Análise do processo de implantação do serviço de atenção ao paciente com COVID-19

 

 

Odilon Adolfo Branco de Souza1, Claudia Mara Melo Tavares1

 

 

1  Universidade Federal Fluminense

 

RESUMO

A pandemia COVID-19 vem exigindo enorme esforço dos gestores hospitalares, desafiando-os a agir e pensar fluxos de atendimento de maneira rápida, adotando estratégias seguras de cuidar. Objetivo: Analisar o processo de planejamento e implantação de um serviço de atenção ao paciente com COVID-19 em um hospital universitário, através da experiência cotidiana de gestão. Método: Trata-se de um relato sistemático de experiência sobre o processo de implantação de fluxo de atendimento e tratamento em um hospital universitário de pessoas acometidas pela COVID-19. Registrou-se em diário de campo a experiência, sendo as narrativas submetidas à análise de conteúdo. Resultados: a análise das narrativas permitiu organizar os dados nas seguintes categorias: necessidade de segurança dos profissionais, capacitação, empatia e gestão participativa. Conclusão: É importante utilizar os processos de trabalho e a Educação Permanente em Saúde como ferramentas para a orientação do cuidado assistencial ao paciente com COVID-19. O raciocínio clínico, o trabalho interdisciplinar e a tomada de decisão de forma participativa permitiu a adequada implantação do atendimento, apesar do temor da equipe frente aos desafios da pandemia.

Palavras-chave: Pandemia; Gestão da Prática Profissional; Educação Permanente.

 

INTRODUÇÃO

A pandemia da COVID-19 desafiou os serviços de saúde, requerendo assistência de alta complexidade, novos modelos de trabalho e processos de Educação Permanente do pessoal da saúde.

No momento atual, importa compreender a realidade e as formas de ação cotidiana que os profissionais de saúde estão vivenciando, em face às demandas por uma assistência integral e multidisciplinar às pessoas acometidas pela COVID-19. Convoca-se os profissionais a refletirem sobre as limitações e a complexidade da oferta dos cuidados, colocando-os diante de dois fenômenos já experienciados historicamente na área da saúde – o medo da morte e do contágio.

Enfrentar uma pandemia de grande proporção requer políticas de saúde abrangentes, além de uma estrutura hospitalar robusta e uma rede integrada aos sistemas de Saúde Pública, que possibilitem tomada de decisões rápidas e adequadas para o controle e propagação do vírus (1).

A infecção por COVID-19 pode resultar em doença grave, incluindo hospitalização em unidade de terapia intensiva e óbito. Segundo boletim datado de 21/08/2020, no Estado do Rio de Janeiro, existem notificados 207.036 casos confirmados, com 15.202 óbitos. No Brasil, já se somam 3.532.330 de casos acumulados, com 113.358 óbitos por COVID-19, com 53,9 de taxa de mortalidade (2).  

A pandemia por COVID-19 resultou numa corrida sem precedentes dos serviços de saúde, principalmente à rede hospitalar de alta complexidade, para dar conta dessa nova e exigente demanda de cuidados críticos. Há ênfase nos cuidados de enfermagem e fisioterapia, exigindo enorme esforço dos gestores hospitalares, desafiando-os a agir frente a aplicação de princípios científicos envolvendo mobilização de competência profissional, administrativa, social e emocional, através da reorganização de fluxos/processos e condutas de atendimento, descrição e obtenção de materiais, medidas de segurança, treinamentos/capacitação, pactuação e trabalho emocional junto à equipe multiprofissional.

É preciso destacar que nesse novo contexto emergencial do cuidar, os trabalhadores de enfermagem estarão expostos ao risco de contaminação frente à exposição prolongada e frequente a pacientes potencialmente contaminados, à intensificação da jornada e a maior complexidade das tarefas de trabalho(1).

Com o início desta pandemia, uma das principais preocupações apresentadas pelos profissionais está relacionada a forma como deve ser realizado o atendimento ao paciente que apresenta suspeita ou confirmação da doença. Este primeiro contato ainda gera dúvidas e apreensões, principalmente devido às mudanças recorrentes no fluxo de atendimento (3).

