ARTIGOS ORIGINAIS
Percepções de adolescentes grávidas sobre o papilomavírus humano: estudo exploratório
Ana Cristina Pereira de Jesus Costa1, Dianne Rose Mesquita Almeida2, Marcelino Santos Neto1, Thiago Moura de Araújo3, Márcio Flávio Moura de Araújo3, Neiva Francenely Cunha Vieira4
1Universidade Federal do Maranhão
2Secretaria Municipal de Saúde de Chapadinha
3Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
4Universidade Federal do Ceará
RESUMO
Objetivo: analisar a percepção de adolescentes grávidas em relação ao papilomavírus humano (HPV).
Método: estudo exploratório, qualitativo, realizado entre abril e maio de 2012 em área domiciliar de equipe da Estratégia Saúde da Família de Imperatriz/MA. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas no domicílio com nove adolescentes grávidas. Para os dados, utilizou-se a análise de conteúdo.
Resultados: ficou perceptível que as concepções das adolescentes grávidas sobre o HPV ainda são confusas e errôneas, pois elas atribuem características comuns às doenças sexualmente transmissíveis (DST) ao HPV, não sabendo definir quais são suas características específicas. Possuem total desconhecimento sobre as implicações que o vírus pode trazer durante a gestação.
Conclusão: o HPV ainda é um assunto de muitas incertezas para as adolescentes no que diz respeito às questões que o envolvem, sobretudo no período gestacional, o que aumenta a vulnerabilidade de jovens grávidas em relação ao vírus.
Descritores: Adolescente; Gravidez; Doenças Sexualmente Transmissíveis; Enfermagem.
INTRODUÇÃO
Este estudo tem como proposta analisar a percepção de adolescentes grávidas em relação ao papilomavírus humano (HPV). Fundamenta-se no fato de que a gestação na adolescência é considerada um real fator de risco para infecção pelo HPV, visto que o vírus pode atingir grandes proporções decorrentes do aumento da vascularização no canal vaginal. As alterações hormonais e imunológicas que ocorrem neste período também influenciam(1-2).
Para as adolescentes com HPV, a gravidez é uma condição potencialmente grave, uma vez que os vírus dos tipos 16 e 18 podem causar papilomas laríngeos em recém-nascidos e crianças, além de hemorragia associada ao parto vaginal e verrugas genitais que crescem rapidamente e acarretam obstrução mecânica do canal de parto no final da gestação(2).
O HPV é um agente infeccioso que ataca o sistema genital feminino, manifestando-se por meio de lesões conhecidas como condiloma acuminado, verruga genital ou crista de galo. É um DNA vírus não cultivável do grupo pavovírus que possui mais de 100 tipos. Os de alto índice oncogênico, quando associados a outros cofatores como multiparidade, precocidade da atividade sexual, história de doenças sexualmente transmissíveis (DST) e os tipos virais conhecidos, como o 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 46, 51, 52, 58, 59 e 68, presentes no organismo, têm relação com o desenvolvimento das neoplasias intraepiteliais e do câncer invasor do colo uterino(3).
A prevalência desse vírus é alta e guarda uma relação estreita com o desenvolvimento do câncer cervical, haja vista que mais de 90% das mulheres que apresentam câncer de colo do útero tiveram HPV. A infecção pelo HPV atinge jovens no início da atividade sexual, e em até 80% dos casos isto é transitório, existindo maior prevalência em mulheres com idade inferior a 25 anos(4).
Durante a adolescência, alguns acontecimentos como a menarca e outras alterações biológicas, responsáveis por uma série de eventos psicológicos que culminam na aquisição da identidade sexual, vêm acontecendo precocemente. A desinformação sobre esses eventos biológicos leva a adolescente à exposição a inúmeros riscos físicos, psíquicos e sociais e, consequentemente, às infecções por DST, por desconhecimento do seu sistema reprodutor e das formas de transmissão(5).
A relação entre o conhecimento e o risco da infecção por HPV na adolescência considera o início e o histórico das atividades sexuais como fatores de grande influência na frequência de infecções por esse vírus. O desconhecimento feminino no que diz respeito às formas de transmissão, os sinais e sintomas desencadeados pelo HPV podem sugerir falhas nas estratégias preventivas dos serviços de saúde(6-7).
