EDITORIAL

 

Jogo dos sete erros no processo de submissão de artigos científicos (Parte 6): conversações entre Fausto e Mefistófeles

 

Eny Dorea Paiva1

1Universidade Federal Fluminense

 


RESUMO
Esse editorial propõe uma reflexão sobre a tecnologia da informação no que tange à inclusão digital e ao processo de submissão de artigos científicos. No que tange a publicação de artigos científicos, a tendência é que as revistas deixem de ser impressas para serem eletrônicas, não apenas pelas questões ecológicas, mas pelo avanço da tecnologia em si. Muitos autores, durante o processo de submissão de seus manuscritos, deparam-se com dificuldades no manejo das plataformas dessas revistas. No intuito de reduzi-las, parte das revistas elabora tutoriais de orientação, contudo, nem sempre utilizados ou mal compreendidos. Não obstante, terceirizar o manuseio tecnológico digital como égide e impermeabilidade a necessidade imperativa de incluir-se digitalmente constitui-se ato temerário e anacrônico. Cabe aos periódicos parcela importante nesse processo de educação digital como forma de salvaguardar seu bem mais precioso que são os produtores de conhecimento.
Descritores: Qualidade em Publicação; Acesso à Informação; Enfermagem Baseada em Evidências.


 

Primeiro Ato - Reza uma lenda popular alemã, escrita no século XV, a existência de um pacto firmado entre o médico Fausto e o demônio Mefistófeles (inimigo da luz). Dr. Fausto, desiludido com o conhecimento de seu tempo, fez um acordo com Mefistófeles quando se estabeleceu que ele viveria por vinte e quatro anos sem envelhecer e, nesse ínterim, o diabo serviria a Fausto, provendo-o de energia satânica insufladora da paixão pela técnica e pelo progresso.

Nos últimos anos, os avanços nas áreas de informática e telecomunicações influenciaram a natureza e a velocidade do processo de disseminação das tecnologias da informação e das comunicações, resultando em significativas mudanças que envolvem não apenas a dimensão tecnológica, mas também aspectos socioculturais, políticos e institucionais das sociedades como um todo. Esse contexto favorece a disseminação de informações entre fronteiras que vão gradativamente desaparecendo, resultando numa sociedade mundial integrada. E, isto, numa economia globalizada, significa milhões de usuários conectados a dispositivos móveis, internet e redes sociais(1). Dados de 2015 apontam que o total de acessos por banda larga móvel no Brasil supera os 181 milhões(2), correspondente a uma alta parcela da população brasileira, projetada em 204 milhões de habitantes, em 30 de setembro de 2015(3).

Nessa conjuntura, a tecnologia da informação pode ser definida como o conjunto de todas as atividades e soluções providas por recursos de computação que visam permitir a produção, armazenamento, transmissão, acesso, segurança e o uso das informações(4). Engendrada a partir desse quadro de transformações, emerge a sociedade da informação, que em graus diferenciados atinge a todos os países e regiões do mundo; e inaugura um padrão de acumulação capitalista distinto: um novo paradigma tecnoeconômico, baseado no uso crescente da informação, do conhecimento e das inovações tecnológicas como vetores essenciais do desenvolvimento social e econômico(5).

A ideia de que indivíduos e nações que não utilizam eficazmente as tecnologias da informação serão “deixados para trás” avança como argumento, para justificar a necessidade de proporcionar meios de acesso como estratégia de persuasão daqueles supostamente menos conscientes da centralidade da tecnologia.


Segundo Ato – Em contrapartida, Fausto hipotecou sua alma a Mefistófeles que, ao término dos 24 anos, ora putativo, poderia, enfim, levá-la ao inferno.

 

Nesse contexto, esse editorial propõe uma reflexão sobre a tecnologia da informação no que tange à inclusão digital e ao processo de submissão de artigos científicos. A inclusão digital corresponde à disseminação do acesso aos recursos da tecnologia da informação, possibilitando a inserção de inúmeras pessoas na sociedade da informação. Portanto, não se trata apenas do simples acesso às tecnologias de comunicação e informação, mas também das estratégias de motivação e capacidade de uso consciente e inovador dos recursos tecnológicos(6).

A demanda pelo domínio digital reveste-se numa preocupação pública que atinge o nível de ministério, com a Secretaria de Inclusão Digital do Ministério das Comunicações do Brasil, criada em 2011, que tem como principal atribuição a formulação, execução e articulação de políticas públicas relativas à inclusão digital no âmbito do Governo Federal(7).

Tópicos como inclusão digital e sua relação com educação, conteúdos e recursos humanos são prioridades que precisam ser consideradas. Autores afirmam que essas preocupações não foram superadas, devendo figurar juntas na política de informação que visa à participação inclusiva digital, tanto no conceito histórico de cidadania plena, quanto no inédito conceito de coesão social(8).

