Acidentes de motocicletas em Belo Horizonte e Região Metropolitana: tendência linear da mortalidade de 2000 a 2012

 

 

Maria Alice Souza Vieira1, Alexandra Dias Moreira1, Lenice de Castro Mendes Villela1, Gustavo Velasquez-Melendez1,Fernanda Penido Matozinhos1

 

1 Universidade Federal de Minas Gerais

 

 

RESUMO

Objetivo: Descrever o perfil e a evolução da taxa de mortalidade por acidentes de motocicletas em Belo Horizonte e na Região Metropolitana, no período de 2000 a 2012. Métodos: Estudo de série temporal com dados extraídos do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e IBGE. Utilizou-se modelo de regressão linear, com nível de significância de 5%. Resultados: De 2000 a 2012, houve um incremento de 278% dos óbitos. A população mais atingida foi a do sexo masculino, faixa etária de 20 a 29 anos, pele negra/parda, sem companheiros e com escolaridade entre 8 e 11 anos. A taxa de mortalidade elevou-se de 1,7 para 3,58 óbitos/100 mil habitantes, com tendência de aumento (β=0,25 ao ano; p<0,01). Discussão: Houve crescimento da taxa de mortalidade por acidentes de motociclistas. Os resultados deste estudo podem contribuir para a formulação de ações que priorizem a prevenção dos acidentes no público de maior risco.

Descritores: Acidentes de trânsito; Motocicletas; Mortalidade; Epidemiologia.

 

 

INTRODUÇÃO

 

Os acidentes de transporte terrestre (ATT) são definidos, pela Classificação Internacional de Doenças, como lesões relacionadas com o trânsito de veículos e pessoas nas vias públicas¹. Nas últimas décadas, os ATT têm ganhado importância crescente no Brasil e no mundo, se configurando como um importante problema de saúde pública, especialmente devido à morbimortalidade e aos custos sociais e econômicos.²

Em 2018, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), os ATT se configuravam como a oitava causa de mortalidade no mundo e a primeira entre as crianças e adultos jovens de 5 a 29 anos.³ No Brasil, segundo dados do Global Burden of Disease, em 1990 os ATT eram a quinta causa de morte, subindo para a terceira causa em 2016.4 Além disso, segundo Relatório de Pesquisa publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2014, os gastos com acidentes de trânsito custaram cerca de 10 bilhões de reais.5

Nesse cenário, as motocicletas ocuparam o espaço urbano como uma alternativa para fluidez no trânsito, devido ao aumento da frota de automóveis, substituição da ineficiência do transporte coletivo, além de ser uma nova possibilidade no mercado de tele entregas. Além disso, a facilidade de aquisição de uma motocicleta contribuiu para crescimento de sua frota em cinco vezes quando comparada à frota de automóveis. Ressalta-se, contudo, que esse crescimento não foi acompanhado de uma melhoria na infraestrutura viária e em mudanças eficazes da legislação brasileira, ocasionando um aumento de acidentes graves e de óbitos relacionados a esse veículo.6

Segundo revisão de literatura, de 1996 a 2009 houve um aumento exponencial da taxa de mortalidade por acidentes de moto no Brasil, variando de 0,5% para 4,5%, ou seja, um aumento de 800% no período analisado, representado incremento médio de 19% ao ano, sendo os homens jovens as principais vítimas fatais.7

Diante da relevância desse cenário, em 2009 a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou a Década de Ação pela Segurança no Trânsito no período de 2011 a 2020, abrangendo mais de 110 países, incluindo o Brasil. O objetivo é reduzir os níveis atuais de mortalidade e as lesões por acidentes de trânsito por meio de ações baseadas no fortalecimento da gestão, na melhoria da infraestrutura viária, no atendimento pré-hospitalar e hospitalar de acidentados e na segurança veicular e dos próprios usuários.8 No Brasil, foi criado um plano de ação nacional, o Projeto Vida no Trânsito, implantado em 2010 e coordenado pelo Ministério da Saúde, visando essa redução. Belo Horizonte/Minas Gerais (MG) foi uma das capitais escolhidas para desenvolver o projeto, representado a região Sudeste.9

O estado de MG tem acompanhado o padrão brasileiro de crescimento da taxa de mortalidade por acidente de motocicletas, sendo que entre 2004 e 2013 a variação percentual dessa taxa foi de 114%.10 Uma das justificativas dessa variação pode ser explicada pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN), na qual foi demonstrado que, entre 2000 e 2012, houve um incremento de 333,48% na frota de motocicletas.11 Diante do aumento da frota de motocicletas, dos anos potenciais de vida perdidos, da elevada mortalidade por acidentes relacionados a esse veículo, além do seu impacto social e econômico na sociedade, o presente estudo objetiva descrever o perfil e a evolução da taxa de mortalidade por acidentes de motocicletas em Belo Horizonte e na Região Metropolitana, entre 2000 e 2012. Ressalta-se, ainda, para o nosso conhecimento, a escassez de estudos atuais publicados acerca dessa temática.

