Objetivo: Avaliar o uso da tecnologia educacional “Painel Integrado Saúde-Ambiente” com graduandos de enfermagem. Método: Trata-se de investigação avaliativa, descritiva, de abordagem qualitativa, realizada por meio da aplicação de questionário com 18 estudantes de enfermagem do campus Rio das Ostras, da Universidade Federal Fluminense, em maio de 2015. Os dados receberam tratamento analítico, que incluiu exploração, organização e síntese interpretativa. Resultados: Os resultados apontam usabilidade da tecnologia e boa capacidade de gerar reflexão, interação e motivação para aprendizagem sobre a dinâmica do processo saúde-doença, resultante de transformações socioambientais no território, e o posicionamento ético-político do enfermeiro frente a estas questões. Discussão: Com a utilização da tecnologia educacional nesse cenário, foi possível implementar uma prática de ensino criativa e estimulante, que envolveu ação-reflexão sobre diversos aspectos da realidade observada, favorecendo a aprendizagem significativa sobre a relação saúde-ambiente no espaço formativo do enfermeiro. Conclusão: Sugerem-se ajustes e validação da tecnologia aludida.
Descritores: Tecnologia Educacional; Saúde Ambiental; Estudantes de Enfermagem.
A literatura sobre a utilização de tecnologias educacionais na área de formação em enfermagem discute sua aplicabilidade em diversas situações, envolvendo docentes, monitores, e graduandos de enfermagem(1).
A tecnologia educacional vem sendo considerada por seus propositores, na área de educação em enfermagem, como um conjunto de dispositivos mediadores do processo de ensino-aprendizagem que devem conter uma organização lógica, de modo que possam ser sistematicamente planejados, observados, compreendidos e transmitidos. Além disso, a tecnologia, enquanto material, também deve ser reconhecida como um componente importante no trabalho educativo, e ser vista como um instrumento facilitador, que, em conjunto com outras estratégias, torne o sistema educacional mais completo em seu planejamento e execução. Assim, uma tecnologia educacional pode ser caracterizada como sendo de processo ou de produto(2).
Contudo, tecnologias educacionais têm sido utilizadas, muitas vezes, sem a devida sistematização e avaliação(1). No cenário brasileiro, sobre o ensino da saúde ambiental na formação do enfermeiro, não foram encontrados estudos que utilizem e avaliem tecnologias educacionais em práticas pedagógicas socioambientais.
A educação ambiental torna-se um importante instrumento de trabalho do enfermeiro frente aos problemas socioambientais contemporâneos e aos seus impactos à saúde pública(3,4). Desse modo, há demandas crescentes de formação do profissional enfermeiro com competências específicas voltadas para a educação, o enfrentamento e o gerenciamento de riscos em saúde ambiental(5).
Nessa linha de pensamento, considera-se que as tecnologias educacionais podem ser utilizadas para conhecimento e reflexão da complexidade dos problemas ambientais antropogênicos, buscando incutir nos educandos uma compreensão ampla e crítica das inter-relações do ambiente com o homem, e seus efeitos à saúde humana(6).
Frente ao exposto, este estudo é relevante no que se refere à contribuição para mudanças nas práticas de ensino que resultem no empoderamento do estudante para atuação na educação e assistência de enfermagem, em consonância com um ideário ecológico, de dignidade, justiça e compromisso social e ético na promoção da saúde. O objetivo deste trabalho é avaliar o uso da tecnologia educacional “Painel Integrado Saúde-Ambiente” com graduandos de enfermagem.
Trata-se de investigação avaliativa, descritiva e de abordagem qualitativa. A avaliação de uma ação ou processo educativo é compreendida como uma metodologia integrada à dinâmica deste processo, que permite a obtenção de informações úteis para julgá-lo. Nesse estudo, a avaliação de uma tecnologia de educação em saúde ambiental foi baseada em uma perspectiva dialógica e dialética(7) , entendendo que a compreensão das dificuldades dos educandos pode provir da percepção e participação dos próprios envolvidos.
A técnica empregada foi o autopreenchimento de questionário elaborado com base no estudo de Sabóia et al(8). Os participantes do estudo foram 18 acadêmicos matriculados em disciplinas do quarto período do curso de graduação em enfermagem do Instituto de Humanidades e Saúde, Campus Rio das Ostras/UFF, que participaram do uso da referida tecnologia no mês de maio de 2015.
