ARTIGOS ORIGINAIS

 


Acidentes de trabalho com material perfurocortante em profissionais da equipe de enfermagem da rede hospitalar pública de Rio Branco - Acre - Brasil (*)


(*)  Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado a Coordenação do Curso de Enfermagem da Universidade Federal do Acre, para obtenção do Grau de Bacharel em Enfermagem - 2004.


Akerna Cristini de Moura Pereira1, Andréa Ramos da Silva1, Cícero Francalino da Rocha1, Iara Soares Cordeiro1, Creso Machado Lopes1

1Universidade Federal do Acre

 


ABSTRACT
Researches accomplished with 126 workers of the nursing team of the medical and surgical of the general hospitals of Rio Branco Clinics - Acre - Brazil, to lift the occurrence of work accidents, caused by cutting and piercing A questionnaire was used contends open and shut questions. It was verified that 82,5% are of the feminine gender, 56,4% married or joined, 44,4% possessed the 2nd complete degree and 30,9% the third complete degree, 72,3% exercised the 6-20 year-old profession. For its time, 50,8% already suffered accidents cutting and piercing, being the Medical Clinic with 66,7% and in the morning period with 45,3%, with syringe needle in 52,2%, where 48,1% acidentaram-if for inattention and 26,6% for negligence. The conduct after the accident for 21,0%, went accomplish to asepsis in the place and to communicate the Commission of Control of Infecção Hospital, while 60,9% didn't accomplish the notification for ignorance.  
Keywords: Accident of the Work; Health of the Worker; Occupational Health.


RESUMO
Pesquisa junto a 126 Profissionais da Equipe de Enfermagem das Clínicas Médica e Cirúrgica dos Hospitais Gerais de Rio Branco - Acre - Brasil, para levantar a ocorrência de acidentes de trabalho, ocasionados por material perfurocortante. Fez-se uso de um questionário contendo perguntas abertas e fechadas. Verificou-se que 82,5% são do gênero feminino, 56,4% casado ou juntado, 44,4% possuíam o 2º grau completo e 30,9% o terceiro grau completo, 72,3% exerciam a profissão de 6-20 anos. Por sua vez, 50,8% já sofreram acidentes percutâneo, sendo a Clínica Médica com 66,7% e no período matutino com 45,3%, com agulha de seringa em 52,2%, onde 48,1% acidentaram-se por desatenção e 26,6% por descuido. A conduta após o acidente por 21,0%, foi realizar a assepsia no local e comunicar a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, enquanto que 60,9% não realizaram a notificação por  desconhecimento.
Palavras Chave: Acidente do Trabalho; Saúde do Trabalhador; Saúde Ocupacional.



INTRODUÇÃO

O homem necessita gozar de boa saúde para garantir um trabalho condigno. Porém, em muitas atividades profissionais há maior exposição aos riscos ocupacionais e, segundo o Centers for Disease Control – CDC, já está demonstrado estatisticamente que o profissional de saúde está sujeito a maior número de riscos que outros profissionais. Sabe-se que no contexto hospitalar, a enfermagem constitui-se na maior força de trabalho, e suas atividades são freqüentemente marcadas por divisão fragmentada de tarefas, rígida estrutura hierárquica, para o cumprimento de rotinas, normas e regulamentos, dimensionamento qualitativo e quantitativo insuficiente de pessoal, situação de exercício profissional que tem repercutido em elevado absenteísmo e afastamentos por doenças(9).

Vários autores destacam que as condições de trabalho vivenciadas por muitos trabalhadores da equipe de enfermagem, particularmente em ambiente hospitalar, têm lhes ocasionado problemas de saúde, freqüentemente relacionados à situação e setor de trabalho, provocando prejuízos pessoais, sociais e econômicos(1).

