The kinds of home health care and the practice of health professionals - exploratory and descriptive research  

As categorias da assistência domiciliar e a prática dos profissionais de saúde – pesquisa exploratório-descritiva 

 

Maria Ribeiro Lacerda1 , Samantha Reikdal Oliniski2 , Clelia Mozara Giacomizzi1 , Kriscie Kriscianne Venturi1 , Thiago Christel Truppel1 

1 Universidade Federal do Paraná, PR, Brasil; 2 Instituto de Tecnologia do Paraná, PR, Brasil

 

RESUMO: A assistência domiciliar à saúde comporta quatro categorias de atendimento que devem ser compreendidos pelos profissionais da área: atenção. atendimento, visita e internação domiciliares. Assim, realizou-se esta pesquisa quali-quantitativa com objetivo de verificar se os profissionais da saúde compreendem e distinguem estes conceitos e os relacionam às suas práticas profissionais. Foram coletados dados de 219 profissionais de saúde por meio de um instrumento composto por questões de múltipla escolha. Constatou-se a existência de dificuldade destes profissionais em discernir as categorias da atenção domiciliar à saúde, bem como em relacioná-las e adequá-las a sua prática profissional. Observou-se ainda que a prática profissional se encontra desarticulada e desapropriada do contexto da atenção domiciliar à saúde. Assim, destaca-se a necessidade de capacitação profissional para uma plena atuação na assistência à saúde domiciliar.

Palavras-chave: Assistência Domiciliar, Equipe Interdisciplinar de Saúde, Visita Domiciliar.

ABSTRACT: In Brazil home health care includes four different kinds of assistance that have to be understood by health professionals. Thus, was undertaken this quail-quantitative research in order to verify if health professionals understand and distinguish these concepts and relate them to their practice. Data were collected from 219 health professionals through a questionnaire with question of multiple choices. It was verified difficulties of health professionals to distinguish the different kinds of home health care and relate them to their own practice. Also it was observed that this practice is disarticulate and inappropriate to the home context. Thus, it is important the professional qualification in order to a right and complete practice in home health care.

Key words: Home nursing, Patient Care Team, Home Visit

 

INTRODUÇÃO

A assistência à saúde da população pode ser abordada por diferentes categorias, entre elas se encontram a assistência hospitalar e a assistência domiciliar à saúde. A assistência à saúde, desenvolvida no âmbito do domicílio, compreende as ações pautadas em uma concepção de saúde-doença que buscam a promoção, prevenção, recuperação e reabilitação do cliente em seu lugar de referência: o lar. Essas atividades ocorrem de acordo com as particularidades e necessidades apresentadas pelo cliente, seus familiares, bem como por todo o contexto que circunda esse domicílio.  É operacionalizada por meio de categorias distintas, dentre as quais estão: a atenção, o atendimento, a internação e a visita domiciliares. Cada uma delas possui características específicas, que permitem aos profissionais de saúde direcionar sua prática de acordo com os objetivos e tipo de assistência peculiar. 

A incompreensão por parte dos profissionais sobre a assistência domiciliar à saúde e, principalmente, um discernimento deficiente acerca das categorias que permitem a sua implementação podem levar a gastos desnecessários de recursos, a um sistema desorganizado e de difícil avaliação e a uma assistência desqualificada e/ou desarticulada, que não atinge suas finalidades e não utiliza os métodos adequados. 

Conforme Lacerda, Zagonel e Martins1 em relação a assistência domiciliar à saúde, o profissional tem como objetivo alcançar o melhor nível de saúde do indivíduo e de sua família. Necessitando do conhecimento que respalde suas ações, de maneira que ao relacionar a teoria com a prática, possibilite ao profissional a clareza e o domínio sobre o cuidado a ser prestado. Diante disto, aponta-se a necessidade do conhecimento e discernimento de cada categoria da assistência domiciliar à saúde para que se tenha qualidade e resolutividade nas ações de saúde planejadas e desenvolvidas no domicílio.  Desse modo, realizou-se esta pesquisa cujo objetivo foi verificar e analisar a distinção e compreensão das principais categorias da assistência domiciliar à saúde, bem como entender a relação entre elas e a prática do profissional de saúde. 

