ARTIGOS ORIGINAIS

 

Segurança do ambiente hospitalar para prevenção de quedas em idosos: estudo descritivo


Élide Vaccari1, Maria Helena Lenardt1, Mariluci Hautsch Willig1, Susanne Elero Betiolli1, Edinaldo Silva de Oliveira2

1Universidade Federal do Paraná
2Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná

 


RESUMO
Objetivo: avaliar a segurança do ambiente físico individual e coletivo para prevenção de quedas em idosos hospitalizados.
Método: estudo quantitativo descritivo de corte transversal. Foram avaliados 127 leitos e sua estrutura física, em três unidades de internação. Os dados foram coletados mediante checklist. Para análise, foi utilizado o software SPSS v.20.0 e empregada estatística descritiva e teste exato de Fisher para associação entre variáveis.
Resultados: as variáveis de segurança relacionadas ao ambiente individual apresentaram inconformidades com os padrões de segurança (77,7%), e não mostraram significância estatística para ocorrência de quedas. A estrutura física de uso coletivo não apresentou adequações quanto à circulação interna (42,8%) e às instalações sanitárias (66,6%).
Discussão: deve-se atentar para as inconformidades a fim de diminuir o risco de queda.
Conclusão: manter o ambiente intra-hospitalar conforme as normas técnicas e a atenção da equipe de enfermagem com o ambiente são imprescindíveis para a segurança e prevenção de quedas.
Descritores: Acidentes por Quedas; Enfermagem Geriátrica; Ambiente de Instituições de Saúde.

 

INTRODUÇÃO

Vários fatores inerentes ao próprio processo de envelhecimento podem determinar progressiva perda da capacidade de adaptação do idoso ao ambiente, principalmente em situações de mudança de local, como o hospitalar. Desse modo, a avaliação do ambiente no qual ele está inserido é essencial para o desenvolvimento de estratégias que auxiliem na prevenção de quedas.

Pensar em áreas seguras, que promovam uma ocupação pelo maior tempo possível para os idosos, é um grande desafio. É necessário um olhar atento, pois o ambiente pode ser um facilitador ou uma barreira para o desempenho físico desses indivíduos(1). Nesse sentido, o ambiente de internação hospitalar precisa ser seguro, favorecer a adaptação rápida, proporcionar segurança, funcionalidade, conforto e compensar as limitações impostas pelo processo de envelhecimento(2).

A expressão “segurança do paciente” é muito utilizada, porém raramente definida com clareza. Em sua forma mais elementar, pode ser conceituada como “o ato de evitar, prevenir e melhorar os resultados adversos ou as lesões originadas no processo de atendimento médico-hospitalar”(3:32).

A portaria nº 2.095 de 2013(4) aprovou os Protocolos Básicos de Segurança do Paciente e, entre esses, o “Protocolo de Prevenção de Quedas”, cuja finalidade é “reduzir a ocorrência de queda dos pacientes nos pontos de assistência”, em específico aos pacientes hospitalizados, abrangendo o período total de permanência. Segundo o protocolo, “todos os pacientes internados devem ter o seu risco de queda avaliado”; o resultado da avaliação precisa ser registrado em prontuário e medidas preventivas adequadas a cada paciente devem ser prescritas e implementadas(5:1).

O ambiente hospitalar é um mundo estranho ao idoso e pode acarretar experiências estressantes, uma vez que o adoecimento humano por si só constitui um acontecimento que gera ansiedade e insegurança(6).

O ambiente físico com sua estrutura, disposição do mobiliário, formas de utilização e material empregado, tem um papel relevante na ocorrência de quedas em idosos, respondendo por cerca de 30% a 50% desses eventos(7). As quedas sofridas pelos pacientes hospitalizados são uma das ocorrências mais importantes na quebra de segurança, e são frequentemente responsáveis pelo aumento do período de internamento e piores condições de recuperação(8).

