Dificuldades de enfermeiros na segurança do paciente em centro cirúrgico: estudo exploratório

 

Larissa de Siqueira Gutierres1, Fernando Henrique Antunes Menegon1, Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni1, Rosângela Marion da Silva2, Simone García Lopes3, José Luís Guedes dos Santos1

 

1 Universidade Federal de Santa Catarina

2 Universidade Federal de Santa Maria

3 Faculdade de Medicina do ABC

 

 

RESUMO

Objetivo: Descrever as dificuldades de enfermeiros na gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico. Método: Estudo exploratório descritivo, com abordagem quanti-qualitativa, por meio de um survey on-line com 204 enfermeiros de centro cirúrgico de diferentes regiões do Brasil. O questionário continha dados de caracterização socioprofissional e uma questão aberta. Para análise, adotou-se estatística descritiva e análise textual com suporte do software IRAMUTEQ. Resultado: Obtiveram-se três classes semânticas: (1) Suporte organizacional (35,6%); (2) Conflitos interpessoais no trabalho (38,3%) e (3) Envolvimento da equipe de saúde no checklist de cirurgia segura (25,8%). Conclusão: as dificuldades de enfermeiros para a gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico relacionam-se principalmente às relações interpessoais no ambiente de trabalho e ao suporte organizacional.

Descritores: Segurança do Paciente; Centros Cirúrgicos; Cuidados de Enfermagem; Hospitais; Organização e Administração.

 

 

INTRODUÇÃO
O Centro Cirúrgico é uma unidade que contempla um sistema sociotécnico estruturado, administrativo e psicossocial. A complexidade que permeia esse ambiente de trabalho relaciona-se aos procedimentos cirúrgico-anestésicos, uso da tecnologia e envolvimento de diferentes categorias profissionais(1).
Decorrente da condição cirúrgica, o período perioperatório é marcado pela suscetibilidade a erros, visto a vasta complexidade de procedimentos e a necessária articulação entre as etapas do pré-operatório, trans-operatório e pós-operatório
(2). Insere-se nessa perspectiva a necessidade de aprofundar os conhecimentos sobre a assistência segura no período cirúrgico, tema que tem sido discutido mundialmente, principalmente após a publicação da campanha Safe Surgery Saves Lives (Cirurgia Segura Salva Vidas) da Organização Mundial da Saúde (OMS) que definiu padrões de segurança internacionais para os procedimentos cirúrgicos(3).
No Brasil, a segurança do paciente já faz parte da agenda política desde 2013, com a mobilização do Ministério da Saúde junto à Organização Mundial da Saúde, a partir da publicação da Portaria 5290/2013, que instituiu o Programa Nacional de Segurança do Paciente
(4). Na assistência de enfermagem em centro cirúrgico, o enfermeiro está presente em todas as etapas do período cirúrgico, sendo considerado um dos principais agentes da equipe de saúde que pode contribuir para a transformação do cuidado ao paciente visando à redução de eventos adversos(5). No cenário brasileiro, conforme dados do Sistema Único de Saúde, ocorreram 31.774 incidentes no país no ano de 2015, sendo 93% no ambiente hospitalar. Estima-se ainda que em média 50% dos eventos adversos estejam relacionados à assistência cirúrgica e que poderiam ter sido evitados(2-4).

Os eventos adversos possuem potencial para ocasionar danos graves e proporcionar repercussões negativas ao paciente, como danos físicos emocionais, aumento do tempo de internação e elevação dos custos hospitalares, uma vez que sua ocorrência está diretamente relacionada à qualidade da assistência à saúde e a cultura de segurança do paciente. Para a redução de eventos adversos e melhoria na segurança do paciente no centro cirúrgico, é necessária a implementação de uma cultura de segurança para potencializar mudanças na prática profissional dentro deste setor(5).

A cultura de segurança é resultante de valores, atitudes, percepções e competências, do grupo ou indivíduos que determinam padrões de comportamentos para o gerenciamento de segurança da instituição. Nesse contexto, o centro cirúrgico tem sido considerado como um dos ambientes hospitalares onde ocorre o maior número de eventos adversos e a segurança do paciente devido à complexidade presente nesse setor(6-7).