AS CATEGORIAS DA ASSISTÊNCIA DOMICILIAR À SAÚDE

A assistência domiciliar à saúde é uma modalidade que comporta diferentes categorias. Entre elas, quatro foram selecionadas para este estudo: atenção, atendimento, internação e visita domiciliares. A seguir, apresentam-se suas distinções para compreensão de suas particularidades.

O termo atenção à saúde tem sido vastamente utilizado e contempla atividades que têm o objetivo desde a promoção até a reabilitação da saúde da população, de forma individualizada ou coletiva. Ao enfocar a assistência domiciliar à saúde, a categoria atenção domiciliar à saúde é a mais ampla pois envolve políticas públicas, econômicas, sociais e de saúde; a fiscalização e o planejamento dos programas de saúde e a sistematização de atividades assistenciais, preventivas e educativas no âmbito domiciliar. Assim, pode-se dizer que toda a ação de saúde relacionada aos domicílios faz parte da atenção domiciliar à saúde. Por conseguinte, ela engloba as demais categorias: atendimento, internação e visita domiciliares.

Para a Anvisa2, a atenção domiciliar é um “termo genérico que envolve ações de promoção à saúde, prevenção, tratamento de doenças e reabilitação desenvolvidas em domicílio.” Essas ações de saúde são desenvolvidas por uma equipe multiprofissional a partir do diagnóstico da realidade em que o cliente está inserido e em que são observados os seus potenciais e limitações3. Assim, a atenção domiciliar à saúde envolve questões macro-sociais, como políticas de saúde, saneamento básico, habitação, emprego e condições de vida e outros.

O atendimento domiciliar à saúde também é um conceito amplo, considerado uma estratégia de atenção à saúde no domicílio. Tem como objetivo principal oferecer ao indivíduo e a sua família os serviços profissionais de saúde em suas residências. Segundo a Anvisa2, o “atendimento em domicílio é um conjunto de atividades de caráter ambulatorial, programadas e continuadas, desenvolvidas em domicílio”, e complementamos esta definição considerando que ela ocorre por meio de ações preventivas e/ou assistenciais com participação de equipe multiprofissional. Tal categoria abrange a realização de ações educativas, orientação, demonstração de procedimentos técnicos realizados pelo cliente ou seu cuidador, bem como a execução desses pela equipe multiprofissional no domicílio. Portanto, nessa categoria são realizadas ações simples ou complexas com o objetivo de preservar e maximizar a autonomia do cliente em seu meio de convívio.

A internação domiciliar pode ser considerada a categoria mais complexa e específica. Internar em domicílio, além de trazer os materiais e equipamentos de suporte hospitalar para a residência, é interagir constantemente com o cliente e familiares e compreender seus relacionamentos, modos de agir e o contexto que os permeia. A internação domiciliar trata-se de uma atividade continuada, com oferta de tecnologia e de recursos humanos, equipamentos, materiais e medicamentos, para pacientes complexos4. O Ministério da Saúde, na portaria nº 2529 de 19 outubro de 2006, define como internação domiciliar:

“no âmbito do SUS, o conjunto de atividades prestadas no domicílio a pessoas clinicamente estáveis que exijam intensidade de cuidados acima das modalidades ambulatoriais, mas que possam ser mantidas em casa, por equipe exclusiva para este fim”.5  

E por fim, a visita domiciliária corresponde às ações de saúde realizadas pelos profissionais e/ou equipe no domicílio que visam avaliar as necessidades do cliente, de seus familiares e do ambiente em que vivem para que se possa estabelecer um plano assistencial4. Considera-se a visita domiciliária um contato pontual de profissionais de saúde com grupos de risco para a coleta de informações e/ou orientações4.  Estas orientações dizem respeito aos aspectos que influenciam no processo saúde-doença do cliente, que vão desde o uso de medicamentos até a existência de saneamento básico. A visita domiciliária deve ser sistematizada e as atividades devem ser programadas de modo que se iniciem antes e continuem após a visitação do cliente em sua residência7. Desse modo, ela precisa ser planejada e o profissional que a executa deve estabelecer objetivos que irão norteá-los na realização desta estratégia8.  

METODOLOGIA

Esta é uma pesquisa exploratório-descritiva de abordagem quali-quantitativa, pois, permite a observação, descrição e análise de um fenômeno, bem como explorar suas dimensões, o modo como se manifesta e como os componentes estão correlacionados9.

