ARTIGOS DE REVISÃO

 

A bioética no processo de trabalho administrativo da enfermagem: uma reflexão

 

Patricia Maria Marcon1, Ymiracy N. S. Polak1, Marineli Joaquim Méier1

1Universidade Federal do Paraná

 


RESUMO
O presente artigo aborda o tema ética e bioética no agir do enfermeiro com cargo administrativo, tendo como objetivo proporcionar aos enfermeiros reflexões que visem aproximar o conhecimento da ética e bioética ao processo de trabalho gerencial da profissão. Para fundamentar este estudo, será descrito sucintamente a profissão de Enfermagem, considerando conceitos como o trabalho e o processo de trabalho. O Processo de Trabalho na Enfermagem está contextualizado sob a abordagem de conceitos como: o cuidar o gerenciar e o ensinar, segundo o ponto de vista de algumas teóricas. A relevância deste estudo decorre da sua possível contribuição para o enriquecimento da prática profissional do enfermeiro, uma vez que subsidiará a análise crítica deste profissional na definição de condutas/ posicionamentos benéficos, justos e adequados a todos os sujeitos envolvidos no processo de trabalho de enfermagem.
Descritores: Enfermagem; Gerenciamento da Prática Profissional; Bioética.


 

INTRODUÇÃO

A profissão de Enfermagem é descrita como um processo de trabalho complexo que engloba três áreas: o Cuidar, o Educar e o Gerenciar. Ao direcionar a atenção aos aspectos gerenciais da Enfermagem, considera-se de elevada importância e essencial à profissão por subsidiar o enfermeiro a prover os recursos humanos, materiais e físicos à execução das atividades cotidianas da categoria profissional(1).

O interesse e o reconhecimento pela importância das temáticas ética e bioética relacionadas às atividades do gerenciamento de Enfermagem surgiu desde a graduação, sendo incentivado pelo Curso de Especialização em Gestão dos Serviços de Enfermagem, o qual possibilitou vivenciar, questionar e imaginar soluções mais fundamentadas e adequadas para situações cotidianas da profissão, que envolvem e requerem conhecimentos específicos e científicos para uma conduta mais apropriada dos profissionais.

Ao observar a prática profissional em determinados contextos, como unidade de saúde e instituições hospitalares, destaca-se que a maioria dos enfermeiros que ocupam cargos de gerência possui carências quanto aos conhecimentos da área administrativa, principalmente em assuntos relacionados à ética e à bioética(2). Ao referenciar sobre enfermeiros com funções administrativas, considera-se que este profissional, concomitantemente às atividades cotidianas, atua como ‘elo de ligação’ entre equipe de trabalho e as coordenações superiores(3), fato que o torna reconhecido como co-responsável na organização de trabalho da instituição. Nesse sentido, considera-se imprescindível que este profissional adquira conhecimentos referentes à ética e bioética, uma vez que estes são de grande aplicabilidade em processos decisórios e definições de posicionamentos, principalmente aos que envolvem os seres humanos trabalhadores.

Nesta perspectiva, acrescenta-se que os profissionais da área da saúde, principalmente os da Enfermagem, vivenciam uma ‘cegueira’ para temas que envolvem ética ou bioética, pois estes somente são lembrados em questões bem conhecidas e polemizadas como o aborto, a eutanásia ou quanto a normatizações profissionais, ocultando-se atividades gerenciais que envolvem seres humanos e, que  por vezes necessitam reflexões à luz deste referencial para tomada de decisões precisas, justas e benéficas a todos os envolvidos(4).

Nesse sentido a problemática do trabalho, centrou-se na dificuldade em encontrar material bibliográfico a respeito de ética e bioética interligados ao gerenciamento dos serviços de Enfermagem.

Desta maneira, o objetivo deste estudo foi proporcionar reflexões que visem aproximar o conhecimento ético e bioético ao processo de trabalho administrativo da Enfermagem. E, ao considerar que as situações do processo de trabalho gerencial são complexas e envolvem diferenciados contextos e sujeitos, entende-se que tais reflexões são importantes para contribuir durante o processo de análise crítica das situações gerenciais cotidianas.

