ARTIGOS ORIGINAIS
Condições e relações de trabalho em unidades críticas: estudo tipo survey
Ingrid Mayara Almeida Valera1, Danielle Wisniewski2, Gislene Aparecida Xavier dos Reis3, Kelly Cristina Inoue4, Laura Misue Matsuda5
1Gestão da Qualidade União Oeste Paranaense de Estudos e Combate ao Câncer
2Universidade Federal do Paraná
3Hospital Santa Casa de Maringá
4Hospital Universitário de Maringá
5Universidade Estadual de Maringá
RESUMO
Objetivo: investigar sobre condições e relações de trabalho de profissionais de enfermagem de unidades críticas.
Método: pesquisa tipo Survey, realizada em 2013, em três hospitais do Paraná. Participaram 64 (30,19%) enfermeiros e 148 (69,81%) profissionais da equipe técnica de enfermagem, atuantes em Centro Cirúrgico, Unidade de Terapia Intensiva Adulta e Pronto Socorro. Aplicou-se o questionário Pesquisa das Condições e Relações de Trabalho e os dados foram analisados por meio de estatística descritiva.
Resultados: constatou-se ocorrência de alta carga de trabalho (pontuações entre 5,25 a 6,85 pontos); subdimensionamento da equipe (4,38 a 6,9); salário insuficiente (4,98 a 8,7); falta de estímulo da instituição (5,83 a 8,0) e baixa motivação laboral (6,03 a 8,3).
Discussão: condições e relações de trabalho de unidades críticas podem influenciar na assistência prestada e na qualidade de vida dos profissionais.
Conclusão: a maioria dos participantes apontou que as condições e relações de tr
abalho onde atuam são inadequadas.
Descritores: Condições de Trabalho; Trabalho; Satisfação no Trabalho; Enfermagem.
INTRODUÇÃO
O trabalho de profissionais de enfermagem se insere no setor terciário da economia e, portanto, é passível de sofrer prejuízos que podem ser decorrentes das políticas sociais e econômicas capitalistas que, ao valorizar a quantidade ao invés da qualidade dos serviços, conduzem as empresas à precarização das condições de trabalho(1).
Especialmente nos hospitais, a equipe de enfermagem, muitas vezes, desenvolve suas atividades com número limitado de colaboradores, sobrecarga de trabalho, déficit na capacitação profissional, exposição a substâncias contaminantes e convívio frequente com o sofrimento e a morte(2). Em cenários assim, o desgaste ou adoecimento físico e emocional do trabalhador tende a ser maior(3), favorecendo a ocorrência de eventos adversos, com prejuízos à saúde e à segurança do paciente(2).
Em uma revisão sistemática da literatura realizada a partir da análise de 29 estudos(4), identificou-se que as condições e as relações de trabalho na enfermagem se relacionavam aos desfechos dos pacientes. Nesse sentido, o maior número de horas de enfermagem, as relações colaborativas entre enfermeiros e médicos e os maiores níveis de capacitação e experiência profissional foram associados ao melhor manejo da dor do paciente e menores frequências de quedas e de úlceras por pressão(4).
Principalmente em unidades assistenciais consideradas críticas(5), como Pronto Socorro (PS), Centro Cirúrgico (CC) e Unidade de Terapia Intensiva (UTI), é comum a existência de condições e relações trabalhistas desgastantes e estressantes, as quais resultam em ambientes desumanos de trabalho, com potencial para afetar a segurança do profissional e também dos pacientes(3).
A investigação de situações relacionadas às condições e às relações no contexto do trabalho da enfermagem pode promover reflexões e práticas voltadas à melhoria do serviço(6). Logo, as informações referentes a essas variáveis, além de fomentar a literatura alusiva ao tema, podem subsidiar tomadas de decisões de forma mais assertiva para o desenvolvimento e monitoramento de medidas de promoção à saúde do trabalhador e à melhoria da qualidade do cuidado.
Com base no exposto, questiona-se: como se apresenta o ambiente de trabalho da equipe de enfermagem que atua em unidades assistenciais críticas de diferentes hospitais? Para responder a esta questão, o presente estudo objetivou investigar sobre condições e relações de trabalho de profissionais de enfermagem de unidades assistenciais críticas.
MÉTODO
Pesquisa tipo Survey, de abordagem quantitativa, realizada no período de fevereiro a junho de 2013, em três hospitais – um filantrópico (HF), um privado (HP) e um público (HPB) – de um município do Paraná.