No Brasil, uma investigação realizada sobre quedas intra-hospitalares de idosos hospitalizados em Belo Horizonte evidenciou que, em cada 1000 leitos, cerca de 3 a 13% dos indivíduos caem por dia(9). Outro estudo, realizado em nove setores de internação do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, constatou 58 eventos de quedas específicas do leito. Os dados revelaram que a maioria dos acidentes ocorreu em pacientes idosos (57%), do sexo masculino (50,9%), no período noturno (56,60%) e no setor de internação clínica (58%)(10).

A queda é um evento multifatorial de grande complexidade e, quando associada a um ambiente e contexto de cuidados, suscita a necessidade de uma investigação e formação contínua sobre os principais fatores de risco, incidências, consequências e medidas preventivas específicas (11). Diante do exposto, o objetivo do presente estudo foi avaliar a segurança do ambiente físico individual e coletivo para a prevenção de quedas de idosos hospitalizados.

 

MÉTODOS

Trata-se de estudo do tipo quantitativo descritivo de corte transversal, realizado em um hospital de ensino de grande porte e referência na atenção à saúde de alta complexidade, na cidade de Curitiba, Paraná. O estudo foi desenvolvido em três unidades de internação, nas enfermarias da Clínica Médica Masculina, Clínica Médica Feminina e Cirurgia Geral. A amostra foi composta pela avaliação do ambiente de uso individual, referente a 127 leitos ocupados por idosos de 60 anos ou mais, e da estrutura física de uso coletivo, no período amostral de abril a julho de 2013.

Os dados foram coletados mediante check list. No ambiente de uso individual, que se refere ao quarto ou espaço de uso privativo em uma enfermaria, foram investigadas as seguintes variáveis de segurança: presença de grades nos leitos, trava nas rodas, campainha, luz auxiliar, trava nos móveis deslizantes, fácil acesso aos pertences, acesso livre ao banheiro, uso de calçado antiderrapante e mobília organizada ao redor do leito. Para avaliação da estrutura física de uso coletivo, o cheklist foi estruturado segundo a NBR 9050/2004 da Associação Brasileira de Normas Técnicas(12), e consideradas as variáveis circulação interna, circulação vertical e instalações sanitárias. Com objetivo de subsidiar os registros do ambiente físico, foi utilizada uma máquina fotográfica digital modelo S. PL120.

Os dados foram codificados e organizados no programa computacional Excel 2007, digitados e submetidos à dupla conferência, para garantir a confiabilidade dos resultados. Para análise estatística utilizou-se o software Statistical Package for the Social Sciences - SPSS v.20.0, e empregada estatística descritiva (frequência absoluta e relativa) nas variáveis de segurança relacionadas à estrutura física de uso coletivo. Para a associação entre as variáveis qualitativas dicotômicas de segurança do ambiente de uso individual e a ocorrência de quedas, aplicou-se o teste exato de Fisher, indicado para amostras aleatórias independentes. Os resultados foram considerados estatisticamente significativos quando p<0,05, como margem de segurança de 95% de chance de acerto e 5% de chances de erro. O estudo foi aprovado no Comitê de Ética da instituição pesquisada, sob registro CAAE 14066113.2.0000.0096, parecer 231.500.

 

RESULTADOS

Na tabela 1 visualiza-se que no ambiente de uso individual, dos nove itens avaliados, 7 (77,7%) não estão em conformidade com os padrões de segurança da NBR 9050/2004. Destaca-se o padrão de conformidades para as camas, das quais 127 (100%) possuíam grades protetoras e rodas traváveis, e apenas 2 (1,6%) camas foram encontradas destravadas. Em todos os ambientes existia luz de cabeceira individual; contudo, a localização da mesma não favorece o acesso fácil do paciente, tanto pela altura, quanto pelo posicionamento do interruptor. Ainda, 14 (11%) das luzes de cabeceira não acendiam, seja por falta de lâmpada ou problemas elétricos (Tabela 1).