A tecnologia “Painel Integrado Saúde-Ambiente” representa uma proposta de metodologia ativa de ensino-aprendizagem sobre a ressonância de transformações socioambientais no processo saúde-doença em um território.
Os passos metodológicos da aplicação da tecnologia estão descritos a seguir.
No primeiro momento, os participantes visitaram um território que tem vivenciado profundas transformações e conflitos socioambientais, além da ampliação dos riscos à saúde das comunidades, decorrentes do processo de construção do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ)(9). Esse cenário foi o município de Itaboraí, uma das áreas pobres da região metropolitana do estado do Rio de Janeiro, com índice de desenvolvimento humano de 0,693(9).
Em um segundo momento, a contextualização da realidade foi retratada em ambiente de sala de aula pelos participantes e pesquisadores. Para tanto, a tecnologia educacional foi desenvolvida a partir da construção de um painel integrado com fotos e descrições das situações-problema encontradas durante a visita realizada com os estudantes em áreas do entorno ao COMPERJ, para que os participantes pudessem relacioná-las aos impactos ambientais e à saúde observados em campo.
No final do encontro, os participantes concordaram em participar da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e preencheram o questionário de avaliação da tecnologia, que continha as seguintes questões: entre muito bom, bom, regular, ruim e sem opinião, qual conceito você daria para a tecnologia educacional? A tecnologia favoreceu reflexão? Os assuntos abordados foram de seu interesse? Você se sentiu à vontade durante o grupo? Você indicaria outros colegas para participar do mesmo tipo de tecnologia educacional? O que você mais gostou na atividade? O que você menos gostou na atividade? Sugestões.
Para análise dos dados coletados, foi adotada a estratégia analítica de interpretação(10), cumprindo-se as etapas de: leitura compreensiva do material; organização dos dados, seguindo a lógica de agrupamento por questões do instrumento; identificação de particularidades do material; e elaboração de síntese interpretativa.
O projeto de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Antônio Pedro da UFF sob o parecer nº 1.585.527.
A amostra de sujeitos foi composta por 18 graduandos de enfermagem com idades compreendidas entre 19 a 38 anos, sendo 16 do sexo feminino, e dois do sexo masculino.
A tecnologia foi bem avaliada pelos estudantes, uma vez que 13 participantes atribuíram o conceito “bom” e cinco atribuíram o conceito “regular”. Algumas limitações identificadas pelos estudantes se referem à distância percorrida, ao veículo da universidade, e à restrição às vias de acesso ao local de construção do empreendimento durante a realização da visita em campo.
Entre os aspectos positivos apontados por todos os estudantes sobre a usabilidade da tecnologia educacional incluem-se: a relevância da tecnologia ao estimular o interesse, a reflexão e a participação discente de forma descontraída, permitindo o aproveitamento de conhecimentos prévios e o esclarecimento de dúvidas dos discentes; a abertura de espaço para a apreensão de novos conhecimentos acerca da temática socioambiental abordada; a indicação a outros colegas para participação da tecnologia; e a sugestão de reproduzí-la em outros momentos da formação acadêmica do enfermeiro.
Os dados evidenciaram que o Painel Integrado Saúde-Ambiente propiciou a expressão dos educandos, nos seus próprios termos, de pontos de vista, crenças, atitudes e representações, bem como trocas de ideias, valores e experiências, baseadas na observação em campo, fotos e interação entre seus participantes.
No que tange à reflexão sobre os conteúdos abordados, 16 acadêmicos afirmaram que a tecnologia foi capaz de promover reflexão, considerando-a interativa e bem elaborada em seu método de ensino, pois foi capaz de estimular a autonomia e motivar a aprendizagem de alguns conteúdos específicos e outros transversais às diversas disciplinas da matriz curricular do curso em questão, tais como o posicionamento ético-político do enfermeiro e a participação social em espaços deliberativos sobre saúde e ambiente.
O caráter dinâmico e criativo da tecnologia “Painel Integrado Saúde-Ambiente” estimulou a participação dos jovens estudantes de forma intensa, descontraída e interativa nas etapas de ação-reflexão sobre diversos aspectos da realidade observada, o que favoreceu trocas de conhecimentos sobre a relação saúde-ambiente.
No âmbito dos cenários formativos do enfermeiro, a característica de promoção da participação ativa discente é percebida como essencial à prática pedagógica problematizadora, uma vez que propicia a interlocução, a aprendizagem significativa e a autonomização do aluno(11).