A população do estudo foi constituída por enfermeiros, técnicos de enfermagem e auxiliares de enfermagem que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: atuar em unidade crítica - CC, UTI Adulto (UTI-A) ou PS -, por no mínimo seis meses, com vínculo empregatício formal no estabelecimento. Foram excluídos profissionais de enfermagem que se encontravam afastados do trabalho, independentemente do motivo. Desse modo, o presente estudo contou com 212 participantes, dentre os quais 64 (30,19%) eram enfermeiros e 148 (69,81%) eram profissionais de enfermagem de nível médio (técnicos e auxiliares de enfermagem), aqui denominados como equipe técnica. Sete enfermeiros, 13 técnicos de enfermagem e nove auxiliares de enfermagem se recusaram a participar da pesquisa. Na tabela 1 consta a distribuição dos sujeitos de acordo com a categoria profissional e hospital.
Tabela 1. Distribuição dos sujeitos conforme a categoria profissional e instituição hospitalar. Paraná, 2013. | |||||||
Hospital | HPB | HP | HF | ||||
Categoria | N | % | N | % | n | % | |
Enfermeiro | 36 | 37,5 | 8 | 19,5 | 20 | 26,7 | |
Equipe Técnica | 60 | 62,5 | 33 | 80,5 | 55 | 73,3 | |
Total | 96 | 100 | 41 | 100 | 75 | 100 | |
Fonte: Próprio autor. |
Após esclarecimentos sobre a pesquisa e autorização formal do participante, com leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias, procedeu-se a coleta dos dados. Para isso, aplicou-se a parte específica sobre condições e relações do trabalho contidas no questionário do Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde (PNASS) do Ministério da Saúde(7) adaptado para fins deste estudo.
Destaca-se que, os 14 itens abordados eramdistribuídos em escala tipo Likert, convertidos para forma escalar de 0 (zero) a 10 (dez) pontos, que representavam respectivamente resultados totalmente insatisfatórios a totalmente satisfatórios.
Os dados foram tabulados, por meio de dupla digitação, no software Microsoft Office Excel® 2007, e em seguida importados para o programa estatístico SAS (StatisticalAnalisys System) para cálculo da média, desvio padrão e frequências absolutas e relativas. Na análise dos dados, notas médias abaixo de 7 (sete) pontos foram consideradas insatisfatórias e, quando iguais ou acima desse valor, satisfatórias(7). A nota de corte foi delimitada em conjunto com o estatístico, pautada no manual do PNASS(7).
Este estudo obedeceu aos preceitos éticos brasileiros e foi aprovado pelo Comitê Permanente de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos (COPEP) da Universidade Estadual de Maringá. Encontra-se registrado sob o CAAE no. 12503813.8.0000.0104, parecer no. 207.365, de 18 de fevereiro de 2013.
RESULTADOS
Na tabela 2 constam as médias por itens referentes às condições de trabalho.
Os dados apontam que em todos os hospitais, e entre enfermeiros e equipe técnica, a carga horária trabalhada foi considerada insatisfatória, porém a segurança foi considerada satisfatória em todos os hospitais e entre todas as categorias profissionais.
Ainda no que se refere às condições de trabalho, observa-se que os profissionais do HPB estavam satisfeitos com o salário, enquanto que do HF e HP encontravam-se insatisfeitos. Dentre esses, o menor valor médio foi da equipe técnica de HF.
Tabela 2. Médias e desvios padrão dos itens que compõem as condições de trabalho, conforme a categoria profissional e instituição. Paraná, 2013. | ||||||
Categoria/Condições | Enfermeiros | Equipe Técnica | ||||
HPB | HP | HF | HPB | HP | HF | |
Carga de trabalho no hospital | 6,19(2,66)* | 5,25(3,2)* | 6,85(2,16)* | 6,18(2,87)* | 6,45(2,29)* | 5,91(2,46)* |
Dimensionamento da equipe | 5,69(2,87)* | 4,38(3,25)* | 6,9(2,22)* | 6,1(2,25)* | 5,67(2,87)* | 6,62(2,51)* |
Segurança para execução do trabalho | 7,25(2,44) | 8,13(2,7) | 8,1(1,8) | 7,48(2,01) | 7,36(2,36) | 8,2(1,86) |
Acomodações e mobiliários da unidade | 5,64(2,55)* | 5,75(3,11)* | 8,35(1,98) | 5,28(2,78)* | 6,3(2,67)* | 8,09(2,22) |
Higiene da unidade de trabalho | 7,53(1,95) | 8,13(2,03) | 8,35(1,84) | 8,1(1,61) | 8,03(1,79) | 8,75(1,52) |
Disponibilidade de materiais e equipamentos na unidade | 6,97(2,37)* | 8,5(1,85) | 8,95(1,23) | 7,72(1,95) | 7,42(2,7) | 8,6(1,76) |
Medicina e segurança do trabalho | 5,31(2,52)* | 7,88(2,75) | 7,6(2,54) | 7,02(2,09) | 6,03(2,66)* | 7,75(2,21) |
Salário | 7,81(2,2) | 6,38(3,11)* | 5,55(2,19)* | 8,7(1,33) | 5,21(2,79)* | 4,98(2,43)* |
Fonte: Próprio autor. |
Na tabela 3 constam as médias por itens referentes às relações de trabalho. Observa-se que o relacionamento com a chefia imediata nas instituições pesquisadas foi considerada satisfatória entre ambas as categorias dos três hospitais. Com exceção dos enfermeiros do HF, os demais profissionais pesquisados se mostraram insatisfeitos com o estímulo dado pela instituição ao trabalho e, pouco motivados para continuar no serviço. E, apenas enfermeiros do HPB e a equipe técnica do HP indicaram insatisfação com a valorização do seu trabalho pela chefia imediata.