Dentre os fatores que facilitam a infecção pelo HPV em mulheres destaca-se o não uso do preservativo nas relações sexuais, o que torna a gestante suscetível à possibilidade de adquirir a infecção(7). No Brasil, o preservativo ainda é pouco utilizado, principalmente entre os adolescentes. Dados do Ministério da Saúde apontam os índices de uso do preservativo em torno de 0,2 a 1,4% pela faixa etária de 15 a 19 anos(4).
A adolescência é uma fase em que a atividade biológica cervical está em nível máximo; a replicação celular e as substâncias presentes no meio cervical facilitam a infecção pelo HPV(5). É uma fase de intensas mudanças físicas, sexuais, psíquicas e sociais advindas da descarga dos hormônios sexuais acompanhada pela descoberta do corpo, dos órgãos sexuais e, consequentemente da sexualidade. Atrelado a isso estima-se que, no Brasil, um milhão de nascidos vivos sejam filhos de mães com idade entre 10 e 19 anos, o que corresponde a 20% do total (8). Dessa maneira, o quantitativo de gestantes adolescentes é significativo.
Ao se levar em conta que durante a gravidez e na adolescência o uso do preservativo é baixo e que ele é fundamental para prevenção do HPV e DST, uma estratégia eficaz de informação é a realização de trabalhos de prevenção voltados para a promoção da saúde com ações educativas nos serviços de saúde: esclarecimento sobre as formas de transmissão, diagnóstico, tratamento, do que se trata a doença, o que a infecção pode causar no corpo da mulher e na criança(9).
Nessa perspectiva, a parceira entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação por meio do Programa Saúde e Prevenção nas Escolas possibilita um conjunto de ações no ambiente escolar que visam à redução da vulnerabilidade dos adolescentes às DST, à infecção pelo HIV e à gravidez precoce, com ênfase na promoção da saúde por meio de ações educativas de prevenção e ampliação do acesso dessa população ao preservativo. Assim, é necessário repensar de que forma essas ações estão sendo implementadas nas escolas, visto que a permanência desses atos pelos profissionais de saúde contribui significativamente para que a população adolescente se torne esclarecida sobre o HPV e possivelmente sensível a adotar comportamentos sexuais mais seguros e saudáveis(10).
Torna-se fundamental tal abordagem diante das evidências da relação delicada entre conhecimento sobre o HPV e a saúde das adolescentes grávidas, da vigilância mundial quanto à magnitude do HPV e da restrição de pesquisas de enfermagem envolvendo essa temática. Ademais, no município de Imperatriz, o segundo maior do estado do Maranhão, até o momento não há registro de manuscritos publicados que tenham procurado conhecer as percepções de adolescentes grávidas acerca do HPV e suas repercussões gestacionais. Além disso, os estudos encontrados com essa temática são essencialmente quantitativos.
A relevância de pesquisas como esta se alicerça na importância da prevenção da infecção pelo HPV para a saúde gestacional e na escassez de estudos em populações específicas, tais como as adolescentes grávidas. Dessa forma, o estudo tem por objetivo analisar a percepção de adolescentes grávidas em relação ao papilomavírus humano.
MÉTODO
Trata-se de um estudo exploratório, com abordagem qualitativa, realizado entre abril e maio de 2012 em área adstrita de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) da Estratégia Saúde da Família (ESF) do Município de Imperatriz.
Inicialmente seriam entrevistadas 15 adolescentes grávidas cadastradas na ESF do estudo. No entanto, considerando a recusa de quatro adolescentes e o fato de que duas entraram em trabalho de parto no período da pesquisa, estas foram excluídas da pesquisa. Assim, as entrevistas foram realizadas apenas com nove adolescentes, na faixa etária de 10 a 19 anos de idade, grávidas e cadastradas na ESF da UBS participante do estudo. Para a definição da faixa etária foi definido o conceito dado pela Organização Mundial de Saúde(11), que considera a adolescência a idade elegível do presente estudo.