 

TABELA 1 – Associação entre as variáveis de segurança do ambiente de uso individual e a ocorrência de quedas. Curitiba, 2013

Variáveis

Resposta

Ocorrência de quedas durante a internação

Total de leitos

avaliados

Valor de p*

Não

Sim

N

n

n

%

Cama com grade

Não

---

---

---

---


---

Sim

118

9

127

100

Rodas travadas

Não

1

1

2

1,6


0,137

Sim

117

8

125

98,4

Luz de cabeceira

Não

13

1

14

11


1,000

Sim

105

8

123

89

Campainha próxima

Não

21

2

23

18,1


Sim

97

7

104

81,9

0,666

Acesso livre ao banheiro

Não

23

2

25

19,7


1,000

Sim

95

7

102

80,3

Móveis deslizantes sem travas

Não

5

0

5

3,9


1,000

Sim

113

9

122

96,1

Mobília Organizada

Não

20

0

20

15,7


0,353

Sim

98

9

107

84,3

Fácil acesso aos pertences

Não

13

0

13

10,2


0,596

Sim

105

9

114

89,8

Uso de calçado antiderrapante

Não

17

1

18

14,2


1,000

Sim

101

8

109

85,8

Legenda: *Teste Exato de Fisher

Fonte: os autores (2013)

 

Observa-se na Tabela 1 que a campainha foi identificada em todos os leitos e banheiros, entretanto 23 (18,1%) não se encontravam próximas ao paciente, o que impossibilitava o alcance para solicitar atendimento. Quanto à avaliação de circulação e organização do ambiente, 13 (10,2%) dos idosos não possuíam fácil acesso aos seus pertences, 122 (96,1%) ainda possuíam móveis deslizantes sem travas (mesinha de cabeceira), e para 25 (19,7%) o acesso ao banheiro não estava livre de objetos, foram constatadas as presenças de poltronas, pias e recipientes de lixo.

A associação entre as variáveis de segurança do ambiente de uso individual e a ocorrência de quedas não se mostrou estatisticamente significativa, mas revelou um percentual preocupante de 9 (7%) ocorrências entre os idosos hospitalizados no período da pesquisa.

Na avaliação da estrutura física de uso coletivo, dos 14 itens avaliados na circulação interna 6 (42,8%) deles não estavam em conformidade às orientações da NBR 9050/2004 (Quadro 1).

 

QUADRO 1 - Avaliação da estrutura física de uso coletivo - circulação interna. Curitiba, 2013


VARIÁVEIS

Resposta

UNIDADE DE INTERNAÇÃO

CMM

CMF

CCG

%

1.

O piso dos corredores e passagens é revestido com material não escorregadio?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

2.

O piso dos corredores e passagens é revestido com material regular, contínuo e durável?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

3.

O piso dos corredores e passagens tem nivelamento contínuo, sem degraus?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

4.

As escadas têm sinalização visual na borda do piso, em cor contrastante com a do acabamento (0,02 m e 0,03 m de largura)?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

5.

Obstáculos como lixeira, telefones públicos, extintores de incêndio e outros estão fora da zona de circulação?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

6.

A sinalização visual é em cores contrastantes?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

7.

Placas de sinalização e elementos suspensos projetados sobre a faixa de circulação estão à altura mínima de 210 cm em relação ao piso?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

8.

Pelo menos um telefone público está a uma distância mínima de 1,5 m em frente à porta do elevador?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

9.

As portas têm vão livre mínimo de 80 cm?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

10.

As maçanetas são do tipo alavanca?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

11.

Há sinalização indicando “Risco de Quedas”?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

12.

Há corrimão em ambos os lados da escada?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

13.

Há frisos antiderrapantes nas escadas?

Não

x

X

X

100

Sim

---

---

---

---

14.

O caminho a ser percorrido pelo paciente é livre e sem obstáculos?

Não

x

X

X

100

Sim

---

---

---

---

FONTE: Checklist adaptado segundo normas da NBR 9050/2004

 

No Quadro 1, observa-se as seguintes não conformidades: nos três setores pesquisados, o piso não é revestido de material antiderrapante; o telefone público não se encontra a distância mínima de 1,5 m em frente à porta de nenhum dos cinco elevadores do andar; não há sinalização indicando “Risco de Quedas”, nem frisos antiderrapantes e corrimão em ambos os lados da escada; o caminho a ser percorrido pelo paciente não está livre e sem obstáculos.

