ORIGINAL ARTICLES

 

Conhecimento sobre aspiração endotraqueal de profissionais de enfermagem: estudo descritivo

 

 

Oleci Pereira Frota1, Marisa Dias Rolan Loureiro1, Adriano Menis Ferreira1

1Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

 


RESUMO
Objetivo: Avaliar o conhecimento dos profissionais de enfermagem de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) acerca da aspiração endotraqueal (AET) por sistema aberto.

Método: Estudo exploratório, descritivo, de abordagem quantitativa, realizado em julho de 2011 em duas UTIs de um hospital universitário de grande porte de Mato Grosso do Sul. Os dados foram coletados por meio de um questionário. A amostra constituiu-se de 27 profissionais, dos quais 51,9% eram do sexo masculino.
Resultados: De maneira global, o conhecimento dos profissionais foi qualificado como regular (73,2% de acertos); contudo, foi considerado como pobre em cinco itens, além de apresentar-se de maneira distinta entre as categorias profissionais.
Discussão: Considerando que conhecimento incorreto predispõe comportamentos inadequados, infere-se que a prática desses sujeitos pode comprometer a segurança dos pacientes.
Conclusão: Os estudados apresentaram déficits de conhecimento em alguns aspectos da AET, fato que merece investimentos no âmbito do ensino e da assistência de enfermagem.
Descritores: Cuidados Críticos; Respiração Artificial; Conhecimentos, Atitudes e Prática em Saúde; Avaliação de Desempenho; Equipe de Enfermagem; Questionários.


 

INTRODUÇÃO

Neste milênio um dos principais objetivos da Enfermagem é prestar assistência baseada em evidências a fim de promover resultados de qualidade aos pacientes, familiares e sistema de saúde. Nesse cenário, um procedimento que merece destaque, haja vista sua relação direta com o risco de infecção, é a aspiração endotraqueal (AET) de pacientes intubados(1).

A AET é um componente essencial no manejo das vias aéreas em pacientes sob ventilação mecânica, sendo um dos procedimentos invasivos mais frequentemente realizado em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). O seu principal objetivo é remover as secreções pulmonares acumuladas, com o intuito de manter a permeabilidade das vias aéreas; proporcionar oxigenação adequada; reduzir o risco de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) e prevenir consolidação e atelectasias pulmonares(2).

O procedimento, no entanto, não é isento de riscos e complicações. Comorbidades como parada cardíaca e/ou respiratória, instabilidade hemodinâmica, lesão traqueobrônquica e hipoxemia podem estar associadas, especialmente quando realizado de maneira inadequada(3). Diante disso, é imperativo que este procedimento seja realizado com competência profissional, o que significa não apenas ter algumas habilidades, mas também conhecimentos baseados em evidências científicas atualizadas, que garantam eficácia e segurança ao paciente(4).

Entretanto, pesquisas têm mostrado que os profissionais de enfermagem não possuem conhecimento suficiente das atuais recomendações para a AET e que a prática é frequentemente baseada em rituais e tradição conforme evidências empíricas(4,5). Diante disso, questiona-se: Qual o conhecimento dos profissionais de enfermagem de terapia intensiva acerca do procedimento de AET por sistema aberto à luz das evidências? Para responder esta questão propõe-se a realização deste estudo que tem por objetivo avaliar o conhecimento dos profissionais de enfermagem de UTI relacionado à AET por sistema aberto.

Justifica-se a realização deste estudo porque investigar e avaliar criticamente o conhecimento desses profissionais constitui-se de etapa diagnóstica de fundamental importância para identificar as competências e as dificuldades existentes, e, com base nesses dados, elaborar medidas operacionais que contribuam para a melhoria da qualidade dos serviços prestados.

 

MÉTODO

Trata-se de estudo exploratório, descritivo, cuja coleta de dados foi realizada em julho de 2011 em duas UTIs (geral e cardiológica), as quais prestam atendimento a pacientes adultos de um hospital universitário de grande porte de Mato Grosso do Sul. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul sob o protocolo nº. 1949/2011.