Conforme identificado a pouca demanda de conteúdos teóricos existentes relacionando a ética e bioética ao processo de trabalho administrativo de Enfermagem, buscou-se na literatura, estudos de autores que enfocam a Enfermagem como um processo de trabalho, explicitando a área administrativa e autores que enfocam a ética e bioética, quando possível no contexto gerencial. Assim, tentou-se relacionar tais conteúdos de modo que alcance a meta do presente trabalho.

A PROFISSÃO DA ENFERMAGEM E A ÉTICA E BIOÉTICA
Esta síntese teórica sustenta-se em duas partes. A primeira, Processo de Trabalho, expondo brevemente o trabalho com algumas definições do termo e aspectos que o constituem e, o Processo de Trabalho, com sua contextualização na Saúde e na Enfermagem, principalmente na Administração dos serviços de Enfermagem. E a segunda parte, evidencia a ética e bioética, sendo contextualizado para o gerenciamento dos serviços de enfermagem. Estruturou-se assim, com a pretensão de seguir uma linha de temas pertinentes e convergentes ao tema central do estudo.

O trabalho sempre fez parte da história humana, acompanha as transformações e evoluções do cotidiano global e, por possuir seu vocábulo de origem no latim, apresenta-se uma definição sob a óptica filosófica:

“Atividade cujo fim é utilizar as coisas naturais ou modificar o ambiente e satisfazer às necessidades humanas. Por isso, o conceito de trabalho implica: 1) dependência do homem em relação à natureza, no que se refere à sua vida e aos seus interesses: isso constitui a necessidade, em um de seus sentidos. 2) reação ativa a essa dependência, constituída por operações mais ou menos complexas, com vista a elaboração ou à utilização dos elementos naturais; 3) grau mais ou menos elevado de esforço, sofrimento ou fadiga, que constitui o custo humano do trabalho”(5:964).

Este mesmo conceito de trabalho, sob a óptica de uma estudiosa da área da Enfermagem, refere que “O homem, no desenvolvimento de seu percurso histórico, aliando sua materialidade (força física) à sua capacidade de pensar e agir para atender a sua necessidade natural de sobrevivência determinou que o trabalho consiste na intervenção sobre a natureza, definindo projetos, implementando-os, realizando produtos, enfim recriando a natureza”(6:45).

Diante das definições expostas anteriormente, percebe-se o quão fundamental é o trabalho na vida do ser humano, pois além de permitir suprir suas necessidades materiais, sociais, culturais, de lazer, entre outras, fornece conhecimento, aprendizado, experiência, modificando-o não apenas fisicamente, mas também psicologicamente, seja por situações vivenciadas, treinamentos ou formação educacional obtida, no contexto das instituições.

Com a institucionalização do trabalho, surgiu a produção de bens e serviços. A Produção de Bens sendo compreendida quando o trabalho resulta em algo material, concreto, visível. Já o Serviço, apresenta-se como uma atividade ou benefício que um indivíduo possa oferecer a outro, suprindo a necessidade apresentada.

Fez-se necessário ressaltar a diferença entre tais conceitos – produção de bens e serviço – com o fito de possibilitar a compreensão de que a Enfermagem surgiu da necessidade do ser humano em obter assistência à saúde, mais precisamente o cuidado. Assim, ao considerar os conceitos anteriormente citados e a história das ciências da saúde, o produto da Enfermagem classifica-se como serviço, resultando em algo não caracteristicamente concreto, mas de essencial importância à vida do ser humano, à assistência à saúde, por meio do cuidado.

Para compreensão do Processo de Trabalho da Enfermagem na perspectiva atual é necessário apresentar alguns recuos históricos. A Enfermagem passou a ser assim denominada e institucionalizada na Inglaterra, no século XIX, quando Florence Nightingale foi convidada pelo Ministro da Guerra do país, para trabalhar junto aos soldados feridos na Guerra da Criméia (1854-1856). Refere-se que Florence, organizando a institucionalização da Enfermagem, pautou-se na disciplina rígida, burocratizando as ações, implantando normas e regimes a serem seguidos, sistematizando as atividades e criando registros burocráticos. Pode-se constatar que em sua trajetória histórica, a Enfermagem sofreu diversas influências, que foram definindo seu perfil. Sendo as características mais marcantes advindas do paradigma religioso-militar(7).

