Verbal history and qualitative research in nursing

História oral e pesquisas qualitativas em enfermagem

Cátia Andrade Silva1, Lucimeire Santos Carvalho2, Climene Laura de Camargo3, Ana Carla Petersen de Oliveira Santos 4 Maria do Rosário de Menezes5

1 FTC, 2 UNEB, 3 UFBA, 4 UFBA, 6 UFBA

ABSTRACT: The present article aims to review the main texts that deal with Oral History by identifying among the most important conceptions, the one that best fits the field of nursing. It´s a bibliografical study, embracing the period from 1983 to 2005. They were identified three main conceptions on Oral History:  research technique; as a subject formed by a distinct theoretical body related to its practice; and research methodology. The outcome of this study emphasizes that the Oral History conception as a research methodology is more appropriate for nursing research due to the fact that it allows the assistance direction from the individuals own experience, e, therefore, must wide be used by the nurses interested in searching the singularity of one given experience one for the life of people and/or groups.
Keywords: Nursing; Qualitative research; Methodology.

RESUMO: O presente artigo objetiva revisar os principais textos que tratam da História Oral, visando identificar, entre as concepções mais difundidas, a mais adequada para a pesquisa em enfermagem. Trata-se de um estudo bibliográfico, abrangendo o período de 1983 a 2005. Foram identificadas três principais concepções de história oral: técnica de pesquisa; disciplina; e metodologia de pesquisa. Concluiu-se que a concepção de história oral como metodologia de pesquisa é uma das mais adequadas para as pesquisas em enfermagem por permitir o direcionamento da assistência a partir do relato oral da vivência dos indivíduos, e, portanto, deve ser largamente utilizada pelos enfermeiros interessados em buscar a singularidade de uma dada experiência para a vida de pessoas e/ou grupos.

Palavras-chave: Enfermagem; Pesquisa qualitativa; Metodologia. 

 

Introdução 

Diversas pesquisas em enfermagem objetivam a solução de problemas relacionados à prática cotidiana da assistência. E a necessidade de compreender esses problemas na perspectiva daqueles que os experienciam tem propiciado o uso da história oral nessa área do conhecimento.

Contudo a acentuada desproporção existente entre o desenvolvimento crescente da história oral e a reduzida quantidade de publicações que tratam dessa temática tem dificultado o entendimento e, conseqüentemente, restringido o uso dessa metodologia. 

Precursores1 na publicação de importantes textos sobre história oral, afirmam que, no Brasil, a história oral ganha muitos simpatizantes; entretanto uma questão preocupante é o caráter limitado da reflexão e da discussão metodológica, que normalmente consiste na gravação das entrevistas e edição dos depoimentos, sem o estabelecimento da ponte de análise entre o discurso e a natureza das fontes ou de seus problemas.

Nesse contexto o objetivo deste artigo é, portanto, revisar os principais textos referentes à história oral, valorizando sua origem, seu conceito e as principais concepções à cerca de sua aplicabilidade.

Buscou-se, através da análise qualitativa da pesquisa bibliográfica – na Internet, em bancos de dados LILACS e SCIELO, bem como consultas diretas às bibliotecas das faculdades de enfermagem situadas na cidade do Salvador/BA, as referências que versassem sobre história oral e sua fundamentação e aplicabilidade em pesquisas na área de saúde. Foram utilizadas como palavras-chave de busca: história oral, metodologia, pesquisas qualitativas e enfermagem. A pesquisa abrangeu o período compreendido entre 1983 e 2005, período esse onde houve maior número de publicações sobre o uso da história oral em pesquisas, particularmente na enfermagem, visando oferecer aos enfermeiros que se lançam no universo das pesquisas, uma visão da metodologia em questão. 

Historiando o método

 

Historicamente, esse método de aproximação do objeto de pesquisa não é recente, segundo Alberti2, Heródoto e Tucídides utilizavam relatos e testemunhos para edificarem suas narrativas históricas sobre eventos passados. Entretanto nesse período não existia o recurso tecnológico da gravação para serem efetuados os registros de tais relatos e, portanto, transformá-los em documento de consulta.