Foram incluídos no estudo todos os profissionais de enfermagem lotados nos setores investigados, de forma que a população foi representada por 34 profissionais de enfermagem, 18 lotados na UTI Geral (dois enfermeiros, quatro técnicos de enfermagem e 12 auxiliares de enfermagem) e 16 na Cardiológica (duas enfermeiras, oito técnicos de enfermagem e seis auxiliares de enfermagem). Contudo, foram exclusos os profissionais que estiveram de licença ou férias durante o período da coleta de dados e aqueles que tinham tempo de atuação na área de terapia intensiva inferior a um ano. Assim, a amostra foi constituída por 27 profissionais.

Para atender o objetivo dessa investigação foi construído um questionário estruturado composto por itens referentes aos dados sociodemográficos e teste de conhecimento. Este último visou identificar o nível de conhecimento dos participantes sobre as atuais ações recomendadas antes, durante e após a técnica de AET por sistema aberto, bem como as medidas de prevenção e controle de infecção.

Na versão final, o componente teste de conhecimento foi constituído por 17 questões fechadas assim distribuídas: 13 frases afirmativas para as quais se deveriam assinalado com um “X” para uma das alternativas possíveis, verdadeiro (V), falso (F) ou não sei (considerou-se como questão correta as afirmações verdadeiras respondidas como V ou as falsas respondidas como F); três interrogações com várias alternativas, devendo o avaliado marcar com um “X” àquela(s) que julgasse correta(s) (nessas questões todas as alternativas eram corretas e considerou-se como acerto quando mais de 50% das alternativas eram assinaladas) e, por último; uma questão que abordava a impressão do profissional quanto às suas dificuldades no manejo de vias aéreas artificiais.

Vale ressaltar que tal questionário foi elaborado com base no Guideline(6) da American Association for Respiratory Care (AARC) de 2010 e secundariamente em outros estudos de referência do tema(1,7-9), sendo estes utilizados como parâmetro para definição de acerto ou erro. Os dados foram coletados durante o expediente de trabalho, em sala específica, não sendo permitido consulta bibliográfica ou ao colega de trabalho, e sem controle de tempo para o completo preenchimento, a fim de minimizar a possibilidade de indução dos participantes a respostas sem a devida leitura e reflexão. Antes da entrega do questionário foi realizada uma rápida explanação aos sujeitos envolvidos, especialmente sobre os objetivos do estudo, sua relevância, método de coleta de dados, sendo ressaltada a necessidade da colaboração e participação voluntária. Após a leitura, assinatura e entrega do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido cada profissional recebia o questionário.

Os dados foram dispostos em um banco de informações utilizando-se o software “Microsoft Office Excel” versão 2010 e analisados por meio de estatística descritiva, sendo empregadas as modalidades de distribuição absoluta e percentual, assim como a média e desvio padrão para os dados sociodemográficos. Ademais, embasado em estudo semelhante(10), que, a priori, fundamentou-se em outros estudos, estabeleceu-se uma atribuição conceitual (com pequena alteração semântica) para apurar e classificar as variáveis do conhecimento, afim de qualificar quanti e qualitativamente esse conhecimento. Ademais, diante de todos os trabalhos analisados sobre avaliação do conhecimento em diferentes áreas, não há consenso de um ponto de corte, portanto, prevaleceu o empirismo e o que os autores consideram como níveis de conhecimento.

Dessa forma, considerou-se o seguinte diagrama de pontuação: igual ou menor que 59 pontos “conhecimento pobre”, de 60 a 69 “fraco”, de 70 a 79 “regular”, de 80 a 89 “bom”, de 90 a 99 “muito bom” e 100 pontos classificado como “conhecimento excelente”.

 

RESULTADOS

Dos 27 (100%) profissionais investigados, 11 (40,8%) trabalhavam na UTI Geral (dois enfermeiros, dois técnicos de enfermagem e sete auxiliares de enfermagem) e 16 (59,2%) na Cardiológica (duas enfermeiras, oito técnicos de enfermagem e seis auxiliares de enfermagem). Dessa amostra, 14 (51,9%) sujeitos eram do sexo masculino. A média da idade foi de 40,6 anos ± 7 (24-55). O tempo médio de experiência na função foi de 17,4 anos ± 7,6 (1-30) e o tempo médio de exercício em UTI adulta foi de 10,2 anos ± 5,87 (1-23). Entre os enfermeiros, três (75%) eram pós-graduados em cursos latu sensus e, dentre os profissionais de nível profissionalizante, 16 (70%) dispunham de ensino médio completo, seis (26%) eram graduados (três em enfermagem) e um (4%) era pós-graduado em enfermagem em terapia intensiva adulta.

