The reality of Nursing Continuing Education in the Public Health Services. A descriptive study

A realidade da Educação Continuada na Enfermagem nos Serviços Públicos de Saúde de Florianópolis

La realidad de la Educación Continua de Enfermería en los Servicios Públicos de la Salud en Florianópolis

 

Mônica Motta Lino1, Vânia Marli Schubert Backes2, Sandra Marcia Soares Schmidt3, Fabiane Ferraz3, Marta Lenise do Prado2, Sabrina Telma Martins1

 

1 Bolsista PIBIC/CNPq/UFSC; 2 Departamento de Enfermagem da UFSC, SC, Brasil. 3Doutoranda do PEN/UFSC, SC, Brasil

 

Abstract. The present study has as an objective to discover how the proposal for the nursing continuing education are constituted in the public health services of Florianopolis/SC; to describe and analyze the conceptions that fundamental the development of these proposals in the services in the form of constructing a political institutional of Continuing Education and knowledge of the political Permanent Education of the Health Ministry. The analytic procedure of data collected, through the means of semi – structured interviews, were the content analysis, including pre – analysis; analytical description and interferential interpretation. The study group, were 10 nursing professionals responsible for the continuing education of the health institution studied. The results indicates that continuing nursing education in the public services of Florianopolis needs a better attention on the part of the representation of the Permanent Education Polo, such as focalize as a political strategy bettered systematized.

Key-words: Education, Continuing; Nursing; Health

 

Resumo. O presente estudo teve como objetivos conhecer como estão constituídas as propostas de educação continuada nos serviços públicos de saúde de Florianópolis/SC; descrever e analisar as concepções que norteiam o desenvolvimento dessas propostas nos serviços em termos da construção de uma política institucional de educação continuada e o conhecimento da Política de Educação Permanente do Ministério da Saúde. O procedimento analítico dos dados coletados, por meio das entrevistas semi-estruturadas, foi a análise de conteúdo, incluindo pré-análise, descrição analítica e interpretação inferencial. Os sujeitos da pesquisa foram 10 profissionais de enfermagem responsáveis pelo serviço de educação continuada nas diferentes instituições de saúde. Os resultados indicam que a educação continuada nos serviços públicos de Florianópolis necessita de maior atenção por parte dos representantes dos Pólos de Educação Permanente, bem como ser focalizada como uma estratégia política mais sistematizada.

Palavras-chave: Educação Continuada; Enfermagem; Saúde.
 

Resumen. El presente estudio tuvo como objetivos conocer como están constituidas las propuestas de educación continuada en los servicios públicos de la salud en Florianópolis/SC; describir y analizar las concepciones que orientan el desenvolvimiento de estas propuestas en los servicios en términos de construcción de una política institucional de educación continuada, y el conocimiento de la Política de Educación Permanente del Ministerio de Salud. El procedimiento analítico de los datos recolectados,  mediante las entrevistas semi-estructuradas fue el análisis de contenido, incluyendo el pre-análisis, la descripción analítica y la interpretación inferencial. Los suyetos de la investigación fueram 10 profesionales de enfermería responsables por el servicio de educación continua en las diferentes instituciones de salud. Los resultados indican que la educación continuada en los servicios públicos de Florianópolis necesitan de una mayor atención de parte de los representantes de los Polos de la Educación Permanente, bien como sea enfocada con una estrategia política mejor sistematizada.

 Palabras-clabe: Educación Continua; Enfermería; Salud. 

 1 Introdução 

Vive-se numa sociedade cuja história humana se encontra em uma das mais extraordinárias revoluções, ou seja, a revolução científica tecnológica, que está transformando muitos aspectos da vida cotidiana, como, por exemplo, as relações de trabalho(1). Atualmente, conhecimento é assunto obrigatório. Conhecer e aprender passam a ser temas importantes no nosso cotidiano(2), o que não é diferente com relação aos serviços de saúde, nos quais avanços tecnológicos vêm sendo introduzidos.