Com tais considerações concernentes a profissão da Enfermagem percebe-se que seu processo de trabalho não se deu de forma tão simples. Afirma-se que a institucionalização com base nos princípios Nightingelianos de organização religiosa e militar e idealização de profissão com vocação nobre e altruísta complexificaram tal processo. Conforme tais características citadas, percebe-se confronto em seus ideais, pois por um lado, há a burocratização, a normatização, regulamentando a profissão para prestar um cuidado pautado na organização; e, por outro, o altruísmo, a bondade, com a finalidade de assistir ao indivíduo com humanismo.

Na tentativa de compreender o processo de trabalho da profissão, estabeleceu-se que a enfermagem possui um processo de trabalho complexo e, apresenta uma combinação de três ações básicas não dissociadas: o Cuidar, o Educar e o Administrar dos serviços de Enfermagem. Refere-se que as três áreas desse processo de trabalho orientam-se para uma mesma finalidade - o cuidado ao ser humano – considera-se que não há predominância de importância entre elas, uma vez que se desenvolvem, na maioria das vezes, interligadas(1).

Ao descrever os processos de trabalho, pode-se compreender: O Processo de Trabalho Cuidar como o trabalho identificador da profissão, no qual a atuação da Enfermagem tem como finalidade atender as necessidades relacionadas à manutenção da saúde como condição de sua natureza de ser vivo. O Processo de Trabalho Educar como o trabalho dirigido para a transformação da consciência individual e coletiva de saúde dos seres humanos, de modo que as pessoas possam fazer suas escolhas, ou seja, agirem com autonomia. Acredita-se que neste processo de educar a comunicação pode ser uma ferramenta importante, devendo ser previamente planejada, conforme o ser humano envolvido, de forma que resulte em ensino e não em manipulação. O Processo de Trabalho Administrar é apresentado como o trabalho privativamente proposto para o Enfermeiro, caracterizado por ter uma finalidade de organizar o espaço, desenvolvendo condições para a realização do cuidado e/ou da educação(1).

Considera-se o objeto de trabalho do processo de administrar, a organização em si, produzindo uma combinação de situações para a assistência e também atuando sobre e com a equipe de enfermagem, no sentido de educação continuada e de decidir condições profissionais que envolvem direta ou indiretamente os seres humanos membros da equipe de enfermagem, assim como os seres humanos clientes.

Ao descrever a administração dos serviços de Enfermagem e, considerá-la uma importante e imprescindível área do processo de trabalho da profissão, necessita-se apontar o surgimento do papel gerencial. Apresenta-se que a necessidade de existir um gerente ocorreu quando houve as primeiras formações de grupos de pessoas com o intuito de realizar atividades pré-determinadas, percebendo a falta de um indivíduo que assegurasse o cumprimento das tarefas e detectasse falhas existentes. Naquela época o gerente destinava-se à fiscalização, visando somente aumento da produtividade do trabalho. Por meio do desenvolvimento social, da complexidade nas organizações, de novos conhecimentos em administração, na saúde e na enfermagem, além de conseqüentes mudanças nos perfis e papéis profissionais, o profissional com cargo gerencial adquiriu novas abordagens na execução de seu processo de trabalho, passando a atuar como orientador/facilitador no ambiente de trabalho e buscando visualizar o trabalhador na sua multidimensionalidade(9).

Ao reportar-se historicamente à prática da enfermagem brasileira, desde a década de 40, quando ocorre um aumento de trabalho nas instituições hospitalares, até os dias atuais, defronta-se com o enfermeiro desempenhando, predominantemente, a função de gerente dos serviços de Enfermagem, ou seja, administrando os serviços de Enfermagem.

Nesse contexto, ressalta-se que em muitas instituições, a estrutura diretiva da profissão apresenta além dos profissionais de nível médio e enfermeiros assistenciais, um enfermeiro com cargo gerencial, para atuar como líder desta e equipe, responsável pela unidade e, concomitantemente, intermediando entre a direção e a equipe de enfermagem(2). Nesse sentido há instituições de ensino, cujos docentes da disciplina Administração Aplicada à Enfermagem enfatizam a importância do desenvolvimento da liderança, com o objetivo de formar profissionais capazes de tomar decisões em situações complexas que lhe sejam submetidos durante a sua vida profissional(10).