Na análise dos aspectos que podem influenciar as atividades no trabalho, abordam-se os fatores intra e extralaborais, como: ambiente físico; riscos ocupacionais; higiene, estruturação e segurança do setor de trabalho; situação social de vida e do processo de trabalho do funcionário; organização e divisão das atividades; os meios disponíveis para o exercício profissional; jornada, turno, alimentação e transporte; situação social de moradia e deslocamento; interação pessoal e as relações entre produção e salário(1).

Tratando-se especificamente do ambiente hospitalar, muito se tem falado e publicado a respeito das condições inadequadas de trabalho vigentes em grande parte dessas instituições, expondo seus trabalhadores a riscos de ordem biológica, física, química, ergonômica, mecânica, psicológica e social. Os hospitais constituem-se em locais de aglutinação de pacientes/clientes acometidos por diferentes problemas de saúde, assistidos por trabalhadores diversos, da área da saúde ou técnico-administrativas, e vários estudos têm apontado que os serviços de saúde, em particular os hospitais, geralmente proporcionam aos seus trabalhadores, principalmente da enfermagem, piores condições de trabalho em relação a outros serviços(1)

Como conseqüência das condições inseguras de trabalho em instituições hospitalares, no caso da equipe de enfermagem, têm sido freqüentes os acidentes de trabalho, o absenteísmo e o afastamento por doenças, o que tem dificultado a organização do trabalho em diversos setores e, conseqüentemente, a qualidade de assistência de enfermagem prestada.

Em termos de Legislação Brasileira, na Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, acidente de trabalho é definido no artigo 19 da Lei 8213 de 24 de julho de 1991, como “aquele que ocorreu em pleno exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, ou a perda, ou redução permanente ou temporária da capacidade para o trabalho” e consta também no inciso II do artigo 21, “acidente sofrido pelo segurado no local e no horário de trabalho em conseqüência de: a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiros ou companheiro de trabalho, e em c) ato de imprudência, negligência ou de imperícia de terceiros ou companheiro de trabalho”. No inciso III do mesmo artigo acrescenta-se “doença proveniente de contaminação acidental de empregado no exercício de suas atividades(9)

O contato com microorganismos patológicos oriundos de acidentes ocasionados pela manipulação de material perfurocortante, ocorre, com grande freqüência, na execução do trabalho de enfermagem. A exposição ocupacional por material biológico é entendida como a possibilidade de contato com sangue e fluídos orgânicos no ambiente de trabalho, e as formas de exposição incluem inoculação percutânea, por intermédio de agulhas ou objetos cortantes, e o contato direto com pele e/ou mucosas(5).

Dentre os fluidos corporais, tem-se reconhecido o sangue como o mais importante veículo de transmissão ocupacional dos vírus da Hepatite B (HBV), Hepatite C (HCV) e AIDS (HIV), sendo que o maior risco para os trabalhadores da área de saúde é o acidente com material perfurocortante, que expõe os profissionais a microorganismos patogênicos, sendo a Hepatite B a maior incidência entre esses trabalhadores(8)

Em decorrência deste fato, em 1987, o CDC publicou uma série de recomendações destinadas aos profissionais de saúde, denominadas precauções universais, com a finalidade de diminuir o risco de infecção por HIV (Human Immunodeficiency Virus) e HBV (Hepatite B) no contato com sangue e fluídos corporais. Inicialmente foram trabalhadas como "medidas de precaução universal" e atualmente são denominadas "precauções padrão".(4)

O risco de transmissão de agentes patógenos veiculados pelo sangue, tais como o HIV ou o HBV, é influenciado pela freqüência e duração da exposição do profissional ao sangue de clientes infectados (Mckinney & Young apud LOPES et al., 1997). Já o risco de exposição é influenciado por fatores ambientais, tais como maior contato com agulhas ou instrumentos contaminados, disponibilidade de equipamento de proteção efetivo e soroprevalência do HBV e HIV na população.