Observa-se que as características mais marcantes do final do século XX foram as intensas mudanças sociais e tecnológicas. Os países desenvolvidos ou em desenvolvimento estão diante do desafio de acompanhar o processo de evolução tecnológica para não correr riscos de estagnação ou declínio econômico. Desde a década de 1970, e com maior intensidade a partir de 1980, a automação, com base nos avanços da microeletrônica e da informática, vem penetrando nos processos de bens e serviços, impondo sérias ameaças ao trabalhador, com o fim de profissões e o avanço do desemprego. Sendo assim, a sociedade passa a ser constituída por trabalhadores incluídos e excluídos do setor produtivo(3).

Com esses avanços, os trabalhadores tendem também a se defrontarem com formas de trabalho mais flexíveis, como os contratos de duração determinada, salários sujeitos à negociação permanente, oscilando conforme a economia. Vislumbra-se, assim, a necessidade de formas de organização do trabalho mais ajustáveis, que buscam garantir a despadronização e as condições para um trabalho mais integrado. Desse modo, a flexibilidade organizacional deve também corresponder a uma flexibilidade educacional(3).

Mas uma educação flexível requer formação geral, conceitual, sistematizada, de forma a possibilitar adaptações constantes, sendo que a educação é um instrumento social que pode favorecer ou não o ser humano. Pois, a partir do momento em que é pensada apenas em propósitos como desenvolvimento, produção, crescimento tecnológico, industrialização, em favor mais de empresas, de sistemas políticos e do próprio regime capitalista, é considerada uma educação instrumental, que favorece um modo de vida social em prol das minorias opressoras e que, muitas vezes, é vista de forma ingênua pelos próprios oprimidos como algo correto e ideal(4).

Atualmente, o que se indica para as pessoas, mesmo as excluídas do mercado de trabalho, é a aquisição de competências de longo prazo, tanto teóricas quanto sócio-comunicativas, compreendendo conhecimentos e atitudes, capacidade de analisar, pensar, planejar, formular alternativas criativas, de agir com independência, de comunicar, de cooperar e de conjugar diferentes formas de competências: saber-fazer e saber-ser. Dessa forma, para o enfrentamento de qualquer situação, o indivíduo deve colocar em ação e em sinergia vários recursos cognitivos complementares, entre os quais o conhecimento, as representações da realidade que constrói e armazena ao longo de sua formação(5).            

Nesse contexto de contínuas e complexas transformações, o sistema tradicional de ensino fica impossibilitado de atender aos desafios com que se defronta. Percebe-se que, em várias profissões, as transformações tecnológicas têm sido tão rápidas, que os conhecimentos transmitidos logo se tornam obsoletos, o que vem reforçar a importância da educação continuada para fazer frente à necessidade de qualificação para o trabalho, com vistas ao desenvolvimento pessoal e profissional, embora não se limite a esse aspecto. Não bastasse isso, o grau de conhecimento que os profissionais possuem, por vezes, já defasado e geralmente adquirido por intermédio de uma “educação bancária”, na qual o professor ensinava e o aluno “aprendia”, este limitando-se a reproduzir o que aquele transmitia, anula qualquer iniciativa de criação e auto-estímulo(6).

Frente às situações expostas, faz-se necessário, nos serviços de saúde, que seja instituída uma política de educação permanente, a fim de suprir essas lacunas e também fazer parte do processo de trabalho dos trabalhadores de saúde, em que a reflexão e a atualização de sua práticas seja feita no seu cotidiano.

Em 1978, a Organização Pan-americana de Saúde – OPAS já conceituava a Educação Permanente como um processo dinâmico de ensino e aprendizagem, ativo e contínuo, com a finalidade de análise e melhoramento da capacitação de pessoas e grupos, frente à evolução tecnológica, às necessidades sociais e aos objetivos e metas institucionais(7).

Hodiernamente, a educação continuada em Enfermagem é compreendida como

[...] um processo educativo, formal ou informal, dinâmico, dialógico e contínuo, de revitalização e superação pessoal e profissional, de modo individual e coletivo, buscando qualificação, postura ética, exercício da cidadania, conscientização, reafirmação ou reformulação de valores, construindo relações integradoras entre os sujeitos envolvidos para uma práxis crítica e criadora(8:201).