Considerado como o pai da história, Heródoto utilizava apenas o testemunho como a fundamentação para a descrição da verdade do que se via, e foi a base para o desenvolvimento da história oral pura, ou seja, aquela que utiliza unicamente os testemunhos. Enquanto Tucídides utilizava a combinação dos testemunhos com outras fontes, questionando assim o método de Heródoto. Esse último abriu caminho para história oral híbrida que utiliza os depoimentos, associados com documentos escritos.3

No século XIX, houve o predomínio da história positivista que considerava o modelo científico como arquétipo para o saber, supervalorizando o documento escrito, como se apenas ele guardasse a verdade absoluta sobre o fenômeno.  Isso acabou por conduzir à prática da coleta de depoimentos à margem das metodologias de estudo.

Nesse momento histórico, considerava-se que os depoimentos não poderiam servir como fontes de informações fidedignas, pois vinham impregnados de valores inerentes ao individuo, forneciam uma visão parcializada do evento ocorrido e estavam sujeitos a falhas de memória.

A história oral voltou a firmar-se como potencial de estudos na segunda metade do século XX. Credita-se o seu ressurgimento a três fatores: ao desagrado dos estudiosos com os métodos quantitativos, que após a guerra cederam lugar aos métodos qualitativos de pesquisa; ao advento do gravador no final da década de 60, permitindo as consultas aos depoimentos gravados e transcritos; e porque esses depoimentos passaram a ser relevantes na área das ciências humanas, já que ampliavam as informações sobre os fenômenos a serem estudados através do aprofundamento de experiências e versões particulares, da compreensão da sociedade através do individuo que nela viveu, e do estabelecimento das semelhanças entre o geral e o particular através da análise comparativa de diferentes versões e testemunhos2.

A moderna história oral teve seu berço na Universidade de Columbia, em Nova York no ano de 1947, quando Allan Nevins formou um arquivo e oficializou o termo, que se tornou indicativo de uma nova postura frente às entrevistas. Isto aconteceu após a Segunda Grande Guerra Mundial, quando associaram os avanços tecnológicos com a necessidade de propor formas de captação de experiências importantes como as vividas pelos combatentes, familiares e vítimas dos conflitos4.

Meihy3  ressalta ainda que nesse momento histórico, o rádio já era um importante meio de divulgação e as entrevistas tornam-se populares. As revistas e os jornais publicavam as entrevistas conjuntamente com fotografias, atraindo assim, o gosto da massa popular. De maneira, que hoje podemos considerar o jornalismo como o incentivador e perpetuador da história oral. 

A primeira geração de historiadores orais surgiu nos Estados Unidos por volta dos anos 50, com o objetivo de reunir material para futuros historiadores. Na Itália a pesquisa oral foi utilizada para reconstituir a cultura popular, e no México os arquivos orais registravam as memórias e recordações dos chefes da revolução mexicana, sendo estes considerados por, como a segunda geração dos historiadores orais5.

No Brasil, a história oral tardou em se desenvolver devido a dois fatores: “a falta de tradições institucionais não-acadêmicas que se empenhassem em desenvolver projetos registradores das histórias locais e a ausência de vínculos universitários com os localismos e a cultura popular”3:23.

O golpe militar de 1964, no Brasil, trouxe a censura que proibiu os projetos que gravassem experiências, vivências, opiniões, julgamentos e conceitos, ou seja, qualquer depoimento contrário às idéias políticas vigentes na época.

Em 1970, iniciou-se a campanha pela anistia e em 1975 nasceu um programa pioneiro da história oral brasileira em vigor até hoje o CPDOC/FGV do Rio de Janeiro. Mas, foi só em 1983, com a abertura política, que as instituições culturais e acadêmicas passaram a buscar a história oral como metodologia de pesquisa e atualmente observa-se um grande avanço no plano nacional e internacional, onde o Brasil destaca-se como produtor de trabalhos de história oral2,3.

 

Conceito e Concepções 

O conceito de história oral apresenta três dimensões: a história oral é uma fonte totalizante, constituída de documentos complementares e associados que permitem uma visão do todo; essa totalização é obtida de forma única, através do confronto entre a experiência vivida e os questionamentos do entrevistador; as versões dos autores não devem ser consideradas unicamente como ideologias, mas, ao mesmo tempo, como práxis, ou seja, como testemunhos dinâmicos da realidade social6.

Em artigo mais atual, Camargo7 refere que compreende e interpreta a história oral como um instrumento pós-moderno para entender a realidade contemporânea, tendo em vista a sua elasticidade, imprevisibilidade e flexibilidade.