Em estudo realizado no Brasil, com trabalhadores de saúde, visando a identificação do risco ocupacional de infecção pelo vírus HIV, foi constatado que 88,8% dos acidentes de trabalho notificados acometeram o pessoal de enfermagem. Dentre os fatores predisponentes a ocorrência de acidentes de trabalho dessa natureza, está a freqüente manipulação de agulhas pelos trabalhadores de enfermagem(6).

As medidas profiláticas recomendadas após o acidente percutâneo são: realizar a limpeza imediata da área afetada e espremer o sangue da ferida; entrar em contato com o Departamento de Saúde dos Empregados ou com o Serviço de Comissão da Infecção Hospitalar – SCIH e descrever o incidente. Posteriormente o acidentado deverá fornecer uma amostra de sangue para realizar testes para o antígeno de superfície da Hepatite B (HBsAg) e anticorpo para o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV); a fonte – objeto perfurocortante (OPC) ou o paciente deve ser testado, se possível; caso a fonte tenha sorologia positiva para o Vírus da Hepatite B (HBV) e o acidentado não tiver sido vacinado contra essa doença, o mesmo deverá conversar com o médico sobre a necessidade de receber imediatamente a série de vacinas contra o HBV. Além disso, será recomendável receber uma dose única da Imunoglobulina da Hepatite B (IGHB), caso o acidentado tenha sofrido exposição nos últimos sete dias. Se a fonte for negativa para HBsAg e o acidentado não tiver sido vacinado, talvez seja necessário receber a série de vacinas para a Hepatite B. Caso a fonte se recuse a ser testada ou não puder ser identificado, o acidentado deverá fazer a série de vacinas para a Hepatite B. Caso a fonte tenha testes positivos para o HBV ou haja grande suspeita de ser portadora dessa doença, considere a necessidade de usar a IGHB.

Caso a fonte seja HIV positiva, o acidentado foi exposto ao vírus, e assim, ele deverá receber aconselhamento sobre o risco de infecção. Ele deverá ser avaliado clínica e sorologicamente para detectar sinais de infecção pelo HIV, logo que possível, após a exposição. Se o teste for negativo para HIV por ocasião da exposição, deve-se repetir o exame dentro de seis semanas, 12 semanas e 6 meses após a exposição. Além disso, o acidentado poderá solicitar um outro teste com 10 a 12 semanas, tendo em vista que existem relatos indicando que o período de incubação pode durar até 8 semanas; caso os testes realizados na fonte sejam negativos para HBsAg ou HIV, o acidentado provavelmente precisará fazer testes de acompanhamento dentro de 12 semanas.

A quimioprofilaxia para acidentes com material contaminado pelo vírus HIV deve ser iniciada imediatamente, dentro de, no máximo, 2 horas após a exposição. Estudos realizados em animais sugerem que, após 24 a 36 horas, esta profilaxia não é eficiente, porém, em especial nos casos de maior risco, ela deve ser iniciada mesmo transcorrido este tempo, uma vez que, mesmo que a infecção não seja prevenida, o tratamento precoce da infecção aguda é benéfico. O tempo ideal de profilaxia não está definido, recomendando-se uma duração de 4 semanas. O esquema profilático deve ser mantido sempre que tolerado e sua recomendação dependerá do tipo de exposição e material fonte(2)

Em relação aos fatores predisponentes à ocorrência de acidentes de trabalho com material perfurocortante, foi constatada por meio de pesquisas realizadas que a categoria profissional mais acometida por esse tipo de infortúnio é a dos Auxiliares de Enfermagem, que são profissionais que estão em contato direto com o paciente, na maior parte do tempo, administrando medicamentos, realizando curativos e outros procedimentos que os mantêm em contato com material perfurante e cortante. A ocorrência desse tipo de acidentes não está relacionada apenas ao nível de formação, mas também ao treinamento, capacitação, recursos materiais disponíveis e cultura local. Segundo dados, a identificação do principal fator associado à ocorrência do acidente percutâneo é o reencape de agulhas, o qual infringe as precauções - padrão, antigamente denominadas universais, e que os Auxiliares e Técnicos de Enfermagem são os que mais comumente realizam esse procedimento inadequado. As informações descritas nas pesquisas apontam que os enfermeiros atribuem, como causas dos acidentes, a sobrecarga de trabalho e negligência médica, e os Atendentes de Enfermagem os relacionam a fatalidade(5).