A avaliação do conhecimento destes profissionais em relação à AET está apresentada na tabela 1 .

Em relação às categorias profissionais – de acordo com o diagrama de pontuação utilizado neste estudo–, o conhecimento global dos enfermeiros foi bom (índice de acerto de 85,3%), o dos técnicos de enfermagem regular (índice de acerto de 72,72%) e o dos auxiliares de enfermagem fraco (índice de acerto de 68,75%). Já o dos profissionais de maneira global, qualificado como regular (73,2% de acertos).

No que diz respeito à impressão do profissional, 12 (44,5%) manifestaram sentir dificuldade em pelo menos um dos cuidados dispensados ao paciente portador de via aérea artificial, sendo o mais referido a verificação de pressão do “cuff” (11 vezes), seguido da fixação do tubo orotraqueal (TOT), higiene bucal e posicionamento do TOT, citados uma vez cada. Doze (44,5%) informaram que nunca receberam qualquer tipo de treinamento em serviço sobre a AET.

 

DISCUSSÃO

Verificou-se resultado preocupante ao constatar que, em cinco itens (instilação rotineira de solução fisiológica (SF) a 0,9% no TET, uso de cateter de aspiração de diâmetro adequado, tempo máximo de aspiração com vácuo aberto, principais consequências/reações adversas relacionadas à AET e, hiperventilação rotineira como forma de prevenir a hipoxemia), o conhecimento dos profissionais foi classificado como pobre.

Considerando que conhecimento incorreto predispõe a práticas inadequadas, infere-se que o déficit de conhecimento desses itens pode causar complicações, como hipoxemias, infecções e instabilidade hemodinâmica e, consequentemente, comprometer a segurança dos pacientes.

Informar previamente o paciente sobre o procedimento e encorajar a sua participação, além de atitude humana e ética, tem sido uma importante estratégia para reduzir o stress e a ansiedade, bem como maximizar os resultados da AET(4). Nessa pesquisa, 92,6% (n=25) dos avaliados informaram ser necessário explicar o procedimento ao paciente, indicando conhecimento muito bom sobre o tema. Resultados semelhantes foram encontrados em estudo realizado na Espanha com enfermeiros de UTI, em que 100% (n=34) assinalaram a prática e apontaram alguns aspectos que devem ser abordados, como o que será feito e porque, as sensações que podem ser sentidas e que poderão ser minimizadas com a administração de oxigênio(4).

Os profissionais foram questionados sobre a necessidade de interromper a dieta enteral antes de iniciar a AET. O índice de acerto foi de 85,2% mostrando que possuem bom conhecimento sobre a temática. Este cuidado é necessário, pois contribui para a redução dos índices de PAV, uma vez que ajuda a prevenir vômitos e a aspiração desse conteúdo pelas vias aéreas inferiores(7).

No tocante a pré-oxigenação como forma de prevenir a hipoxemia, o conhecimento dos profissionais mostrou-se fraco, pois apenas 63% dos entrevistados acertaram a questão. Apesar da técnica ideal (gold standart) para a disponibilização de oxigenação na AET (pré-oxigenação, pós-oxigenação, insuflação e hiperinsuflação, exclusiva ou associada) permanecer indeterminada, o último Guideline da AARC(6) recomenda pré-oxigenação a 100% em pacientes pediátricos e adultos, por 30 a 60 segundos (categoria 2B), sobretudo nos hipoxêmicos e naqueles cuja saturação de oxigênio diminui durante a sucção. Entretanto, estudos realizados com enfermeiros intensivistas mostram que a maioria conhece a importância da pré-oxigenação, mas poucos utilizam rotineiramente(4,5).

A aspiração de vias aéreas está indicada quando há a necessidade de remover as secreções pulmonares acumuladas. Isso pode ser evidenciado por: 1) secreção visível nas vias aéreas; 2) necessidade de coleta de secreção para exames microbiológicos; 3) suspeita de aspiração de fluídos gástricos ou de vias aéreas superiores; 4) inviabilidade do paciente para gerar uma tosse espontânea e eficaz; 5) queda da saturação de oxigênio e 6) angústia respiratória aguda(6). O conhecimento dos profissionais sobre essas indicações revelou-se muito bom, pois 96,3% assinalaram pelo menos três das seis alternativas possíveis, sendo as quatro primeiras as mais apontadas com 27, 25, 21 e 15 registros respectivamente e, menos apontadas, as duas últimas com 11 e 5 registros respectivamente.