A pandemia traz um desafio extra para a saúde mental de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. Sob maior pressão, estes profissionais tendem a descuidar da própria saúde mental na incansável e constante luta contra a COVID-19, podendo propiciar o surgimento de transtornos relacionados ao estresse e ansiedade (3).

Frente a este contexto, o trabalho do gestor de enfermagem torna-se ainda mais desafiador, a ele compete assegurar não só a qualidade dos cuidados prestados ao paciente, mas garantir condições para que toda equipe possa atuar de forma segura.

Diante dos inúmeros desafios postos pelo cenário de pandemia vivido na atualidade, considerando a emergência global do tema e o papel do gestor, o presente estudo procura responder a seguinte questão: Que aspectos relativos à gestão estão envolvidos no processo de implementação do atendimento às pessoas acometidas pela COVID-19 em um hospital universitário?

Sendo assim, o objetivo desse estudo é relatar a experiência cotidiana de gestão dos cuidados hospitalares, no período de planejamento e implantação de ações para o cuidado de pessoas acometidas pelo COVID-19 em um hospital universitário.

 

METODOLOGIA

Trata-se de uma análise da experiência sobre o processo de implantação do serviço de atenção às pessoas acometidas pela COVID-19 em um hospital universitário. A partir da sistematização da experiência construiu-se narrativas do que foi vivido por um gestor de enfermagem frente a necessidade de rever processos e protocolos para atendimento a esta clientela, objetivando adequações necessárias para a garantia da assistência aos usuários suspeitos ou confirmados e suas complicações, bem como a segurança para os profissionais assistenciais envolvidos no processo do cuidado direto e indireto.

A Sistematização de Experiência é uma modalidade de pesquisa qualitativa, orientada para a produção de sentidos, através de análise crítica e autocrítica, para registrar realizações de maneira fundamentada, falhas, dificuldades e possibilidades de melhoria (4). Ela permite construir e explicitar os saberes produzidos numa determinada experiência por um ou diferentes sujeitos, mediante a análise e valorização de ações (5).

O cenário do estudo foi um hospital universitário, localizado na cidade de Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Este hospital encontra-se no programa referenciado para atendimento de agravos previamente classificados de média e alta complexidade, bem como é, em princípio, referência para o tratamento das pessoas acometidas pela COVID-19.

As narrativas foram realizadas através de relatos diários sobre o que fora vivido nas rotinas e decisões tomadas pelo gestor e foram enviadas por mensagens instantâneas, via aplicativo WhatsApp, para a orientadora do autor, durante as duas semanas iniciais da Pandemia COVID-19 no Brasil e posteriormente categorizadas.

Para o desenvolvimento da pesquisa, a partir das categorizações identificadas através dos relatos analisados, foram seguidas as etapas propostas por utilização da técnica de análise de conteúdo: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados, inferência e interpretação(6). Sistematizou-se as ideias iniciais colocadas pelo quadro referencial teórico e estabelecendo indicadores para a interpretação das informações coletadas. Procedeu-se a leitura geral do material eleito para a análise, leitura flutuante, escolha dos documentos (definição do corpus de análise; formulação das hipóteses e objetivos a partir da leitura inicial dos dados; elaboração de indicadores a fim de interpretar o material coletado).

A ausência de submissão do projeto ao Comitê de Ética em Pesquisa para emissão de Parecer Consubstanciado não foi necessária por se tratar de um autorrelato de experiência, configurando assim, etapa dispensável.

 

RESULTADOS

A análise das narrativas cotidianas permitiu organizar os dados nas seguintes categorias: necessidade de segurança dos profissionais; capacitação e as demandas ao setor de Educação Permanente; empatia como instrumento para humanização da gestão; gestão participativa - compartilhando o poder de agir.

Necessidade de Segurança dos Profissionais

A enfermagem como profissão envolve diferentes tipos de riscos - químicos, biológicos, físicos e emocionais, lidando todos os dias com situações que envolvem ameaças à sua condição existencial e de seus familiares. As condições de trabalho e salário dos enfermeiros e da equipe de enfermagem são cronicamente insatisfatórias e embora haja uma aura idealista e romantizada sobre a profissão, essa é uma categoria profissional pouco valorizada socialmente. Esse ponto de partida contextual e macro-estrutural gerou muita insegurança para o início do trabalho com pacientes afetados pela COVID-19.