O acidente de trabalho em nosso país deve ser notificado, o que significa registrá-lo no protocolo de Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT, por meio de via impressa e eletrônica. O empregador é obrigado a comunicar à Previdência Social a ocorrência do acidente de trabalho. A notificação deve ser feita até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e de imediato à autoridade policial competente em caso de acidente fatal. No caso de falta de comunicação, por parte da empresa, poderão emitir a CAT o próprio acidentado, seus dependentes, a entidade sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública, não havendo neste caso limite de prazo para a notificação(6)

A notificação dos acidentes de trabalho é uma exigência legal e através dela são fornecidos dados relativos ao número e distribuição dos acidentes e as características das ocorrências e das vítimas e a apresentação destes resultados através de estatísticas constituem base indispensável para a indicação, aplicação e controle de medidas prevencionistas.8  Além disso, a notificação é um recurso que assegura ao trabalhador o direito de receber avaliação médica especializada, tratamento adequado e benefícios trabalhistas.

A subnotificação da exposição ocupacional a doenças infecciosas é uma grande barreira para entender os riscos e os fatores associados com a exposição ocupacional a sangue e fluídos corpóreos(8)

A falta de tempo do trabalhador para notificar o acidente foi constatada também por Figueiredo, Silva(8), os quais apontam como causa decorrente do ritmo acelerado imposto para a execução das atividades, pressão exercida pela chefia, e da grande responsabilidade assumida pelos trabalhadores no trabalho.

Esta causa pode também estar relacionada às dificuldades burocráticas geralmente envolvidas no processo de notificação de acidentes de trabalho conforme descrito por Figueiredo, Leme Benatti, Jansen et al., apud NAPOLEÃO, ROBAZZI, MARZIALE & HAYASHIDA., 2000).

Diante do exposto, devido a freqüente ocorrência de acidentes do trabalho ocasionados por material perfurocortante observado na atuação da equipe de enfermagem e do elevado índice de subnotificação destes acidentes acreditamos que o trabalhador de enfermagem deva se preocupar com a implementação de práticas que lhe ofereçam condições seguras para o desempenho de suas atividades laborais, assim como conscientizar-se da necessidade de incorporar à prática profissional de notificação dos acidentes ocorridos para garantir a seguridade de seus direitos.

Portanto, motivados por esta problemática, é que se propôs realizar a presente pesquisa, e que de posse dos seus resultados conhecer como essa realidade se apresenta em nosso meio, e com isso contribuir com a prevenção dos acidentes perfurocortantes junto aos profissionais da Equipe de Enfermagem do Acre, onde para sua realização estabeleceu como objetivo: Levantar a ocorrência de acidentes de trabalho entre os profissionais de enfermagem ocasionados por material perfurocortante na Rede Hospitalar Pública de Rio Branco – Acre.


MATERIAL E MÉTODO

O trabalho de pesquisa do tipo exploratório - descritivo,  foi realizado exclusivamente junto aos profissionais de enfermagem da Rede Hospitalar Pública, no período de abril e maio de 2004. Foram incluídos os Auxiliares de Enfermagem, Técnicos de Enfermagem e Enfermeiros das Clínicas Médica e Cirúrgica do Hospital Geral de Clínicas de Rio Branco – HGCRB e Fundação Hospital Estadual do Acre – FUNDHACRE.

Com relação ao processo de amostragem, conforme levantamento junto as Divisões de Enfermagem dos referidos hospitais, foram encontrados 148 profissionais de enfermagem, dos quais 126 (85,1%) responderam os questionários de forma espontânea. 