Assim, a produção científica sobre segurança do paciente no centro cirúrgico é escassa, embora seja um tema atual e relevante para a prática da enfermagem nesses ambientes de cuidado. Além disso, estudos recentes sobre segurança do paciente têm focado na análise da cultura de segurança do paciente(5,6) e identificação de tecnologias e boas práticas para promoção da segurança do paciente(8).

Frente ao exposto, os resultados deste estudo podem auxiliar no desenvolvimento de ações e oportunizar o planejamento de estratégias visando à segurança do paciente no perioperatório. Portanto, este estudo está direcionado a responder a seguinte questão norteadora: Quais são as dificuldades identificadas pelos enfermeiros na gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico?

Apresenta-se como objetivo descrever as dificuldades de enfermeiros na gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico.

 

MÉTODO

Pesquisa quanti-qualitativa, do tipo exploratório descritiva, desenvolvida a partir de um survey on-line, na plataforma Google Forms®. A opção pelo desenvolvimento de uma pesquisa online deu-se para potencializar a coleta de dados, permitindo um maior acesso a amostragem por conveniência dos participantes elencados para a pesquisa(9).
A pesquisa iniciou por meio do envio do
link, contendo o questionário da pesquisa por e-mail para os enfermeiros que trabalham em centro cirúrgico no Brasil e que eram cadastrados na Sociedade Brasileira de Centro Cirúrgico, Central de Material Esterilização e Recuperação Pós Anestésica (SOBECC), Rede Brasileira de Enfermagem e Segurança do Paciente (REBRAENSP) e Rede de Hospitais do Brasil com Núcleo de Segurança do Paciente (NSP) registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
O envio das mensagens foi realizado diretamente pelas instituições mencionadas ou pelos pesquisadores a partir da listagem de e-mails disponibilizada. De forma complementar, foi solicitado aos Conselhos Regionais de Enfermagem (COREN) e às seções estaduais da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEN) o encaminhamento do questionário para os enfermeiros associados. Outro método adotado foi o compartilhamento do
link do questionário nas redes sociais Facebook®, LinkedInn® e Instragam® e em grupos de WhatsApp®.
A coleta de dados foi realizada no segundo semestre de 2017, a partir de um instrumento composto por uma ficha de caracterização sócio profissional dos enfermeiros contendo sexo, idade, experiência em centro cirúrgico, formação, região do país, tipo de estabelecimento de trabalho, área de trabalho, carga horária semana, tipo de atuação profissional e informações sobre o serviço, como a quantidade de sala cirúrgicas sob responsabilidade do enfermeiro e número de cirurgias e uma questão aberta acerca das dificuldades dos enfermeiros na gestão do cuidado para a segurança do paciente no centro cirúrgico. Antes da coleta de dados, realizou-se pré-teste do instrumento com três enfermeiros de centro cirúrgico e dois enfermeiros docentes com experiência na temática. Não se constatou necessidade de modificações no instrumento. Os dados obtidos foram organizados em uma planilha
do Microsoft Excel®.
O critério de inclusão no estudo foi experiência profissional mínima de três meses como enfermeiro de centro cirúrgico. Foram excluídos os questionários com informações incompletas e em duplicidade. A duplicidade de respostas foi avaliada por meio da auditoria dos registros de e-mail dos participantes, sendo considerada a última resposta recebida. A partir disso, obteve-se uma amostra por conveniência.
A amostra inicial foi composta por 248 respostas. Foram excluídos 10 participantes que indicaram tempo de atuação inferior a três meses em centro cirúrgico, 10 questionários devido à duplicidade de participação e oito com itens incompletos. Dezesseis participantes não responderam à questão aberta sobre as dificuldades em relação à segurança do paciente em centro cirúrgico. Portanto, consideraram-se as respostas de 204 enfermeiros, que compõem a amostra final da pesquisa.
A análise dos dados referentes ao perfil sócio profissional dos participantes foi realizada por meio
Software Statistical Package for Social Sciences (SPSS) for Windows, versão 19. As variáveis categóricas foram avaliadas por meio de frequência absoluta e percentual. Para as variáveis contínuas, foram analisadas as medidas de posição (média, mínimo e máximo) e dispersão (desvio padrão).
As respostas da questão aberta do questionário foram analisadas por meio do software
Interface de R pourles Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ), que explora a informação principal contida em um segmento de texto por meio do processamento e análise estatística. Cada texto analisado diz respeito à resposta de um dos participantes à pergunta aberta e o conjunto de textos deve ser organizado em um corpus único para o processamento dos dados que foi preparado em um arquivo do programa Open Office®. Termos compostos por mais de uma palavra foram reescritos utilizando-se traço sob escrito entre as palavras de modo a identificá-las como um termo único nas análises. As categorias de palavras incluídas para análise foram: adjetivos, substantivos, verbos e formas não reconhecidos, de modo que 98,3% do material foi aproveitado pelo software.

