ARTIGOS ORIGINAIS

 

Análise espacial dos nascimentos em um município de pequeno porte: estudo observacional

 

Eneida Patrícia Teixeira Stephan1, Luciane Peter Grillo1, Elisete Navas Sanches Próspero1, Rita de Cássia Teixeira Rangel1

1Universidade do Vale do Itajaí

 


RESUMO
Objetivo: avaliar as condições de nascimento de recém-nascidos, de mães residentes no município de Balneário Piçarras/SC.
Método: estudo exploratório ecológico de análise quantitativa, no qual o banco de dados utilizado foi o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos. A população foi composta pelo conjunto de declarações de nascidos vivos no período de 2008 a 2011.
Resultados: os nascimentos se caracterizam por recém-nascidos de mães com idade de 20 a 34 anos, solteiras, com oito ou mais anos de escolaridade, acompanhamento pré-natal com sete ou mais consultas; predominância de partos vaginais, a termo; recém-nascidos do sexo masculino, com peso adequado. A análise espacial dos indicadores revela que os riscos associam-se à dificuldade de acesso aos serviços de saúde nas localidades rurais e a condições socioeconômicas desfavoráveis na área urbana.
Descritores: Peso ao Nascer; Declaração de Nascimento; Análise Espacial.


 

INTRODUÇÃO

Os serviços de saúde destacam o baixo peso ao nascer (peso inferior a 2500g) e a prematuridade como principais focos de ação, destinando-lhes cuidados diferenciados e de acompanhamento, em decorrência de problemas como a elevada morbimortalidade e o maior risco de atraso de crescimento e desenvolvimento nesses casos, que configuram grupos vulneráveis ao impacto de condições ambientais e sociais(1). O peso ao nascer, presente em estudos desde a década de 1950, destaca-se entre os indicadores de saúde. A Organização Mundial de Saúde (OMS) o reconhece como elemento mais importante associado à chance de sobrevida, de crescimento e desenvolvimento normal do recém-nascido e um dos indicadores mais utilizados para determinar as condições de saúde e nutrição da população, refletindo sua qualidade de vida. Alcançar o potencial normal de crescimento intrauterino é fundamental, pois o seu déficit é o principal fator de risco no aumento dos índices de mortalidade infantil, devido à vulnerabilidade nos primeiros meses de vida(2).

A duração da gestação é importante para o crescimento intrauterino e reflete na sobrevida do recém-nascido. A diminuição do período gestacional levará a um nascimento pré-termo e ao risco de imaturidade dos órgãos - uma preocupação da perinatologia, dadas as elevadas taxas de morbimortalidade neonatal ligadas à prematuridade. Estima-se que 75% das mortes neonatais associem-se ao parto pré-termo ou às complicações destes recém-nascidos(2,3).

O Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) tem sido utilizado para descrever populações de nascidos vivos em municípios e regiões brasileiras, apresentando cobertura nacional de 92%(4). É um sistema de informação nacional gerido pelo Departamento de Análise de Situação de Saúde, da Secretaria de Vigilância em Saúde em conjunto com as secretarias estaduais e municipais. Implantado em todas as unidades federativas desde 1990, reúne informações epidemiológicas sobre nascimentos no território nacional. Tem como instrumento de coleta de dados a Declaração de Nascidos Vivos (DNV), documento individualizado e padronizado com cerca de 30 variáveis(5,6).

Nesse sentido, o georreferenciamento constitui ferramenta de análise e avaliação de riscos à saúde coletiva relacionada ao meio ambiente e ao perfil socioeconômico da população. As tecnologias de análise de dados vêm sendo cada vez mais utilizadas, trazendo novos subsídios para o planejamento e avaliação das ações baseadas na análise da distribuição espacial das doenças e na localização dos serviços e nos riscos ambientais, entre outros aspectos do território e da população(6,7).