Há inúmeras atividades de enfermagem a serem realizadas pelo enfermeiro com cargo gerencial9. No entanto, neste trabalho a atenção está voltada a evidenciar a importância do conhecimento sobre ética e bioética permeando tais atividades e como estes, podem contribuir para uma análise crítica e uma posição mais eficaz do enfermeiro em suas funções administrativas.

Salienta-se que as instituições de saúde são constituídas por seres humanos, sejam profissionais de saúde, clientes ou familiares. A instituição, na presença de seus profissionais, necessita possuir em sua estrutura, filosofia, valores, princípios e normas de comportamento para seus integrantes e, destes para com os outros. Acredita-se que tais normatizações auxiliarão na definição de posicionamentos e condutas adequados(11).

Nesse sentido, ao direcionar-se à ética, explicita-se que este termo provém do grego ethos, significando ‘caráter’, ‘modo de ser’, entre outros, e que implica em opção individual do ser humano, sua escolha conforme adesão aos valores, princípios e normas morais. Complementa-se que a ética visa a interioridade do ser humano, por meio da solicitação de convicções próprias(12).

Destaca-se que vive-se e vivencia-se uma sociedade pluralista, na qual coexistem diferentes compreensões e interpretações sobre princípios e valores éticos, sendo esses não aceitos como absolutos. Por isso a ética, em sua expressão maior, atua como um mecanismo de relações sociais, que visa garantir a coesão social e harmonizar interesses individuais e coletivos, respeitando a autonomia individual(12).

De acordo com este pensamento, define-se o ser humano ético como àquele que procede de maneira a não causar dano à nada nem a ninguém; outorga aos outros aquilo que, por justiça, lhes pertence; aceita que os outros tenham liberdade para recusar ou aceitar, realizar ou deixar de realizar, enfim, respeita a autonomia nas ações do outro(11).

Ao visualizar a Enfermagem como uma profissão desenvolvida por seres humanos e direcionada para um ser humano que apresenta necessidade de assistência à saúde, acredita-se ser imprescindível a aplicabilidade de valores e princípios morais e éticos ao processo de trabalho gerencial, por acreditar que os mesmos reforçam o compromisso profissional, o que repercute no seu produto de trabalho, com orientações para suas atividades com honestidade, justiça e beneficência(2).

Desta forma, o enfermeiro com cargo administrativo tendo responsabilidade sobre as decisões e intervenções de caráter institucional do serviço de enfermagem, necessita alicerçar suas decisões em princípios éticos como justiça, respeito às pessoas, honestidade, veracidade, sigilo, beneficência a fim de manter-se íntegro em seu posicionamento para que seus posicionamentos sejam respeitados por estarem fundamentados em conhecimentos reconhecidos cientificamente como a ética e a bioética.

É a partir da exigência das relações éticas entre sujeitos envolvidos que surge a aproximação da ética com a bioética. Compreende-se que este ressurgimento foi provocado pelos questionamentos acerca do poder da ciência em encontrar soluções para problemas cotidianos, que não eram resolvidos com eqüidade, justiça e/ou beneficência(8).

Encontra-se um conceito de bioética, definindo-a como: “[...] um mecanismo de coordenação e serve como instrumento de reflexão para orientar o saber biomédico e tecnológico, em função de uma proteção cada vez maior e mais responsável da vida humana”(8:18). Assim, pode-se considerar que a bioética destina-se à proteção do ser humano, da vida humana, independentemente do contexto o qual esteja inserido.

Nesse sentido, o enfermeiro com cargo administrativo, por possuir inserido em seu objeto de trabalho o ser humano – profissional, cliente ou familiar - e, por atuar como co-responsável pela organização na respectiva instituição, desempenha a fundamental tarefa de definir posicionamentos e decisões que remetem a reflexões fundamentadas na ética e na bioética.

No sentido de tornar compreensível e aplicável os conhecimentos éticos e bioéticos, explicitou-se quatro princípios, que até o momento são os mais utilizados como referencial para abordagem de dilemas éticos na saúde e podem contribuir para a reflexão de situações da Enfermagem que remetem a tais conhecimentos. São eles: a Beneficência; a Não-maleficência; o Respeito à autonomia e a Justiça(13).