Esta forma mais abrangente de entender o processo de educação continuada vem ao encontro dos anseios da sociedade, que vive a era da globalização e da revolução da informática, atrelada aos graves problemas de ordem social e econômica. Sob essa ótica, a educação continuada não pode estar relacionada somente ao aperfeiçoamento técnico, mas também a uma constante reflexão de valores, dentro de um contexto coletivo(9).

Habitualmente, percebe-se um crescente interesse institucional na educação continuada com o intuito de melhoria da capacitação técnica dos seus profissionais. Mas isso é insuficiente para que ela seja de fato compreendida como importante em primeira instância pelos próprios profissionais. Essa finalidade contempla vários obstáculos tanto no âmbito de construção como no de implementação da educação continuada, pois se necessita a priori da disponibilidade para o diálogo, para os interesses humanos, ou seja, para as necessidades das pessoas. Entende-se que a educação continuada como uma transformação político-social deve partir da compreensão da realidade dos profissionais enquanto construtores da história, seres de decisão, da ruptura, da opção, da ética(10).

A educação continuada no trabalho precisa levar em consideração o saber adquirido pelo profissional nas experiências de trabalho. A valorização desse saber permite apontar com maior propriedade a realidade desse serviço, a expressão de suas necessidades e problemas, estimulando, no processo de educação continuada, a troca de experiências, a criação de novo saber e nova prática, a partir da crítica e instrumentalização gerada pela vivência deste processo(3).

Vale ressaltar que, na área da saúde, a década de 80 é peculiar, porque, com o avanço de novas tecnologias e das novas formas de organização do trabalho, houve um movimento político e ideológico interno para a saúde, que foi gestado desde a década de 70, com o ideário da Reforma Sanitária e que se centrou na discussão de um Sistema Único de Saúde para o país, consolidando-se na Constituição Brasileira de 1988 e na Lei Orgânica da Saúde-8080/90, reconfigurando o modelo de atenção à saúde e à sua organização de forma descentralizada(11,12).

Em 2003, foi lançada, pelo Ministério da Saúde, uma proposta de ação estratégica colocando em evidência a formação e o desenvolvimento para o SUS como construção da Política de Educação Permanente em Saúde, a qual busca a agregação entre desenvolvimento individual e institucional, entre serviços e gestão setorial e entre atenção e controle social(13). Em fevereiro de 2004, por meio da Portaria GM/MS nº 198, fica instituída a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde como estratégia do Sistema Único de Saúde para a formação e desenvolvimento dos trabalhadores.

Diante destas considerações, apresenta-se este processo investigativo, o qual pretende contribuir com os serviços públicos de saúde, com os profissionais de saúde e, por conseguinte, com a população-usuária dos mesmos, na elucidação do presente problema de pesquisa: Como estão constituídas as propostas de educação continuada nos serviços públicos de saúde de Florianópolis/SC e em que concepção as mesmas se fundamentam?  

2 Metodologia 

Este estudo identifica-se como uma pesquisa descritiva de abordagem qualitativa. As pesquisas descritivas “tem como objetivo primordial a descrição das características de determinado fenômeno, podendo estabelecer relações entre variáveis, pretendendo determinar a natureza dessa relação” (14:46), sendo que este tipo de pesquisa é habitualmente realizada por pesquisadores sociais preocupados com a atuação prática. A abordagem qualitativa “baseia-se na premissa de que os conhecimentos sobre os indivíduos só são possíveis com a descrição da experiência humana, tal como ela é vivida e tal como ela é definida por seus próprios autores”(15:270). A pesquisa qualitativa “envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes”(16:13).

Optou-se, na coleta de dados, pela entrevista semi-estruturada, visto que “na entrevista, a relação que se cria é de interação, havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde”(16:33). A entrevista semi-estruturada é um dos principais meios que tem o investigador para realizar a coleta de dados, tendo em vista que ele valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade, enriquecendo a investigação. Ainda afirma o autor que, nas suas práticas de pesquisa qualitativa, em geral o processo de entrevista semi-estruturada oferece melhores resultados quando se trabalha com diferentes grupos de pessoas(17).