Além dessas, há outras condições que sugerem a AET, como a presença de crepitações grosseiras na traqueia, o padrão “dente de serra” no circuito de fluxo-volume na tela do monitor do ventilador e quando o pico de pressão inspiratória está aumentado durante o modo volume controlado ou diminuição do volume corrente durante a pressão controlada(6).

Com relação à ao momento em que se deve aspirar as vias aéreas, isto é, rotineiramente (horários pré-estabelecidos conforme prescrição ou rotina da unidade) ou apenas quando necessário, o conhecimento dos participantes também foi conceituado como muito bom, uma vez que, 92,6% apontaram corretamente que a AET deve ser realizada apenas quando necessário. Apesar dessa recomendação atual, dados da literatura revelam que o procedimento foi tradicionalmente realizado de forma rotineira a cada uma ou duas horas com vistas a prevenir a ocorrência de PAV e a oclusão do TET. No entanto, com o transcorrer dos anos, vários estudos randomizados indicaram que não há benefício da aspiração periodicamente determinada em relação àquela empregada apenas quando indicada; pelo contrário, o maior quantitativo de aspiração coloca o paciente em riscos potenciais(9).

Quanto à instilação rotineira de SF 0,9% antes da AET, o conhecimento dos profissionais investigados mostrou-se deficiente, sendo conceituado como pobre, já que apenas 44,5% acertaram a questão ao referirem que não deve ser utilizada de rotina. É importante destacar que este procedimento é tema de muitas discussões, controvérsias e até mesmo resultados divergentes, e que os estudos empregados na confecção do questionário foram utilizados como parâmetro para definição de acerto ou erro.

O uso de solução salina isotônica antes da AET manteve-se tradicionalmente estável porque se acreditava na hipótese que seu uso facilita a remoção de secreções ao amolecer e diluir as secreções pulmonares, lubrificar o cateter de sucção e estimular a tosse, o que facilitaria a mobilização de secreções para as vias aéreas mais centrais, aumentaria o volume de secreções removidas e melhoraria a oxigenação. Entretanto, não há evidência suficiente para comprovar essa hipótese, dado que uma grande quantidade de estudos registra insuficiência da SF 0,9% para potencializar a remoção de secreções. Nesse sentido, umidificar os gases inspirados e hidratar sistemicamente o paciente são medidas mais aceitas(11).

Recente revisão de literatura constatou que, nos últimos anos, diferentes investigações têm sido conduzidas para determinar os efeitos fisiológicos e psicológicos da instilação de tal solução na AET. Baseadas em relatos de pós-extubação, parâmetros gasométricos, remoção de secreção, consumo de oxigênio e taxas de infecções, as investigações incluídas na revisão mostraram que o procedimento não apresenta benefícios significantes, ao contrário, associa-se com desconforto e alterações hemodinâmicas. Além disso, esta revisão forneceu evidências para afirmar que o aumento da remoção de secreções não tem importância clínica, pois o volume de secreções extras removidas varia de um a dois gramas em relação ao grupo controle. E, ainda, que a SF 0,9% é rapidamente absorvida pelo parênquima cardiopulmonar e não se mistura com as secreções traqueobrônquicas, apenas 18,7% da solução instilada é recuperada(12).

Diante de diversas controvérsias e de não haver benefícios concretos documentados do uso da SF 0,9% na AET, o Guideline da AARC(6) não recomenda o seu uso rotineiro (categoria 2C), visto que tal procedimento está associado a riscos e complicações, ficando o seu uso facultado ao manejo de secreções de difícil remoção, como no caso de secreções espessas e tampões mucosos.

No que diz respeito ao calibre ideal do cateter de aspiração, o índice de acerto foi de 59,2%, denotando conhecimento pobre. Esse dado é preocupante, pois cateteres muito calibrosos causam grandes pressões negativas nas vias aéreas, acarretando, por consequência, em queda súbita da capacidade residual funcional, hipoxemias, atelectasias e traumas. Por outro lado, cateteres pouco calibrosos não proporcionam aspiração satisfatória(13).