O presente estudo é resultante de uma parceria entre a Secretaria de Saúde de Balneário Piçarras (SC) e o Programa de Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho da Universidade do Vale do Itajaí, significando importante relação da academia com os serviços públicos de saúde. Seu objetivo: avaliar as condições de nascimento de recém-nascidos, de mães residentes no município, entre 2008 e 2011, a partir da análise das informações do SINASC, por meio dos indicadores baixo peso ao nascer, sobrepeso ao nascer e prematuridade.

 

MÉTODOS

Trata-se de um estudo exploratório ecológico de análise quantitativa em Balneário Piçarras, Foz do Vale do Itajaí, litoral norte de Santa Catarina, município com 17.552 habitantes; população feminina de 8.795 - 4.641 em idade fértil (15 a 49 anos), e menores de 1 ano, 280 (136 masculinos e 144 femininos).

Geograficamente, o município divide-se em seis bairros na zona urbana (Centro, Itacolomi, Santo Antônio, Bela Vista, Nossa Senhora da Conceição e Nossa Senhora da Paz) e sete localidades na zona rural (Morro Alto, Morretes, Lagoa, Medeirinhos, Nova Descoberta, São Braz e Rio Novo). Enquadra-se nos 75% dos municípios brasileiros com menos de 25 mil habitantes. Por ser de pequeno porte, não dispõe de avaliação socioeconômica nos censos demográficos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Utilizou-se moradia e saneamento, indicadores indiretos, para avaliação das condições sociais e de saúde, conforme Monteiro & Nazário(8). Esses dados encontram-se no Sistema de Informação da Atenção Básica. O município apresenta 100% de cobertura de Estratégia de Saúde da Família.

Na área urbana, os bairros Centro e Santo Antônio são os mais antigos do município, compostos de famílias antigas e tradicionais. O bairro Nossa Senhora da Conceição ampliou-se na década de 1970 com migrantes de Minas Gerais e Paraná. São dotados de abastecimento de água (rede pública, 92%); coleta de lixo (coleta pública, 99%); esgoto (sistema de esgoto, 29%; fossa séptica, 69%), e moradias na maioria de alvenaria (69%). A população é atendida por três Unidades Básicas de Saúde (UBS): Centro; Santo Antônio e Nossa Senhora da Conceição.

Nossa Senhora da Paz, Bela Vista e Itacolomi destacam-se pelo número de migrantes do oeste de Santa Catarina e Paraná, respondendo por todos os habitantes de favela. Apesar disso, e por se localizarem próximos ao centro do município, presentam alta densidade populacional e são dotados de abastecimento de água (rede pública, 97,29%); coleta de lixo (pública, 99,30%); esgoto (sistema,57,67%; fossa séptica, 40,85%; vala, 1,47%). As moradias são em alvenaria (71,5%) e madeira (27,5%). A população é atendida por duas UBS: Nossa Senhora da Paz (duas equipes); Bela Vista (Bela Vista e Itacolomi).

Nas localidades rurais a população descende de italianos e alemães, agricultores dedicados ao plantio de banana e arroz, sujeitos aos riscos ambientais por inadequados processos de cultivo (agrotóxicos indiscriminados). De baixa densidade populacional, registram carência de infraestrutura: abastecimento de água (rede pública, 3,04%; poço ou nascente, 96,96%); coleta de lixo (pública, 46,01%; queimado/enterrado, 49,05%); esgoto (sistema, 1,52%; fossa séptica,83,65%; vala, 14,83%). Moradias de alvenaria, 41,44%; madeira e casas mistas, 57,79%. A população é atendida por uma UBS - Morro Alto (Morretes, Medeirinhos, São Braz, Nova Descoberta e Rio Novo). Lagoa recebe atendimento da UBS Nossa Senhora da Conceição devido à localização geográfica.