A análise no IRAMUTEQ ocorre por meio do agrupamento de vocábulos, chamados de ocorrências, por similaridade semântica, permitindo cinco tipos de análises: estatísticas textuais clássicas; pesquisa de especificidades de grupos e análise fatorial confirmatória; Classificação Hierárquica Descendente (CHD); análise de similitude de palavras; e, nuvem de palavras(10). Neste estudo, realizou-se a análise por CHD, que gera classes semânticas. A partir dos segmentos de texto atribuídos a cada uma das classes reveladas pelo programa, procederam-se à análise e interpretação dos dados pelos pesquisadores para identificação das dificuldades identificadas pelos enfermeiros na gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico.
As recomendações éticas foram seguidas e a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, mediante, mediante Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) n° 64255317.9.0000.0121. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi apresentado
on-line aos participantes antes de iniciar a coleta de dados por meio de uma página de esclarecimento sobre a pesquisa. O participante precisava clicar na opção “concordo em participar da pesquisa” para confirmar a sua anuência em relação aos termos do estudo e ser direcionado para a tela seguinte com o questionário.

 

RESULTADOS

Os enfermeiros participantes da pesquisa eram majoritariamente do sexo feminino (n=186; 85%), com média de idade de 37,6 anos (DP=8,40; mínimo de 21 e máximo de 62 anos) e especialização na área de centro cirúrgico (n=75; 35%). Referente às variáveis laborais, predominaram enfermeiros de hospitais privados (n=79; 39%), da região Sudeste (n=75; 35%), com atuação na assistência de enfermagem (n=108; 53%) e tempo médio de atuação em centro cirúrgico de 7,84 anos (DP=7,11; mínimo de 3 meses e máximo de 37 anos).

Quanto às dificuldades dos enfermeiros em relação à segurança do paciente, o corpus analisado foi composto por 242 textos, 2289 palavras, sendo 668 ocorrências diferentes, divididos pelo software em 246 segmentos de texto. A análise por CHD gerou três classes semânticas: (1) Suporte organizacional (35,6%); (2) Conflitos interpessoais no trabalho (38,3%) e (3) Envolvimento da equipe de saúde ao checklist de cirurgia segura (25,8%). A análise das relações entre as classes semânticas indica complementaridade entre as classes 2 e 3, as quais são englobadas pela classe 1. A frequência de ocorrências por classe e as relações entre ambas estão apresentadas na figura 1.

Figura 1- Distribuição das ocorrências e relações entre as classes semânticas. Florianópolis, SC, Brasil, 2020.

Figura1

Fonte: Elaborado pelos autores


A Classe 1 diz respeito às dificuldades em relação ao suporte organizacional como à falta de funcionários, rotatividade dos profissionais e suporte dos gestores da instituição. Ainda, destaca-se que as dificuldades referentes ao suporte organizacional se relacionam às outras classes semânticas como fator contributivo para as outras dificuldades encontradas pelos enfermeiros no centro cirúrgico. A Classe 2 abrange as dificuldades quanto à comunicação e ao trabalho em equipe no centro cirúrgico, especialmente em relação aos médicos/cirurgiões. A Classe 3 evidencia a falta de envolvimento da equipe de saúde na adoção do
checklist de cirurgia segura. Na figura 2, apresentam-se depoimentos que ilustram as classes semânticas e uma síntese qualitativa de cada uma delas.