Tabela 3.Médias e desvios padrão dos itens que compõem as relações de trabalho, conforme a categoria profissional e instituição. Paraná, 2013. | ||||||
Categoria/Relações | Enfermeiros | Equipe Técnica | ||||
HPB | HP | HF | HPB | HP | HF | |
Distribuição das tarefas da equipe | 6,22(2,84)* | 6,5(3,66)* | 7,5(1,64) | 7,1(2,28) | 6,91(2,38)* | 6,98(2,39)* |
Relacionamento com a chefia imediata | 7,22(2,11) | 7,25(4,23) | 9(1,41) | 7,55(2,75) | 7,61(2,44) | 8,2(1,92) |
Estímulo do hospital pelo trabalho | 5,83(2,73)* | 6,75(3,77)* | 8(1,97) | 6,17(2,33)* | 6,03(2,54)* | 6,42(2,94)* |
Valorização do trabalho pela chefia imediata | 5,89(2,72)* | 7,63(3,54) | 8,15(1,87) | 7,03(2,33) | 6,58(2,82)* | 7,49(2,28) |
Compatibilidade entre atividades realizadas e o cargo que exerce | 7,83(1,95) | 8,75(1,16) | 8,55(1,28) | 8,17(1,67) | 8,30(1,59) | 7,78(2,35) |
Motivação para continuar no serviço | 6,03(2,93)* | 6,88(3,44)* | 8,3(1,78) | 6,6(2,72)* | 6,64(2,16)* | 6,84(2,73)* |
Fonte: Próprio autor. |
DISCUSSÃO
Os dados apontaram que as condições de trabalho apresentaram desequilíbrio entre a adequação do tempo de assistência de enfermagem com a demanda das instituições investigadas, já que tanto a carga de trabalho como o dimensionamento da equipe apresentaram resultados insatisfatórios. Na mesma direção, um trabalho anterior verificou que as condições e as relações de trabalho dos profissionais de enfermagem, sobretudo de unidades assistenciais críticas, podem influenciar positiva ou negativamente na assistência prestada e também na qualidade de vida dos profissionais(4).
Esse resultado é alarmante, pois a carga de trabalho de enfermagem se relaciona inversamente com o dimensionamento de pessoal(8), e por isso é um fator que urge ser investigado e adequado a fim de melhorar a qualidade de vida e, consequentemente, a saúde do profissional.
Embora seja reconhecida a necessidade de dimensionar a equipe de enfermagem em todas as suas áreas de atuação para que a carga de trabalho seja ajustada às demandas de trabalho, ela parece não ser prática comum em instituições brasileiras, pois se percebe que a maioria dos enfermeiros não domina as técnicas e ferramentas necessárias para realizar o dimensionamento(9).
Aliado a isso, existe limitação na própria normatização do cálculo de dimensionamento e também dificuldades institucionais para suprir o número de contratações necessárias(10).
Tem-se então que a sobrecarga de trabalho derivada do subdimensionamento potencializa o desgaste e o adoecimento dos profissionais, e isso tende a aumentar a taxa de absenteísmo por doenças(8) que, por sua vez, pode se associar a piores resultados assistenciais(11).
Nos HPB e HP, as acomodações e os mobiliários das unidades também foram considerados como insatisfatórios (Tabela 2), mas satisfatórios pela equipe do HF. Embora estudos sobre a influência desses elementos no trabalho da enfermagem sejam incipientes, acredita-se que a insuficiência causa riscos e danos aos pacientes e à equipe porque, além de promover ambiente de trabalho desconfortável, favorece o improviso, a má utilização dos poucos recursos disponíveis e limita a ergonomia no desenvolvimento das atividades.
