título e 27 indicadores. Para cada indicador foram desenvolvidas definições conceituais, operacionais e de magnitude. Esses conteúdos foram analisados por nove especialistas, que avaliaram os critérios de simplicidade, clareza e relevância, bem como ofereceram sugestões para aprimorar o que foi proposto pela pesquisadora. 

Após a primeira rodada com as especialistas, foram excluídos dois indicadores: “Perguntas respondidas completamente” e “Informações fornecidas sobre o processo de parto e mudanças esperadas”. 

Dentre os 25 indicadores validados para o RE desenvolvido, 13 não necessitaram de ajustes após o teste com as mulheres, pois as mesmas não demonstraram dúvidas ao longo de sua aplicação. São eles: “Proteção do direito legal da presença de um acompanhante”; “Auxílio e/ou estímulo para mudanças de posição desejadas durante o processo de parto”; “Assistência na escolha e no acesso a alimentos e líquidos para consumo”; “Assistência para manter o conforto; A equipe apresenta informações de forma compreensível”; “Limpeza do ambiente de cuidado”; “Tempo de espera para ter as necessidades atendidas”; “Conhecimento e habilidade demonstrados pela equipe de saúde durante o processo de parto”; “Equipe se comunica com a cliente sem demonstrar julgamentos”; “Consideração demonstrada pela equipe quanto aos sentimentos e opiniões da mulher”; “Segurança quanto à identificação da cliente em pulseira e leito”; “Informações e condutas para prevenção de quedas ao longo do processo de parto”; “Uso apropriado do toque vaginal”. O Quadro 1 apresenta o conteúdo do RE que foi validado pelos especialistas após a segunda rodada:

 

Quadro 1:

Resultado de Enfermagem “Satisfação da Cliente: Processo de Parto” após validação de conteúdo por especialistas. Campinas, SP, Brasil, 2017.

Satisfação da Cliente: Processo de Parto

Definição: Extensão da percepção positiva das mulheres quanto aos cuidados prestados pela equipe de saúde durante o processo do parto.

Indicadores

Insatisfeita

Pouco satisfeita

Moderadamente satisfeita

Muito Satisfeita

Completamente satisfeita

 

1

2

3

4

5

1

Informações recebidas sobre os métodos para o alívio da dor

1

2

3

4

5

NA

2

Cuidados não farmacológicos para o controle da dor

1

2

3

4

5

NA

3

Cuidados farmacológicos para o controle da dor

1

2

3

4

5

NA

4

Proteção do direito legal da presença de um acompanhante

1

2

3

4

5

NA

5

Preferências pessoais foram consideradas ao longo dos cuidados

1

2

3

4

5

NA

6

Auxílio e/ou estímulo para mudanças de posição desejadas durante o processo de parto

1

2

3

4

5

NA

7

Continuidade dos cuidados à medida que a mulher é transferida de um ambiente para outro

1

2

3

4

5

NA

8

Assistência na escolha e no acesso a alimentos e líquidos para consumo

1

2

3

4

5

NA

9

Assistência para manter o conforto

1

2

3

4

5

NA

10

Instruções para melhorar a participação da mulher no processo de parto

1

2

3

4

5

NA

11

A equipe apresenta informações de forma compreensível

1

2

3

4

5

NA

12

Limpeza do ambiente de cuidado

1

2

3

4

5

NA

13

Tempo de espera para ter as necessidades atendidas

1

2

3

4

5

NA

14

Conhecimento e habilidade demonstrados pela equipe de saúde durante o processo de parto

1

2

3

4

5

NA

15

Acesso a suprimentos e equipamentos

1

2

3

4

5

NA

16

Promoção da Privacidade

1

2

3

4

5

NA

17

Integração de crenças culturais aos cuidados de enfermagem

1

2

3

4

5

NA

18

Uso do nome do cliente ao longo dos cuidados

1

2

3

4

5

NA

19

Equipe se comunica com a cliente sem demonstrar julgamentos

1

2

3

4

5

NA

20

Cortesia demonstrada pela equipe

1

2

3

4

5

NA

21

Consideração demonstrada pela equipe quanto aos sentimentos e opiniões da mulher

1

2

3

4

5

NA

22

Segurança quanto à identificação da cliente em pulseira e leito

1

2

3

4

5

NA

23

Informações e condutas para prevenção de quedas ao longo do processo de parto

1

2

3

4

5

NA

24

Uso apropriado do toque vaginal

1

2

3

4

5

NA

25

Intervenções e manobras no processo de parto

1

2

3

4

5

NA

Fonte: Dados dos pesquisadores. 