A circulação vertical, referente aos elevadores, está padronizada nos três setores e todos estão de acordo com as normas, exceto referente à existência de sinalização tátil de alerta na porta dos elevadores (Quadro 2).

QUADRO 2 - Avaliação da estrutura física de uso coletivo - circulação vertical (elevadores). Curitiba, 2013.


VARIÁVEIS

Resposta

UNIDADE DE INTERNAÇÃO

CMM

CMF

CCG

%

1.

A porta de elevador tem vão mínimo de 80 cm?

Não

---

----

---

---

Sim

X

X

X

100

2.

O tempo de permanência da porta aberta está entre 5s e 15s?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

3.

O elevador tem dimensão mínima de cabine de 110 cm por 140 cm?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

4.

O revestimento do piso da cabine tem superfície dura e antiderrapante, permitindo uma fácil manobra da cadeira de rodas?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

5.

O piso da cabine tem cor contrastante com a do piso do pavimento?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

6.

Ao abrir a porta, o piso do elevador se encontra no mesmo nível que o piso do saguão, sem formação de desnível?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

7.

Existe sinalização tátil de alerta às portas dos elevadores, em cor contrastante com a do piso, com largura entre 0,25 m a 0,60 m.?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

8.

Os comandos de emergência estão agrupados na parte inferior do painel de comandos da cabine?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

Fonte: Cheklist adaptado segundo normas da NBR 9050/2004

 

Quanto às instalações sanitárias (Quadro 3), verifica-se que dos seis itens avaliados, 4 (66,6%) não estão em conformidade às normas da NBR 9050/2004. Não existem barras padronizadas na lateral e no fundo, junto à bacia sanitária para apoio e transferência nas três unidades, e nenhum sanitário possuía barras ao fundo. Os vasos sanitários não estão na altura adequada, o piso não é antiderrapante e possui desníveis, além de não haver sinalização evidenciando “Risco de Quedas”. Infere-se que os sanitários dos três setores não estão em conformidade com as normas da NBR 9050/2004, tornando-se um fator predisponente a quedas.

 

QUADRO 3 - Avaliação da estrutura física de uso coletivo – instalações sanitárias. Curitiba, 2013

VARIÁVEIS

Resposta

UNIDADE DE INTERNAÇÃO

CMM

CMF

CCG

%

1.

Existem barras na lateral e no fundo, junto à bacia sanitária, para apoio e transferência?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

2.

As bacias sanitárias estão a uma altura entre 0,43 m e 0,45 m do piso acabado, medidas a partir da borda superior, sem o assento?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

3.

Existem barras de apoio próximas ao chuveiro?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

4.

O box possui abertura com fácil acesso?

Não

---

---

---

---

Sim

X

X

X

100

5.

O piso instalado é antiderrapante e sem desníveis?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

6.

Há sinalização indicando “Risco de Quedas”?

Não

X

X

X

100

Sim

---

---

---

---

Fonte: Cheklist adaptado segundo normas da NBR 9050/2004

 

DISCUSSÃO

Na instituição onde se realizou a presente pesquisa, todas as camas das unidades de internação são elétricas, com controle remoto independente acoplado às laterais superiores da cama e dispensam o uso de escadinhas, proporcionando maior segurança e conforto. Todas possuem grades que abrem somente pelo lado de fora, induzindo o paciente a solicitar auxílio da equipe de enfermagem ou do acompanhante para abrir as grades, ao sair do leito. Manter as grades elevadas é um fator de proteção para os idosos; entretanto, pode se tornar um elemento predisponente na manutenção do paciente no leito por períodos prolongados, induzindo à síndrome de imobilidade e consequentemente à cascata de dependência. Pode ainda se transformar em um fator de risco para o idoso sem acompanhante que, ao insistir em sair do leito sozinho, passa por cima das grades de proteção sujeitando-se à ocorrência de quedas.