Para a coleta dos dados, fez-se uso de um questionário contendo questões prioritariamente fechadas e algumas abertas, o qual foi respondido pelos servidores de enfermagem dos referidos hospitais e como critério de inclusão, fizeram parte do estudo, apenas aqueles que estavam em exercício ativo no período determinado.

Para a tabulação dos dados fez-se uso de um banco de dados utilizando o Programa Epinfo(6), no qual às perguntas fechadas foram analisadas sob o ponto de vista quantitativo, com apresentação de freqüência e percentual e nas perguntas abertas a abordagem foi do tipo qualitativa com categorização e agrupamentos das respostas por semelhança de conteúdo, segundo (MINAYO, 1999).

Antes da aplicação definitiva do instrumento de coleta de dados, fez-se o pré-teste, para verificar a compreensão e adequabilidade das questões, assim como efetuar a validade aparente e de conteúdo das questões.

Sob o aspecto ético do projeto de pesquisa envolvendo seres humanos, este foi inicialmente encaminhado para o Comitê de Ética em Pesquisa – CEP, da Fundação Hospital Estadual do Acre - FUNDHACRE, o qual foi oficialmente autorizado para sua realização. Vale ressaltar que após sua explicação foi facultado ao pesquisado participar ou não da pesquisa e que foi garantido o sigilo e o anonimato dos sujeitos pesquisados.

Convém esclarecer também que foi solicitada autorização por escrito às Divisões/Chefias de Enfermagem e Direções dos Hospitais,  para que a coleta de dados fosse realizada junto à equipe de enfermagem, os quais somente participaram após tomarem conhecimento, concordarem e assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Ao discorrer sobre a primeira parte do instrumento de pesquisa, versando sobre os dados de identificação, dos 126 sujeitos 22(17,5%) eram do sexo masculino e 104(82,5%) feminino. Tais dados mostram o acentuado número de sujeitos do gênero feminino, representando uma força de trabalho expressiva no setor de prestação de serviços desta natureza. Vargens apud SOUZA & VIANNA (1993), cita em seu trabalho que apenas 5,6% dos enfermeiros no Brasil são do sexo masculino. Portanto, a enfermagem é exercida basicamente por mulheres, que assumem dupla jornada de trabalho decorrente de serviços domésticos e familiares, sem descanso e/ou férias. Essas premissas, segundo estudo realizado por Silva apud SOUZA & VIANNA (1993), favorecem uma maior incidência de acidentes de trabalho entre o pessoal de enfermagem.

Por sua vez, quanto a faixa etária, dos 126 sujeitos entrevistados, 83(65,9%) estavam compreendidos na faixa de 30-44 anos, 34 (27,0%) na de 45 a 60 e 9 (7,1%) na de 20-29.

Quanto ao estado civil, os dados revelam que dos 126 sujeitos, 71(56,3%) são casados/juntados/amasiados, 34(27,0%) solteiros, 17(13,5%) divorciados e 4(3,2%) são viúvos.

Constatou-se que 56(44,4%) dos entrevistados possuem o 2º grau completo, estando neste caso representado pelos Auxiliares e Técnicos de Enfermagem e  39(30,9%) possuíam o terceiro grau completo, sedo que destes 26(20,6%) possuíam Curso de Pós-Graduação em nível de Especialização, enquanto que os 17 (13,4%) estavam entre o terceiro grau incompleto e primeiro completo.

Observa-se percentagem elevada de funcionários com o 2º grau de instrução completo (44,4%). Para os enfermeiros, há necessidade do superior completo, no entanto, para os Auxiliares de Enfermagem, o pré-requisito é apenas o 1º grau. Desta forma, nota-se que além do esforço em progredir profissionalmente, há uma sobrecarga de atividades: estudo e trabalho.