 

O teste do RE junto às puérperas demonstrou a necessidade de ajustes em 12 indicadores, apesar de seus IVC de todos os títulos dos indicadores terem sido superiores a 0,80 após a segunda rodada com as especialistas. Discutiu-se com as autoras e optou-se por termos que poderiam substituir os incompreendidos pelas mulheres. Tais termos foram inspirados pelas próprias definições conceituais, as quais foram utilizadas junto às mulheres para facilitar a compreensão quando apenas o título do indicador não se mostrou suficiente. 

Após aplicar o RE estudado, utilizou-se o instrumento para avaliar a praticabilidade desse resultado, sendo que 32 responderam o instrumento. Em relação à facilidade de compreensão das instruções oferecidas sobre o RE, a maioria das mulheres (20 = 63%) concordou plenamente que foram entendidas facilmente. Também a maioria delas relatou que entendeu com facilidade os indicadores apresentados, o que representou 66% (21) das mulheres; enquanto 88% (28) concordaram plenamente que era fácil assinalar as respostas sobre o indicador.

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Os estudos sobre satisfação da mulher com o processo de parto, em consonância com o conteúdo do RE aqui proposto, apontam a necessidade de se olhar com maior atenção para tal fenômeno, assim como atentar-se para a relevância da enfermeira obstétrica capacitar-se para avaliar questões subjetivas, nomear fenômenos de enfermagem, propor intervenções, bem como planejar os resultados a serem obtidos e avalia-los, levando em conta as necessidades da cliente. 

O título proposto para o RE foi “Satisfação da Cliente: processo de parto” no intuito de manter correspondência com os RE já existentes na NOC que usam a palavra “cliente”(5) e contemplar o aspecto feminino dessa experiência. A definição do RE inicialmente proposta foi modificada considerando-se a equipe de saúde e não apenas a equipe de Enfermagem, o que também direcionou os indicadores passando a ser “extensão da percepção positiva das mulheres quanto aos cuidados prestados pela equipe de saúde durante o processo do parto”.

Assim, “equipe de saúde” foi o termo utilizado para descrever os profissionais envolvidos no cuidado ao longo do processo do parto já que a própria NOC(5) propõe que os resultados possam ser utilizados por outros profissionais, considerando que os cuidados aos clientes no âmbito da saúde, em sua maioria, são oferecidos por diversos profissionais. 

Para o indicador “Cuidados para o controle da dor” sugeriu-se dividi-lo em “Cuidados não farmacológicos para o controle da dor” e “Cuidados farmacológicos para o controle da dor”, visto que a atuação da equipe de saúde se diferencia em cada cuidado. Além disso, a literatura aponta estas duas formas de amenizar a dor durante o processo de parto(9)

Considerando a definição conceitual do indicador “Informações recebidas sobre os métodos para o alívio da dor”, ressalta-se que nem sempre a experiência sensitiva e emocional da dor é desagradável. Nessa proposição foi utilizada a definição de dor no trabalho de parto proposta pela NANDA-I(10), bem como o estudo que validou clinicamente o diagnóstico de enfermagem “dor de parto”. Assim modificou-se a definição conceitual para “Informações recebidas da equipe de saúde quanto às opções para amenizar experiência sensitiva e emocional variável de dor, durante o processo de parto, abrangendo método não farmacológico e /ou método farmacológico”.

Os métodos não farmacológicos “banho de imersão” e “uso do cavalinho” não foram localizados na revisão integrativa, porém foram indicados pelas especialistas. Aceitou-se tais indicações para a descrição da definição operacional relacionada ao cuidado não farmacológico, pois são apontados por guidelines internacionais reconhecidos em Obstetrícia(11) e são aplicados na prática assistencial. 

As especialistas que participaram desse estudo salientaram que a equipe de saúde não apenas deve permitir a presença do acompanhante, mas também estimulá-la, visto que, apesar da existência de lei que dá sustentação a esse cuidado, ainda existe resistência na sua execução(12), constituindo assim o indicador “Proteção do direito legal da presença de um acompanhante” um relevante fator a ser avaliado. 