Do ponto de vista da socióloga a história oral é um termo amplo que abriga uma quantidade de depoimentos referentes a eventos não registrados por outros tipos de documentação ou, ainda, cuja documentação se deseja complementar. Essa é colhida por meio de diversas modalidades de entrevistas, registrando-se a experiência de um único ator social ou de uma coletividade8.

Dentre as inúmeras concepções a respeito da história oral, destaca-se as três principais, que a definem como uma técnica, uma disciplina e uma metodologia1.

Na primeira concepção, a história oral é definida como uma técnica para coleta de dados. O foco de interesse são as experiências com a gravação, transcrição e conservação de entrevistas. 

Sobre essa técnica “a chamada história oral não passa de um conjunto de procedimentos técnicos para a utilização do gravador em pesquisa e para posterior conservação das fitas1:xiii.” Para justificar a sua afirmação, esse autor alega que a história oral não possui bases filosóficas da teoria, nem os artifícios que podem ser considerados como metodológicos, reduzindo-a ao produto do “[...] cruzamento da tecnologia do século XX com a eterna curiosidade do ser humano”.

Todavia pode-se questionar essa concepção de história oral, com base na argumentação de Haguette 9:73. Essa autora ressalta que a história oral, ao contrário de outras técnicas para a coleta de dados utilizadas pelas ciências humanas – a exemplo da observação participante, da história de vida e da entrevista –, mostra-se mais complexa, o que dificulta sua definição clara e objetiva. Assim, afirma que é mais fácil descrevê-la do que defini-la. Em termos gerais, sinaliza que “[...] tudo que é oral, gravado e preservado pode ser considerado história oral”.

 Nesse sentido, os discursos, as conversas ao telefone ou qualquer outro tipo de comunicação humana passível de ser gravada, transcrita e preservada como fonte primária para uso futuro da comunidade científica estariam contidos no rótulo de história oral.

No âmbito dessa concepção, Lutz Nilthammer apud François10:6 define história oral como “[...] técnica de investigação própria da história do século XX.” Contudo, a mesma autora salienta que essa definição não é persuasiva, porque não lhe atribui o merecido valor, já que é capaz de resgatar uma ampla gama de conhecimentos do passado.

E, afirma ainda que a história oral é considerada como superior a “[...] um simples aperfeiçoamento técnico ou um requinte metodológico.”10:7

A segunda concepção compreende a história oral como uma disciplina. Para fundamentá-la, os autores lançam mão de explicações complexas e, por vezes, conflitantes. É consenso, entretanto, que a história oral “[...] inaugurou técnicas especificas de pesquisa, procedimentos metodológicos singulares e um conjunto próprio de conceitos”1:xii

 Para Mikka apud Ferreira e Amado1:xiii

Pensar a história oral dissociada da teoria é o mesmo que conceber qualquer tipo de história como um conjunto de técnicas, incapaz de refletir sobre se [sic] mesma [...] Não só a história oral é teórica, como constitui um corpus teórico distinto, diretamente relacionado às suas práticas.

Entretanto se a história oral for concebida como disciplina existirão dois caminhos difíceis de serem percorridos: o primeiro seria ignorar as questões exclusivas da teoria, ou seja, não abordá-las nas pesquisas; o segundo consiste em se tentar localizar respostas para as questões da teoria apenas no bojo de conhecimentos da história oral1. Assim, chegam à conclusão de que o produto dos seus trabalhos serão estudos com conclusões óbvias e restritas à mera reprodução de trechos das falas dos entrevistados, caso a história oral seja considerada como disciplina.

A terceira concepção entende a história oral como qualquer outra metodologia capaz de determinar e orientar as etapas do estudo, funcionando como um mecanismo de ligação entre a teoria e a prática.

Nessa perspectiva, a história oral é uma metodologia de pesquisa que valoriza a execução de entrevistas com indivíduos que fizeram parte ou presenciaram fatos, momentos históricos, entre outros, com a finalidade de aproximar o pesquisador do fenômeno a ser estudado2.

Também, é concebida como o resultado do processo de interação entre entrevistados e pesquisadores e não meramente uma fala gravada por meio de um equipamento tecnológico3.

Por fim, Becker11 ressalta que a história oral possui um lugar imprescindível porque possibilita aos grupos sociais que não possuem habilidades com a escrita exteriorizar suas experiências. E Thompsom12 confirma que os analfabetos são os verdadeiros portadores da fonte oral; portanto, nesse contexto, há uma história a ser registrada.