 

MÉTODO

 

Trata-se de estudo com delineamento ecológico de séries temporais, com dados referentes à mortalidade por acidentes de motocicletas em ATT em Belo Horizonte e 33 municípios que compõem a Região Metropolitana, no período de 2000 a 2012.

Foram utilizados dados referentes à mortalidade por acidentes de motocicletas, obtidos no Departamento de Informática do SUS (DATASUS) pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), o qual possui como fonte de dados a Declaração de Óbito (DO). Os óbitos foram selecionados segundo CID-10, sob os códigos de V20 a V29, categoria que engloba acidentes envolvendo motociclistas, considerados por ocorrência e estratificados segundo ano (2000 a 2012), sexo (masculino e feminino), faixa etária (0 a 19 anos, 20 a 29 anos, 30 a 49 anos, 50 a 59 anos, 60 anos ou mais), raça/cor (branca, preta/parda, amarela/indígena), estado civil (com companheiro, sem companheiro) e escolaridade (nenhuma, 1 a 3 anos, 4 a 7 anos, 8 a 11 anos, 12 anos ou mais).

Os denominadores empregados para o cálculo das taxas de mortalidade geral, por faixa etária e sexo, foram obtidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), pelos censos e projeções intercensitárias, durante o período analisado. Os dados foram extraídos por meio do Tabnet (tabulador genérico de domínio público).

Inicialmente, foi realizada uma análise descritiva dos dados, a partir do cálculo das frequências e das proporções. Posteriormente, foram realizadas análises de regressão linear para estimar a tendência linear das taxas de mortalidade nas categorias de sexo e idade. Foram estimados coeficientes beta (β), intervalos de confiança de 95% e considerados níveis de significância estatística de 5% (p<0,05). Os resultados foram apresentados por meio de tabelas e figuras.

Os dados foram processados e analisados pelo programa Statistical Software for Professionals (Stata) versão 14.0 (Stata Corp., Texas, USA).

 

RESULTADOS

 

De 2000 a 2012, houve um aumento de 278% no número de óbitos por acidentes de motocicletas, com predominância no sexo masculino, variando de 88,8% a 96,5% dos casos. A faixa etária mais acometida foi a de 20 a 29 anos em todos os anos estudados, alcançando o maior percentual da mortalidade em 2000 (57,45%) e menor percentual em 2006 (34,33%). Em relação à raça/cor, a população mais atingida foi a de cor de pele parda, representando 66% dos óbitos em 2000, e 54% em 2012. A maioria dos óbitos ocorreu em pessoas sem companheiros, chegando a aproximadamente 82% em 2005, e a 80% em 2012.

Em relação à escolaridade, o número de óbitos predominou nos indivíduos com escolaridade entre 4 e 7 anos e 8 a 11 anos de estudo, variando ao longo do período analisado. Em indivíduos com 1 a 3 anos de estudo, a variação foi de 25,5% do número de óbitos em 2000 para 5,08% do número de óbitos em 2012 (Tabela 1).

Tabela 1 - Número (n) e Proporção (%) dos acidentes de moto, segundo sexo, faixa etária, raça/cor, escolaridade e estado civil - Belo Horizonte e Região Metropolitana, 2000 a 2012.

Ano

 

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

Sexo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Masculino

n (%)

45 (95,74)

54 (93,1)

83 (96,51)

64 (91,43)

97 (94,17)

100 (92,59)

119 (88,81)

137 (89,54)

194 (93,72)

135 (92,47)

178 (95,19)

186 (88,57)

164 (92,13)

Feminino

n (%)

2 (4,26)

4 (6,9)

3 (3,49)

6 (8,57)

6 (5,83)

8 (7,41)

15 (11,19)

16 (10,46)

13 (6,28)

11 (7,53)

9 (4,81)

24 (11,43)

14 (7,87)

Idade (anos)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

0-19

n (%)

5 (10,64)

13 (22,41)

15 (17,44)

14 (20,00)

14 (13,59)

15 (13,89)

29 (21,64)

19 (12,42)

35 (16,91)

14 (9,59)