Quanto a Função/Cargo Ocupado/Profissão, 76(60,3%) desempenham a função de Auxiliar de Enfermagem, seguido por 36(28,6%) como Enfermeiro e 14(11,1%) como Técnico de Enfermagem.
A maioria dos profissionais de enfermagem é representada pela categoria dos Auxiliares de Enfermagem, que são os profissionais que mais permanecem em contato com os pacientes realizando procedimentos que envolvem em sua maior parte a administração de medicamentos e soroterapia, atividades estas que expõem estes profissionais a um risco maior de acidentaram-se, já que os materiais que mais utilizam para a sua execução incluem as agulhas e scalps.

Com relação aos meios de locomoção para chegar ao trabalho, verificou-se que 49(38,9%) utilizam ônibus como principal meio de transporte, 46(36,5%) usam automóvel próprio, 13(10,3%) iam a pé, 10(7,9%) usavam moto própria e os 8(6,4%) restantes utilizavam moto táxi, bicicleta e táxi.

Com relação aos dados relacionados ao tempo de serviço, verificou-se que 91(72,3%) trabalhavam de 6 - 10 anos, seguido por 19(15,0%) 21 a 26 e mais anos, e o restante 16(12,7%) de menos de um ano a cinco anos.

Ao questionar junto aos profissionais quanto ao número de empregos que possuem, constatou-se que 90(70,4%) possuem 1 emprego, 31(24,6%)  2 empregos e apenas 5(4,0%) tem mais de 2 empregos.

Devido aos baixos salários recebidos é comum encontrarmos trabalhadores de enfermagem que possuem mais de um emprego, fator este que aumenta sua exposição aos riscos ocupacionais e a sobrecarga de trabalho.

No tocante aos dados relacionados a acidentes com material perfurocortante, tem-se que 64(50,8%) dos trabalhadores de enfermagem acidentaram-se com OPC e 62(49,2%) afirmaram não ter sofrido acidente.

Vários autores, Furth, Jagger et al., apud SOUZA & VIANNA (1993), demonstraram a alta incidência de acidentes de trabalho ocorridos com materiais perfurocortantes ( agulha, scalps, lâminas de bisturi, de gilete, de barbear, alfinete). Neste estudo encontrou-se também agulhas e scalps como causadores de 70,3% de todos os acidentes.

No que diz respeito as clínicas em que ocorreram os acidentes, observou-se que a maior prevalência deu-se na Clínica Médica representado por 36(66,7%) seguido pela Clínica Cirúrgica com 18(33,3%) dos acidentes.

Ao investigarmos o período em que ocorreu o acidente, tem-se que 29(45,3%) aconteceram no período matutino e 17(26,6%) no período noturno, e 7(10,9%) a tarde.

Os turnos de trabalho na enfermagem hospitalar são obrigatórios para manutenção da assistência nas 24 horas do dia ininterruptamente. Silva apud SOUZA & VIANNA(1993), salienta que as alterações de turno e, principalmente o trabalho à noite, trazem alterações fisiológicas, interferem no sono e repouso, no lazer, prejudicando o relacionamento social e familiar.

Geralmente é opção do funcionário trabalhar no horário da noite, com o objetivo de melhorar o seu orçamento (adicional noturno), como também poder ter outra fonte de renda, ou mesmo estudar. Um trabalho realizado nos Estados Unidos da América por Neuberger & Hartley apud SOUZA & VIANNA (1993), demonstram que o maior número de acidentes na enfermaria ocorre à noite.

Diante destes dados, observa-se uma porcentagem maior no turno da manhã, porém não se pode ignorar o fato de se ter um maior número de procedimentos e concentração de profissionais neste horário.

Ao investigar com qual material havia acontecido o acidente, dos 67 verificou-se que 35(52,2%) ocorreram com agulha de seringa, seguido por 19(28,3%) com scalps e os 13(19,5%) foram por abocath, bisturi, ampolas, agulha de raqui, gilete, instrumental cirúrgico e lanceta.