Os serviços públicos de saúde de Florianópolis, foco deste estudo, englobam o setor hospitalar e o setor comunitário. Desenvolveu-se a pesquisa junto a três Hospitais Públicos de Florianópolis/SC, sob a ingerência da Secretaria Estadual da Saúde, designados como HP1, HP2 e HP3; e um Hospital Público Federal denominado HPF4. Nos serviços de atenção básica à saúde de Florianópolis, elegeu-se quatro Unidades Básicas de Saúde sob a Coordenação da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis/SC, identificados com os números UBS5, UBS6, UBS7 e UBS8. Ainda, constituem parte integrante da pesquisa dois órgãos públicos que respondem pelo direcionamento das iniciativas de educação continuada no Município e no Estado, designados pelos números OP9 e OP10.

Os sujeitos que contemplam o estudo são os responsáveis pelo serviço de educação continuada desenvolvido na área de Enfermagem das instituições e órgãos referidos anteriormente, num total de 10 sujeitos, como pode ser observado no quadro a seguir:

 

O procedimento analítico dos dados coletados por meio das entrevistas semi-estruturadas constitui-se da análise de conteúdo, que é tido como um método de tratamento de dados obtidos em textos, e como um conjunto de técnicas da análise de comunicação. A análise de conteúdo trata-se de “um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”(18:38). Este tipo de análise propõe várias modalidades técnicas, sendo que todas buscam compreender os conteúdos manifestos, ocultos, e suas significações, ultrapassar o olhar imediato das aparências e estudar o problema a partir da própria expressão dos indivíduos. A sistemática para análise dos dados com a técnica de análise de conteúdo inclui a pré-análise, representada pela seleção e organização dos dados com a transcrição das fitas gravadas; a descrição analítica, na qual os dados são submetidos a um estudo orientado pelo referencial teórico-metodológico, possibilitando a expressão de concepções relacionadas às categorias já definidas pelo referencial teórico ou que emergirão, e culminando com a interpretação inferencial, em que se elucidam os aspectos mais latentes, tornando-os mais visíveis(18). 

A organização para análise dos dados foi estabelecida a partir de quatro grandes categorias nas diferentes áreas, a saber: 1) Entendimento acerca da educação continuada; 2) Processo de desenvolvimento da educação continuada, com subcategorias: planejamento, metodologia, avaliação; 3) Existência ou viabilidade de construção de uma política de educação continuada institucional; 4) Conhecimento e aplicação da Política de Educação Permanente - Portaria GM/MS no 198/04.

         A pesquisa foi realizada conforme as Normas Éticas da Resolução 196/96 para a realização da pesquisa envolvendo a participação de seres humanos. Para tanto, foi apresentado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo aceita a participação na pesquisa e assegurado anonimato aos respondentes, que integrou o instrumento de coleta de dados aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina. 

3 Relato e Discussão 

Nas Instituições HP1, HP2, e HP3 as iniciativas de educação continuada desenvolvidas orientam-se por uma pauta estabelecida pela Secretaria Estadual de Saúde, que por sua vez está ligada às diretrizes de diferentes secretarias ou programas do Ministério da Saúde. Na Instituição HPF4, há um Centro de Estudos e Pesquisa de Enfermagem que promove atividades de educação continuada sistematizada aos trabalhadores desta área.

Em relação à categoria de entendimento acerca da educação continuada, os sujeitos a compreendem como sendo um momento de reciclagem, aperfeiçoamento, atualização e/ou capacitação no trabalho, contemplando as necessidades mobilizadas pela introdução de novas tecnologias de terapêutica e de equipamentos, atendendo igualmente à demanda de profissionais ligados à instituição como também abrindo a oportunidade para os profissionais de outras localidades, como ilustram as falas:

Educação continuada eu compreendo como sendo uma oportunidade que a gente pode dar para as pessoas para o seu aperfeiçoamento.... (Sujeito A).

É a continuidade do desenvolvimento profissional em primeiro plano, acarretando aum crescimento pessoal e melhoria institucional. É o recebimento de informações de forma contínua, de maneira que o profissional mantenha-se atualizado para o desenvolvimento de suas atividades (Sujeito D).