O principio da BENEFICÊNCIA é considerado o princípio fundamental para a assistência à saúde, por ser compreendido como uma ação a ser realizada em benefício ao outro. No desenvolvimento das atividades da Enfermagem, tal princípio deve ser evidenciado a todos os profissionais, de forma a conscientizá-los da importância de tal valor na execução de qualquer ação sobre o ser humano. No gerenciamento dos serviços da profissão, a beneficência deve ser considerada durante todo o processo de tomada de decisão do enfermeiro com cargo gerencial, de modo que a decisão resulte em fatores positivos sobre todos os seres humanos envolvidos.

O princípio da NÃO-MALEFICÊNCIA pode ser compreendido como a obrigação de não causar dano ao outro. Conforme o princípio anterior, a não-maleficência e a beneficência, podem parecer semelhantes e até confundirem-se em um único princípio, mas são distinguíveis; pois o primeiro se caracteriza como obrigação, por isso sua essência é não prejudicar, não causar danos; já a beneficência, não é obrigação, mas sim o resultado de uma ação coerente.

Na utilização deste princípio para reflexão e conseqüente tomada de conduta, é imprescindível estar atento e concentrado no contexto e, principalmente, nas crenças, valores e costumes pessoais, pois o que despercebidamente não causa dano a um determinado indivíduo, pode causar dano a outrem. No contexto da profissão, os profissionais devem primar em conhecer o ser humano a quem se destina o cuidado, na tentativa de compreender seus diversos aspectos sociais, políticos, econômicos, religiosos, entre outros, para executar ações que não interfiram de forma negativa em suas crenças. O enfermeiro na função de gestor necessita fazer com que suas ações atendam à instituição, aos profissionais e clientes envolvidos. Devido à complexidade de tais atividades, faz-se necessário adquirir conhecimento sobre ética e bioética, para subsidiar as decisões, de forma que satisfaça a todos.

O princípio do RESPEITO À AUTONOMIA pode ser definido como uma questão de ter capacidade de controlar ponderadamente e de se identificar com desejos e preferências próprias. O respeito à autonomia é o reconhecimento do direito da pessoa de ter suas opiniões, fazer suas escolhas e, de agir com base em suas crenças e valores pessoais, sem intervenções.

No fazer da Enfermagem, muitas vezes tal princípio é omitido pela preocupação central em executar as tarefas em tempo hábil. Tanto na assistência como no gerenciamento é imprescindível que os profissionais se conscientizem para a importância de tal princípio como ‘guia’ para toda a atividade a ser executada. Durante o cuidado, é necessário buscar a autonomia do cliente, para prestar um cuidado personalizado e respeitoso. No gerenciamento, o respeito à autonomia do funcionário contribui para este sentir-se mais valorizado e respeitado, permitindo sua participação em decisões, de forma que essas resultem em ações participativas e comprometidas pela equipe de enfermagem.

O último princípio, de JUSTIÇA, é entendido como uma palavra que possui como significado a distribuição eqüitativa, conforme respectivas prerrogativas, deveres e benefícios. O enfermeiro em todas as áreas do seu processo de trabalho necessita alicerçar suas atitudes neste princípio. Ao exemplificar, observa-se o profissional, no cargo gerencial possuindo inúmeras atividades em que necessita fazer escolhas de pessoas (para determinado cargo, atividade, horário, folga,) e, para isso, precisa deste princípio muito bem esclarecido, evitando interferências advindas de amizades ou parentescos. Este princípio não é de fácil utilização, por envolver uma análise crítica aprofundada da situação em questão para tomar determinados posicionamentos.