Os dados para a realização do estudo foram coletados no período de dezembro de 2003 a fevereiro de 2004, por meio de um instrumento de pesquisa composto por 12 questões de múltipla escolha com definições referentes a cada uma das categorias, as quais deveriam ser enumeradas de acordo com o conceito correspondente. Cada categoria possuía correlação com no mínimo duas e no máximo quatro definições. Embora, tenha-se deixado espaço para marcação de apenas uma resposta, alguns assinalaram mais de um conceito para a mesma definição. Realizado o levantamento numérico, procedeu-se uma análise qualitativa dos dados.

O questionário foi aplicado junto aos profissionais de saúde atuantes em Unidades de Saúde (US), a maioria delas vinculada ao Programa Saúde da Família (PSF), no município de Curitiba/PR. Foram utilizados como critérios de inclusão a formação técnica ou profissional na área da saúde e disposição para participação voluntária e anônima na pesquisa. Obteve-se uma amostra de 219 questionários respondidos com a seguinte distribuição profissional: 29 enfermeiros, 84 auxiliares de enfermagem, 22 técnicos em enfermagem, 25 odontólogos, 26 auxiliares de consultório dentário, 14 técnicos em higiene dental, 17 médicos e 2 psicólogos.

Destaca-se que foram respeitadas as diretrizes éticas de pesquisa envolvendo seres humanos, conforme a Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Desta forma, obteve-se a aprovação da pesquisa nos Comitês de Ética em Pesquisa das instituições envolvidas, os participantes foram informados sobre os objetivos e a confidencialidade das informações lhes foi assegurada. Pelo número de registro CEP/SD: 007.SM.07/03-09, garante-se a aprovação pelo Comitê de Ética. 

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Com o intuito de maior fundamentação da prática profissional e compreensão das especificidades das categorias da assistência domiciliar à saúde em estudo, apresenta-se a seguir as atribuições traduzidas pelos profissionais da saúde em relação a cada uma delas e a análise realizada com base na literatura relacionada.  

Atenção domiciliar À SAÚDE

O maior percentual geral de equívoco apresentado foi o da atenção domiciliar à saúde. Tal engano, entretanto, não é absoluto, uma vez que visita, atendimento e internação domiciliares também são formas de atenção domiciliar. Contudo, representa pouca compreensão e distinção completa das quatro categorias pelos profissionais de saúde.

Dos 219 profissionais pesquisados, 53 responderam corretamente às alternativas correspondentes a este conceito (22,46% do total) e metade dos profissionais trocou a atenção por atendimento domiciliar à saúde.

A primeira definição de atenção domiciliar à saúde utilizada no instrumento de pesquisa refere-se à mesma como “o serviço em que as ações são desenvolvidas no domicílio do paciente, por uma equipe multiprofissional, a partir da realidade na qual o paciente está inserido”3:416.

Visto que a amplitude da expressão e as ações no domicílio apresentadas são características de todas as categorias, são compreensíveis os equívocos realizados com relação a este conceito. As ações da atenção à saúde em domicílio envolvem desde a prevenção à reabilitação da saúde e são realizadas no atendimento, na visita e na internação domiciliares, cada qual com sua aplicação e finalidade.

A visita domiciliária considera, além da realidade social na qual o cliente está inserido, a sua observação pelo levantamento dos aspectos determinantes da saúde ou doença; a prevenção é a ação central dos profissionais. De acordo com Takahashi e Oliveira10:43, a visita domiciliária é “um instrumento de intervenção fundamental para os profissionais de saúde conhecerem as condições de vida e saúde dos pacientes e suas famílias”. Assim, 37 profissionais (15,68%) não tiveram este discernimento com relação ao conceito de atenção domiciliar à saúde, trocando-o pela definição de visita domiciliária.

A expressão em análise refere ainda a atenção domiciliar à saúde como o “serviço em que as ações são desenvolvidas”. Esse fragmento é generalista, portanto, não deveria ser aplicado aos conceitos das demais categorias, uma vez que necessita de maior elucidação acerca das ações às quais se refere. Deste modo, os profissionais que confundiram atenção domiciliar à saúde com atendimento domiciliar à saúde (50%), com visita domiciliária (15,68%) e com internação domiciliar (7,63%), demonstram pouca clareza das especificidades das categorias de assistência domiciliar à saúde.