A população do estudo foi composta por 983 DNV de Balneário Piçarras, de 2008 a 2011, período solicitado pela Gestão Municipal de Saúde para avaliação dos indicadores. Os dados foram coletados na Secretaria Municipal de Saúde, na base de dados e nos relatórios do SINASC, disponibilizados pela Gerência Regional de Saúde, em outubro de 2012. O município não alimenta a base de dados do SINASC visto que não apresenta maternidade em seu território, porém realiza retroalimentação das DNV de mães residentes neste município.

Os dados foram trabalhados em planilhas do Excel, foram excluídos 10 casos por ausência do endereço ou informação de endereço não correspondente ao município, portanto, foram incluídas 973 DNV.

Variáveis utilizadas
Do recém-nascido: Peso ao nascer - em gramas. Categorias: Baixo Peso entre 1.500 e 2.499 g; Peso Insuficiente entre 2.500 e 2.999g; Peso Adequado entre 3.000 e 3.999g; e Sobrepeso ≥4.000g. Idade Gestacional - duração da gestação em semanas, no momento do parto. Categorias: Pré-termo (≤ 36 semanas de gestação); A Termo (37 a 41 semanas); Pós-termo (≥ 42 semanas). Geográfica: corresponde ao local de residência. Calculadas as prevalências de baixo peso e sobrepeso ao nascer e de prematuridade para cada local do município, conforme fórmula:

Prevalência= nº de nascimentos de baixo peso; sobrepeso; e pré-termo de B. Piçarras, 2008-2011x100
nº de nascimentos B. Piçarras 2008-2011

Os mapas temáticos consideraram os percentis (trigésimo terceiro e sexagésimo sexto) de cada um dos indicadores. Aos valores menores que o trigésimo terceiro percentil, atribuiu-se risco baixo (verde); intermediários, risco moderado (amarelo) e aos superiores ao sexagésimo sexto, alto risco (vermelho). Um padrão cartográfico foi aplicado para todos os mapas. Os resultados das análises estatísticas, nomeadamente os percentis calculados, foram associados à base vetorial e cada zona recebeu valor correspondente. Esses valores, denominados atributos dos vetores, permitem a representação dos dados em associação com cores, sobreposição de gráficos, densidade de pontos etc.

Para o desenvolvimento do georreferenciamento dos diferenciais intraurbanos, utilizou-se como unidade de análise o município de Balneário Piçarras. A análise espacial envolveu elaboração da base cartográfica em escala 1:50.000 em Sistema de Informações Geográficas (SIG), com divisão municipal (Cartas Topográficas do IBGE); a plataforma SIG adotada foi o ArcGis®versão 9.3. Isso permitiu mapear as prevalências de peso e idade gestacional associadas aos 13 bairros e localidades de Balneário Piçarras; preparação da base cartográfica com dados do censo do IBGE; entrada dos dados da classificação do peso ao nascer e idade gestacional em planilhas com a geoinformação; geração de cartas temáticas dos indicadores.

O projeto foi aprovado na Comissão de Ética em Pesquisa da UNIVALI sob protocolo nº 115.220 de 28/09/12.

 

RESULTADOS

A maioria dos nascimentos em Balneário Piçarras ocorreu na zona urbana - 90,44%. Somente 9,55% na zona rural.

Os dados da Tabela 1referem-se às 973 DNV registradas no SINASC no período de 2008 a 2011, em relação às seguintes variáveis: maternas (idade materna, situação conjugal, escolaridade), de assistência (número de consultas pré-natal, tipo de parto) e do recém-nascido (idade gestacional, sexo do recém-nascido, peso ao nascer).

Observa-se que a média de idade das mães foi de 25,82 anos ± 6,54 anos, com maior concentração na faixa etária de 20 a 34 anos de idade (68,13%), solteiras (56,83%) e o grau de escolaridade predominante foi de oito anos de estudo (69,06%). Quanto às variáveis de assistência ao pré-natal e parto, evidenciou-se uma boa cobertura pré-natal (sete ou mais consultas, 81,80%). Quanto ao parto, houve prevalência maior de partos vaginais (53,64%). Em relação às variáveis do recém-nascido, 93,01% nasceram com idade gestacional a termo, período considerado adequado para os nascimentos, com predominância do sexo masculino (51,90%). Quanto ao peso ao nascer, 65,5% apresentaram peso adequado; 6,1%, baixo peso e 7,2%, sobrepeso.