Grande parte das atividades dos trabalhadores de enfermagem está concentrada na administração de medicamentos e soroterapia, atividades que envolvem a manipulação constante de agulhas e scalps, sendo estas as situações que mais expõem os trabalhadores ao risco de acidentes perfurocortantes.

No que diz respeito ao modo como ocorreram os acidentes, constatou-se que 47(73,4%) foram através da realização ou auxílio de procedimentos, seguido por 11(17,2%) por meio do reencape de agulhas, 3(4,7%) pelo descarte inadequado de OPC e 3(4,7%) pela manipulação de resíduos sólidos hospitalares.

A análise dos dados permitiu a identificação de que o 2º principal fator associado a ocorrência desse tipo de acidente percutâneo é o reencape de agulhas, o qual infringe as precauções-padrão, e que os auxiliares e técnicos de enfermagem são os que mais comumente realizam esse procedimento inadequado.

Ao questionar o que provocou a ocorrência do acidente, identificou-se que 31(48,1%) afirmaram que o motivo foi desatenção, 17(26,6%) alegaram descuido, 9(14,1%) citaram o fato de o paciente encontrar-se agitado, e os 7(11,2%) por diversas causas como, descarte inadequado de OPC, iluminação precária, falta de conscientização, imprevisto, sonolência e um não soube responder.

Diante do descrito anteriormente pode-se perceber que uma série de fatores estão associados à ocorrência de acidentes de trabalho, dentre os quais existe relação direta com a peculiaridade das atividades laborais da enfermagem, da forma de organização do trabalho, do comportamento dos profissionais, das condições de trabalho oferecidas, além da falta de sensibilização/conscientização e a não percepção individual sobre o risco, contribuem para a ocorrência de acidentes de trabalho com material perfurocortante.

Ao investigar quais são os materiais de biossegurança que os trabalhadores de enfermagem devem utilizar para evitar acidentes, constatou-se que parcela significativa dos entrevistados, 116(92,1%) conhecem os equipamentos de proteção individual e apenas 10(7,9%) não conhecem tais equipamentos.

Veronesi & Focaccia apud SOUZA & VIANNA (1993), salientam a importância das precauções devido a impossibilidade de se realizar testes sorológicos para todos os pacientes que são atendidos pelos profissionais da saúde. Apesar de existir alguns artigos que questionam as precauções universais, como o de Manian apud SOUZA & VIANNA (1993), considera-se necessário constante treinamento, com orientação em serviço, com o objetivo da conscientização geral da necessidade do uso de tais precauções, evitando maiores conseqüências a todos os trabalhadores que atuam na área da saúde. Daí, a importância de todos os profissionais de saúde não apenas conhecerem, mas utilizarem os equipamentos de proteção individual.

De acordo com a conduta tomada pelos sujeitos do estudo, após o acidente com material perfurocortante, 14(21,0%) fizeram assepsia no local da lesão e comunicaram a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, seguido por 10(15,6%) que fizeram apenas a assepsia, 8(13,5%) comunicaram a Enfermeira e os demais 31(49,9%) tomaram diversas providências, como: fizeram exames, comunicaram ao médico, a vigilância epidemiológica, procuraram a Coordenação Estadual de DST/AIDS, como também um que não tomou nenhuma providência.

No que se refere a notificação do acidente ocorrido com material perfurocortante, verificou-se que dos 64 acidentados, 39(60,9%) não notificaram o ocorrido e apenas 25(39,1%) notificaram. Dos que não notificaram 14(35,8%) não o fizeram porque desconheciam que era preciso notificar, seguido de 10(25,6%) que não julgaram necessário e os 15(38,6%) restantes, acharam que o acidente foi simples, por falta de tempo, a sorologia do paciente era negativo dentre outros motivos.

Embora se constitua uma prática legalmente exigida, foi constatado por 14(35,8%) dos trabalhadores que apresentaram déficit de informações sobre a obrigatoriedade e a importância do registro do acidente, pois através do número de ocorrência se torna possível diagnosticar a gravidade do problema e planejar medidas específicas de prevenção a população trabalhadora da instituição em cada ambiente de trabalho.