Foi utilizada a técnica da entrevista semiestruturada realizada no domicílio das adolescentes e conduzida pela primeira autora, mediante a utilização de questões abertas relativas ao objetivo da pesquisa proposta. Em média, as entrevistas previamente agendadas duraram de 45 minutos a 1 hora e foram gravadas por meio de um gravador de voz MP3 após o consentimento das participantes e dos responsáveis legais das menores de idade. O agendamento das visitas domiciliares ficou a critério das adolescentes.
Durante a primeira visita, houve a explanação dos objetivos e metodologia do estudo, seguida pela leitura e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) para o desenvolvimento do estudo. Na sequência, fez-se o registro dos dados sociodemográficos, obstétricos, sexuais, entre outros. Nas demais três visitas, os questionamentos das entrevistas e a interação pesquisador/pesquisadas convergiram no sentido de se conhecer as percepções das adolescentes grávidas sobre o HPV.
Para a análise dos dados, considerou-se o referencial da análise qualitativa de conteúdo(12), seguindo os passos de identificação, codificação e categorização. Isso implica que o pesquisador deve procurar o significado de passagens específicas e alocá-las em categorias apropriadas.
Assim, primeiramente, houve a descrição das adolescentes, seguida da transcrição dos dados coletados, para uma leitura criteriosa e a organização dos depoimentos. Nesse último passo observaram-se a conformidade e semelhança dos depoimentos, os quais, finalmente, foram alocados em categorias temáticas.
Como princípio ético global, a pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (CEP-HUUFMA) sob o Protocolo 4545/10.
RESULTADOS
São apresentados em duas etapas: a primeira foi constituída pela caracterização das participantes do estudo e a segunda pela descrição das falas resultantes das entrevistas na íntegra, selecionando-se dois temas: “O que é Papilomavírus humano (HPV)?” e “HPV e gravidez”. No primeiro e no segundo temas foi investigado o conhecimento das entrevistadas sobre o HPV e a relação com a gravidez, respectivamente.
Caracterização das participantes do estudo
As nove participantes do estudo apresentam idade entre 13 e 19 anos. Em relação ao nível de escolaridade, uma possui o ensino fundamental incompleto, duas possuem ensino fundamental completo, quatro possuem ensino médio incompleto e duas possuem ensino médio completo. Ressalte-se que as três adolescentes que possuem ensino fundamental incompleto e completo são primíparas. Quanto ao estado civil, duas disseram ser casadas, uma é solteira mas com namorado fixo, e seis relataram união estável. Entre as nove participantes, apenas uma trabalha, sendo as demais estudantes.
Quando questionadas sobre a vida sexual, relataram ter tido a primeira relação com idade em torno de 13 a 16 anos. Quanto ao número de parceiros nas relações sexuais, seis disseram ter tido somente um até o momento, entretanto três relataram ter tido de dois a quatro parceiros.
No que diz respeito ao uso de anticoncepcionais, quatro disseram nunca ter feito uso de nenhum tipo de anticoncepcional, três já fizeram uso de anticoncepcional oral e duas disseram ter usado contraceptivo de emergência. Sobre o uso do preservativo, seis disseram utilizar o preservativo e três disseram não ter utilizado nas relações sexuais anteriores. Entre as que não utilizaram, apenas uma disse não ter adotado o preservativo em nenhuma das relações sexuais; e entre as que utilizaram, duas relataram o uso em todas as relações sexuais e seis em metade delas. Durante o estudo, como referido pelas adolescentes, observa-se que algumas destas têm preferência pelo uso de contraceptivo oral em detrimento do uso regular do preservativo durante as relações sexuais, por terem a concepção de que somente utilizando o contraceptivo oral estão autoimunes aos riscos de contrair uma DST, em especial o HPV. Salienta-se que a adolescente que referiu não utilizar o preservativo nas relações sexuais possui união estável.
Em se tratando das DST, todas as adolescentes possuem conhecimento simplificado relacionado às mesmas; cinco relataram já ter apresentado alterações em seu aparelho genital e quatro nunca perceberam nenhuma alteração; nos órgãos genitais do parceiro, todas disseram nunca ter percebido nenhuma mudança. Quanto a realizar tratamento anterior de alguma DST, apenas uma referiu ter feito uma vez tratamento para tricomoníase.