No tocante ao processo de desenvolvimento da educação continuada, encontrou-se convergência nos aspectos relacionados à ocorrência de reuniões, as quais podiam ser quinzenais ou  mensais, científicas, administrativas, apenas com o grupo de Enfermagem ou de grupos de apoio já formalizados. Há referência também da organização de educação continuada na forma de cursos ou estágios profissionais de reciclagem/aperfeiçoamento de especialidades para atender a uma demanda externa de profissionais da área, o que parece revelar a preocupação e o compromisso de oportunizar o contínuo processo de atualização e de aumento de conhecimentos.

[...] as capacitações para os funcionários nós montamos a partir das necessidades que nós percebemos nos setores, por meio das chefias, ou enfermeiros que relatam as dificuldades, ou seja, a partir do que eles nos falam e o que eles escrevem num instrumento... (Sujeito D).

A visão dos sujeitos converge na dimensão de situar a educação continuada no cotidiano do trabalho lançando mão de estratégias que envolvem a ampliação do conhecimento técnico-científico para resolver os problemas enfrentados. Um dos sujeitos tem a compreensão do termo permanente como sendo um processo de avanço na formação profissional e continuada ligado à educação no trabalho.

Sem desconsiderar a questão, este aspecto conceitual se reveste de diferentes roupagens, pois, no artigo intitulado “Educación continua o permanente de los profesionales de salud: el ‘nombre de la rosa’ hace la diferencia?”, os autores defendem que o “nome da rosa não faz diferença”, e consideram a educação permanente ou continuada em um sentido mais amplo do que capacitação e qualificação profissional. Entendem que o processo de educação continuada é um direito dos trabalhadores e uma questão de cidadania também em relação aos usuários do sistema de saúde(19).

O propósito é educar, qualificar e desenvolver o ser humano. A educação continuada ocorre periodicamente junto ao grupo de estudos dos enfermeiros mensalmente com palestras, cursos, oficinas, etc... Os assuntos desenvolvidos abordam temas técnico-científicos, gerencial-administrativo e relacionamento humano. A metodologia às vezes é tradicional com aula expositiva e, outras seguindo a teoria da problematização/construtivismo (Sujeito B).

Evidencia-se uma perspectiva de educação continuada mais ampla, não somente preocupada com a qualidade técnico-científica dos trabalhadores, mas também com a valorização do ser humano. Também a busca e aplicação de metodologias alternativas revela uma tentativa de avançar no processo ensino-aprendizagem, bem como na participação mais efetiva para a resolução de problemas.

Sobre o alcance dos objetivos com o desenvolvimento das atividades de educação continuada previstas e a satisfação dos envolvidos, as falas convergiram para a dificuldade de motivação e a conseqüente baixa participação dos trabalhadores.

Em relação à categoria de existência ou viabilidade de se instituir uma política de educação continuada institucional, os sujeitos mencionam que atualmente não há, mas que já existiram algumas iniciativas neste sentido, e julgam importante e viável uma ação nesta perspectiva, pois proporciona visibilidade ao que é desenvolvido na instituição e valoriza o trabalho de todos.

Não temos um serviço organizado [...], porém, em órgãos como associações e eventos, os departamentos de educação permanente têm contribuído muito. Considero importante uma Política de Educação Continuada Institucional. Os serviços / setores são interligados, acho que todos os profissionais devem ter sua representação, para que o desenvolvimento seja integrado (Sujeito A).

Seria altamente positivo pelos motivos já mencionados (...) Os cursos e treinamentos oferecidos causam impacto no desenvolvimento dos trabalhos e atuação da equipe pelo crescimento profissional, pessoal, resolutividade e maior credibilidade institucional (Sujeito F).

Percebe-se grande esforço por parte dos responsáveis pelas atividades de educação continuada nas instituições, uma vez que compreendem a importância que este serviço tem na vida dos trabalhadores, podendo gerar repercussões de satisfação pessoal e progresso profissional. Contudo, a carência de recursos e a pouca valorização por parte das estruturas dirigentes dificulta ou inibe muitas iniciativas que poderiam reverter para uma assistência de melhor qualidade aos usuários/população.