O desconhecimento da necessidade de registro apontado pela maioria dos entrevistados revela o grau de desinformação dos trabalhadores de enfermagem em relação aos aspectos epidemiológicos e jurídicos envolvidos nesta preocupante situação.

Destaca-se ainda os 10(25,6%) que julgaram ingenuamente não ser necessário a notificação, fato que pode estar relacionado a crença de que não seria atingido pela infecção e  a falta de importância atribuída pelos próprios trabalhadores às pequenas lesões causadas por agulhas. Salienta-se que todos os acidentes com material perfurocortante devem ser notificados e cabe ao médico especialista avaliar a necessidade de realização de exames laboratoriais e o tratamento preventivo com antiretrovirais.

Com relação ao número de sujeitos que fizeram curso de biossegurança constatou-se que a grande maioria dos trabalhadores de enfermagem, 80(63,5%) não participaram de nenhum curso sobre este tema, enquanto que apenas 46(36,5%) haviam participado.

Dos 126 pesquisados, 123(97,6%) conheciam as principais doenças que podem ser transmitidas em acidentes com objetos perfurocortantes e somente 3(2,4%) não souberam responder ao questionamento.

Ao investigar o que representou para os entrevistados que sofreram acidentes aguardar o aparecimento ou não de doença, 89,1% referiram preocupação, ansiedade, medo, stress, nervosismo, angústia, desespero e pânico, 4(6,2%) tranqüilidade, 2(3,1%) não souberam responder e 1(1,6%0) diz que depende do acidente.

Estes dados revelam o sentimento de pesar e medo que cerca a mente dos profissionais de enfermagem que já se acidentaram com objetos perfurocortantes e revela a preocupação destes diante da possibilidade de terem adquirido alguma doença em seu ambiente de trabalho decorrente do acidente.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização da presente pesquisa abordando a temática dos acidentes ocorridos com material perfurocortante entre os trabalhadores de enfermagem, foi extremamente importante, pois através dela verificou-se a ocorrência de acidentes em parcela significativa da equipe de enfermagem, representada por 50,8% dos pesquisados, sendo que destes 52,2% sofreram acidente percutâneo com agulhas de seringa.

Um fato relevante diz respeito ao grau de informação dos entrevistados com relação aos materiais de biossegurança que devem ser utilizados para evitar a ocorrência de acidentes, bem como quais são as doenças que podem ser transmitidas após acidente percutâneo.

Por outro lado, constatou-se que a grande maioria dos acidentados, 60,9% não realizaram a notificação do acidente, destacando-se o desconhecimento da necessidade de notificação.

Estes dados revelam que todas as categorias de profissionais de enfermagem estão sujeitos a acidentes com material perfurocortante e o planejamento e a implementação de orientações específicas e sistematizadas à equipe de enfermagem se fazem necessárias e urgentes para que estes profissionais adotem o exercício profissional seguro.

Além disso, o elevado índice de acidentes não notificados nos fazem inferir que não existem exigências de se instituir uma política de informação por parte dos órgãos trabalhistas fiscalizadores junto às instituições e que a enfermagem se revela como uma classe que pouco questiona suas condições de trabalho.

A partir do que foi exposto anteriormente, considera-se necessário agregar programas educativos à aquisição de material de segurança, adequação da organização do trabalho e ao incentivo à notificação para controlar e prevenir os acidentes com objetos perfurocortantes entre os trabalhadores de enfermagem.

Assim de posse destes resultados espera-se contribuir com as autoridades do setor da saúde, direção das unidades hospitalares, chefias de enfermagem, conselho de representação de classe e de categorias profissionais no conhecimento da problemática estudada, para que medidas possam ser tomadas na minimização dos problemas de acidentes com material perfurocortante.  


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Received: October 17th 2004
Revised: November 23th 2004
Accepted: December 2nd 2004