Diante disso, é consenso na literatura que o calibre do cateter deva ser o menor possível, mas grande o suficiente para facilitar a remoção de secreções. Também é consagrado que, em adultos, o diâmetro externo do cateter de sucção deve ocluir menos que 50% do diâmetro interno da via aérea artificial. Isso permite que o ar ambiente entre nos pulmões enquanto o oxigênio alveolar e outros gazes estão sendo removidos pelo vácuo do cateter(9). Embora muito discutido, não há nenhuma evidência para apoiar a proporção exata entre cateter de aspiração e TET. Todavia, a seguinte fórmula é amplamente recomendada para calcular o calibre ideal do cateter de aspiração: calibre do cateter de aspiração [Fr] = (calibre do TET [mm] - 2) x 2(13).

Encontrou-se dado preocupante ao afirmar que a duração do procedimento de sucção (pressão negativa estabelecida) limita-se à no máximo 30 segundos. O conhecimento sobre esse tema foi analisado como pobre, pois apenas 33,3% dos avaliados acertaram. Na realidade, baseado em experiências clínicas e estudos randomizados, os consensos atuais recomendam que o procedimento de aspiração deva durar no máximo 15 segundos. Tempo de sucção superior pode ocasionar hipoxemias, atelectasias e desconforto respiratório(6).

Considerável parte dos profissionais acertou ao responder como verdadeiro que o paciente deve ser acompanhado com oximetria de pulso antes, durante e após o procedimento (96,3%) e que o cateter deve ser inserido no tubo com o sistema de vácuo fechado (92,6%), conhecimento conceituado em ambas as questões como muito bom. Esses itens são amplamente sugeridos e foram enfatizados por meio de metanálise que objetivou esclarecer e analisar os efeitos das intervenções aplicadas para evitar hipoxemia induzida pela AET(14).

Dos pesquisados, apenas 18,5% acertaram a questão referente às principais consequências/reações adversas relacionadas à AET. Esse resultado indica conhecimento pobre e ao mesmo tempo alarmante, haja vista que tais profissionais podem subestimar efeitos nocivos advindos do procedimento e, na prática, não adotar as medidas preventivas preconizadas, o que pode resultar em morbimortalidade. São elas: aumento da pressão arterial e da pressão intracraniana, hipoxemia, arritmias cardíacas, parada cardíaca e/ou respiratória, broncoespasmo, atelectasias, infecção nosocomial, hiperestimulação vagal, danos a árvore traqueobrônquica, ansiedade, sangramentos, instabilidade cardiovascular, alterações neurológicas e até morte(8).

No que tange aos principais parâmetros que devem ser avaliados durante e após a AET, o índice de acerto foi de 77,8%, denotando conhecimento regular. O paciente deve ser monitorizado quanto à saturação de oxigênio, frequência cardíaca, nível de consciência, pressão arterial e suas reações(9).

Afirmou-se aos profissionais que a hiperventilação (aumento da quantidade de ar que ventila os pulmões, seja pelo aumento da frequência respiratória ou fluxo inspiratório) não deve ser rotineiramente utilizada. Apenas 12 (44,5%) acertaram ao responder a questão como verdadeira, configurando-se como conhecimento pobre. Este resultado é preocupante, visto que esta técnica além de não recomendada por estar relacionada a efeitos prejudiciais, como barotrauma e distúrbios ácidos básicos(6), não está amparada do ponto de vista ético. Recente parecer do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo concluiu que não é de competência do enfermeiro realizar programações e alterações de parâmetros de aparelhos de Ventilação Pulmonar Mecânica” (15:3).

Sobre as ações de higienização das mãos (antes e após o procedimento), uso de luvas, óculos e avental, os profissionais foram perguntados se todas são necessárias para a AET. Todos (100%) acertaram a questão e obtiveram grau de conhecimento classificado como excelente. A higienização das mãos é, sem dúvida, a medida mais importante para a redução dos riscos de transmissão de microrganismos. Deve ser realizada antes e depois de contatos com pacientes, sangue, fluidos corpóreos, secreções, excreções e objetos contaminados por tais substâncias. Já o uso de luvas, óculos e avental se faz necessário em situações nas quais possam ocorrer respingos e espirros de sangue ou secreções nos profissionais(16).

No tocante a permanência da esterilidade do cateter de aspiração, 92,6% dos profissionais acertaram a questão, denotando conhecimento muito bom sobre o tema.