Metodologia de pesquisa 

Através desse método pode-se estudar não apenas eventos ocorridos na história, em instituições, nos grupos sociais, entre milhares de outros fenômenos, como também o objeto à luz dos depoimentos dos indivíduos que vivenciaram o fenômeno que se pretende analisar.  

Nessa perspectiva e de acordo com Alberti2:1

[...] a história oral é um método de pesquisa que privilegia a realização de entrevistas com pessoas que participaram de, ou testemunharam, acontecimentos, conjunturas, visões de mundo, como forma de se aproximar do objeto de estudo.

Lozano13:16 também concebe a história oral como metodologia e assim a descreve: [...] um espaço de contato e influência interdisciplinares; sociais, em escalas e níveis locais e regionais; com ênfase nos fenômenos e eventos que permitam, através da oralidade, oferecer interpretações qualitativas de processos histórico-sociais.

Para isso, conta com métodos e técnicas precisas, em que a constituição de fontes e arquivos orais desempenha um papel importante. Dessa forma, a história oral, ao se interessar pela oralidade, procura destacar e centrar sua análise na visão e na versão que brotam do interior e do mais profundo da experiência dos atores sociais.

A história oral como metodologia de pesquisa pode ser dividida, de acordo com Meihy14, em três ramos: a tradição oral, a história oral temática e a história oral de vida.

A tradição oral relaciona-se à transmissão geracional e percebe o indivíduo enquanto um veículo da transmissão de costumes e tradições antigas. Já a história oral temática é conceituada como vinculada ao testemunho e à abordagem sobre algum assunto específico; é um recorte de uma experiência e uma abordagem de questões externas, objetivas, factuais, temáticas, colaborando para o preenchimento de espaços vazios em versões estabelecidas. Permite, como destaca Alberti2:5 : “[...] recuperar aquilo que não encontramos em documentos de outra natureza.”

Por último, a história oral de vida é definida pelo autor como um registro da experiência pessoal que segue um procedimento em que o entrevistador interfere o mínimo possível, atuando como estimulador, e o depoente tem liberdade para falar da sua experiência. Cuida de impressões e subjetividades, e a individualização é fundamental. 

A história oral, ainda, pode ser dividida, de acordo com Meihy14, em híbrida e pura. A primeira associa a coleta de depoimentos orais a documentos coletados diretamente dos atores sociais ou escritos; a história oral pura refere-se exclusivamente aos depoimentos e valoriza apenas o que foi dito.

É importante salientar que existe um mito de que história oral não possui objetividade; entretanto, Camargo6 propõe alguns critérios que devem ser seguidos para garantir a objetividade: a amostragem – deve-se trabalhar com um conjunto de entrevistas obtido através de amostra expressiva, selecionada, cujos suportes essenciais estejam presentes no universo em análise; a saturação – deve-se ter a máxima atenção, pois em determinado momento pode-se perceber a repetição das informações, o que leva ao esgotamento do universo em análise; e a multi ou interdisciplinaridade – o que confere potencialidade à técnica é a capacidade de utilizar contribuições de diversas disciplinas: antropologia, história, psicanálise, entre outras.

De acordo com Tourtier-Bonazzi15, a história oral prende-se, fundamentalmente, a quatro questões: a seleção da testemunha deve obedecer aos critérios do estudo e faz-se indispensável criar uma relação de confiança entre o depoente e o entrevistador, tendo um primeiro encontro para estabelecer confiança; só num encontro posterior deve-se realizar a entrevista com a gravação; o lugar da entrevista deve ser confortável para o depoente, preferencialmente em sua casa, impedindo que o ambiente seja mecanismo de pressão ou que outras pessoas possam interferir na entrevista; o roteiro das entrevistas deve ser preparado minuciosamente, de tal modo que permita a coleta dos dados para o estudo; a transcrição consiste numa interpretação ou recriação, pois nenhum sistema de escrita é capaz de reproduzir o discurso com absoluta fidelidade e deve ser realizada o quanto antes, de preferência pelo próprio entrevistador.

O mesmo autor ressalta-se, ainda, o cuidado que se deve ter durante a transcrição das entrevistas gravadas: colocar entre colchetes as passagens pouco audíveis; assinalar por reticências as dúvidas, os silêncios e as rupturas sintáticas; designar por iniciais as pessoas citadas pelos depoentes; utilizar grifos para anotações, por exemplo: risos, choro; grafar em negrito as palavras usadas com forte entonação; organizar cuidadosamente o texto em parágrafos, atentando para a pontuação; colocar subtítulos para facilitar a leitura; e corrigir em notas os erros por parte do entrevistado: datas, nomes próprios, entre outros.