 

Figura 2 – Classes semânticas e síntese dos achados do estudo. Florianópolis, SC, Brasil, 2020.

Depoimentos

Síntese qualitativa

Suporte organizacional

Falta de funcionários no setor e alta rotatividade de pessoal; Falta de materiais, rotatividade dos funcionários, a falta de treinamentos para melhorar o atendimento;

Falta de apoio da alta administração para implantação correta do checklist para cirurgia segura por ser um hospital com alguns médicos donos não acatam o checklist;

Recursos físicos e materiais adequados e quantitativo de pessoal;

Falta de estrutura organizacional para potencializar a implantação de novas práticas de segurança do paciente.

O absenteísmo e a rotatividade dos funcionários dificultam a atuação do enfermeiro, que muitas vezes precisa exercer funções que não são de sua competência. A enfermagem desenvolve ações em prol da segurança do paciente, porém necessita tanto do apoio assistencial quanto gerencial para alcançar bons resultados.

Conflitos interpessoais no trabalho

Falta da parceira multidisciplinar, principalmente dos médicos;

A arrogância dos médicos;

A cooperação da equipe médico cirúrgico, pois eles não consideram importante a apresentação da equipe e ficam até chacoteando, chegando muitas vezes a interromper a checagem em sala operatória;

Existem dois grandes problemas: a comunicação e a aceitabilidade de novas rotinas pela equipe multiprofissionais, principalmente cirurgiões;

A discordância de alguns cirurgiões e anestesistas sobre boas práticas para a segurança do paciente.

A busca pela assistência segura do paciente no Centro Cirúrgico requer cooperação e participação da equipe multiprofissional.
Ressalta-se a importância do uso dos protocolos institucionais e da comunicação entre os profissionais, visto que esta facilita a uniformização e continuidade de condutas assistenciais, contribuindo para uma boa relação interpessoal e consequentemente um ambiente laboral favorável.

Envolvimento da equipe de saúde no checklist de cirurgia segura

A adesão das equipes médicas ao cumprimento das metas internacionais de segurança;

Não colaboração da maioria dos cirurgiões e anestesistas;

Falta de envolvimento dos profissionais da enfermagem, anestesistas e cirurgiões;

O comprometimento de alguns colaboradores;

O comprometimento dos anestesistas nas ações de segurança do paciente.

É importante a utilização do checklist e dos protocolos de cirurgia segura para redução de danos ao paciente cirúrgico. É fundamental o comprometimento e envolvimento da equipe multiprofissional, incluindo equipe médica e de enfermagem para garantir a segurança do paciente.

  Fonte: Elaborado pelos autores

 

DISCUSSÃO

As principais dificuldades de enfermeiros na gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico estão relacionadas principalmente ao “suporte organizacional”. Nesse sentido, na classe semântica correspondente a esse tema, os participantes destacaram o subdimensionamento da equipe de enfermagem, falta de recursos materiais e falta de apoio dos gestores. Nesta perspectiva, percebe-se a relação entre às condições promovidas pela organização para a prática profissional dos enfermeiros e as dificuldades encontradas para a gestão da segurança do paciente no centro cirúrgico. Os cenários complexos mostram a necessidade do desenvolvimento do suporte organizacional e controle para favorecer um ambiente propício para promover cuidados de qualidade e com segurança para os pacientes(11).
Percebe-se que o subdimensionamento da equipe de enfermagem foi uma das principais dificuldades citadas pelos participantes, destacando a alta rotatividade e a falta de profissionais para atuação no centro cirúrgico. Nas organizações de saúde, a intensidade do trabalho revela-se principalmente pelo subdimensionamento dos trabalhadores, trazendo como consequência a precarização do trabalho e o comprometimento da segurança do paciente. O dimensionamento adequado da equipe de enfermagem mostra-se como um elemento importante para a garantia da qualidade e segurança da assistência prestada aos pacientes(12).
Além das dificuldades já apresentadas, os enfermeiros ainda destacam a falta de recursos materiais no centro cirúrgico, o que está em consonância com a falta de recursos humanos para o desenvolvimento da assistência. Nesse sentido, o cenário de limitação de recursos, a sobrecarga de trabalho da equipe de enfermagem e o acúmulo de funções dos enfermeiros contribui para fragilidades na segurança do paciente. A elevada taxa de cancelamento e suspensão de cirurgias por falta de recursos, equipamentos, médicos e profissionais de enfermagem
(13). A limitação de recursos de trabalho e o acúmulo de funções dos enfermeiros são aspectos que contribuem para fragilidades na segurança do paciente. Essa problemática envolvendo a sobrecarga de trabalho e o potencial risco de evento adverso é um dos causadores das elevadas taxas de mortalidade nas unidades de saúde, e está fortemente relacionado ao quantitativo reduzido de profissionais de enfermagem, que propicia a incidência de evento adverso(14).