Na literatura, é fato consagrado que a esterilidade do cateter deve ser rigorosamente mantida em todos os passos da AET por sistema aberto, além das medidas assépticas(17). Assim, visando erros nesse processo e consequentemente a PAV, o sistema fechado de aspiração surgiu como alternativa ao aberto. Contudo, ainda não há consenso literário de que o sistema fechado diminui a incidência de PAV, dado os resultados controversos encontrados nas diversas investigações(9).

Estudos bem delineados, robustos e com validade interna e externa são necessários não só para afirmar ou refutar a eficácia desse sistema na prevenção de infecções, mas também para estratificar a partir de qual pressão positiva expiratória final (PEEP) este dispositivo é indicado para manter a fração de oxigênio estável e as pressões pulmonares em pacientes que demandam altas pressões. E ainda, contribuição do sistema fechado para a saúde ocupacional com a redução da propagação de microrganismo em pacientes bacilíferos(18).

Na aspiração de vias aéreas, é amplamente aceito que o profissional deve respeitar a sequência TET, nariz e, por último, cavidade bucal. Em relação a essa problemática, 81,5% dos profissionais acertaram a questão indicando bom conhecimento. Esse cuidado é muito relevante, visto que erros nesse processo podem culminar em infecções nosocomiais(1,3,4,9).

A pressão do cuff, principal dificuldade relatada pelos profissionais no manejo de vias aéreas artificiais, deve ser mensurada a cada oito ou 12 horas ou quando necessário e deve ser mantida entre 15 e 25 mmHg (20 e 34 cmH2O). Valores superiores predispõem a lesões isquêmicas e estenose traqueal; valores inferiores afetam a ventilação mecânica e facilitam a aspiração de secreções orofaríngeas para as vias aéreas inferiores, aumentando o risco de PAV(19). Diante de problemáticas dessa natureza, cabe ao enfermeiro não apenas a confecção e implementação de protocolos preventivos, mas também a avaliação periódica da adesão às medidas propostas, aplicação de indicadores clínicos e educação continuada(20). De mesma importância é o compromisso com a qualidade e/ou melhoria de questões estruturais e organizações, além de recursos humanos e materiais.

Em particular, o conhecimento relativo ao uso rotineiro de SF 0,9%, cateter de aspiração com diâmetro adequado, tempo máximo de aspiração, principais consequências/reações adversas relacionadas ao procedimento e hiperventilação rotineira mostrou-se pobre. Tais itens merecerem ser analisados e revistos no âmbito do ensino e da assistência de enfermagem no local da pesquisa.

Esta investigação apresenta como limitação a não avaliação, em situação real de assistência, da adesão dos profissionais quanto aos itens do procedimento de AET segundo as suas respostas, o que impõe o desenvolvimento de estudos com este fim; a amostra foi pequena, embora tenha englobado todos os profissionais das unidades investigadas, entretanto, generalizações dos resultados são frágeis.

 

CONCLUSÃO

Os profissionais de enfermagem estudados apresentam conhecimento regular sobre a técnica de AET. Além disso, os achados sugerem que quanto maior o grau de instrução profissional melhor o preparo teórico para a realização do procedimento de AET. Isto, pois, enfermeiros apresentaram escores maiores que técnicos de enfermagem que, por sua vez, expuseram escores maiores do que os auxiliares de enfermagem.

Os resultados obtidos sugerem algumas das deficiências do conhecimento dos membros da equipe de enfermagem e podem nortear, no cenário estudado, o planejamento de estratégias. Entre elas, a educação permanente para disseminação e adoção de medidas preventivas visando à melhoria do nível de conhecimento desses profissionais e, consequentemente, a qualidade na assistência prestada.

 

REFERÊNCIAS

 1. Kelleher S, Andrews T. An observational study on the open-system endotracheal suctioning practices of critical care nurses. J Clin Nurs. 2008; 17 (3): 360-9.

2. Seckel MA. Does the use of a closed suction system help to prevent ventilator-associated pneumonia? Crit Care Nurse. 2008; 28 (1): 65-6.

3. Davies K, Monterosso L, Leslie G. Determining standard criteria for endotracheal suctioning in the paediatric intensive care patient: an exploratory study. Intensive Crit Care Nurs. 2011; 27 (2): 85-93.