Tanto na Instituição OP9 quanto na Instituição OP10, os sujeitos explicitaram um entendimento diferente com relação à concepção de educação continuada e de educação permanente, como nas falas abaixo:

Para mim são conceitos diferentes. A educação permanente consiste em uma construção como já coloquei gestão - educação. As formações são multidisciplinares, centradas no coletivo construída com múltiplos olhares. A educação continuada apresenta-se ligada ao fazer uniprofissional, técnica. As vejo como formas diferentes, porém ambas necessárias dependendo do momento (Sujeito J).

A Educação continuada na Secretaria Municipal de Saúde é compreendida como o processo que incentiva e apóia a formação de seus funcionários, tanto no nível médio, como no nível superior e de pós-graduação. A Educação Permanente é o processo geral que engloba os cursos, treinamentos, participação de eventos científicos e outros, incluindo a educação em serviço, ações de supervisão e avaliação (Sujeito I).

Nota-se que a proposta de educação continuada ou permanente não é nova nas práticas educativas na saúde, “o que de fato é inovador são os seus princípios operativos. Portanto, se educação continuada ou permanente, o que propicia a diferença é a proposta alinhada com práticas pedagógicas críticas para além de uma ou outra denominação”(19:126).

         Com relação à compreensão da questão de estruturar o serviço de educação continuada como uma Política de Educação Continuada Institucional, houve contraste com relação aos sujeitos das Instituições OP9 e OP10. Enquanto há afirmação, por parte do sujeito da Instituição OP9, de que a Política de Educação Continuada Institucional já é realizada, mesmo que extra-oficialmente, o sujeito da Instituição OP10 refere que esta não se aplica na instituição.

         O depoimento aponta para questões macroconjunturais e a existência de um processo de educação continuada em construção na Instituição OP10. Já o entrevistado da Instituição OP9 demonstra pleno conhecimento das atividades desenvolvidas em prol da educação continuada no nível central, apontando para uma perspectiva mais integrada às demais instâncias e clareza de que o processo de educação continuada contribui para a melhoria da qualidade dos serviços prestados à população. Por outro lado,  nas Instituições UBS5, UBS6, UBS7 e UBS8, a educação continuada desenvolvida está ligada às diretrizes da Secretaria Municipal da Saúde.

Quanto ao entendimento acerca da educação continuada, os depoimentos contemplaram uma visão mais relacionada como uma estratégia de consolidação do SUS, de garantia da qualidade assistencial e outra mais voltada à atualização profissional no trabalho, como exposto:

Entendemos como um processo educativo sistemático, desenvolvido pela instituição para os funcionários, equipe de trabalho, com finalidade de atualização técnica e padronização dos procedimentos e serviços (Sujeito H).

Educação Permanente/Continuada são atividades importantíssimas para garantia de desenvolvimento pessoal, profissional e Institucional. São atividades que devem ser propostas e planejadas a partir da realidade local visando atualizar, reciclar, promover o conhecimento e explicação de conceitos, técnicos, e ações pertinentes aos serviços com o objetivo maior de manter os profissionais comprometidos nas suas funções garantindo assim a qualidade (Sujeito E).

Os depoimentos demonstram a existência de educação continuada no trabalho ligada às demandas de atualização profissional de cunho técnico-científico. Não que se negue a importância deste conhecimento, contudo, não abarca as demais necessidades de ordem pessoal, institucional e mesmo profissionais ligadas a uma maior inovação na assistência prestada e maior satisfação no trabalho(20).

É unânime a vontade e a credibilidade na construção de uma Política de Educação Continuada Institucional, mesmo não havendo muita clareza a respeito de como a mesma poderia se constituir no interior das instituições.

No que se refere ao conhecimento e aplicação da Política de Educação Permanente - Portaria GM/MS no 198/04, as respostas se coadunam com as demais emitidas pelos sujeitos do estudo das diferentes Instituições. Fica latente a necessidade de maior divulgação a respeito da composição e finalidade dos Pólos de Educação Permanente para haver uma participação comprometida dos trabalhadores da saúde e ações conseqüentes com seus princípios e metas.

         Tecendo alguns comentários acerca do processo de educação continuada, as manifestações se direcionam para a insipiência das propostas, assim como para a falta de elementos como estrutura física e de pessoal e também de uma política da instituição para essa forma de educação. 