O atendimento à saúde em domicílio possui ações mais abrangentes do que as realizadas na visita e internação domiciliares e está diretamente relacionado à prática profissional individualizada, na qual estão incluídas a prevenção, recuperação e reabilitação do cliente. Dessa forma, o atendimento domiciliar à saúde pode ser operacionalizado pela visita e internação domiciliares. Na internação domiciliar, as ações são tanto preventivas quanto de recuperação e reabilitação, embora as duas últimas sejam mais claras neste tipo de serviço.

Observa-se também que na literatura há uma relativa dificuldade em discernir corretamente a atenção e o atendimento domiciliares. Assim, ao analisar e discutir os conceitos em estudo, percebeu-se a ambivalência de uma definição utilizada no instrumento de pesquisa.

Nesta definição, o atendimento domiciliar à saúde é descrito como:

 “componente do continuum do cuidado à saúde por meio do qual os serviços de saúde são oferecidos ao indivíduo e sua família em seus locais de residência com o objetivo de promover, manter ou restaurar a saúde, maximizar o nível de independência, minimizando os efeitos das incapacidades ou doenças, incluindo as sem perspectiva de cura”11:12.

 

Em nosso entendimento, este conceito pertence à categoria atenção domiciliar à saúde, uma vez que a promoção da saúde engloba ações destinadas ao bem-estar, sem visar nenhuma doença em particular. Inclui educação sanitária, nutrição, habitação, emprego, enfim, condições para a satisfação das necessidades básicas do indivíduo12, medidas que dependem de instâncias maiores no sistema político e de saúde.

Desta forma, o quadro de acertos e enganos apresentado inicialmente ficaria alterado, uma vez que o gabarito utilizado também modificaria segundo nossa percepção. Considerando a definição de Marrelli11 como pertinente à atenção domiciliar à saúde, 31,56% dos profissionais conceituaram-na corretamente, ao passo que 36,89% a trocaram por atendimento domiciliar à saúde. As trocas referentes à visita e internação domiciliares permaneceram inalteradas, bem como o percentual de respostas em branco.

Nos gráficos abaixo, é possível analisar o quadro de respostas apresentado para o conceito de atenção domiciliar com base na definição de Marrelli11 (gráfico 1) e de outros autores do estudo (gráfico 2).

      

Diante do exposto, pode-se considerar que a atenção domiciliar à saúde é pouco compreendida pelos profissionais de saúde, ainda que somente 4,24% dos questionários foram deixados em branco. Deve-se ressaltar que os sujeitos parecem não reconhecer a existência de uma modalidade mais ampla e abrangente, determinante no processo de saúde e doença. 

ATENDIMENTO DOMICILIAR À SAÚDE

Referente ao conceito desta categoria, 27,62% dos profissionais acertaram sua definição. Trocaram o conceito de atendimento domiciliar por atenção domiciliar à saúde (36,83%), 18,7% por visita e 11,61% por internação domiciliar, ao passo que 5,245% dos profissionais nada responderam (gráfico 3).

Analisando separadamente as questões do instrumento, Protnows e Samuels13 destacam o atendimento domiciliar como uma estratégia de atenção à saúde (16,87% de acertos). A expressão acima pode pertencer tanto à definição de atendimento, quanto às de visita e internação domiciliares; o que fez com que 30,92% e 4,42% dos profissionais, respectivamente, que equivocaram os conceitos desta questão não estejam completamente enganados.

Já no que tange aos erros de conceitos entre atendimento e atenção domiciliares à saúde nesta questão (42,97%), podemos considerar que, de fato, os profissionais estão equivocados porque a atenção domiciliar à saúde não é uma estratégia.

A segunda expressão do instrumento refere-se ao atendimento domiciliar como categoria de nível intermediário, em que a equipe não permanece na residência e os equipamentos podem ou não ali permanecer.

A princípio, esta definição parece adequar-se à internação domiciliar, perfazendo 43,75% dos equívocos. Contudo, a internação domiciliar corresponde ao nível mais específico e rico em atividades complexas. Houve, ainda, 25,9% de trocas por atenção domiciliar à saúde, entretanto esta definição é ampla e abrangente. Em 8,92% das respostas houve troca do conceito de atendimento pelo de visita. Contudo, na visita domiciliar só serão utilizados equipamentos se a mesma estiver instrumentalizando um atendimento domiciliar à saúde. Ainda, 15,63% dos sujeitos trocaram atendimento por internação e 5,8% não responderam.