Todos os dias um novo momento, mas com situações bastante semelhantes... a cada informação sobre um profissional que chega para mim e comunica que apresenta sintomas gripais, vejo nos olhos deles a preocupação em ter sido contaminado pela COVID -19.

O número de infectados pela COVID-19 está aumentando e pessoas próximas a nós já apresentam complicações relacionadas a doença.  Ficamos nos  questionamento perguntando quem será o próximo. Os profissionais manifestam cada vez mais  medo de se contaminar.

Observamos, que apesar da insegurança gerada nos profissionais pela gravidade da pandemia, quando percebem que o gestor preocupa-se com sua segurança tendem a desenvolver sua prática laboral com maior autoconfiança e tranquilidade.

Acompanho de perto, a dinâmica do trabalho dos profissionais de enfermagem e da CCIH que estão realizando a coleta agendada do SWAB das vias aéreas superiores dos profissionais sintomáticos, pelo sistema drive-thru e percebo a condução desses, no que se refere às orientações para a importância da manutenção do isolamento social, até que saiam os resultados. Noto apreensão no rosto dos profissionais que estão sendo testados e me coloco ao lado deles.

Capacitação e as demandas ao setor de Educação Permanente

O setor de  Educação Permanente do hospital foi muito requisitado nesse período, dando ênfase aos conhecimentos requeridos para a segurança da equipe e dos pacientes.

As principais demandas foram por treinamentos relacionados ao uso adequado de EPI's, pois todos estão muito inseguros para prestar assistência de enfermagem diante dos riscos trazidos pela COVID-19, sendo os setorores de Educação Permanente e Infecão Hospitalar muito requisitados.

Os responsáveis por esses treinamentos são os Enfermeiros da Educação Permanente, a equipe médica e de enfermagem da CCIH e a equipe da Vigilância Epidemiológica, sempre aproximando os Enfermeiros coordenadores de unidade para serem multiplicadores das ações de segurança.

Não é possível fazer um trabalho dessa magnitude, centrado apenas em uma única categoria profissional, todos os trabalhadores da instituição hospitalar precisam ser considerados para os processos de capacitação e educação permanente.

Ações internas, em parceria com a Educação Permanente foram ativadas para promoção de treinamentos, pensando exatamente no perfil e nas possibilidades dos pacientes e suas necessidades investigativa/diagnóstica para a COVID-19, dentre elas, a higienização das mãos antes e após procedimentos, paramentação e desparamentação, técnica para coleta do SWAB - que irá diagnosticar a contaminação do paciente ou do profissional.

Empatia como instrumento para humanização da gestão

Ter empatia é condição fundamental para liderar a equipe em momentos de crise, numa perspectiva humanística. O uso da empatia contribui para o gestor compreender o comportamento de sua equipe, tomando decisões mais acertivas, considerando as dimensões objetivas e subjetivas que influenciam a prática profissional.

Percebo que a equipe do CTI encontra-se muito insatisfeita com as condições estruturais de trabalhando para o  atendimento ao paciente acometido por  COVID-19. Levarei as demandas da equipe à CCIH, solicitarei a presença da médica e da enfermeira para possíveis esclarecimentos, visando minimizar as dúvidas e melhorar o processo de trabalho no CTI.

Posiciono-me frente ao grupo, escuto, analiso e peço prudência frente a situação que vivenciamos no momento. Comprometo-me a buscar respostas para os questionamentos e oriento quanto à estratégia de registros internos para que tenhamos melhores insumos e possamos aumentar a segurança dos nossos profissionais. Digo-lhes que estou presente para colaborar no que for preciso e eles reforçam a questão da falta de comunicação.

Quando a equipe de enfermagem encontra-se inserida ao processo de trabalho de forma empática, utilizando protocolos institucionais adequadamente, desenvolve uma prática profisional mais segura, trazendo menor risco à  sua saúde e do paciente.