Percebe-se que o Enfermeiro gerencial ao realizar uma análise crítica a fim de determinar um posicionamento em uma situação do seu cotidiano profissional, principalmente que envolve seres humanos, necessita desses quatro princípios como subsídios para sua decisão. Nesse sentido, observa-se que os quatro princípios atuam indissociados, ou seja, se inter-relacionam e se interdependem. Assim pode-se compreender que ao utilizar o princípio de Respeito à Autonomia do ser humano, concomitantemente está sendo desenvolvido o princípio da Beneficência e, posteriormente será obedecido o princípio da Justiça, pois haverá dados específicos para subsidiar uma conduta justa e benéfica.Assim, considera-se essencial o conhecimento pleno dos quatro princípios a fim de aplicá-los relacionando-os, com vistas ao posicionamento mais adequado frente às situações.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme visto, o processo de trabalho da enfermagem se baseia em três formas de atuar para obter o produto final da enfermagem – cuidado -, no entanto essas três formas são de importância igualitária e desenvolvem-se concomitantemente para um único resultado. Ao centralizar o olhar sobre processo de trabalho administrativo, pode-se perceber que este se encontra desenvolvido em todas as atividades de enfermagem.

Ao compreender tal atividade gerencial, visualiza-se que suas ações, direta ou indiretamente, destinam-se e envolvem seres humanos - trabalhadores ou clientes. Desta maneira buscou-se a aproximação desta atividade com o conhecimento sobre ética e bioética, por conceber que tais conhecimentos são essenciais à profissão, pois fornecem embasamento teórico que sustentam um fazer com resultados mais efetivos, de forma a proteger os seres humanos. O reconhecimento da importância e utilização do conhecimento ético e bioético na assistência, no ensino e, principalmente, no gerenciamento da enfermagem, contribui para tomadas de decisões benéficas, justas, imparciais, íntegras, enfim, mais adequadas, por meio de reflexões baseadas em fundamentações teóricas de extrema credibilidade por todos envolvidos no processo de trabalho.

Finalizando, considera-se que a bioética pretende clarificar as soluções, analisando criticamente as circunstâncias concretas e servindo como guia para decisões e ações a serem executadas cotidianamente.


REFERÊNCIAS

1. Leopardi MT, Gelbcke FL, Ramos FRS. Cuidado: objeto de trabalho ou objeto epistemológico da enfermagem? Texto Contexto Enferm 2001 Jan-Abr; 10(1): 32-49.

2. Marcon PM. Proposta de um instrumento de auto-análise crítica para o Processo de Trabalho Gerencial da Enfermagem, fundamentado nos princípios da Bioética. [ Monografia ] Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2004.

3. Mesquita MPRL. A Dimensão Gerencial da Identidade profissional da (o) Enfermeira (o) na percepção da equipe de enfermagem: uma perspectiva de construção coletiva. [ dissertação ]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2002.

4. Ramos FRS, Martins CR. Ética e cotidiano: uma motivação para o debate em saúde. Texto Contexto Enferm 2002 Jul-Dez; 4(2): 60-72.

5. Abbagnano N. Dicionário de Filosofia. São Paulo:Martins Fontes; 2000.

6. Capella BB. Uma abordagem sócio-humanista para um “modo de fazer” o trabalho de enfermagem. Pelotas: Universitária/UFPEL; Florianópolis: Programa de Pós-Graduação em Enfermagem/UFSC; 1998.

7. Geovanini T. et al. História da Enfermagem: versões e interpretações. Rio de Janeiro: Revinter;1995.

8. Ramos, FRS. et al. Cuidado: essência da enfermagem. In: Prado ML, Gelbcke FL. Fundamentos de Enfermagem. 2a ed. Florianópolis: Cidade Futura; 2002. p.15-30.

9. Kurcgant P, coordenadora. Administração em Enfermagem. São Paulo: EPU; 1991.

10. Santos SR, Moreira RC. The nurse’s leadership: challenges of the practice. Online Brazilian Journal of Nursing (OBJN-ISSN 1676-4285) [ online ] 2004 December 3(3) Available in: www.uff.br/nepae/objn303santosetal.htm

11. Londono GM, Morera RG, Laverde GP. Administração Hospitalar. Tradução Marcelo T. de Alvear. 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2003. Título original: Administracion hospitalaria.

12. Fortes PAC. Ética e Saúde: questões éticas, deontológicas e legais. Autonomia e direitos do paciente. São Paulo: EPU;1998.

13. Beauchamp TL, Childress JF. Pricípios de Ética Biomédica. Tradução Luciana Pudenzi. São Paulo: Loyola; 2002. Título original: Principles of Biomedical Ethics.

 

 

Recebido: 28/06/2005
Revisado: 16/08/2005
Aprovado: 23/08/2005