4 Algumas Considerações 

O entendimento acerca da educação continuada oscilou desde uma perspectiva adstrita ao treinamento, à capacitação e à atualização por meio de cursos, palestras, dentro do modelo tradicional, com aulas expositivas e a relação de um ensinando e o outro aprendendo, até uma visão que incorpora a capacitação, a atualização e o treinamento, mas não se esgota nessa dimensão. Ao contrário, é entendido como um momento de valorização e crescimento pessoal do sujeito no trabalho, como um compromisso de melhor atender aos clientes. Como um compromisso social. Entende-se, também, como um direito do trabalhador e uma obrigação da instituição.

Além de valer-se das modalidades de cursos e palestras, soma-se o desenvolvimento de oficinas com vivências/experiências buscando metodologias alternativas em que a tônica inclua o sujeito trabalhador como um agente ativo do seu processo de educação contínua, explicitado por algumas áreas na metodologia problematizadora, em que, enquanto se ensina se aprende e, enquanto se aprende, se ensina.

Cabe ressaltar que essa visão mais ampliada deste processo é ainda minoria, mas é detectada dentro de algumas instituições. No entanto, é ainda incapaz de provocar as mudanças que tanto objetivam à prática e à política de educação continuada, como atitudes pessoais de compromisso consigo e com o outro, de satisfação, competência e resolutividade no trabalho, tendo em vista um atendimento digno à saúde das pessoas que procuram pelos serviços de saúde.

No processo de desenvolvimento da educação continuada, incluindo  planejamento, metodologia e avaliação, a maioria dos depoimentos explicitaram o caminho tradicional de planejamento encaminhado pelas chefias dos setores até aos responsáveis pelo processo de educação continuada; algumas áreas, de todas as Instituições, revelaram a adoção de planejamento estratégico, o que em tese pressupõe maior participação dos trabalhadores. Nas Instituições UBS5, UBS6, UBS7 e UBS8, há adoção do planejamento mais central repassado pela Instituição OP9.  A metodologia foi anteriormente referida e os assuntos também a princípio seguem um esquema tradicional de apresentar temas de relevância técnico-científica, de ordem administrativa - gerencial, de relacionamento interpessoal, e outros incorporam temas de outra natureza como a ética, aspectos jurídicos, de direitos humanos, entre outros.

Em relação à realidade da educação continuada na Instituição OP9, considera-se que esta  encaminha-se para uma política institucional mais integrada, apesar de não ser plenamente referido pelos sujeitos nas Instituições UBS5, UBS6, UBS7 e UBS8. Este descompasso, bem se sabe, é presente nos processos de estruturação e/ou planejamento de propostas neste nível. Acredita-se que, para haver maior integração, um passo imprescindível seja tornar mais visíveis as ações empreendidas no âmbito central, ou seja, na Assessoria de Desenvolvimento Institucional.

No tocante ao processo avaliativo, foi praticamente unânime a manifestação de não existir nenhum processo formal, mas ser de suma importância, de estarem os entrevistados preocupados em desenvolver algo a respeito; outros manifestam  que até possuem um instrumento avaliativo, mas sem ter uma análise correspondente, e outras áreas, também de todas as instituições, mencionam a aplicação pontual de questionários ou de pré e pós-testes. A modalidade informal, por meio de conversas, da observação e da procura por determinada atividade foi também apontada como recurso avaliativo, no entanto não foi considerada a mais apropriada. Percebe-se, nitidamente, a fragilidade nesta questão referindo a impossibilidade de se conhecer e analisar as reais repercussões das experiências do processo de educação continuada.

 Quanto à existência ou viabilidade de construção de uma Política de Educação Continuada Institucional, praticamente foi consenso por parte de todos responsáveis pela educação continuada nas instituições de que não há uma política institucional, contudo esta mesma maioria refere como de máxima importância e viável a existência dessa política. A referência de que o processo de implantação de uma política institucional devesse partir da direção geral também foi feita por sujeitos das instituições e, em uma das instituições, foi mencionado já ter existido uma iniciativa neste sentido, mas encontrou resistência por parte dos trabalhadores.  De qualquer forma, fica a vontade expressiva da maioria dos sujeitos da importância da construção de uma política institucional amparada na interdisciplinaridade, na maior visibilidade dos trabalhadores, dos diferentes serviços e da própria instituição, servindo de referência à população/sociedade na atenção de qualidade à sua saúde.