 A terceira questão do instrumento se refere ao atendimento, conceito de Marrelli11 já discutido. Nessa expressão, 15,03% trocaram atendimento por visita e 15,45% por internação. O atendimento, mesmo englobando a visita, não possui como diferencial as ações educativas, de orientação e observação como a visita. Quanto à internação domiciliar, caracteriza-se por uma diversidade de atividades, destacando a utilização da tecnologia e complexidade de suas ações.

Responderam corretamente à questão 23,60% dos profissionais, ao passo que 40,77% trocaram-na pelo conceito de atenção. No entanto, conforme já referido, discordamos com Marrelli11 e aplicamos este conceito à atenção domiciliar à saúde, ressaltando que as ações de promoção da saúde são resultantes de políticas públicas de saúde, e não somente dos profissionais atuantes, como ocorre no atendimento domiciliar à saúde.

Assim, novamente o quadro de respostas fica alterado, possuindo dois eixos de análise: o de Marrelli11 (gráfico 3) e o dos autores deste trabalho (gráfico 4).

 

 Observamos que, de uma maneira geral, os profissionais não reconhecem e distinguem as categorias da atenção e do atendimento domiciliares, visualizando-os e executando-os como uma mesma forma de atenção à saúde.    

Internação domiciliar à saúde

A internação domiciliar é uma categoria bem específica da atenção domiciliar à saúde, com 45,5% de respostas corretas. Dentre os 219 sujeitos, 23,14% trocaram a definição de internação por atendimento domiciliar à saúde (gráfico 5).

 

Também foi confundido o conceito de internação pelos de visita e atenção domiciliares (9,10% e 16,23% respectivamente), ao passo que 6% das respostas foram deixadas em branco.

No instrumento, a primeira definição referente à internação domiciliar é de Lacerda6 que a define como a prestação de cuidados sistematizados, de forma integral e contínua no domicílio, com supervisão/ação de equipe de saúde específica, personalizada, centrada na realidade do cliente, envolvendo a família. Podendo ou não ter equipamentos e materiais.

Nessa questão, houve 32,36% de respostas corretas, ao passo que 37,4% foram associadas à definição de atendimento, 20,14% à de atenção e 5,9% à de visita domiciliar e, ainda, 4,2% em branco.

O equívoco da definição de internação pela de atendimento pode ser justificada porque ambas são formas de prestação de serviços com ações voltadas para a realidade do cliente e família e a internação é uma forma de atendimento. Contudo, o atendimento não contempla a ação contínua da equipe de saúde. Na troca do conceito de internação pelo de atenção domiciliar, ocorreu a generalização da internação. A atenção domiciliar é a mais ampla categoria e, sendo assim, não há necessidade de uma prestação de cuidados por uma equipe específica e personalizada, como ocorre na internação. Quanto à aplicação do conceito para a visita domiciliar é possível referi-la como incoerente, pois a visita é um momento de encontro da equipe de saúde com o cliente e família, no qual são compartilhadas informações e conhecimentos, realizadas orientações e observado o contexto domiciliar.

Uma outra definição exposta no instrumento destaca a internação domiciliar como um serviço prestado a uma população mais seleta. Somente 14,67% das respostas foram corretas, 28% associadas ao atendimento domiciliar, 25,78% à atenção, 23,11% à visita domiciliar. Tais dados revelam uma prática profissional desarticulada, em que a realidade e as atividades realizadas dissociam-se dos conceitos adequados.