Outro aspecto destacado é a falta de apoio da administração para promoção da segurança do paciente no centro cirúrgico. A avaliação acerca da percepção da cultura de segurança entre profissionais de saúde atuantes em unidades de centro cirúrgico evidenciou que os enfermeiros em cargos gerenciais necessitam incentivar a segurança do paciente na unidade cirúrgica(5). Os desafios e as limitações encontrados nas atividades gerenciais no centro cirúrgico derivam de condições intrínsecas do próprio ambiente, além da imprevisibilidade e da necessidade constante de planejamento e organização das ações.

Para a segunda classe denominada “Conflitos interpessoais no trabalho” destaca como dificuldades as relações com os médicos, a falta de comunicação entre os profissionais e o trabalho em equipe multidisciplinar. Problemas de relacionamento e falhas de comunicação podem contribuir para eventos potenciais relacionados à segurança do paciente.
Ainda, os profissionais destacaram como dificuldade o relacionamento com a equipe médica. Para os enfermeiros, as dificuldades de manutenção de um bom relacionamento com a equipe médica é uma das principais dificuldades enfrentadas no centro cirúrgico. Dificuldades de relacionamento entre a equipe médica e de enfermagem também estão descritos e outros ambientes de trabalho dos enfermeiros como fatores que podem influenciar negativamente na segurança dos pacientes
(15).

A má comunicação está implicada na ocorrência de muitos eventos adversos na sala de cirurgia. No contexto dinamarquês, identificou-se quatro padrões de comunicação e relacionamento em equipes cirúrgicas interdisciplinares: comunicação proativa e intuitiva; comunicação silenciosa e comum; comunicação desatenta e ambígua; e, comunicação contraditória. A primeira ocorre quando os membros da equipe trocam considerações sobre os desafios esperados antes e durante os procedimentos cirúrgicos e, assim, conseguiam resolver os problemas antecipadamente por meio da tomada de decisão compartilhada.

A comunicação silenciosa e comum manifesta-se quando a comunicação entre os membros da equipe era informativa e instrutiva, sem discussões prévias em relação ao paciente e ao procedimento cirúrgico. Já comunicação desatenta e ambígua caracteriza-se pela desatenção e troca de comunicações ambíguas entre si os membros da equipe. Em contrapartida, a comunicação contraditória diz respeito à troca de comunicação entre os membros da equipe de forma irônica e/ou desrespeitosa. Portanto, é essencial o investimento no aperfeiçoamento do trabalho no que tange à comunicação entre os membros da equipe para avançar nas questões relacionadas à qualidade e segurança do paciente em centro cirúrgico(16).

A comunicação dentro do centro cirúrgico também foi destacada pelos enfermeiros como uma dificuldade. Evidencia-se que a comunicação é uma competência chave para a segurança nos serviços de saúde, ambiente no qual os profissionais devem estar aptos para se comunicarem efetivamente com a equipe e pacientes. Estudo peruano que buscou avaliar a cultura de segurança do paciente evidenciou as falhas na comunicação como uma das maiores fragilidades(17). Enfermeiros de um hospital de Angola identificaram que a comunicação é um risco na sala de operações quando os membros da equipe falam muito alto sobre outros tópicos, o que interfere no processo de comunicação adequado(18). Para a última classe semântica “Envolvimento da equipe de saúde no checklist de cirurgia segura”, destaca-se a falta de adesão da equipe de saúde com o checklist de cirurgia segura, considerado desafio para a promoção da segurança do paciente nesse setor. Estudo realizado com a equipe de saúde e instrumentadores com o objetivo de identificar o conhecimento sobre a lista de verificação para segurança cirúrgica constatou que a maioria conhecia o protocolo, porém a falta de adesão da equipe foi o principal desafio encontrado para utilização deste protocolo(19).