 Em relação ao conhecimento e aplicação da Política de Educação Permanente – Portaria GM/MS no 198/04, grande parte dos sujeitos revelaram ter conhecimento superficial da mesma, que consideravam o dispositivo mais aplicável à atenção básica de saúde, e outros que simplesmente nunca tinham ouvido falar. Dentre estes, há os que se manifestaram preocupados em buscar maiores informações, demonstrando claro interesse na questão. Salienta-se que este aspecto deve ser mais bem conduzido no interior das instituições pelos seus representantes que tomam assento no Pólo Locorregional de Educação Permanente do Centro-Florianópolis/SC, bem como no próprio âmbito dos Pólos e Fórum de Capacitação Permanente. 

Referências 

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10 Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 31a ed. São Paulo (SP): Paz e Terra; 2005.

11 Campos GWS. O Anti-Taylor: sobre a invenção de um método para co-governar instituições de saúde produzindo liberdade e compromisso. Cad Saúde Pública, Rio de Janeiro (RJ) 1998; 14(4):863-70.

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13 Ministério da Saúde (Brasil). Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Portaria GM/MS no 198/04, de 13 de fevereiro de 2004. Institui a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde - como estratégia do Sistema Único de Saúde para a formação e o desenvolvimento de trabalhadores para o setor e dá outras providências; Brasília (DF) 2004. Disponível em: <http://www.saude.gov.br/sgtes>. Acessado em: 23 de agosto de 2004.

14 Gil AC. Como elaborar projetos de pesquisa. 3ª ed. São Paulo (SP): Atlas, 1996.

15 Polit DF, Hungler BP. Fundamentos de pesquisa em enfermagem. 3a ed. Porto Alegre (RS): Artes Médicas; 1995.

16 Lüdke M, André M. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo (SP): EPU, 1988.

17 Triviños ANS. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo (SP): Atlas, 1987.

18 Bardin L. Análise de conteúdo. 7ª ed. Lisboa (PT): Edições70; 1977.

19 Backes VMS, Schmidt SMS, Cartana MHC, Prado ML, Lino MM, Martins ST,  et al. Educación continua o permanente de los profesionales de salud: el “nombre de la rosa” hace la diferencia? Rev Panamericana Enfermería,  México (DF) 2005; 3(2):125-33.

20 Gelbcke FL, Leopardi MT. Perspectivas para um novo modelo de organização do trabalho da enfermagem. Rev Bras Enferm, Rio de Janeiro (RJ) 2004; 57(2):193-97.

Apoio e Financiamento do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e FAPESC (Fundação de Apoio a Pesquisa Científica e Tecnológica do Estado de Santa Catarina)

 

Contribuição dos autores:

Concepção e desenho: Vânia Marli Schubert Backes, Mônica Motta Lino; Fabiane Ferraz.

Análise e interpretação: Vânia Marli Schubert Backes, Mônica Motta Lino; Sandra Marcia Soares Schmidt; Marta Lenise do Prado.

Escrita do artigo: Vânia Marli Schubert Backes; Mônica Motta Lino; Sandra Marcia Soares Schmidt.

Revisão do artigo: Fabiane Ferraz; Marta Lenise do Prado.

Aprovação final do artigo: Vânia Marli Schubert Backes; Marta Lenise do Prado.

Coleta de dados: Mônica Motta Lino; Sabrina Telma Martins

Previsão de materiais ou recursos: Vânia Marli Schubert Backes, Fabiane Ferraz.

Expertise em Estatística: não se aplica.

Obtenção de suporte financeiro: Vânia Marli Schubert Backes

Suporte administrativo: Mônica Motta Lino; Sabrina Telma Martins.

 

Endereço: Rua Victor Konder. Centro, Florianópolis – SC. CEP 88015-400. E-mail: oivania@nfr.ufsc.br  Fone: (48) 3025-6870 e (48) 3331-9480.

 

Recebido: Oct 29th, 2006
Revisado: Nov 24th, 2006
Aceito: Dec 29th, 2006