No que tange à gestação, duas estão no primeiro trimestre da gravidez, cinco no segundo trimestre e duas no terceiro, sendo que destas, cinco são primíparas, quatro tiveram uma ou mais gravidezes anteriores, duas tiveram aborto e duas possuem filhos vivos.
Em relação ao exame Papanicolau, seis jovens relataram tê-lo realizado e três afirmaram nunca ter feito. Entre as seis que realizaram, quatro o fizeram nos últimos três meses, e duas nos últimos oito meses. Apenas duas não voltaram para buscar o resultado, e quatro retornaram ao serviço de saúde para a entrega do resultado. Quanto à frequência da realização desse exame, apenas uma relatou realizar com tempo superior a 12 meses, uma relatou fazer pela primeira vez e quatro relataram fazê-lo entre seis e 12 meses.
O que é HPV?
Ao realizar as entrevistas, observou-se que a percepção das adolescentes grávidas sobre o HPV apresenta definições variadas, direcionando características dessas doenças no geral como sendo do HPV, demonstrando desconhecimento sobre o que seja de fato o vírus. O HPV é uma infecção pouco abordada entre o público adolescente (em que o foco prioritário é dado às demais DST), como se pode observar nas três falas abaixo:
Eu sei que é uma doença do corpo humano, que atinge mulher e homem, que é tipo uma infecção que tem que fazer o exame de prevenção. (Adolescente 1)
Para mim é uma doença que não é difícil de tratar não, não é uma doença perigosa, porque se tratar vou me curar, mas se não tratar vira um câncer [...] (Adolescente 2)
Eu já ouvi falar na escola. Eu sei que é uma DST que se transmite através da relação sexual, podendo causar feridas e verrugas no útero da mulher. (Adolescente 3)
Acho que esse HPV deve ser algum tipo de DST [...] (Adolescente 4)
Em alguns relatos também é visível que as percepções sobre o HPV apresentem-se desconexas e com significados diferentes a real definição, como se pode perceber a seguir:
HPV deve ser coceira e corrimento. Eu acho que deve deixar a vagina da mulher ferida. (Adolescente 5)
Não sei o que é HPV. Causa uma doença é? (Adolescente 6)
Eu sei que pega HPV pelo sangue [...](Adolescente 7)
A partir das falas dessas adolescentes, observa-se que as suas percepções sobre o HPV ainda são errôneas, pois elas atribuem características comuns às DST ao HPV, não sabendo definir quais as características que são específicas desses vírus.
HPV e gestação
Investigaram-se ainda as implicações que o HPV pode trazer durante a gestação, considerando o fato de se que as adolescentes estavam no período gestacional. Ressalta-se que novamente observou-se o total desconhecimento pelas adolescentes grávidas sobre as implicações para a gestante e o feto quando infectadas pelo HPV. Esta situação pode ser verificada nas falas abaixo:
Não sabia nem que ‘ele’ pegava na criança. (Adolescente 1)
Essa doença eu não sei não, nunca me falaram sobre isso. O que é que causa? Eu pensava que só atingia a mulher, mas o bebê não. (Adolescente 2).