Além do diálogo, a empatia da equipe, a tomada de decisão em conjunto durante o trabalho de parto, as preferências da parturiente foram pontos importantes destacados na fala das mulheres. Isso ofereceu subsídios para a proposição do indicador “Preferências pessoais foram consideradas ao longo dos cuidados”(13)

O indicador “Auxílio e/ou estímulo para mudanças de posição desejadas durante o processo de parto” baseia-se no fato de que as mulheres durante o processo de parto nem sempre precisam ser assistidas para se movimentarem, porém necessitam de liberdade e estímulo para que a movimentação seja possível, sempre que desejarem e seja oportuno(2). 

Ao investigar as experiências relacionadas ao ambiente do parto, as mulheres afirmam que permanecer no mesmo local no trabalho de parto, parto e pós-parto imediato é um aspecto positivo da sua experiência. Ao passo que outras apontam que a logística de mudar de sala ou clínica durante o expulsivo e precisar aguardar o profissional que atenderá seu parto foi uma experiência negativa(14). Para investigar a satisfação da mulher, considerando tais afirmações e as sugestões das especialistas, sugeriu-se o indicador “Continuidade dos cuidados à medida que a mulher é transferida de um ambiente para outro”.

A literatura traz situações em que as mulheres solicitam água, porém receberam permissão apenas para molhar os lábios. Divergindo dessa conduta, outro estudo aponta que a ingestão de líquidos claros não afeta a duração do parto e a taxa de cesariana, estando associada a maior satisfação com o parto(15). Outro estudo de revisão não identificou malefícios da restrição de alimentos e líquidos, concluindo que as mulheres podem alimentar-se durante o processo de parto, se esse for o desejo delas(16) e que provavelmente isso se dará em pequeno volume. Nenhum estudo incluído avaliou a opinião das mulheres que ficaram em jejum. Assim o indicador definido para esse contexto após a validação pelas especialistas foi “Assistência na escolha e no acesso a alimentos e líquidos para consumo”.

Pode ser observado na literatura que as mulheres se sentem inseguras e indecisas ao não receberem informações por parte dos profissionais de saúde(17). Além disso, algumas das entrevistadas pelos autores relataram que a comunicação era mais importante que aparatos tecnológicos. Portanto, foram propostos os seguintes indicadores: “Instruções para melhorar a participação da mulher no processo de parto”, a “A equipe apresenta informações de forma compreensível” e “Equipe se comunica com a cliente sem demonstrar julgamentos”.

Verifica-se que ao planejar o parto, o fator “tempo” esteve presente nas decisões das famílias. O indicador sugerido foi “Tempo de espera para ter as necessidades atendidas”. A percepção da mulher em relação ao tempo é bastante subjetiva. Assim, seguindo a literatura e as recomendações das especialistas, não foi proposta uma especificação de valor numérico do tempo.

A literatura aponta que as mulheres, ao receberem informações sobre o seu processo de parto, podem perceber a capacidade técnica da equipe e assim sentirem-se seguras durante o processo, ficando mais satisfeitas inclusive no pós-parto. Afirmam ainda que o ambiente hospitalar pode assegurar um atendimento rápido, quando se fizer necessária uma intervenção, pois acreditam que os profissionais saberão agir diante de qualquer necessidade delas(18). Assim, considerou-se relevante a proposição do indicador “Conhecimento e habilidade demonstrados pela equipe de saúde durante o processo de parto”.

O hospital foi descrito pelas mulheres como um local seguro para parir. Tal segurança foi atribuída aos equipamentos médicos disponíveis, caso necessário; assim como equipe de saúde capacitada para atender o parto, sugere-se o indicador “Acesso a suprimentos e equipamentos”.

Compartilhar o mesmo ambiente com outras clientes em trabalho de parto foi descrito pelas mulheres como um fator que afetou sua privacidade(14). A privacidade também pode ser tanto desconsiderada quanto respeitada ao longo do exame físico e do próprio atendimento ao parto como um todo. A literatura traz, nesse contexto, a exposição de áreas do corpo associadas à sexualidade e intimidade, apontando também o número de pessoas estranhas à mulher durante o processo de parto como fatores que comprometeram sua satisfação(4). O que deu sustentação para a proposição do indicador “Promoção da privacidade”.

O cuidado ao cliente vai está além do emprego de tecnologia dura. Para cuidar de pessoas é necessário compreender necessidades biológicas, físicas e culturais. Quando a equipe de saúde ou um determinado profissional desconsidera o contexto no qual a mulher em processo de parto está inserida, a mulher sente-se como uma máquina em funcionamento e classifica o cuidado como desumanizado. Com base nessas considerações, foram sugeridos os indicadores “Integração de crenças culturais aos cuidados”, “Cortesia demonstrada pela equipe” e “Consideração demonstrada pela equipe quanto aos sentimentos e opiniões da mulher”(19).