Como método às pesquisas em enfermagem 

Considera-se a pesquisa como uma das formas pela qual uma categoria profissional expressa seus conhecimentos, se fundamenta e se desenvolve. É através dela que se torna possível a aquisição de novas informações.16

No que tange a enfermagem, esta vivencia o processo de produção de conhecimento através da pesquisa; todavia o despreparo do enfermeiro é evidenciado pelas dificuldades que enfrenta no desenvolvimento de pesquisas e na sua aplicação à prática17.

Acredita-se que seja consenso a inexistência de dúvida quanto à importância da escolha correta do método que fundamentará a pesquisa. Ele é imprescindível para a apreensão, descrição e análise do objeto do estudo, bem como para o alcance dos objetivos propostos pelo pesquisador. Sabe-se, entretanto, que a escolha do método de pesquisa que mais se adeque ao objeto a ser estudado é um dos grandes desafios dos pesquisadores, e a enfermagem não se exime dessa realidade.

Arcuri18 salienta que o método de pesquisa acende várias perguntas relacionadas à interação enfermeiro-paciente, todavia a questão fundamental é definir aquele que melhor controle as variáveis complexas nessa interação, na tentativa de caracterizar o fenômeno com maior fidedignidade.

O mesmo autor acrescenta ainda, que a maior parte das pesquisas de enfermagem está ligada à prática assistencial, ou seja, à busca de soluções para questionamentos que emergem do exercício diário da profissão.

Nesse sentido, a história oral apresenta-se como uma excelente metodologia a ser aplicada nas pesquisas de enfermagem que busquem resgatar e compreender profundamente determinados fenômenos à luz de quem os experienciou, pois somente eles (atores sociais) serão capazes de descrever com exatidão suas experiências19.

A descrição das vivências fornecidas pelos atores do processo serão de suma importância para a compreensão de situações da prática de enfermagem. E de acordo com Silva e Trentini20 as narrativas dos indivíduos permitem, não só a enfermagem, como também a equipe de saúde edificar conhecimentos fundamentado-os na vivência dos indivíduos que se encontram sob seus cuidados.

Nesse âmbito percebe-se a crescente difusão da história oral nos centros universitários, apesar de algumas diferenças em relação a sua utilização e status. Vê-se seu uso sendo estimulado por parte dos pesquisadores, entre eles os da área da saúde, onde  apontamos autores da enfermagem que através dos relatos orais têm realizado entrevistas com sujeitos que possam discorrer sobre experiências diretas ocorridas durante a vida.21

É inegável que a vivência de cada indivíduo é única. Por meio da história oral, utilizada como método de pesquisa, pode-se reconstituir determinados fenômenos e a partir deles formar um grupo de conhecimentos específicos acerca do objeto em estudo e propor intervenções conscientes direcionadas à realidade do fato estudado.

Conclusões 

Faz-se importante ressaltar que a história oral deve ser utilizada pelo enfermeiro-pesquisador como método de pesquisa e não, apenas, como é proposto por alguns estudiosos, como técnica para a coleta de dados ou disciplina.

A história oral é um recurso moderno utilizado como forma de captação de experiências de pessoas dispostas a falar sobre aspectos de sua vida, com o compromisso de se manterem no contexto social. Nesse sentido a memória é um fator essencial para as pesquisas fundamentadas na história oral, já que possibilita o processo de construção, reconstrução e preservação da identidade individual e coletiva.22, 23

Com base nas discussões sobre história oral, conclui-se que a concepção da mesma como metodologia de pesquisa é adequada para a pesquisa em enfermagem e, portanto, pode ser largamente utilizada pelos enfermeiros interessados em buscar, na experiência dos indivíduos, informações não documentadas e capazes de direcionar a assistência de enfermagem.

Espera-se que este trabalho possa contribuir para o despertar do interesse pelo desenvolvimento de pesquisas norteadas pela metodologia da história oral, assim como para estimular o desejo de aprofundar os conhecimentos nessa temática.

Referências

1 Ferreira MM, Amado J. Apresentação. In: Ferreira MM, Amado J, organizadores. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; 2001: vii-xxv.