Eu pensei que por causa do bebê eu não pegava essa doença. (Adolescente 9)
Entre os métodos contraceptivos utilizados pelas entrevistadas, o preservativo foi citado poucas vezes como forma de prevenção ao HPV. Segundo as adolescentes, o uso ainda está condicionado à prevenção somente da gravidez, levando-as a relatar concepções de que o mesmo seja desnecessário durante a gestação como método preventivo de DST. Essa assertiva pode ser vislumbrada nos depoimentos abaixo:
Não uso. Porque a gente usa preservativo é para evitar a gravidez; depois que eu engravidei, não evita mais. Eu usava mais era pra evitar a gravidez. A maioria das pessoas nem se importa com as doenças. (Adolescente 8)
Usei algumas vezes. É porque às vezes a gente confia, às vezes desconfia do parceiro [...] e se estou grávida, para que usar? (Adolescente 7)
Usava mesmo porque tinha medo de ficar grávida, mas depois que engravidei nunca mais usei. (Adolescente 5)
As entrevistadas também relataram sobre os motivos que as impediram de utilizar o preservativo em todas as relações sexuais, sendo observada a ausência da prática de proteção às DST e à gravidez. Elas utilizaram como justificativas a confiança conjugal de seus parceiros, a insatisfação nas relações com preservativo ou ainda o esquecimento. Essa situação é observada a seguir:
Muitas vezes não tinha a camisinha no momento, e outras nós esquecemos de usar. (Adolescente 5)
Não usei camisinha porque até o momento eu só transei com duas pessoas, e os dois foram meus namorados. (Adolescente 6)
Eu não usava preservativo às vezes porque sem o preservativo a relação é melhor, e por confiança no meu esposo. (Adolescente 2)
Nessa perspectiva, observa-se que a atitude das adolescentes grávidas em optar por não utilizar o preservativo sugere uma despreocupação com os riscos eminentes de adquirirem infecções durante as relações sexuais.
Estudos envolvendo adolescentes grávidas detectaram que 53% das adolescentes que engravidam completam o ensino médio, enquanto que esses dados correspondem a 95% entre as adolescentes que não engravidam. Possuir melhor escolaridade é considerado fator contribuinte para um nível de conhecimento mais apurado e uma estrutura familiar mais sólida, em que os pais participam ativamente do crescimento e desenvolvimento dos seus filhos e favorecem a discussão sobre temas como gravidez e DST(11). Isso diverge da situação encontrada entre a maioria das adolescentes grávidas do presente estudo.
As informações relatadas pelas participantes acerca do estado civil refletem um pouco sobre sua iniciação sexual. De acordo com o Ministério da Saúde, os adolescentes brasileiros têm iniciado a vida sexual precocemente e mantêm um maior número de parceiros; 36% dos jovens entre 15 e 24 anos expuseram ter tido a primeira relação sexual antes dos 15 anos de idade, enquanto que apenas 21% dos jovens entre 25-29 anos tiveram a primeira relação nesta faixa(12).
Sendo a adolescência uma fase em que o indivíduo passa por mudanças, especialmente relacionadas à maturação sexual - em que há experimentação e variabilidade de parceiros, quando acompanhada de fatores como o baixo nível socioeconômico, a baixa escolaridade e o baixo conhecimento, aponta para uma maior probabilidade ao acontecimento de atividade sexual precoce(8,12).
Destaca-se, ainda, conforme observado no presente estudo, o surgimento de novas conformações de relacionamentos entre os adolescentes, tal como a união estável. A partir da Lei 9.278 de 10 de maio de 1996, a união estável é reconhecida como entidade familiar entre um homem e uma mulher, exercida contínua e publicamente, semelhante ao casamento, quando os parceiros convivem de modo duradouro, estabelecida com objetivo de constituição de família, apresentando-se como marido e mulher(13).
Mesmo diante de relacionamentos estáveis, geralmente no início da vida sexual, os adolescentes quase sempre não fazem uso de métodos contraceptivos, que os deixam protegidos de uma gravidez não planejada, o que pode tornar-se fator desencadeante também para a infecção por HPV e DST(14).
Estudos destacam que as DST são doenças que manifestam poucos sintomas ou são inicialmente assintomáticas, tornando-se de difícil detecção. No entanto, podem trazer consequências secundárias severas que prejudicam a saúde reprodutiva e o bem-estar da mulher, ocasionam disfunção sexual, infertilidade, abortamento espontâneo, malformação congênita, nascimento de bebês prematuros e a morte, caso não sejam adequadamente tratadas(2,7).
Logo, o início precoce da vida sexual, a multiplicidade de parceiros sexuais, a não utilização de contraceptivos, entre outros fatores tornam as adolescentes suscetíveis à gravidez, às DST e ao HPV(15). Além disso, destaca-se que significativa parcela dos adolescentes não é contemplada pelos serviços de saúde, colaborando ainda mais para o desconhecimento sobre as DST(16).