Amanheço com a informação que um dos nossos técnicos de enfermagem do Serviço de Emergência teve resultado positivo para COVID-19 e que ele estaria em observação no HUAP com complicações decorrentes da doença. Mesmo sendo feriado, compareço ao Serviço para acompanhar o andamento, dar apoio, me colocar à disposição e observar como a equipe se sente frente ao atendimento de um membro da equipe. Constatei Equipes de Saúde e de apoio do plantão bastante equilibradas, focadas, conduzindo bem e rapidamente o processo de trabalho. Servidor inserido no protocolo completo (Isolamento respiratório, coleta de sangue, tomografia computadorizada (TC) torácica e internação no DIP).

Não somente na prática de cuidados com o paciente isso é percebido, mas também na gestão. O fato do gestor, comparecer aos diversos serviços por ele gerenciados e permitir escutar ativamente as possíveis fragilidades nas construções  de fluxos, protocolos e rotas, chama-o para uma reflexão e possibilita a troca de experiências, possibilitando a confiança e a sensação de interesse para que o processo se torne cada vez mais adequado, minimizando danos para os trabalhadores da ponta, do front, bem como para os usuários, além da possibilidade de visualização das frentes que esse gestor precisa adotar para produção de melhorias estruturais ou protocolares.

Realizei visita presencial aos setores críticos (emergência e CTI), para buscar conhecer as demandas e as dificuldades que possam surgir, por estarmos em fase de desenvolvimento de um processo de trabalho muito dinâmico e por vezes gerador de dúvidas.  

Se fazer presente e assumir o compromisso de acompanhar de perto o processo de trabalho da equipe de saúde, faz com que o gestor também se exponha aos riscos de contaminação pela COVID-19, mas são condições inerentes à função que desenvolve.

A sobrecarga emocional está grande para todos, mas para mim também, não sou diferente. Percebo que preciso passar confiança, preciso transmitir calma e controle da situação e além de tudo, preciso dar apoio, escutar... mas estou cansado e preocupado com nosso evoluir, pelo que ainda estar por vir, baseando-me na projeção do pico da COVID-19.

Gestão Participativa: compartilhando o poder de agir

Enxergar o macro hospitalar se faz importante frente a esse processo, para que se possa dar seguimento em todos os setores do universo hospitalar, sem distinção, de maneira unificada, objetivando condutas direcionadas e referenciadas pelas determinações institucionais e ainda com a participação proativa e efetiva dos pacientes, que devem expor seus interesses, suas necessidades e serem respeitadas, dentro de uma lógica minimamente adequada para um ambiente hospitalar.

Ser ou estar partícipe representa um poder de fala, um espaço, uma conquista. A voz, não pode ser impedida de emissão, pois nela, podem conter elementos essenciais para mudança ou remanejamentos de ações que não possuímos conhecimento. Para que eu faça, eu preciso saber fazer, para eu fazer, eu preciso conhecer e para eu conhecer, eu preciso participar.

Exponho ao time a necessidade, a intenção e a importância em desenvolvermos uma Gestão Compartilhada próxima à ponta, onde as mais diversas opiniões serão consideradas, valorizadas e discutidas, resultando assim em estratégias consolidadas, mas não engessadas. Em função do cargo que ocupo, preciso em alguns momentos tomar decisões rápidas e de forma solitária, pois todo processo é muito dinâmico. Contudo, tentarei ao máximo compartilhar pensamentos e idéias  sem ferir a missão institucional, estando orientado por princípios éticos.

Um processo de gestão compartilhado, participativo, promove integração e maior adesão dos profissionais, faz eles se sentirem parte e co-autores da ação. A participação da equipe de trabalhadores que compõem a unidade de atenção à saúde, possibilita melhoria do processo, valorização profissional, escuta ativa e reconhecimento por direitos.

Hoje o dia foi de maior leveza, ao menos para meu gerenciamento, embora tenhamos tido a informação da altíssima virulência da COVID-19, acima da média, do paciente que está internado no CTI... os profissionais de enfermagem estavam mais inseridos no contexto da precaução e cientes da importância em seguir os protocolos e orientações da CCIH.

Percebo um compromisso ético e social por parte de muitos profissionais, que mesmo residindo em municípios distantes, mesmo com idade superior aos 60 anos, associados à comorbidades estão presentes no cumprimento de suas atividades laborais e estão se disponibilizando a colaborar, pois reconhecem sua importância atual frente à situação a qual estamos passando.

