Objetivo: caracterizar o perfil sociodemográfico e clínico-epidemiológico de pessoas com traumatismo raquimedular (TRM). Método: estudo transversal, quantitativo, com 80 indivíduos com TRM. Resultados: amostra majoritariamente composta por homens, jovens, com lesão torácica, vítimas de acidentes de trânsito. Encontrou-se correlação entre o TRM em nível lombar com os acidentes por arma de fogo, entre as lesões torácicas e os acidentes de trânsito e entre as lesões cervicais e as lesões por mergulho em águas rasas. A tetraplegia teve maior influência enquanto fator de risco para todas as complicações em relação à paraplegia, mas apresentou fator de proteção às síndromes dolorosas. A reutilização do cateter apresentou fator de risco para infecção urinária, obstrução e sangramento. O uso de cateter lubrificado foi fator de proteção para todas as complicações estudadas. Conclusão: o conhecimento dos fatores intervenientes às lesões medulares, bem como a identificação dos riscos de complicações, corrobora para um cuidar mais qualificado.
Descritores: Traumatismos da Medula Espinal; Medidas em Epidemiologia; Cateterismo; Enfermagem.
A lesão medular pode ser considerada epidemia mundial, ocupando, no Brasil, a segunda posição em número de incidência para as causas traumáticas. Embora dados epidemiológicos sobre a temática sejam escassos em virtude da falta de notificação pelos órgãos que atendem a essa clientela, estima-se que haja anualmente, dependendo da região, 20 a 50 casos novos de traumatismo para cada um milhão de habitantes(1). A lesão de medula espinhal é considerada como um dos acometimentos mais avassaladores da atualidade, com enorme repercussão física, psíquica e social(2).
Aproximadamente 500.000 pessoas sofrem com lesão medular a cada ano no mundo(3). Esse dado representa pouco menos de 0,1% da população com deficiência conhecida(4). Diante do contexto fisiopatológico que envolve esses pacientes, atenta-se para as complicações urinárias, com destaque para a disfunção neurológica do trato urinário inferior, em cujos casos se recomenda a realização do cateterismo intermitente limpo (CIL).
Caracterizar o perfil sociodemográfico e clínico-epidemiológico de pessoas com traumatismo raquimedular (TRM); analisar as correlações entre as características clínicas, nível da lesão traumática e as complicações na pessoa com TRM; identificar a prevalência de pessoas com TRM que realizam o CIL; avaliar o risco de complicações relacionadas ao uso do CIL em pessoas com TRM.
Estudo observacional, do tipo corte-transversal, de abordagem quantitativa, realizada com indivíduos com TRM. A amostra foi de 80 participantes. A coleta de dados se deu entre maio e setembro de 2014, por meio de um formulário semiestruturado. Os dados foram analisados mediante o emprego de técnicas de estatística descritiva e inferencial e análise de correspondência, para verificar associação multivariada entre as causas do trauma, nível da lesão e sequelas do trauma; e o teste qui-quadrado e risco relativo a fim de verificar associação e sua magnitude entre os tipos de sequela e as complicações do TRM. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), CAAE nº 58639216.1.0000.5183, em atendimento as exigências da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde(5).
A amostra se caracterizou por indivíduos jovens do sexo masculino solteiros e/ou casados, sem filhos, com mais de quatro anos de estudo e renda mensal básica de um a três salários mínimos. Foram identificados 51 indivíduos em uso de CIL, apontando a prevalência de 65,4%. Os resultados apontam correlação do TRM em nível lombar com os acidentes por arma de fogo, das lesões torácicas aos acidentes de trânsito, e das lesões cervicais às lesões por mergulho em água rasa. Quanto às complicações, a tetraplegia teve maior influência enquanto fator de risco para todas as complicações em relação à paraplegia, mas apresentou fator de proteção às síndromes dolorosas. A complicação mais ocorrente foi a infecção urinária (76,4%). A reutilização do cateter proporcionou riscos para infecção urinária, para sangramento e obstrução, enquanto que a não reutilização se configurou fator de proteção para as mesmas complicações. O uso de cateter lubrificado se apresentou como fator de proteção para todas as complicações estudadas.
O CIL está relacionado à riscos e complicações, como tantas outras estratégias disponíveis na literatura, todavia, quando em comparação a essas, os agravos são minimizados. É perceptível que avanços são necessários no campo da enfermagem para que boas práticas sejam disseminadas e para que pessoas com disfunção neurológica do trato urinário inferior possam aderir a melhores escolhas, refletindo positivamente no seu cotidiano e qualidade de vida.
Existe considerável prevalência do uso do CIL entre as pessoas com TRM, constituindo-se fator de proteção à infecção urinária neste grupo, quando comparada às outras formas de controle miccional. A ausência de notificação constitui um fator limitante para as pesquisas e para a construção de novas políticas públicas que visem à prevenção das causas externas determinantes do TRM e à elaboração de ações voltadas ao atendimento especializado de forma a minimizar as complicações e melhorar a qualidade de vida dessa população.
Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir, de acordo com as recomendações do International Committe of Medical Journal Editors (ICMJE, 2013): (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida. Todos os autores declaram para os devidos fins que são de suas responsabilidades o conteúdo relacionado a todos os aspectos do manuscrito submetido ao OBJN. Garantem que as questões relacionadas com a exatidão ou integridade de qualquer parte do artigo foram devidamente investigadas e resolvidas. Eximindo, portanto o OBJN de qualquer participação solidária em eventuais imbróglios sobre a matéria em apreço. Todos os autores declaram que não possuem conflito de interesses, seja de ordem financeira ou de relacionamento, que influencie a redação e/ou interpretação dos achados. Essa declaração foi assinada digitalmente por todos os autores conforme recomendação do ICMJE, cujo modelo está disponível em http://www.objnursing.uff.br/normas/DUDE_final_13-06-2013.pdf
Recebido: 18/01/2017 Revisado: 08/08/2018 Aprovado: 08/08/2018