18 (9,63)

22 (10,48)

24 (13,48)

20-29

n (%)

27 (57,45)

29 (50,00)

34 (39,53)

34 (48,57)

54 (52,43)

49 (45,37)

46 (34,33)

80 (52,29)

106 (51,21)

71 (48,63)

93 (49,73)

91 (43,33)

74 (41,57)

30-49

n (%)

13 (27,66)

14 (24,14)

33 (38,37)

16 (22,86)

30 (29,13)

39 (36,11)

49 (36,57)

46 (30,07)

55 (26,57)

50 (34,25)

61 (32,62)

81 (38,57)

60 (33,71)

50-59

n (%)

2 (4,26)

1 (1,72)

3 (3,49)

1 (1,43)

4 (3,88)

2 (1,85)

5 (3,73)

7 (4,58)

8 (3,86)

9 (6,16)

11 (5,88)

12 (5,71)

15 (8,43)

60 ou mais

n (%)

0 (0,00)

1 (1,72)

1 (1,16)

5 (7,14)

1 (0,97)

3 (2,78)

5 (3,73)

1 (0,65)

3 (1,45)

2 (1,37)

4 (2,14)

4 (1,90)

5 (2,81)

Raça/cor

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Branca

n (%)

13 (27,66)

27 (46,55)

48 (55,82)

26 (37,14)

40 (38,83)

42 (38,89)

47 (35,07)

55 (36,18)

72 (34,78)

53 (36,30)

77 (41,18)

71 (33,81)

60 (33,71)

Preta

n (%)

3 (6,38)

5 (8,62)

4 (4,65)

4 (5,71)

10 (9,71)

8 (7,41)

14 (10,45)

15 (9,87)

22 (10,63)

10 (6,85)

21 (11,23)

23 (10,95)

22 (12,36)

Parda

n (%)

31 (65,96)

26 (44,83)

34 (39,53)

40 (57,15)

53 (51,46)

58 (53,70)

73 (54,48)

81 (53,29)

113 (54,59)

83 (56,85)

89 (47,59)

115 (54,76)

96 (53,93)

Indígena                       

n (%)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

1 (0,66)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

Amarela

n (%)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

0 (0,00)

1 (0,48)

0 (0,00)

Escolaridade (anos)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nenhuma

n (%)

0 (0,00)

1 (1,72)

2 (2,38)

1 (1,45)

1 (0,98)

1 (0,95)

0 (0,00)

1 (0,68)

1 (0,49)

1 (0,70)

2 (1,08)

1 (0,48)

1 (0,56)

1 -3

n (%)

12 (25,53)

4 (6,90)

3 (3,57)

2 (2,90)

4 (3,92)

12 (11,43)

13 (9,92)

13 (8,90)

14 (6,86)

7 (4,90)

5 (2,69)

13 (6,25)

9 (5,08)

4 - 7

n (%)

23 (48,94)

24 (41,38)

29 (34,52)

33 (47,83)

33 (32,35)

36 (34,29)

61 (46,56)

53 (36,30)

72 (35,29)

47 (32,87)

59 (31,72)

76 (36,54)

54 (30,51)

8 - 11

n (%)

9 (19,15)

28 (48,28)

35 (41,67)

29 (42,03)

56 (54,90)

50 (47,62)

47 (35,88)

73 (50,00)

95 (46,57)

74 (51,75)

106 (56,99)

98 (47,12)

95 (53,67)

12 ou mais

n (%)

3 (6,38)

1 (1,72)

15 (17,86)

4 (5,80)

8 (7,84)

6 (5,71)

10 (7,63)

6 (4,11)

22 (10,78)

14 (9,79)

14 (7,53)

20 (9,62)

18 (10,17)

Estado Civil

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Com companheiro

n (%)

15 (31,91)

16 (28,07)

16 (19,05)

14 (20,29)

29 (28,43)

18 (17,31)

33 (25,00)

32 (21,19)

33 (15,94)

30 (20,69)

39 (20,86)

44 (20,95)

34 (19,10)

Sem companheiro

n (%)

32 (68,09)

41 (71,93)

68 (80,95)

55 (79,71)

73 (71,57)

86 (82,69)

99 (75,00)

119 (78,81)

174 (84,06)

115 (79,31)

148 (79,14)

166 (79,05)

144 (80,90)

Total

 

47

58

86

70

103

108

134

153

207

146

187

210

178

Fonte: Elaborada para fins deste estudo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A taxa de mortalidade dos motociclistas elevou-se de 1,7 para 3,58 óbitos/100 mil habitantes no período analisado, ou seja, 110%, com uma tendência crescente de aumento (β= 0,25 ao ano; p<0,01). Em relação ao sexo masculino, a taxa aumentou de 2,13 para 6,88 óbitos/100 mil habitantes (β= 0,48 ao ano; p<0,01). Para o sexo feminino, a variação foi de 0,08 para 0,54 óbitos/100 mil habitantes (β= 0,05 ao ano; p<0,01) (Figura 1).