 

DISCUSSÃO

As instituições não estão preparadas para contextualizar os problemas de saúde, considerando sua complexidade. Seguem-se às normas, protocolos e rotinas, sem que muitas vezes as necessidades da pessoa sejam consideradas. E aí, quando nos deparamos com uma situação inesperada, que foge ao nosso controle e que até parece insignificante como um vírus, ficamos perplexos, reflexivos, analisando a interdependência que temos numa instituição e os micro-poderes existentes e sua capacidade de gerar potência/impotência em nosso modo de agir cotidiano.

As unidades de urgência e emergência são ambientes onde os profissionais de saúde estão constantemente expostos a riscos, tanto físicos como psíquicos, por se tratar de  um  serviço  em  que  o  atendimento  é  permeado  por  pressão,  e  local  cujos  os  trabalhadores lidam rotineiramente com pacientes em risco iminente de morte (7) .

Torna-se importante ressaltar que, a concepção acerca dos riscos ocupacionais que permeia o trabalho da enfermagem é fundamental para se compreender a relação do processo saúde-doença do trabalhador e, a partir disso, elaborar medidas que busquem melhorar as condições laborais, objetivando assim, promover a saúde e prevenir agravos, como também  o controle e diminuição/eliminação dos riscos e dos problemas de saúde do pessoal de enfermagem(8).

Cabe ressaltar que os serviços devem assegurar condições de trabalho adequadas, propiciando aos profissionais alternativas capazes de motivar para o trabalho multiprofissional em saúde, ainda que em contextos de risco. O clima institucional adequado promove boas relações nas equipes de trabalho. O reconhecimento social também é uma questão fundamental e pode ser demonstrado por meio de remuneração adequada (9).

No contexto da epidemia por COVID19, a Educação Permanente em Saúde emerge com grande força e necessidade, devendo ser mediada por um plano de ação bem ajustado às necessidades do momento, contemplando os aspectos técnicos, mas também os emocionais e relacionais, presentes no cotidiano do trabalho e sobressaltados nesse momento de Pandemia.

Os enfermeiros podem propiciar diferentes modos de saber e fazer realizando as práticas de cuidado e de educação em uma modelagem mais refinada às necessidades e ao contexto das ações de EPS (10).

A EPS se tornou uma possibilidade para o enfermeiro aprimorar competências profissionais,  qualificando seu agir em face da complexidade envolvida em seu trabalho (11).

Contudo, a EPS exige o trabalho em equipe. É  preciso  pensar  nas  dimensões psicossociais do cuidado, que podem ser identificadas e consideradas pela equipe de enfermagem e desenvolvidas de forma integrada com os serviços de fisioterapia, psicologia e serviço social. Seria muito importante e necessário, integrar membros da comunidade como voluntários, apoiadores emocionais e sociais.

Nesse contexto, a empatia é a habilidade para entender as necessidades, os sentimentos e os problemas dos outros, pondo-se no lugar deles e respondendo satisfatoriamente às suas reações emocionais. A aplicabilidade de ferramentas que permitam a produção de relações envolvidas no encontro profissional-usuário mediante a prática de uma escuta ativa, a demonstração de interesse, a construção de vínculos de confiança, são as ferramentas que possibilitam mais  precisamente, captar  as  singularidades dos usuários, potencializando essa relação. A empatia é um processo pelo qual um indivíduo consegue ver além do comportamento externo e perceber corretamente a vivência interior de outra pessoa (12).

Não somente na prática de cuidados com o paciente isso é percebido, mas também na gestão. O fato do gestor, comparecer aos diversos serviços por ele gerenciados e permitir escutar ativamente as possíveis fragilidades nas/das construções  de fluxo, protocolos e rotas, chama-o para uma reflexão e possibilita a troca de experiências, possibilitando a confiança e a sensação de interesse para que o processo se torne cada vez mais adequado, minimizando danos para os trabalhadores da ponta, do front, bem como para os usuários, além da possibilidade de visualização das frentes que esse gestor precisa adotar para produção de melhorias, quer estruturais, quer protocolares.

A empatia pode ser incorporada como um instrumento capaz de melhorar o convívio entre o gestor, os profissionais e os usuários, contribuindo para a eficácia, eficiência e satisfação na produção em saúde. O líder precisa ser capaz de sentir e entender os pontos de vista de todos os membros que compõem sua equipe. Utilizar empatia como instrumento de gestão significa levar em conta os sentimentos dos colaboradores, juntamente com outros fatores, no processo de tomar decisões inteligentes e tornar o ambiente de trabalho um lugar de pessoas saudáveis e produtivas (13).