Os dados evidenciam, também, que o uso do Painel Integrado Saúde-Ambiente viabilizou a aproximação da teoria à prática a partir da problematização de situações socioambientais e de saúde cotidianas do trabalho do enfermeiro, que exigem, deste profissional, competências gerenciais e assistenciais para o cuidar sob o novo paradigma ecossistêmico em saúde(9).
Problemas atuais da realidade vivenciada pelos estudantes podem ser utilizados como elementos constitutivos de estratégias pedagógicas inovadoras, otimizando o processo ensino-aprendizagem sobre saúde ambiental na formação do enfermeiro(5).
Desponta-se neste estudo, a metodologia ativa da problematização, fundamentada pelo referencial teórico-filosófico de Paulo Freire, como prática pedagógica promissora em saúde ambiental, face às dificuldades e lacunas apontadas em outros estudos para superação de uma abordagem socioambiental fragmentada, reducionista, dicotômica e descontínua nos currículos de graduação em enfermagem no Brasil(4,12).
Nesse sentido, a tecnologia incentivou o aluno a refletir sobre a problemática ambiental local e sua associação com os riscos à saúde e, ademais, facilitou o aprofundamento das discussões sobre o posicionamento ético-político da população e do enfermeiro como pressuposto indispensável para a mudança destes problemas, pois foi identificado forte interesse dos discentes em compartilhar e discutir valores sociais e ambientais.
Desse modo, o processo educativo colaborou no desenvolvimento de competências profissionais fundadas no exercício crescente da autonomia, cidadania e compromisso social(13).
Um estudo(14) identificou que estudantes da área da saúde não perceberam que é responsabilidade do profissional da saúde a busca por ambientes saudáveis, urgindo a discussão sobre este tópico em espaços formativos destes profissionais.
No ensejo de uma educação ambiental que mude atitudes e comportamentos, devemos ampliar os espaços acadêmicos para o interior das comunidades e buscar práticas pedagógicas que possam estimular nos alunos a compreensão de como os diferentes grupos e classes sociais produzem, organizam e transformam os ambientes de vida, de acordo com seus interesses, posições e relações de poder(15).
Depreende-se que o entendimento pelo estudante da organização sociopolítica dos indivíduos e grupos populacionais, e como estes enfrentam as situações complexas socioambientais nos territórios, são premissas para a discussão de valores e o compromisso ético e social do enfermeiro relacionados à promoção da saúde e à sustentabilidade da vida(5).
Conclui-se que foram atingidos os objetivos precípuos da tecnologia “Painel Integrado Saúde-Ambiente”, uma vez que os resultados apontam avaliação positiva do processo educacional, usabilidade e boa capacidade de gerar reflexão, autonomização e motivação do graduando de enfermagem para a aprendizagem sobre problemas socioambientais e de saúde, competências e valores éticos do enfermeiro para o cuidado ecológico e cuidado em saúde.
Todavia, identificou-se que a tecnologia necessita de ajustes na primeira etapa de explanação ao público-alvo sobre todas as fases do processo, contemplando objetivos, dúvidas e expectativas da visita de campo, inclusive sobre a logística desta atividade.
Assim, considerando as limitações desta investigação avaliativa em termos de desenvolvimento de um processo metodológico experimental para educação em saúde ambiental com graduandos de enfermagem e das técnicas de levantamento e de análise de dados, sugere-se a validação da tecnologia em questão, vislumbrando a reprodutibilidade deste recurso nas práticas de ensino teórico-prático sobre a relação saúde-ambiente em cenários formativos do enfermeiro.
Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir, de acordo com as recomendações do International Committe of Medical Journal Editors (ICMJE, 2013): (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida. Todos os autores declaram para os devidos fins que são de suas responsabilidades o conteúdo relacionado a todos os aspectos do manuscrito submetido ao OBJN. Garantem que as questões relacionadas com a exatidão ou integridade de qualquer parte do artigo foram devidamente investigadas e resolvidas. Eximindo, portanto o OBJN de qualquer participação solidária em eventuais imbróglios sobre a materia em apreço. Todos os autores declaram que não possuem conflito de interesses, seja de ordem financeira ou de relacionamento, que influencie a redação e/ou interpretação dos achados. Essa declaração foi assinada digitalmente por todos os autores conforme recomendação do ICMJE, cujo modelo está disponível em http://www.objnursing.uff.br/normas/DUDE_final_13-06-2013.pdf
Recebido: 04/12/2015 Revisado: 04/08/2016 Aprovado: 15/08/2016