Tabela 1: Distribuição da população segundo as características maternas e do recém-nascido, no período de 2008 - 2011, Balneário Piçarras, 2012.
Variáveis N % Média Desvio Padrão Mediana
Maternas
- Idade Materna: 25,82 6,54 25
≤ 19 anos 196 20,14
20 – 34 anos 663 68,13
> 35 anos 114 11,71
- Situação conjugal:
Solteira 553 56,83
Casada 379 38,95
Viúva 5 0,51
Separada 14 1,43
União consensual 22 2,26
-Escolaridade:
Nenhuma 2 0,2
1 – 3 anos 25 2,56
4 – 7 anos 272 27,95
8 – 11 anos 502 51,59
> 12 anos 170 17,47
Ignorado 2 0,2
De Assistência
- Número de consultas pré-natal:
Nenhuma 9 0,92
1 – 3 consultas 27 2,77
4 – 6 consultas 138 14,18
7 ou mais consultas 796 81,8
Ignorado 3 0,3
- Tipo de parto:
Vaginal 522 53,64
Cesáreo 451 46,35
Do Recém-nascido
- Idade gestacional:
Pré-termo 61 6,26
A termo 905 93,01
Pós-termo 7 0,71
- Sexo do Recém-nascido:
Feminino 468 48,09
Masculino 505 51,9
- Peso ao nascer: 3271,02 541,13 3300
Muito Baixo Peso 8 0,82
Baixo Peso 59 6,1
Peso Insuficiente 199 20,5
Peso Adequado 637 65,5
Sobrepeso 70 7,2      
Fonte: Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), Secretaria Municipal de Saúde de Balneário Piçarras, 2012.


Na Tabela 2 podem-se observar os nascimentos distribuídos por bairros de acordo com as prevalências de peso ao nascer e idade gestacional: baixo peso (BP), peso insuficiente (PI), peso adequado (PA), sobrepeso (SP), pré-termo, a termo e pós-termo. Observa-se que a maior prevalência de baixo peso, com valores acima da prevalência do município (6,10%), ocorreu na localidade de São Braz (13,3%). Em relação ao peso insuficiente, a prevalência foi maior na localidade de Lagoa (28,57%). Com relação ao peso adequado para nascimento, o bairro com maioria foi Nova Descoberta (87,50%). Quanto à prevalência de sobrepeso (7,20%), chama atenção esta ser superior à prevalência de baixo peso (6,10%). O bairro com maior prevalência para sobrepeso foi Medeirinhos (33,33%). Quanto à idade gestacional, as maiores prevalências foram: pré-termo: São Braz (13,33%); a termo: Lagoa, Morro Alto e Nova Descoberta (100,00%) e pós-termo: Medeirinhos (11,11%).