 

Figura 1 - Taxa de mortalidade por acidentes de moto, segundo sexo da vítima – Belo Horizonte e Região Metropolitana, 2000 a 2012

Imagem 1

Fonte: Elaborado para fins deste estudo.

 

 

 

 

 

 

As faixas etárias até 59 anos apresentaram tendência de crescimento estatisticamente significante (p<0,01), tendo a maior variação na faixa etária de 20 a 29 anos (β= 0,60 ao ano; p=0,01), seguida pela faixa etária de 30 a 49 anos (β= 0,30 ao ano; p= 0,01), de 50 a 59 anos (β= 0,20 ao ano; p= 0,01) e de 0 a 19 anos (β= 0,09 ao ano; p= 0,01). A faixa etária de 60 anos ou mais teve pequena tendência de crescimento, porém sem significância estatística (β= 0,04 ao ano; p=0,24) (Figura 2).

 

Figura 2 - Taxa de mortalidade por acidentes de moto, segundo faixa etária da vítima – Belo Horizonte e Região Metropolitana, 2000 a 2012

Imagem 2

Fonte: Elaborado para fins deste estudo.

 

 

 

 

DISCUSSÃO

 

Os resultados das análises de tendência da mortalidade em Belo Horizonte e na Região Metropolitana mostraram um incremento de 110% na taxa de mortalidade por acidentes de motocicletas durante o período de 2000 a 2012, com tendência crescente. Nos anos de 2002, 2008 e 2011, houve redução da taxa de mortalidade e aumento em todos os outros anos do período analisado.  

De acordo com pesquisa do Ministério da Saúde sobre o panorama da morbimortalidade por acidentes envolvendo motociclistas no Brasil, a taxa de motorização passou de 3,9 motos para 100 habitantes, em 2004, para 10,7 motos por 100 habitantes, em 2013, ou seja, um crescimento de 176%.10 Tal aumento da frota pode ser explicado pela possibilidade de inserção no mercado de trabalho, ineficiência do transporte público, otimização do tempo e facilidade no financiamento para aquisição de uma motocicleta.6,7,12

Acredita-se que as reduções das taxas de mortalidade nos anos previamente citados estão relacionadas com a Resolução n.º 136, de 2 de abril de 200213, que aumenta os valores das multas de infração de trânsito e a Lei n.º 11.705, de 19 de junho de 200814, que dispõe sobre a “Lei Seca”, tendo a finalidade de estabelecer a alcoolemia zero (com tolerância até 0,2 g/L) em condutores de veículos e aplicar penalidades, caso seja descumprida. Dados publicados em um estudo de série temporal com dados de mortalidade por ATT entre os anos de 1980 e 2014 demonstram que a taxa de mortalidade reduziu após a implementação da Lei Seca.15 Porém, é possível perceber nos resultados desse estudo um aumento da taxa de mortalidade no ano seguinte, em 2009, demonstrando que a Lei teve efetividade, mas durante um período determinado, como indicado em outros estudos.15

Em 2011, a redução da taxa de mortalidade pode ser explicada pela implementação do Programa Vida no Trânsito em Belo Horizonte, desenvolvido pelo governo brasileiro como estratégia para o Plano Nacional da Década de Ações de Segurança no Trânsito. Segundo Moraes, em pesquisa para avaliação do Projeto Vida no Trânsito de 2010 a 2011, houve uma redução de 16,8% na taxa de mortalidade por ATT em Belo Horizonte, evidenciando a importância do Programa.16

Em relação ao aumento das taxas de mortalidade no período analisado neste estudo, destacam-se aspectos como o comportamento de risco dos motociclistas e o mecanismo de trauma dos acidentes. Entre os comportamentos de risco relacionados ao aumento da mortalidade por acidentes de moto, pode-se citar o consumo de bebidas alcoólicas, o tráfego nos corredores das faixas de trânsito e o excesso de velocidade. O consumo de álcool associado à direção é reconhecido como um verdadeiro agravante dos acidentes de trânsito.6,7 A bebida alcoólica, a partir dos seus efeitos no sistema nervoso, oferece um sentimento de confiança aos condutores, alteração da capacidade de atenção, de coordenação e do tempo de reação.7