Nesse sentido, a literatura(13) aponta a necessidade de eliminar os riscos ambientais, como excesso de conversas ou barulho; iluminação inadequada e problemas de revestimento; cama em posição baixa com rodas travadas e grades laterais abaixadas (ou conforme política por unidade), pois quando as grades laterais estão fechadas, as quedas podem ser mais prováveis. Os autores afirmam também que manter a cama na altura certa, 100% a 120% do comprimento inferior da perna do paciente também auxilia a minimizar o risco de quedas.

Vários pacientes relataram que não gostam de utilizar a campainha para não atrapalhar a equipe de enfermagem, nem a luz de cabeceira para não incomodar quem está ao lado. Não raramente, o idoso se sente constrangido ao solicitar a presença dos componentes da equipe de enfermagem para ações de necessidades básicas, como beber água ou ir ao banheiro, o que pode ser determinante para ocorrência de acidentes por queda. A atenção dispensada pela equipe também contribui para a escolha do paciente de usar ou não a campainha. Se ele a utilizar e for ignorado, mal atendido ou ocorrer grande demora no atendimento, provavelmente terá uma percepção negativa.

Relacionado à atenção da equipe de enfermagem ao atendimento da campainha, um estudo realizado em quatro hospitais do meio oeste dos Estados Unidos da América, com 641 profissionais de enfermagem revelou que 49% dos funcionários reconhecem que atender imediatamente é uma iniciativa importante para a segurança do paciente. Ainda, 77% concordam que essas chamadas são significativas e promovem proteção(14). Orientar a equipe de enfermagem para o atendimento imediato das solicitações pelas campainhas auxilia na promoção de um atendimento adequado e seguro. Também é necessário programar com a equipe da infraestrutura revisões periódicas tanto das campainhas como das luzes de cabeceira. Salienta-se a importância da conscientização do paciente sobre a iluminação adequada no período noturno.

As diferenças entre o espaço hospitalar e o doméstico, com o seu movimento próprio e alterações de espaço e organização, podem representar grandes mudanças, principalmente para os mais idosos ou com maior dificuldade de ajustamento a alterações do seu ambiente(11). A facilidade de acesso aos pertences, a organização do ambiente e o uso de calçados antiderrapantes são fatores contributivos para prevenir o risco de quedas.

Quanto à organização do ambiente, ressalta-se estudo documental que apontou que 15 (60%) dos profissionais consideraram como ponto negativo a existência de vários objetos e mobiliários na enfermaria, dificultando a circulação(2). O uso de calçados antiderrapantes é uma prática estimulada no ambiente hospitalar já inserida no protocolo de prevenção, e representa uma estratégia simples, mas de forte adesão pelos idosos. Em quatro hospitais de Nova York e um da Alemanha, fazem parte do kit de prevenção o uso de pulseira amarela e chinelo antiderrapante amarelo ou vermelho como identificador de paciente para risco de quedas(15).

A avaliação dos fatores de risco em pacientes internados constitui um cuidado que precisa ser desenvolvido no momento da internação e durante todo o período em que permanecem hospitalizados. Para ajudar a garantir a segurança do paciente em um ambiente hospitalar, a “enfermeira necessita direcionar uma visão de 360 graus do quarto cada vez que entrar e sair”(13:7). A percepção da profissional em relação aos possíveis riscos que o ambiente apresenta é fundamental para a prevenção de acidentes por quedas.

O ambiente de uso individual e privativo é o local de maior permanência e mobilidade durante a internação. São indispensáveis o conforto, a segurança e a facilidade de locomoção, pois promovem maior independência ao idoso hospitalizado.