Tabela 2: Distribuição das prevalências de Peso ao Nascer e Idade Gestacional por bairros no período de 2008 - 2011, Balneário Piçarras, 2012.
Bairros Peso ao Nascer Idade Gestacional
BP PI PA SP Pré-termo A termo Pós-termo
Balneário Piçarras 59 199 637 70 60 906 7
6,1 20,5 65,5 7,2 6,16 93,11 0,71
Bela Vista 4 8 30 3 1 45 0
8,69 17,39 65,21 6,52 2,17 97,82 0
Centro 10 50 139 12 14 196 3
4,69 23,47 65,25 5,63 6,57 92,01 1,4
Itacolomi 6 20 66 12 7 96 2
5,71 19,04 62,85 11,42 6,66 91,42 1,9
Lagoa 0 6 12 3 0 21 0
0 28,57 57,14 14,28 0 100 0
Medeirinhos 0 0 6 3 0 8 1
0 0 66,66 33,33 0 88,88 11,11
Morretes 2 5 19 1 1 26 0
7,4 18,51 70,37 3,7 3,7 96,29 0
Morro Alto 0 2 6 0 0 8 0
0 25 75 0 0 100 0
Nossa Senhora da Conceição 3 12 53 6 2 73 0
4,05 16 70,62 8 2,66 97,33 0
Nossa Senhora da Paz 24 57 183 23 25 265 0
8,27 19,65 63,1 7,93 8,62 91,37 0
Nova Descoberta 0 1 7 0 0 8 0
0 12,5 87,5 0 0 100 0
Rio Novo 0 1 4 0 0 5 0
0 20 80 0 0 100 0
Santo Antônio 8 34 102 7 8 142 1
5,29 22,51 67,54 4,63 5,29 94,03 0,66
São Braz 2 3 10 0 2 13 0
13,33 20 66,66 0 13,33 86,66 0
Fonte: Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), Secretaria Municipal de Saúde de Balneário Piçarras, 2012.


Na Figura 1, verifica-se que São Braz, Bela Vista e Nossa Senhora da Paz são os locais de maior risco para nascimentos com baixo peso, e as prevalências variaram de 8,80 a 13,30, em vermelho. No entanto, todos os bairros da zona urbana e os bairros limítrofes da zona rural apresentaram risco médio variando de 0,00001 a 8,80, em amarelo.


 
 


Na Figura 2, nota-se que houve maior risco no bairro Medeirinhos para nascimentos com sobrepeso, com uma variação das prevalências entre 14,20 a 33,40, em vermelho.


 
 


Na Figura 3, é possível observar que São Braz é isoladamente o local com maior risco para nascimentos pré-termo, com as prevalências variando entre 8,90 e 13,40, em vermelho.


 
 

 

DISCUSSÃO

Os resultados da presente pesquisa permitem a análise dos nascimentos em Balneário Piçarras no período de 2008 a 2011, município de pequeno porte com características singulares a muitos municípios do Brasil no que se refere à infraestrutura e disponibilização de recursos destinados ao setor da saúde.

Com relação à idade materna, os achados são semelhantes aos de outros estudos, com uma concentração na faixa etária de 20 a 34 anos (68,13%) e maioria um tanto elevada para mães adolescentes (20,14%).  Um estudo realizado em Goiânia/ GO(9) encontrou 68,55% e 25,86%, respectivamente. Em Foz do Iguaçu/PR(10) registraram-se variações de 66,97 a 71,38%, seguidas dos nascimentos entre adolescentes com uma variação de 19,21 a 24,55%, com taxas mais elevadas de mães adolescentes em Guarapuava/ PR (34%)(3).

Uma análise realizada em maternidades de Aracaju/SE revelou que as mães adolescentes apresentaram piores condições socioeconômicas, reprodutivas e resultados perinatais mais adversos se comparadas a outros grupos com idades distintas. A proporção de baixo peso ao nascer e prematuridade foi duas vezes maior entre adolescentes menores de 18 anos do que entre mães de outras faixas etárias. Os autores apontam que a gravidez na adolescência é ainda associada a desfechos desfavoráveis da gestação devido à vulnerabilidade social, visto que só foram observados em adolescentes sem um parceiro(11).

Chama atenção, também, o percentual de mães com idade maior que 35 anos (11,71%), superior ao encontrado em outro estudo: 4,62% (Goiânia/GO)(9), no entanto semelhante de Niterói/RJ:11,8% (2000) e 14,3% (2009)(5).