4. Ania González N, Martínez Mingo A, Eseberri Sagardoy M, Margall Coscojuela MA, Asiain Erro MC. Assessment of practice competence and scientific knowledge of ICU nurses in the tracheal suctioning. Enferm Intensiva. 2004; 15(3):101-11.

5. Day T, Iles N, Griffiths P. Effect of performance feedback on tracheal suctioning knowledge and skills: randomized controlled trial. J Adv Nurs. 2009; 65(7):1423-31.

6. American Association of Respiratory Care. AARC clinical practice guidelines: endotracheal suctioning of mechanically ventilated patients with artificial airways 2010. Respir Care. 2010; 55 (6): 758-64.

7. Celik SA, Kanan N. A current conflict: use of isotonic sodium chloride solution on endotracheal suctioning in critically iil patients. Dimens Crit Care Nurs. 2006; 25 (1):11-4.

8. Farias GM, Freitas MCS, Rocha KMM, Costa IKF. Pacientes sob ventilação mecânica: cuidados prestados durante a aspiração endotraqueal. Inter Science Place [ Internet ]. 2009 Sep [ cited 2012 Nov 25 ] 2 (9): [ about 5 p. ]. Available From: http://www.interscienceplace.org/interscienceplace/article/view/109/111

9. Pedersen CM, Rosendahl-Nielsen M, Hjermind J, Egerod I. Endotracheal suctioning of the adult intubated patient - what is the evidence? Intensive Crit Care Nurs. 2009; 25 (1): 21-30.

10. Lourenço SA, Ohara CVS. Nurses’ knowledge about the insertion procedure for peripherally inserted central catheters in newborns. Rev latinoam enferm. 2010; 18 (2):189-95.

11. Roberts FE. Consensus among physiotherapists in the United Kingdom on the use of normal saline instillation prior to endotracheal suction: a delphi study. Physiother Can. 2009; 61(2):107-15.

12. Halm MA, Krisko-Hagel K. Instilling normal saline with suctioning: beneficial technique or potentially harmful sacred cow? Am J Crit Care. 2008; 17 (5): 469-72.

13. Day T, Farnell S, Haynes S, Wainwright S, Wilson-Barnett J. Tracheal suctioning: an exploration of nurses’ knowledge and competence in acute and high dependency ward areas. J Adv Nurs. 2002; 39 (1): 35-45.

14. Oh H, Seo W. A meta-analysis of the effects of various interventions in preventing endotracheal suction-induced hypoxemia. J Clin Nurs. 2003; 12 (6): 912-24.

15. Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo [ homepage in the Internet ]. Parecer n.º 046, de 06 de dezembro de 2010. Atribuições do enfermeiro e equipe de enfermagem na assistência ao paciente submetido à ventilação pulmonar mecânica [ cited 2011 Sep 10 ]. Available From: http://portal.coren-sp.gov.br/sites/default/files/parecer_coren_sp_2010_46_0.pdf

16. Freire ILS, Farias GM, Ramos CS. Prevenindo pneumonia nosocomial: cuidados da equipe de saúde ao paciente em ventilação mecânica invasiva. Rev eletrônica enferm. 2006; 8 (3):377-97.

17. Jongerden IP, Rovers MM, Grypdonck MH, Bonten MJ. Open and closed endotracheal suction systems in mechanically ventilated intensive care patients: a meta-analysis. Crit Care Med. 2007; 35 (1): 260-70.

18. Ferreira AOM, Silvino ZR, Christovam BP, Lima DVM. Aspiração endotraqueal em unidade de terapia intensiva: uma revisão integrativa. Rev enferm UFPE on line [ Internet ]. 2013;7(7):4910-7.

19. Jerre G, Silva TJ, Beraldo MA, Gastaldi A, Kondo C, Leme F, et al. Fisioterapia no paciente sob ventilação mecânica. J bras pneumol. 2007; 33 Suppl 2:142-50.

20. Silveira IR, Gnatta JR, Lacerda RA. Reproducibility and confiability of a processual indicator to evaluate adherence to oral hygiene in patients with orotracheal intubation. Online braz j nurs [ Internet ]. 2011 May [ cited 2012 Nov 30 ] 10(1): [ about 6 p. ]. Available From: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/3207

 

Recebido: 01/12/2012
Revisado: 15/07/2013
Aprovado: 23/07/2013