A literatura tem demonstrado que o aumento da gravidez na adolescência em países em desenvolvimento tem relação íntima com a baixa escolaridade das mesmas, entre outros fatores, como a pobreza, a desestruturação familiar e a falta de conhecimento(17). Neste estudo, verifica-se que quase a metade das entrevistadas teve mais de uma gravidez, evidenciando a iniciação sexual precoce na adolescência.
Outras análises conduzidas(5,13) apontam que mulheres que tiveram relações sexuais por volta dos 16 anos de idade apresentaram risco dobrado de ter adquirido HPV e câncer cervical em relação a mulheres que tiveram relações sexuais após os 20 anos de idade. A rápida mudança do epitélio cervical durante a puberdade reflete em áreas de transformação em que o processo neoplásico se inicia. As células metaplásicas e colunares na ectocérvice têm maior preponderância nessa faixa etária, tornando as adolescentes vulneráveis ao HPV. Além dessa informação, a proliferação do epitélio escamoso colunar da ectocérvice é visível na adolescência, facilitando infecções pelo HPV mais do que o epitélio escamoso presente na cérvice uterina em mulheres adultas(18).
A presente pesquisa demonstra que mais da metade das adolescentes vêem o exame Papanicolau como importante para visualizar as condições do colo do útero, identificando a presença ou ausência de alguma alteração nos órgãos genitais femininos, como feridas e/ou verrugas genitais sugestivas do HPV, o que torna importante a sua realização regular.
Desde 1998, Ministério da Saúde recomenda a realização do exame Papanicolaou na intenção de detectar precocemente o câncer cervical em mulheres que já iniciaram a vida sexual(4). Ele consiste no esfregaço ou raspado de células esfoliadas do epitélio cervical e vaginal, tendo seu valor tanto para prevenção secundária quanto para diagnóstico, pois possibilita a descoberta de lesões pré-neoplásicas e da doença em seus estágios iniciais. Mesmo sendo um procedimento de baixo custo, não está incorporado a todos os serviços de saúde, tendo utilização reduzida e não disponível a toda população feminina(15).
Estimativas indicam que em torno de 40% das mulheres brasileiras com vida sexualmente ativa nunca realizaram o exame Papanicolau, tendo como principais motivos a vergonha da exposição da genitália, o desconforto emocional, as dificuldades de acesso aos serviços de saúde e a falta de conhecimento sobre as finalidades do exame e sobre as DST(4).
Dados do Programa Nacional de DST do Ministério da Saúde afirmam que, entre as DST virais, a maior prevalência em mulheres gestantes corresponde ao HPV com 40,4%(9). A gestação é um fator facilitador no processo de aparecimento, crescimento ou ressurgimento de lesões condilomatosas causadas pelo HPV. Nas gestantes infectadas, há maior frequência de complicações obstétricas(18).
O HPV genital, denominado condiloma acuminado, apresenta-se com lesões vegetantes, úmidas, isoladas ou agrupadas, ou pápulas sésseis que lembram a verruga vulgar, podendo adquirir aspecto de “couve-flor” e surgir tanto interna como externamente na genitália feminina(13).
O DNA do vírus HPV de alto risco é detectado na maioria dos espécimes de câncer do colo do útero, sendo que cerca de quarenta tipos de vírus têm sido encontrados em infecções na mucosa anogenital. Esses tipos virais são considerados carcinogênicos para a cérvice uterina, acometendo assim a saúde da mulher e sendo um dos fatores de mais alta morbimortalidade feminina(6,13).
O HPV tem prevalência de 15% a 40% na população geral, e a infecção cervical por HPV, atualmente, representa a DST isolada mais frequente no mundo, sendo extremamente comum em jovens(19).
Na gravidez há maior incidência do HPV, e, consequentemente, ocasiona infecções no feto, transmitido verticalmente da mãe para o filho, fato que torna relevante discutir o HPV durante a gestação, principalmente na adolescência. A transmissão vertical pode ocorrer pela via hematogênica, por contaminação pela via ascendente ou no canal do parto, o que pode resultar na papilomatose laríngea no feto ou recém-nascido(15). A infecção por HPV é verificada em especial, no segundo trimestre de gestação, cuja explicação se dá pela diminuição da função do sistema de defesa imunológico devido aos altos níveis de estrógeno e progesterona que podem interferir no sistema regulatório da replicação viral(12).