Quanto à cobertura pré-natal, sete ou mais consultas (81,80%), os achados foram superiores aos encontrados em outros estudos: uma variação de 26,60 a 66,46% em Foz do Iguaçu/PR(10); 53,28% em Goiânia/GO(9); 70% Vale do Paraíba/SP(6). De acordo com a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde PNDS – 2006(13), as regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste foram as que apresentaram melhor situação quanto à assistência pré-natal, com percentuais de 88,2, 87,5 e 83,7%, respectivamente.

A elevada taxa de parto cesáreo ora encontrada (46,35%) também foi identificada em outros estudos: 56,3% Vale do Paraíba/SP(6); uma variação de 33,84 a 49,94% em Foz do Iguaçu/PR(10). Embora existam evidências de associação entre os partos cesáreos e a morbimortalidade materna, não se detectam sinais de redução das tendências atuais de aumento dessas cirurgias(4).

A vigilância do peso ao nascer é fundamental por dois motivos: primeiro por estar intrinsecamente relacionada com as condições de saúde e nutrição da gestante, a duração da gestação e o crescimento fetal.  Segundo, por representar o fator isolado mais importante para avaliação da sobrevivência, do crescimento e desenvolvimento infantil. A redução na incidência de recém-nascidos com baixo peso seria um dos indicadores de progresso de um país ou região; sendo assim, tal redução se refletirá na queda da morbidade e mortalidade infantil e terá repercussões econômicas, políticas e sanitárias(2).

No município de Balneário Piçarras, as prevalências de peso ao nascer (6,10%), apresentam distribuição semelhante para baixo peso ao nascer encontradas no Brasil (6,1%), na capital do Estado, Florianópolis (6,68%) e Região da Foz do Rio Itajaí Açu (6,29%); e menor que o da Região Sul (8,71%) e Santa Catarina (7,99%)(12).

Chama atenção que a prevalência de sobrepeso (7,20%) foi superior à de baixo peso ao nascer (6,10%), superior ao encontrado na Região da Foz do Rio Itajaí Açu (5,87%) e em Florianópolis (5,91%)(12).

Estudo realizado a fim de investigar os fatores sociais, demográficos, biológicos e ambientais determinantes do baixo peso ao nascer no Brasil, que utilizou dados PNDS – 2006, encontrou uma prevalência de baixo peso de 6,1% (apresentando diminuição da PNDS – 1996, cuja prevalência foi de 8,1%). Foram identificados fatores de risco para o baixo peso ao nascer com razões de chance que variaram entre 1,55 a 2,22: sexo feminino, residir nas macrorregiões Sudeste e Sul, escolaridade materna inferior a quatro anos e tabagismo. Os estudos realizados por meio de inquéritos como a PNDS dispõem de informações mais abrangentes para abordagens analíticas dos dados de baixo peso ao nascer, não disponíveis na base de dados do SINASC(13).

Observou-se, no estudo acima citado, uma maior prevalência de baixo peso ao nascer entre famílias de condição socioeconômica mais elevada, reforçando a ideia de que o aumento do baixo peso ao nascer tem relação com a prematuridade e o acesso a tecnologias de saúde em regiões mais desenvolvidas, que resultam em menores índices de mortalidade infantil. Este fenômeno denomina-se paradoxo epidemiológico do baixo peso ao nascer(13).

Alguns autores sugerem que o Brasil esteja passando por uma transição epidemiológica perinatal, na qual o baixo peso ao nascer é identificado em regiões mais desenvolvidas, amparadas por tecnologias avançadas na medicina neonatal. Também se identifica aí a ocorrência da redução do período gestacional devido ao aumento do número de partos cesáreos eletivos, seja por opção da mãe e/ou do médico obstetra(14).