2 Alberti V. História oral a experiência do CPDOC. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas; 1990.

3 Meihy JCSB. Manual de história oral. São Paulo: Loyola; 1996.

4 Grele RJ. Pode-se confiar em alguém com mais de 30 anos? Uma crítica construtiva a história oral. In: Amado J, Ferreira MM. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: FGV, 2001: 267-77.

5 Joutard P. História oral: balanço da metodologia e da produção nos últimos 25 anos. In: Ferreira MM, Amado J. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; 2001: 43-62.
6 Camargo A. O método qualitativo: usos e perspectivas. In: Anais do 3o. Congresso Nacional de Sociologia; Brasília (DF), Brasil, Soc. Brás. Soc.;1987: 275-83.

7 Camargo A. História oral e política. In: Moraes M. História oral. Rio de Janeiro: Diadorim; 1994.

8 Queiroz MIP. Relatos orais: do indizível ao dizível. Ciência e Cultura, 1987; 39:272-86.

9 Haguette TMF. Metodologias qualitativas na sociologia. Petrópolis: Vozes; 2000.

10 François E. A fecundidade da história oral. In: Ferreira MM, Amado J. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; 2001: 3-13.

11 Becker JJ. O handicap do a posteriori. In: Ferreira MM, Amado J. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; 2001: 27-31.

12 Thompson P. A voz do passado – história oral. São Paulo: Paz e Terra; 1992.

13 Lozano JEA. Práticas e estilos de pesquisa na história oral contemporânea. In: Ferreira MM, Amado J. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; 2001:15-27.

14 Meihy JCSB. Definindo história oral e memória. CERU 1994; 5: 52-60.

15 Tourtier-Bonazzi C. Arquivos: propostas metodológicas. In: Ferreira MM, Amado J. Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas; 2001: 233-46.

16 Westruup MHB, Carraro TE, Souza ML. A Pesquisa na enfermagem. Texto e Contexto Enfermagem 1994; 3: 128-36 [Acesso em 26 ago 2006] Available  from: bases.bireme.br/cgi-bin/wxislind.exe/iah/online/?IsisScript=iah/iah.xis&base=LILACS&lang=p&ne... - 29k

17 Mendes IA, Trevisan MA. Acerca da utilização do método científico nas pesquisas de enfermagem. Rev Bras Enferm 1983; 36: 13-19 [Acesso em 14 dez 2005] Available  from: www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-11691998000200011&script=sci_arttext - 49k -

18 Arcuri EAM. Pesquisa em enfermagem: estudo atual e questões éticas. Texto e Contexto Enfermagem 1994, 3: 20-9.

19 Silva CA. Conhecendo história oral: uma experiência para a enfermagem. Rev. UERJ; 2005, 13(1):97-101 [Acesso em 28 maio 2006]  Available  from: bases.bireme.br/cgi-bin/wxislind.exe/iah/online/?IsisScript=iah/iah.xis&base=LILACS&lang=p&ne... - 30k

20 Silva DGV, Trentini, M. Narrativas como técnica de pesquisa em enfermagem. Rev. Latino-Am. Enfermagem 2002, 3: 423-32 [Acesso em 10 de março de 2006] Available  from: www.scielo.br/scielo.php?script=sci_pdf&pid=S0104-11692002000300017&lng=es&nrm=iso&tlng=pt

21 Reinaldo MAS, Saeki T, Reinaldo TBS. O uso da história oral na pesquisa em enfermagem psiquiátrica: revisão bibliográfica. Rev Eletr de Enferm 2003, 5(2): 55-60 [Acesso em 14 ago 2006] Available from: http://www.fen.ufg.br/revista.

22 Kusumota L, Rodrigues RAP, Marques S. Elderly persons with chronic kidney failure: health status alterations. Rev Lat-Am Enferm 2004, 12(3): 525-32.

23 Sobral V, Silveira F, Tavares C, Santos I, Garcia A. The social and poetical care with the subjects of research - in the memory remains what it means. Online Braz J Nurs [online] 2003, 2(2) [Acesso em 14 ago 2006] Available from: http//www.uff.br/nepae/objn202sobraletal.htm.

 Endereço para correspondência: Lucimeire Santos Carvalho. Rua L Quadra 4 Lote 5 Jardim Brasília Pernambués, CEP:41100-160, Salvador –Bahia, Brasil

Received: Aug 25th , 2006
Revised: Sept 25nd
Accept: Oct 14th , 2006