Corroborando a estudo já mencionado, a vulnerabilidade das adolescentes ao HPV está atribuída à maior exposição da zona de transformação da cérvice durante a adolescência do que na vida adulta. Logo, é essencial o uso do preservativo em todas as relações sexuais, independentemente de estar grávida ou não(5).
A prevenção da gravidez é considerada pelas adolescentes como principal motivo do uso do preservativo em relações sexuais. Diante disso, afloram questões preocupantes quanto à prevenção do HPV e DST, já que a utilização do preservativo é dispensada nas relações sexuais entre as adolescentes grávidas. Logo, a utilização esporádica e/ou dispensa do preservativo na gravidez está diretamente relacionada ao baixo ou nenhum conhecimento que as adolescentes possuem acerca das finalidades do preservativo também para prevenir DST, sobretudo, na gravidez(13,21).
As percepções das adolescentes apresentadas mostram que o uso descontínuo do preservativo nas relações sexuais é considerado um grave problema, uma vez que essa atitude contribui para a exposição ao HPV. Ademais, as adolescentes não se percebem vulneráveis e apresentam maior risco para infectarem-se, especialmente se não possuem conhecimento suficiente. Em suas falas, as jovens revelaram as suas experiências e expressaram a sua percepção sobre o assunto.
A adolescência é uma fase que precisa de atenção especial, pois além da iniciação sexual precoce, o baixo conhecimento que possuem sobre as DST contribui para percepções equivocadas sobre o risco pessoal de adquiri-las, considerando a ausência de práticas de proteção como o não uso do preservativo(8,16).
Além disso, no caso de ocorrerem infecções por DST na adolescência, a manifestação tardia dessas doenças repercute no grau de vulnerabilidade de possíveis contatos, demonstrando uma situação preocupante e colocando os adolescentes como prioridade para estudos sobre as DST/HIV no Brasil e no mundo(20,22).
CONCLUSÃO
O estudo revelou que, em relação a uma possível contaminação por HPV, o conhecimento das adolescentes grávidas é deficitário. Ademais, somente algumas afirmaram fazer uso do preservativo e, entre as que não o adotam, justificam seu comportamento na fidelidade masculina, no esquecimento e desconforto. Além disso, as entrevistadas relataram não saber sobre os efeitos do vírus HPV no feto e na criança.
Diante dos resultados obtidos, pode-se ressaltar que o HPV é uma doença pouco conhecida e embutida de definições variadas. Isso faz com que as adolescentes se tornem um público suscetível por possuírem baixo conhecimento sobre as características que compõem o vírus e pelas nuances culturais que sustentam sua vulnerabilidade. Diante disso, é necessário um cuidado direcionado para o desenvolvimento de educação em saúde por meio de um processo educativo de forma contínua e adequada às necessidades das adolescentes grávidas, conscientizando-as das verdades e inverdades no que diz respeito à saúde e à doença, em especial a infecção pelo HPV.
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Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir, de acordo com as recomendações do International Committe of Medical Journal Editors (ICMJE, 2013): (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida. Todos os autores declaram para os devidos fins que são de suas responsabilidades o conteúdo relacionado a todos os aspectos do manuscrito submetido ao OBJN. Garantem que as questões relacionadas com a exatidão ou integridade de qualquer parte do artigo foram devidamente investigadas e resolvidas. Eximindo, portanto o OBJN de qualquer participação solidária em eventuais imbróglios sobre a materia em apreço. Todos os autores declaram que não possuem conflito de interesses, seja de ordem financeira ou de relacionamento, que influencie a redação e/ou interpretação dos achados. Essa declaração foi assinada digitalmente por todos os autores conforme recomendação do ICMJE, cujo modelo está disponível em http://www.objnursing.uff.br/normas/DUDE_final_13-06-2013.pdf
Recebido: 3/05/2014
Revisado: 4/12/2014
Aprovado: 4/12/2014