O envolvimento de todos os profissionais que estão ligados diretamente ou indiretamente com o cuidado é de suma importância para o desenvolvimento do clima de segurança dentro do centro cirúrgico. Estudo brasileiro que mensurou o clima de segurança evidenciou que esse aspecto é inerente à prática profissional, porém pouco desenvolvido dentro do centro cirúrgico(5).
Problemas relacionados à baixa cultura de segurança no ambiente cirúrgico são descritos não apenas no Brasil, mas também em outros países. No cenário internacional, identificou-se que a cultura de segurança quando disseminada entre a equipe tem sido associada à diminuição de danos ao paciente em hospitais e em unidades como o centro cirúrgico
(20).

Neste sentido, o descomprometimento da equipe presente nos resultados pode ser associado como um fator que leva à baixa adesão dos protocolos de segurança da equipe médica. É importante que enfermeiros atentem à necessidade de maior envolvimento de cirurgiões e anestesistas na busca pela segurança do paciente no centro cirúrgico. Esse resultado pode estar relacionado ao desconhecimento de médicos sobre protocolos e/ou checklists de segurança do paciente. Além disso, muitos cirurgiões e anestesistas têm atuação esporádica em centros cirúrgicos conforme suas especialidades, com pouca ou nenhuma participação nas discussões organizacionais sobre segurança do paciente(20).

Por fim, as dificuldades identificadas relacionadas ao suporte organizacional, comunicação e a adesão ao checklist de cirurgia segura sugerem interferência na segurança do paciente em centro cirúrgico, e exigem ações pontuais conforme o contexto de trabalho. O enfermeiro de centro cirúrgico tem a oportunidade de causar impacto positivo no cuidado ao paciente por meio do planejamento compartilhado das ações a serem realizadas, sendo um dos profissionais responsáveis pela gestão da segurança do paciente.
Os resultados indicaram como principais dificuldades o suporte organizacional, os conflitos interpessoais no trabalho e o envolvimento da equipe de saúde na utilização do
checklist de cirurgia segura. A comunicação efetiva entre os membros da equipe ainda é a principal dificuldade dos enfermeiros do centro cirúrgico, sendo o problema que mais contribuiu para a ocorrência de eventos adversos nos procedimentos cirúrgicos.
Como limitação do estudo, a utilização de coleta de dados
online pode ser considerada um fator dificultador do controle de amostras e populações, pois o participante está mais suscetível à recusa ou o abandono ao estudo em andamento. Além disso, há possibilidade de pessoas interessadas pelo tema da pesquisa enviesarem a composição da amostra.

 

CONCLUSÃO

Este estudo permitiu a descrição das dificuldades enfrentadas por enfermeiros para a gestão e promoção da segurança do paciente em centro cirúrgico. Os resultados apresentados poderão contribuir com a prática de enfermeiros assistenciais e gestores de centro cirúrgico no desenvolvimento de estratégias para superação das dificuldades que podem comprometer a segurança do paciente. É importante que o enfermeiro tenha suporte organizacional e condições de trabalho que potencializem sua atuação como líder e gerente do cuidado no centro cirúrgico em prol de uma maior adesão a protocolos de segurança por todos os membros da equipe.

 

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Contribuições:


Larissa de Siqueira Gutierres: aquisição, análise e interpretação de dados do estudo.

Fernando Henrique Antunes Menegon: aprovação da versão final do estudo a ser publicado.

Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni: aprovação da versão final do estudo a ser publicado.

Rosângela Marion da Silva: aprovação da versão final do estudo a ser publicado.

Simone Garcia Lopes: aprovação da versão final do estudo a ser publicado.

José Luís Guedes dos Santos: aquisição, análise e interpretação de dados do estudo.

 

Recebido: 29/09/2020

Revisado: 09/11/2020

Aprovado: 30/11/2020