O tráfego nos corredores das faixas de trânsito é um fator de risco devido à dificuldade de visualização das motos pelos outros veículos, principalmente por veículos maiores, como os ônibus. As condições climáticas e a condição estrutural das vias também podem aumentar a instabilidade da motocicleta, elevando o número de acidentes.17

Somado a esses fatores, o excesso de velocidade, que está intimamente relacionado à inobservância das leis de trânsito, interfere diretamente no mecanismo de trauma dos acidentes de moto, uma vez que a velocidade é um importante fator responsável pela produção de energia cinética. No caso das motos, há uma grande vulnerabilidade do motociclista e do passageiro, uma vez que durante o acidente seus corpos estão expostos, com exceção da cabeça que é protegida pelo capacete, agravando o trauma, visto que toda energia cinética produzida é transferida para a vítima.15

Em relação ao perfil das vítimas de óbito por acidentes de motocicletas, as características encontradas no presente estudo corroboram com as observadas na literatura.(2, 7, ,10, 15, 18) Vítimas jovens, solteiras, do sexo masculino e com baixo status socioeconômico estão mais frequentemente envolvidas nos acidentes, o que pode ser explicado pela maior exposição no trânsito e pelos comportamentos de risco relacionados à condução e ao uso de álcool.(7, 10, 15) Algumas características, como a inexperiência, prazer em experimentar sensações de risco e impulsividade são comportamentos encontrados nesse grupo e, muitas vezes, efeito de padrões sócio-culturais.17 Nos resultados apresentados no Sistema de Vigilância de Violência e Acidentes, em 2014, do total de atendimentos de acidentes de trânsito nas 24 capitais e no Distrito Federal, os mais acometidos eram indivíduos pardos e com 9 a 11 anos de estudo, semelhante ao que foi encontrado nesse trabalho.18

Por fim, ressalta-se, dentre uma das limitações deste estudo refere-se ao uso dos dados de mortalidade pelo SIM. Esse sistema tem se configurado como uma importante ferramenta de fonte de dados em estudos epidemiológicos. Todavia, problemas, como ausência de dados, ainda são comuns.12

Ademais, para o nosso conhecimento, há escassez de trabalhos de séries temporais voltados para a temática, com dados referentes à mortalidade de motociclistas em ATT em Belo Horizonte e em municípios da Região Metropolitana, nos períodos de incluídos nesta pesquisa.

 

 

 

CONCLUSÃO

 

Os resultados deste estudo demonstram que a tendência da mortalidade por acidentes de moto em Belo Horizonte e na Região Metropolitana foi de crescimento, apesar das tentativas de redução. Acredita-se na importância de ações que abranjam não só leis punitivas, mas ações multissetoriais relacionadas com a educação no trânsito e que priorizem a prevenção deste tipo de acidentes, especialmente no sexo masculino e nas faixas etárias de maior risco.

 

Agradecimentos

MASV agradece a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, Brazil, pela bolsa de pesquisa (demanda social).

GVM agradece a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – Fapemig - (grant PPM0071316).

Agradecimento ao Núcleo de Estudos e Pesquisa em Vacinação (NUPESV) – CNPq pelo apoio na realização deste estudo.

 

REFERÊNCIAS

 

1. World Health Organization (WHO) [Internet]. International Classification of Diseases 11th Revision. [cited 2019 ago 28]. Available from: https://icd.who.int/en/ .

2. Morais Neto OL, Montenegro MMS, Monteiro RA, Rodrigues FR, Botacin CF, Beniz LAF. Perfil e evolução da morbimortalidade de acidentes de transporte terrestre-Brasil, 2004-2013. In: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2014: Uma Análise da Situação de Saúde e das Causas externas [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde. 2015 [cited 2019 ago 28]; p.345-372. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_brasil_2014_analise_situacao.pdf  

 

3. Global status report on road safety 2018. Geneva: World Health Organization; 2018.

 

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MASV e ADM participaram da análise estatística, interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual e aprovação da versão a ser publicada. GVM participou da redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual e aprovação da versão a ser publicada. LCMV foi responsável pela concepção e projeto, supervisão, redação do artigo, revisão crítica do conteúdo intelectual e aprovação da versão a ser publicada. FPM participou do planejamento da pesquisa, análise estatística, interpretação dos dados, redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual e aprovação da versão a ser publicada.

 

 

Recebido: 27/02/2019

Revisado: 25/08/2019

Aprovado: 22/11/2019