Por se tratar de unidades assistenciais críticas, onde as decisões e procedimentos exigem imediatismo e precisão, a adequação do ambiente ao trabalho é fator imprescindível. Neste aspecto, estudo(12) de avaliação sobre acolhimento com classificação de risco realizado no Serviço Hospitalar de Emergência de um hospital de ensino público concluiu que a estrutura física do serviço, quando apropriada, além da comodidade e segurança ao usuário e acompanhante, contribui à qualidade da assistência da equipe de enfermagem.
Ressalta-se que a satisfação apontada pelos profissionais do HF sobre a adequação física e também dos mobiliários dos serviços pode ter relação com a reforma efetuada recentemente na instituição. Em contrapartida, apenas os enfermeiros do HPB consideraram a disponibilidade de materiais e equipamentos da sua respectiva unidade como insatisfatória (Tabela 2).
A questão relacionada à segurança para a execução do trabalho obteve escores satisfatórios em ambas as categorias profissionais dos três hospitais, o que contradiz com o que foi exposto até o momento, pois os profissionais dos serviços investigados, em sua maioria, mostraram-se insatisfeitos com a carga de trabalho, dimensionamento da equipe, acomodações e mobiliário que, conforme foi abordado, são recursos necessários para a garantia da segurança e da qualidade das ações desempenhadas.
O paradoxo referido pode ter ocorrido pela disponibilidade suficiente de materiais e equipamentos, aspecto que revelou a satisfação dos participantes desta pesquisa, com exceção dos enfermeiros do HPB. Desse modo, prepondera-se que as deficiências que contribuem à insegurança no trabalho e que são inerentes ao quadro funcional da enfermagem e à estrutura física sejam minimizadas por dispositivos que facilitem e tornem o cuidado mais seguro.
No Brasil, a Norma Regulamentadora 32, aprovada pela Portaria no 485 do Ministério de Trabalho e Emprego, estabelece desde 2005 diretrizes fundamentais para a criação de medidas protetivas à segurança dos trabalhadores, atuantes em serviços de saúde, com ações voltadas à melhoria e manutenção periódica de equipamentos e redução da sobrecarga físico-emocional do profissional decorrente de condições precárias de serviço(13). No entanto, uma década depois ainda se observa que existe insatisfação do profissional com alguns aspectos de natureza elementar à adequada execução da assistência ao cliente, como se vê neste estudo.
Ainda no que se refere às condições de trabalho, observa-se na tabela 2 que os profissionais de HPB estavam satisfeitos com o salário, enquanto que do HF e HP encontravam-se insatisfeitos. Dentre esses, o menor valor médio foi da equipe técnica de HF. O fato de os trabalhadores do HPB se apresentarem mais satisfeitos com o salário possivelmente se relaciona com regime de contrato estatutário, estabilidade, plano de carreira e por receberem melhores salários que os demais trabalhadores da mesma categoria que atuam em outras instituições de saúde da região.
No Brasil, como ocorre em outros países, a baixa remuneração dos profissionais de enfermagem e a consequente necessidade de complementação da renda por meio de outras atividades geram sobrecarga de trabalho, insatisfação, desinteresse e intenção de abandonar a profissão(14,15). Diante de tal cenário, a literatura(15) aponta possíveis soluções, como o acompanhamento regular da desmotivação em seguir na profissão, por meio de estudos científicos que verifiquem a opinião, não apenas de profissionais ainda atuantes, como daqueles que efetivamente abandonaram a profissão. Além disto, a promoção de ações, visando o favorecimento das relações interpessoais com os colegas como, reuniões informais, programas de treinamento em grupo no trabalho e; mudanças na organização do trabalho por meio de horários mais flexíveis.
No que se refere às relações de trabalho, observa-se que o relacionamento com a chefia imediata nas unidades investigadas obteve escores satisfatórios em ambas as categorias dos três hospitais. Nesse sentido, a literatura(16) aponta que a boa convivência com os colegas de trabalho e, a consequente manutenção de um ambiente laboral agradável, pode incentivara permanência do profissional no serviço.
A exemplo da premissa anterior, a compatibilidade entre as atividades realizadas com o cargo para o qual foi contratado também foi considerada satisfatória por todas as categorias profissionais das três instituições. Isso demonstra que as condições trabalhistas, na maioria das vezes delimitadas por meio de contratos de trabalho, estão sendo cumpridas. Contudo, há que se considerar que certos fatores como o clima organizacional e tensões, alheios aos termos contratuais e vivenciados no cotidiano da profissão, têm forte influência sobre a ocorrência de eventos adversos e também na (in) satisfação profissional(3,14).