Em relação à publicação de artigos científicos, a tendência é que as revistas deixem de ser impressas para serem eletrônicas, não apenas pelas questões ecológicas, mas pelo avanço da tecnologia em si. Constata-se, nos dias atuais, que muitos autores, durante o processo de submissão de seus manuscritos, deparam-se com dificuldades no manejo das plataformas dessas revistas. E, no intuito de reduzi-las, parte das revistas elabora tutoriais de orientação. Porém, na prática, as limitações durante o processo de submissão ainda são perceptíveis, quer seja pela não utilização dos tutoriais ou mesmo pelo não entendimento dos passos descritos nos mesmos.

Não obstante, terceirizar o manuseio tecnológico digital como égide e impermeabilidade da necessidade imperativa de incluir-se digitalmente constitui-se ato temerário e anacrônico, comparável ao pacto de Fausto.

Apesar de autores relatarem que é importante reconhecer o direito à opção pela não utilização das tecnologias de informações(5), não é mais plausível a não utilização dessas tecnologias no processo de submissão de artigos científicos.

A sociedade precisa estar atenta a formação dos indivíduos, auxiliando-os no desenvolvimento de suas capacidades com o intuito de prepará-los para participarem ativamente da vida moderna(9).
Sendo assim, o avanço da tecnologia e a inclusão na era digital trazem facilidades para os profissionais/autores na publicação de resultados de suas pesquisas, fomentando a comunidade e conhecimento científicos. A tecnologia da informação auxilia e ajuda a criar, divulgar saberes e constatações acadêmicas bem como possibilita a enfermagem a solidificar seu saber.

Terceiro Ato – No decurso e regozijo de poder sem limite auferido pelo pacto, Fausto encontra seu verdadeiro amor, Margarida, a quem tenta renegociar a salvação, no entanto, implacável foi o destino a que se comprometera.

Conclui-se, portanto, que mais prudente do que pactuar com Mefistófeles é inteirar-se do irrevogável e irreversível universo digital que nos cerca. Naturalmente, cabe aos periódicos parcela importante nesse processo de educação digital como forma de salvaguardar seu bem mais precioso que são os produtores de conhecimento.

 

REFERÊNCIAS

1. Finardi KR,  Porcino MC. Tecnologia e metodologia no ensino de inglês: impactos da globalização e da internacionalização. Ilha Desterro [ online ]. 2014  [ cited  2015 Sept 28 ] 66: 239-283. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-80262014000100239&lng=en&nrm=iso>. ISSN 2175-8026. DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-8026.2014n66p239

2. Ministério das Comunicações (Brasil). Resumo de indicadores comunicações. [ homepage ] [ cited 2015 Sept 28 ]. Available from: http://www.mc.gov.br/formularios-e-requerimentos/doc_download/2373-dados-de-bolso

3. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [ homepage ] [ cited 25 Sept 2015 ]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/

4. Ministério do Trabalho (Brasil). Era da tecnologia da informação. Revista Eletrônica – Coordenação Geral de Informática – MTE [ internet ]. 2014 [ cited2015 Sept 24 ] 1(1). Available from: http://revistaeletronica.mte.gov.br/ojs/index.php/erati/index

5. Araújo EN, Rocha E. Trajetória da sociedade da informação no Brasil: proposta de mensuração por meio de um indicador sintético. Ci. Inf. 2009 Sept/Dec; 38(3):9-20.

6. Carvalho LA. Inclusão digital no Brasil. Revista eletrônica – MTE [ internet ] 2014 [cited 2015 Sept 27] 1(1). Available from: http://revistaeletronica.mte.gov.br/ojs/index.php/erati/article/view/8

7. Ministério das Comunicações (Brasil). Estrutura - Secretaria de Inclusão Digital (SID). [ homepage ]. [ cited 2015 Sept 24 ]. Available from: http://www.mc.gov.br/estrutura-institucional/142-institucional/secretaria-de-inclusao-digital/32325-secretaria-de-inclusao-digital-sid

8. Neves, BC. Políticas de informação, as tecnologias de informação e comunicação e a participação no âmbito da sociedade da informação: enfoque na inclusão digital do global ao local. TransInformação. 2010 Jan/Apr; 22(1):47-60.

9. Araújo DAC, Slavez MHC, Valadão RS. Cursos de formação de professores e a nova demanda educacional nascida na era digital. Revista InterAtividade [ internet ] 2013 [ cited 2015 Sept 24 ]1(2). Available from: http://www.firb.br/editora/index.php/interatividade/article/view/58/97

 

 

REFERÊNCIA DE IMAGEM:

Retzsch. Johann Faust.[ ilustração ]. [ s.l. ] 2006. Available from: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Johann_Faust_by_Retzsch.jpg

 

 

Recebido: 10/09/2015
Revisado: 22/09/2015
Aprovado: 24/09/2015