A distribuição espacial do baixo peso ao nascer em Balneário Piçarras revelou que São Braz, Bela Vista e Nossa Senhora da Paz são os locais de maior risco para nascimentos com baixo peso. Os bairros Nossa Senhora da Paz e Bela Vista são bairros com maior concentração de população carente socioeconômica, contexto que reforça a necessidade de atenção especial ao acompanhamento materno infantil, com a garantia de acesso ao pré-natal e à continuidade do cuidado em todos os níveis de atenção da rede de saúde do município. Já a localidade de São Braz, por situar-se na zona rural, apresenta como complicador a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, o que configura fator de risco aumentado para a gestante e seu filho, principalmente considerando-se o peso como indicador de qualidade(15). Além disso, todos os demais bairros da zona urbana apresentaram risco médio para baixo peso ao nascer, reforçando a ideia de que, no meio urbano, onde se concentra a maior parte da população e, principalmente, os dois extremos do extrato social, o baixo peso deve ser monitorado e utilizado como indicador para avaliação da qualidade da assistência prestada nos serviços de saúde, bem como quanto ao uso indiscriminado de tecnologias do parto.

A análise espacial utilizada em estudos para planejamento e gestão dos serviços de saúde é um grande facilitador da compreensão dos fenômenos e tem como aliados o conhecimento de estratégias para melhorar a assistência à saúde. O baixo peso ao nascer é um fator determinante da mortalidade neonatal, associado a infecções e maior tempo de hospitalização do recém-nascido, bem como predisposição à deficiência de crescimento e desenvolvimento psicomotor pós-natal(16).

A utilização do peso ao nascer na avaliação das condições de saúde materno infantil é bastante valorizada, pois tem a capacidade de mostrar a qualidade de vida de uma comunidade. Historicamente, o baixo peso era associado apenas à prematuridade, posteriormente estudos comprovaram não existir associação significativa, associando-se outras variáveis para sua incidência, como fatores obstétricos (retardo de crescimento intrauterino, gemelaridade), comportamentais (tabagismo, uso de drogas), geográficos (altitudes e regiões) e étnicos. Estudos após a década de 1970 incluíram fatores maternos não patológicos para ocorrência do baixo peso ao nascer, como idade materna (precoce < 20 anos ou tardia > 35 anos) e o ganho de peso materno durante a gestação (acima de 8 Kg). O número de consultas pré-natal também é considerado fator importante para diminuição de complicações durante a gravidez, podendo afetar diretamente no peso ao nascer.

Na década de 1990, incluiu-se mais um fator na ocorrência de baixo peso ao nascer, o parto cesáreo, que se indicado indiscriminadamente poderia aumentar a ocorrência de partos prematuros(17).

Os dados do presente estudo mostraram uma prevalência maior de sobrepeso (7,20%) em relação ao baixo peso ao nascer (6,10%). Esta prevalência, no mesmo período, é maior que a encontrada na Região da Foz do Rio Itajaí Açu (5,87%) e na capital Florianópolis (5,91%)(12). A prevalência de sobrepeso ao nascer (macrossomia) é de 5% da população geral, podendo aumentar para 15 a 25% nos casos de mães diabéticas(18). No Rio de Janeiro, uma coorte realizada no período de 2005 a 2007 encontrou incidência de 6,7% de macrossomia(15); em Goiânia, no período de 2006 a 2008, foi de 6,5%(19).

Alguns autores sugerem uma tendência de aumento do número de recém-nascidos macrossômicos, semelhante à de países desenvolvidos (Reino Unido, 9%; Alemanha, 10,1%; Dinamarca 20%; Estados Unidos 10%)(15).

Duas coortes realizadas no Rio de Janeiro em períodos distintos constataram que a macrossomia apresenta como fatores determinantes a idade materna avançada, a multiparidade, obesidade pré-gestacional e o ganho excessivo de peso durante a gestação(15).

A análise espacial dos nascimentos com sobrepeso demonstrou maior risco para o bairro Medeirinhos, pertencente à zona rural. É fato que as mulheres dessa área apresentam uma condição nutricional melhor por praticarem o cultivo de vegetais, frutas e hortaliças no quintal. No entanto, esta nutrição deve ser observada para que não seja hipercalórica, aumentando as chances de ganho de peso excessivo durante a gravidez e constituindo fator de risco para a macrossomia.