Nesse sentido, o percentual de 7% na ocorrência de quedas entre idoso hospitalizados é considerado alto para os padrões internacionais(15); no entanto, no Brasil ainda não temos uma conclusão a respeito de um padrão aceitável. Um estudo desenvolvido na cidade de São Paulo abrangendo todos os pacientes das unidades de internação (200 leitos) de um hospital privado de alta complexidade e acreditado pela Joint Commission International, notificou 80 eventos de queda entre janeiro e dezembro de 2008. O local apresentou um índice de 1,45 queda/1.000 pacientes-dia e as unidades que mais contribuíram com esse índice foram a Clínica Médica, Neurológica e a Oncologia, perfazendo respectivamente 2,79; 2,77 e 2,41 quedas/1.000 pacientes-dia. Nas demais unidades, a incidência variou entre zero e 1,66 queda/1.000 pacientes-dia. O índice 2,0 foi considerado como de alerta(16).

No que se refere à estrutura física, as áreas de atendimento de uso comum, como corredores, escadas e elevadores precisam oferecer os espaços adaptados às necessidades dos idosos. Na Clínica Cirúrgica, encontram-se pelos corredores maca e mesinhas com rodas deslizantes para procedimentos assistenciais. Na Clínica Médica Masculina estão alocados no corredor o carrinho de emergência, mesinhas com rodas deslizantes para materiais de uso nos isolamentos e geladeira para exames. Na Clínica Médica Feminina também se encontram mesinhas com rodas deslizantes e armário para estagiários, o que dificulta a circulação livre pelo hospital.

A inexistência de sinalização tátil na porta dos elevadores (ela apenas possui indicação visual em cor contrastante com a do piso), de placas de identificação das áreas de risco para quedas, de faixas antiderrapantes e a presença apenas um corrimão nas escadarias são fatores extrínsecos que contribuem para ocorrência de quedas durante o internamento.

Segundo a WHO(17), a queda pode ocorrer mesmo em percursos com rotas bem conhecidas, como consequência de design inadequado dos edifícios e pouca atenção aos fatores de segurança. Os principais fatores problemáticos são obstáculos sem sinalização clara, superfícies escorregadias, iluminação inadequada e distâncias longas entre áreas de espera e sanitários.

Dentre as ações preventivas, a NBR 9050/2004(12) preconiza a inclusão de corrimão bilateral e frisos antiderrapantes nas escadarias, sinalização de alerta como placas escritas “risco de quedas” e sinalização tátil em frente à porta dos elevadores. Oferecer autonomia e segurança nos ambientes necessários à circulação do paciente na instituição hospitalar evita risco de quedas e aperfeiçoa a qualidade da assistência prestada.

Independente do seu caráter, as instituições são responsáveis pela segurança dos usuários, e “nos hospitais, há necessidade de regras e normas destinadas a definir e regulamentar a acessibilidade e segurança dos ambientes, como uma forma de prevenção e segurança no deslocamento entre as pessoas” (18:585).

A adequação da estrutura física do banheiro às condições de fragilidade do idoso internado e ao padrão básico de segurança é indispensável. Referente ao uso dos sanitários, destacam-se como riscos ambientais a presença de pisos escorregadios e desníveis do piso entre a área de circulação do banheiro e o box do chuveiro, a falta de barras de apoio nos banheiros e os assentos sanitários de altura inadequada(12).

De forma geral, o banheiro é apontado como o local onde ocorrem quedas. A necessidade do uso de medicamentos como diuréticos, laxantes e/ou preparos para exames durante o internamento podem desencadear frequência e urgência nas eliminações fisiológicas. Diante dessas ocorrências, o idoso tende a levantar várias vezes durante a noite para ir ao banheiro, expondo-se ao risco de quedas. Entretanto, a maioria dos estudos realizados no ambiente hospitalar(9,16,19) aponta o quarto/enfermaria, seguido do banheiro, como os locais mais comuns de ocorrência das quedas.

Em estudo realizado no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia do Rio de Janeiro (INTO), cujo objetivo foi avaliar o perfil de quedas identificando os pacientes de risco, de 35 notificações de eventos adversos os pesquisadores encontraram quedas em 34 delas, com incidência de 55,8% na enfermaria e 44,1% no banheiro(19). Corroboram com esses dados os achados no estudo desenvolvido em um hospital privado na cidade de São Paulo, Brasil, que registrou a notificação de 80 quedas intra-hospitalares, sendo 52 (65%) ocorrer no quarto e 21 (26,3%) no banheiro(16). Estudo(20) revelou que, dos 245 eventos institucionais notificados em 30 meses, 42 (17,1%) referem-se a falhas na infraestrutura física do prédio hospitalar.