É preciso considerar que o trabalho realizado pela enfermagem em unidades hospitalares é complexo, intenso e contínuo. Com isso, as consequências da jornada estressante de trabalho podem maximizar os impactos produzidos por eventuais más condições laborais, como subdimensionamento da equipe, alta carga de trabalho e desgaste físico e psicológico, que comprometem a saúde do trabalhador e, consequentemente, a qualidade do cuidado prestado(1).
Em relação à satisfação, os resultados apontaram que a maioria dos profissionais pesquisados se mostrou insatisfeita com o estímulo dado pela instituição de trabalho e pouco motivada para continuar no serviço. Esses dados são preocupantes porque a desmotivação para a permanência do trabalhador da enfermagem na instituição e a intenção de abandonar a profissão têm sido tema de pesquisas nacionais e, principalmente, internacionais, que apontam para esta tendência e concluem que a força de trabalho da enfermagem, particularmente aquela composta por jovens, se encontra cada vez mais instável e insatisfeita com as suas condições laborais(14-16).
Um estudo realizado com 3.229 enfermeiros dos 18 maiores hospitais públicos do Rio de Janeiro identificou que metade dos profissionais já tentou deixar a profissão, e cerca de um quarto se dizia insatisfeito com o trabalho(14), corroborando com os dados apresentados neste estudo. De acordo com a literatura(17), fatos desse tipo ocorrem porque a atuação da enfermagem em um sistema de saúde falho, em que não há recursos humanos e materiais suficientes para suprir a demanda e onde as expectativas dificilmente são atendidas, os preceitos de humanização nas relações de trabalho e no cuidado tendem a ser escassos.
No presente estudo, apesar de a maioria dos participantes apontar que não se sentia estimulada para o trabalho, a insatisfação com a valorização do trabalho somente foi demonstrada entre profissionais enfermeiros do HPB e os integrantes da equipe técnica do HP. Esse dado pode significar que o bom relacionamento com os superiores e o reconhecimento pelas chefias das atividades realizadas são fatores importantes para o andamento do serviço; mas ao contrário do que afirma a literatura(16), não são suficientes para estimular e garantir a permanência do trabalhador na instituição.
Na enfermagem, verifica-se que a falta de reconhecimento das competências dos profissionais de nível médio é fonte de conflitos hierárquicos que geram grande sofrimento e diminuição da autoestima desses indivíduos(18), porque seus conhecimentos são questionados e sua experiência profissional é rejeitada por não possuírem nível superior.
Sabe-se que a valorização do mérito dos profissionais de enfermagem se dá, principalmente, por sua atuação, mas também por seu conhecimento técnico-científico(19). Por isso, recomenda-se aos profissionais de nível médio que compõe a equipe de enfermagem o aprimoramento contínuo para que, além de desenvolver as suas competências, se obtenha maior reconhecimento do seu trabalho de modo natural e permanente.
O cuidado em saúde é executado por profissionais que visam à satisfação própria e do usuário. Contudo, a exposição a situações no ambiente de trabalho que geram descontentamento e insatisfação pode resultar em adoecimento e comprometimento da segurança dos pacientes(3). Nessa perspectiva, os serviços de saúde e a própria enfermagem necessitam atentar-se às suas fragilidades e implementar estratégias eficazes de prevenção e de enfrentamento de fatores que debilitam o trabalhador e o cuidado despendido ao usuário(20).
Conforme o exposto, adequações nas condições e nas relações de trabalho da equipe de enfermagem são necessárias e emergentes. Para isso, as propostas/estratégias de melhorias devem ser amplamente discutidas e planejadas para que se atendam às necessidades dos trabalhadores, da instituição e do serviço.
CONCLUSÃO
Nas unidades críticas investigadas, a maioria dos participantes apontou que as condições e as relações de trabalho onde atuam são inadequadas. Apesar disso, alguns aspectos foram considerados satisfatórios, como a segurança para a execução do trabalho, a higiene da unidade, o relacionamento com a chefia imediata e a compatibilidade entre atividades realizadas e o cargo que exerce.
No sentido de fomentar o conhecimento sobre o tema deste estudo, melhorar a qualidade de vida dos profissionais e, principalmente, promover cuidados seguros, sugere-se a realização de estudos com foco nos itens avaliados, utilizando-se de diferentes abordagens e métodos, como aqueles do tipo longitudinal e/ouexperimental, com a intenção de estabelecer, de maneira mais aprofundada, a relação de causa e efeito existente entre relações, condições de trabalho e a satisfação dos profissionais de enfermagem.
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Recebido: 30/01/2016
Revisado: 13/04/2016
Aprovado: 17/04/2016