Enxergar o macro hospitalar se faz importante frente a esse processo, para que se possa dar seguimento em todos os setores do universo hospitalar, sem distinção, de maneira unificada, objetivando condutas direcionadas e referenciadas pelas determinações institucionais e ainda com a participação proativa e efetiva dos pacientes, que devem expor seus interesses, suas necessidades e serem respeitadas, dentro de uma lógica minimamente adequada para um ambiente hospitalar.

O gerente de enfermagem deve reunir qualidades pessoais e adequadas ferramentas de trabalho, atuar democraticamente, ser capaz de estimular a comunicação e valorizar o saber da equipe, atuar com senso de justiça apurado para cobrar maiores resultados (14).

A gestão participativa, articulado ao modelo de cuidado, é gerador de espaços de escuta, troca de informações, planejamentos, decisões, compromissos e de corresponsabilização pelos processos de trabalho e seus resultados. Nesses espaços expressam-se desejos, afetos, interesses e poderes, capazes de produzir sujeitos mais autônomos e mais comprometidos com os interesses coletivos (15).

O trabalho integrado da Equipe de EPS e da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar foi fundamental para efetividade assistencial, pois juntas nutriram e fortaleceram, através da capacitação profissional, o processo de trabalho na linha de frente ao tratamento de pessoas acometidas pela COVID-19.

Se fazer presente e assumir o compromisso de acompanhar de perto o processo de trabalho da equipe de saúde, faz com que o gestor também se exponha aos riscos de contaminação pela COVID-19, mas são condições inerentes à função que desenvolve.

 

CONCLUSÃO

Com base no estudo realizado concluímos que o processo de planejamento e implantação de um serviço de atenção ao paciente exposto à COVID -19, exige um trabalho multidisciplinar meticuloso, revisão de protocolos assistenciais - integrando diferentes atores profissionais - desde segurança para as equipes, trabalho articulado entre comissões de infecção hospitalar, educação permanente, gestão, entre outros.

Pode-se concluir que o modo de gestão adotado e descrito nesse estudo, propiciou um cuidado de saúde humanizado e empático, com maior segurança para os trabalhadores de enfermagem e o cliente, ampliando a participação da equipe multiprofissional de saúde, promovendo maior interação.

A Pandemia por COVID-19 impôs revisões de processos, protocolos e rotas instituídas no hospital universitário, fazendo com que o enfermeiro gestor, conjuntamente com o time de gerentes, compreendesse amplamente a fragilidade a que o serviço de enfermagem estava exposto, para então, revisar, construir e reconstruir diretrizes para um processo de trabalho eficaz, identificável e aplicável.

Para ampliar a segurança da equipe de saúde nos cuidados prestados às pessoas acometidas pela COVID-19, foi importante utilizar o Processo de Trabalho em Enfermagem como ferramenta para a orientação do cuidado assistencial. O raciocínio clínico e a tomada de decisão diagnóstica, promoveram resultados e intervenções satisfatórias, permitindo potencializar o trabalho em equipe.

O trabalho integrado da Equipe de Educação Permanente em Saúde e da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar foi fundamental para que chegássemos a efetividade assistencial, fortalecendo o processo de capacitação dos profissionais da linha de frente e as ações imperiosas frente à Pandemia COVID-19.

Este estudo contribui para revisão da prática de enfermagem, ressaltando o valor do trabalho em equipe multidisciplinar e do uso da empatia no processo de gestão. Evidencia-se a importância da educação permanente em serviço e da descrição das etapas de treinamento e elaboração de protocolos, visando o trabalho seguro da equipe e ensino de enfermagem. A estratégia implementada nesse estudo para obtenção de dados e descrição de resultados por meio de narrativas do cotidiano, pode colaborar para o  desenvolvimento de novas pesquisas em enfermagem, onde a urgência da inovação para tomada de decisão se faz necessária.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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Recebido: 12/07/2020

Revisado: 22/07/2020

Aprovado: 22/08/2020