Nessa perspectiva de estrutura física, atentar para itens que não estão em conformidade é primordial, a fim de eliminar fatores expressivos de risco para queda nas instalações sanitárias. Classificar o paciente quanto ao risco de queda e orientá-lo sobre prevenção são cuidados básicos e essenciais que reduzem e evitam o evento durante o internamento e até mesmo em sua residência.

Desse modo, as orientações e cuidados por parte da equipe de saúde precisam ser realizados de forma contínua, iniciadas na admissão e prolongadas no período da internação. São medidas prudentes evitar que os idosos se levantem sem auxílio e voltar a atenção quando eles se dirigirem ao banheiro(19:85). Para orientar o idoso internado, é fundamental que o profissional de enfermagem conheça as possibilidades de risco a que estão sujeitos no ambiente hospitalar, suas limitações temporárias ou definitivas e compartilhe com eles as ações necessárias para prevenção de quedas.

 

CONCLUSÃO

O ambiente hospitalar é propício às quedas. Manter a estrutura física conforme padrões de segurança são medidas preventivas de quedas.

O hospital, local do presente estudo, possui boa infraestrutura nas alas das enfermarias, com a presença de camas com grades e sistema elétrico que permite adaptar a posição e a altura da cama conforme seja necessário. Considera-se o ambiente organizado com campainha e luz de cabeceira em todas as enfermarias e banheiros. No entanto, alguns objetos de risco se encontram nas enfermarias, como os móveis de cabeceira deslizantes sem travas, a campainha fora do alcance do paciente e a pavimentação lisa.

Aponta-se como destaque negativo as instalações sanitárias, que não estão de acordo com a legislação vigente e oferecem risco para ocorrência de quedas. Recomenda-se realizar levantamento das condições dessas instalações e apresentar propostas de adequação conforme NBR 9050/2004 à direção da instituição. Do mesmo modo, providenciar frisos antiderrapantes nas escadarias e sinalizar espaços críticos, retirar ou adaptar os desníveis no piso do banheiro e complementar a instalação de barras de apoio, assim como na parte externa do chuveiro, para proporcionar ponto de apoio no momento do paciente se vestir, evitando utilizar a pia como barra de segurança.

A ausência de significância estatística entre as variáveis de segurança do ambiente de uso individual e a ocorrência de quedas indica a necessidade de mais estudos relacionados à temática, abrangendo os fatores intrínsecos e comportamentais dos idosos internados.

Tendo em vista que não existe um índice de prevalência de quedas intra-hospitalar em idosos considerado aceitável, entende-se como indispensável a elaboração de uma metodologia de avaliação padronizada desse evento adverso. Essa padronização permitiria estabelecer comparações entre instituições hospitalares, e os resultados poderiam ser voltados aos processos desenvolvidos para qualidade da assistência e aprimoramento da infraestrutura.

Entende-se como necessária a implantação do Protocolo de prevenção de quedas proposto pela Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)(5) em todos os hospitais,. O documento estipula a formação de um Núcleo de Segurança do Paciente com a finalidade de aplicar e fiscalizar regras sanitárias e protocolos de atendimento, e prevenir quanto a falhas de assistência. Acredita-se que os hospitais que tiverem o protocolo implementado possam criar equipes multiprofissionais ou comissões próprias para cada clínica, com a função de supervisionar e atualizar as atividades e cuidados referentes à prevenção de quedas. Isso permitirá a identificação do perfil e do índice nacional de ocorrência desse evento adverso intra-hospitalar.

Diante dos resultados obtidos, ressalta-se que manter o ambiente intra-hospitalar conforme as normas técnicas e a atenção da equipe de enfermagem com o ambiente são imprescindíveis para a segurança e a prevenção de quedas.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido: 18/05/2014

Revisado: 16/062014
Aprovado:
30/06/2014