O sobrepeso ao nascer configura-se tão importante quanto o baixo peso ao nascer, visto que pode aumentar o risco de morte intrauterina, a necessidade de cuidados intensivos, fraturas, hiperbilirrubinemia neonatal, paralisia do plexo braquial e obesidade na infância e fase adulta(19).

A distribuição espacial de nascimentos pré-termo no município de Balneário Piçarras mostrou-se com uma prevalência de prematuridade de 6,16%, compatível com os nascimentos de baixo peso ao nascer (6,10%). O bairro de maior risco para prematuridade foi São Braz, que também apresentou maior risco para baixo peso ao nascer. Este percentual foi inferior ao encontrado em outros municípios, Vale do Paraíba/SP (9%)(6), Niterói/RJ (7,4 a 7,9%)(5) e Guarapuava/PR (10%)(3).

A prematuridade somada ao baixo peso ao nascer foram as características dos recém-nascidos de risco que mais necessitaram de internações hospitalares em crianças menores de um ano no município de Maringá/PR, com uma chance de 2,5 vezes maior de sofrerem hospitalização(20).

Estudo realizado em Uberlândia/MG nos anos de 2008 a 2010, a fim de analisar a dinâmica espacial da ocorrência de baixo peso ao nascer, prematuridade e do coeficiente dos óbitos infantis, constatou que a prematuridade é um sinalizador do baixo peso ao nascer e as maiores prevalências ocorreram em bairros que possuem em comum no seu perfil a ocupação por habitantes de baixa renda. Isso aponta que a questão da renda ainda é, em primeiro lugar, a causa de maior ocorrência de óbitos fetais nesses locais. Por meio do mapeamento foi possível identificar um padrão de ocorrência que se concentrou em sua maioria em áreas de população carente, com serviços de saúde escassos ou com falhas de gerenciamento do sistema de cadastramento, sugerindo a necessidade de revisão no planejamento da atenção materno-infantil, que deve ser considerada como prioridade da gestão municipal(16).

 

CONCLUSÃO

O SINASC apresenta atualmente uma cobertura superior a 90%, constatada em vários estudos em todo o território nacional, indicando sua viabilidade para o cálculo de indicadores de saúde. No entanto, ainda existem subnotificações no sistema, detectadas por meio do cruzamento com informações de outras fontes, como também falhas no preenchimento e processamento dos dados.

Feita essa ressalva, o presente estudo permitiu observar que a análise espacial apontou maior risco para baixo peso na localidade rural de São Braz e nos bairros Bela Vista e Nossa Senhora da Paz; sobrepeso em Medeirinhos, outra localidade rural; e prematuridade em São Braz. Os indicadores revelaram que os riscos estão associados à dificuldade de acesso aos serviços de saúde nas localidades rurais e a condições socioeconômicas desfavoráveis nos bairros da zona urbana.

Uma avaliação contínua desses indicadores de saúde pela administração pública permitiria a implementação de estratégias para assistência integral à saúde da mulher e criança, medidas eficientes para redução da incidência de morbimortalidade infantil.

Apesar da cobertura de ESF em 100% e cobertura pré-natal adequada, recomenda-se a implementação de programas voltados para a garantia de um atendimento de qualidade, redirecionando políticas públicas para as áreas mais carentes de infraestrutura urbana, com a melhoria da oferta de serviços públicos, adequada assistência durante o pré-natal, rastreamento e acompanhamento das gestantes de risco e promoção de ações para o acompanhamento do recém-nascido. Este conjunto de propostas, direcionadas por meio do georreferenciamento para as áreas e situações de risco, possibilitará a melhoria dos indicadores materno-infantis no município.

 

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Recebido: 08/08/2014
Revisado: 23/12/2014
Aprovado: 23/12/2014