A internação domiciliar pode ser compreendida como a forma de atendimento que se refere mais ao cuidado intensivo e multiprofissional. Requer o deslocamento de parte da estrutura hospitalar, equipamentos e pessoas, ao domicílio de doentes com complexidade moderada ou alta12. Esta foi a terceira questão referente à internação domiciliar e obteve 81,7% de acertos, 6,25% de trocas por atendimento domiciliar, 3,57% por atenção e 2,23% por visita. Esta definição não poderia ser aplicada às demais categorias, pois, segundo Dal Ben15, a internação domiciliar exige, em casos especiais, acompanhamento contínuo, e, às vezes, até mesmo ininterrupto.      

 visita domiciliar à saúde

Com relação à definição de visita domiciliar, evidenciou-se 42,35% de acertos, 24,86% de troca por atenção domiciliar e 18,92% por atendimento. A visita é um instrumento que permite a operacionalização da atenção e do atendimento domiciliar, portanto, corresponde ao nível específico de atuação. Já o atendimento domiciliar à saúde corresponde ao nível intermediário e a atenção domiciliar ao nível genérico. Mas é compreensível tal confusão, visto que ambos englobam o conceito de visita. Em 8,03% das respostas, atribuiu-se à visita o conceito de internação domiciliar, mesmo sendo a visita um instrumento utilizado na internação. Ainda, apresentou-se 5,83% de respostas em branco (gráfico 6).

A primeira definição afirma que a visita domiciliar geralmente é programada com objetivo definido6. Nesta, obteve-se 71,88% de acertos, o que pode evidenciar a compreensão da necessidade de planejar e estabelecer objetivos prévios à realização da visita domiciliar. Houve, ainda, 11,16% respostas trocadas por atendimento, 6,70%, por internação, 5,36%, atenção e 4,91% em branco. Mesmo não sendo uma afirmação pertinente a apenas um dos conceitos, tal definição refere-se de modo particular à visita domiciliar.

A segunda definição de visita domiciliar afirma que:

“nesta modalidade a assistência é mais pontual e a equipe principalmente fornece, orientações relativas aos cuidados a serem realizados pelo cuidador (familiar, leigo ou profissional), pessoa responsável pelo cuidado no contexto domiciliar, ou pelo próprio cliente”6;16:5.  

Apenas 15,86% das respostas estavam corretas, 40,53% consideraram-na como atenção domiciliar, 25,55% como atendimento, 10,13% como internação e 7,93% foram respostas em branco. A orientação é uma atividade concernente tanto à visita quanto ao atendimento domiciliar. Embora a visita esteja contida na categoria de atendimento domiciliar, é principalmente por meio dela que o profissional orienta o cuidador ou o cliente sobre os cuidados a serem realizados.

A terceira definição afirma que a visita domiciliária “poderia ser realizada para a população em geral”16:5. Dentre os profissionais, 25,22% acertaram a questão, 35,40% trocaram-na por atenção domiciliar à saúde, 18,58% por atendimento, 14,16% por internação e 6,64% não responderam. A visita domiciliar é a de menor custo e seu atendimento encontra-se no nível primário de atenção. Requer ações pontuais, menor complexidade, tornando-a exeqüível a toda  população. As demais categorias demandam maiores insumos ou ainda se situam em uma esfera de ação global e independe da atuação exclusiva do profissional no domicílio.

A quarta definição aponta que a visita domiciliar é um tipo de atendimento realizado pelos profissionais de saúde e/ou equipe na residência do cliente com objetivo de avaliar as demandas do paciente e de seus familiares, bem como o ambiente onde vivem, e estabelecer um plano assistencial6.

Dentre os sujeitos, 56,47% reconhecem que uma das finalidades da visita domiciliar é a avaliação. Esta não deve se limitar ao aspecto biológico do cliente, pois para que o cuidado seja realizado no domicílio, o profissional precisa contar com a participação da família. Por conseguinte, avalia-se também a possibilidade de desenvolvimento das ações de saúde nesse ambiente.

Em 20,26% das respostas o conceito de visita foi relacionado ao de atendimento domiciliar, 18,10% ao de atenção, 1,29% ao de internação e 3,88% não responderam a questão.

A avaliação do cliente, das relações familiares e do domicílio é o que distingue a visita domiciliar das demais. Não significa que ela não seja realizada nas demais categorias, mas aqui ela é um é um dos principais enfoques da visita, constituindo-se portanto em um diferencial.  

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atenção domiciliar à saúde engloba as ações, medidas, estratégias e programas de saúde voltados para atendimento do paciente e família no domicílio. No entanto, sua característica principal é a promoção da saúde. Dessa forma, a atenção domiciliar à saúde envolve a proposição de normas e regulamentação para a assistência à saúde no domicílio; a discussão sobre as questões que interferem diretamente na saúde, como o saneamento básico, a alimentação, acesso a recursos, entre outros, bem como a implementação das melhorias necessárias, políticas econômicas, sociais e ambientais.