Considera-se que ao identificar a mulher pelo seu nome, oferece-se uma possibilidade de que ela se sinta tratada como um indivíduo. É importante para a segurança da mulher que a equipe conheça seu nome e o utilize ao falar com ela. O uso de diferentes nomes para a mesma pessoa, como apelidos e/ou nomes preferidos, pode levar a erros. Considerando a satisfação da mulher, bem como que qualidade e segurança do cuidado são aspectos indissociáveis, foi proposto o indicador “Uso do nome do cliente ao longo dos cuidados”. 

Ainda sob tal perspectiva, os indicadores “Segurança quanto à identificação em pulseira e impressos” e “Segurança quanto à prevenção de quedas” foram propostos, a partir da experiência clínica da pesquisadora, mesmo não sendo identificados na revisão integrativa. Mas atendendo à regulamentação da Resolução nº 36/2013 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a qual aponta a importância de implantação de programas relacionados à segurança do paciente.

O indicador “uso apropriado do toque vaginal” foi inspirado em indicador já existente “uso apropriado do toque”, uma vez que, dentre diferentes toques a serem feitos às mulheres, esse é um exame específico durante o processo de parto, passível de interferir negativamente na satisfação das mulheres se não for bem conduzido(20)

Os estudos apontaram alguns aspectos relacionados às intervenções durante o processo de parto que podem interferir na satisfação da mulher, tais como monitoramento contínuo do batimento cárdio-fetal, anestesia epidural, ruptura artificial de membranas, vácuo extrator, fórceps, episiotomia e uso de ocitocina sintética(11, 19)

A mudança do modelo de assistência intervencionista ainda é um desafio que requer esforços de gestores e equipe de saúde. Pois, mesmo em instituições brasileiras que se dedicam à mudança desse modelo, encontrou-se práticas prejudiciais nos atendimentos prestados: posição supina horizontal e pressão em fundo de útero; assim como intervenções úteis, mas que são usadas de forma inapropriada: amniotomia, ocitocina, analgesia, episiotomia(17). Diante desses achados e reflexões, foi sugerido o indicador “Intervenções e manobras no processo de parto”.

Dentre os 25 indicadores que tiveram seu conteúdo validado pelos especialistas, 12 indicadores precisaram ser explicados com o uso das definições conceituais para possibilitar a compreensão pelas mulheres. Isso pode estar relacionado à construção do indicador, mas também ao perfil das mulheres participantes do estudo. A baixa escolaridade de algumas participantes pode ter dificultado a compreensão dos indicadores desenvolvidos, sobretudo aqueles que apresentaram linguagem científica. Assim, é importante que seja aplicado a mulheres com diferentes níveis culturais para confirmar esse achado e direcionar a revisão dos enunciados. 

Uma limitação do estudo pode ter sido o RE ser aplicado pela pesquisadora que o desenvolveu. Como a pesquisadora tinha total domínio dos indicadores apresentados às mulheres, pode ter facilitado de alguma forma a compreensão. Ao se tratar de uma linguagem padronizada de enfermagem, é desejável que o RE seja amplamente aplicado e estudado em diferentes contextos. Isso de forma a verificar se outros enfermeiros também compreendem o RE “Satisfação da cliente: processo de parto”, assim como as mulheres. 

 

 

CONCLUSÃO

O RE “Satisfação da cliente: processo de parto” teve 25 indicadores validados, sendo que desses, 12 foram ajustados após a aplicabilidade e avaliação das mulheres participantes do estudo. Assim, foi possível realizar a validação de conteúdo deste RE. 

Alguns indicadores mostraram-se de difícil compreensão pelas mulheres, o que denota a necessidade de repensar a forma como esses descritores foram escritos. 

Considera-se que o uso da NOC, embora recente na nossa prática assistencial, representa uma possibilidade para avaliar cuidados relacionados ao processo de parto. Por outro lado, a escassez de estudos na área de enfermagem obstétrica relacionados à linguagem padronizada em enfermagem foi um obstáculo enfrentado para aprofundar a discussão. Assim, o presente estudo poderá contribuir para que novas pesquisas sejam desenvolvidas na área, bem como dar um suporte à prática clínica e ensino.

 

 

REFERÊNCIAS

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Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir: (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida.

 

 

 

Recebido: 20/10/2020

Revisado: 11/01/2021

Aprovado: 11/02/2021