Os profissionais que compuseram a amostra da pesquisa demonstraram compreender de maneira escassa essa dimensão da assistência domiciliar à saúde. Poucos entenderam que ela está em um nível amplo de atuação, não se limitando à assistência direta ao cliente, mas contemplando todas as ações que interfiram no processo saúde-doença.

As ações do atendimento domiciliar à saúde visam a recuperação e reabilitação do cliente, e a prevenção de doenças, de etiologia biológica, química ou física, bem como das multifatoriais e influenciadas pelo meio ambiente. Por meio dele, é que os profissionais prestam o cuidado, acompanham os clientes e realizam procedimentos técnicos. Por meio dele também, os cuidados são prestados de forma contínua, mas não necessariamente ininterrupta. Portanto, a troca realizada entre os conceitos de atenção e atendimento domiciliar à saúde evidencia uma visão reducionista dos profissionais em relação à atenção domiciliar à saúde e pode demonstrar uma ênfase nas ações assistenciais, específicas e técnicas.

A internação domiciliária é categoria da assistência domiciliar à saúde caracterizada por aspectos como a sistematização do cuidado, a abordagem integral, contínua e intensiva do cliente, a necessidade de uma equipe especializada e altamente qualificada para realização da assistência e a necessidade de equipamentos tecnológicos. Por ser uma atividade de alta complexidade e com definição precisa, não deveria suscitar dúvidas em sua conceituação pelos profissionais de saúde. Por conseguinte, apesar de esta categoria apresentar 45,5% de acertos, os profissionais que atribuíram a ela os demais conceitos demonstraram não compreender seu nível de complexidade e sua esfera de atuação e a realidade de implementação nos serviços públicos de saúde.

A visita domiciliar tem como característica a avaliação do cliente, seus familiares e do domicílio. Por meio dela o profissional realiza o diagnóstico da realidade em que o cliente está inserido, conhecendo os diversos fatores que influenciam no seu processo saúde-doença, e busca subsídios para sua ação no domicílio, que envolve principalmente a orientação e o acompanhamento das condições de saúde do cliente. Referente a este conceito apresentou-se 42,35% de acertos. No entanto, esperava-se uma maior margem de acertos, pois esta é a categoria que os profissionais tem familiaridade, uma vez que faz parte de suas atividades cotidianas.

Percebeu-se que os profissionais de saúde apresentaram uma dificuldade em relacionar as definições da assistência domiciliar à saúde aos seus respectivos conceitos, o que se traduz em uma deficiência de entendimento não apenas em relação à conceituação em si, mas nas atividades e nível de abrangência que elas envolvem. Salienta-se que a incompreensão dos objetivos e tipos de assistências apresentadas em cada categoria pode significar uma prática desarticulada, cujos métodos e recursos utilizados podem não ser adequados.

Por outro lado, é compreensível que os profissionais não possuam domínio e clareza em relação às categorias, pois a assistência domiciliar à saúde é uma modalidade, de certa forma, recente e que não está completamente inserida no sistema de saúde e na formação e/ou capacitação dos profissionais de saúde. Portanto, aponta-se a necessidade dos currículos de graduação e pós-graduação contemplarem essa modalidade, bem como o Programa Saúde da Família preparar e instrumentalizar os profissionais para o tipo de atuação que realizarão nos domicílios. Acredita-se que, desse modo, será possível a explicitação e diferenciação entre cada uma das categorias e conseqüentemente haverá uma maior integração entre as finalidades e a atuação dos profissionais no domicílio, favorecendo assim a população, que terá um atendimento adequado às suas necessidades e à especificidade de sua condição de saúde-doença. 

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Nota: Para melhor esclarecimento em relação aos conceitos da atenção domiciliar à saúde consultar: Lacerda MR, Giacomozzi, CM, Oliniski SR, Truppel TC. Atenção à saúde no domicílio: modalidades que fundamentam sua prática. Saúde e Sociedade 2006; 15 (2): 88-95. Disponível em:

http://www.apsp.org.br/saudesociedade/XV_2/revista%2015.2_artigo%2007.pdf

 

Recebido: Oct 3rd , 2006
Revisado: Nov 3rd, 2006
Aceito: Dec 12th, 2006