TREINAMENTO DE PESQUISA NA GRADUAÇÃO

 

Prática de atividade física em adolescentes de escolas públicas: um estudo descritivo

 

 

Laís Evêncio Bernardes1; Ana Roberta Vilarouca da Silva1; Jonathan Veloso Costa1; Roberto Wagner Júnior Freire de Freitas1; Karla Beatriz Alves Carvalho Campos1; Zálya Liande Cavalcante de Deus1

1Universidade Federal do Piauí

 

 


RESUMO
Objetivo: conhecer a prática de atividade física dos adolescentes de escolas públicas na cidade de Picos, Piauí.
Método: estudo descritivo com uma amostra de 145 adolescentes com idades entre 12 e 18 anos, de ambos os sexos. A coleta de dados ocorreu no período de agosto a dezembro de 2010, com uso de um formulário.
Resultados: dentre os participantes, 62,8% eram mulheres, a média de idade foi de 14,8 anos (±3,19). Observou-se que 49,7% foram classificados como inativos fisicamente. Destes, 86,1% eram do sexo feminino (p=0,000), 58,3% tinham idade entre 12 e 14 anos, 8,3% tinham índice de massa corporal elevado, 9,7% apresentaram glicemia duvidosa, 45,8% tinham níveis pressóricos elevados.
Discussão: mulheres e adolescentes mais jovens são mais sedentários. Este resultado é semelhante ao de outros estudos de mesma temática. Conclusão: a prática regular de atividade física oferece vários benefícios para a saúde, podendo contribuir para a prevenção das doenças crônicas não transmissíveis.

Palavras-chave: Atividade motora. Estilo de vida. Saúde do adolescente.


 

 

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas vem ocorrendo a transição do perfil epidemiológico, principalmente nos países em desenvolvimento, passando da predominância de doenças infectocontagiosas para uma maior prevalência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Estas são conhecidas por possuírem história natural prolongada com multiplicidade de fatores de risco complexos. Nesse contexto, ganham destaque o Diabetes Mellitus tipo 2, a obesidade e as doenças cardiovasculares(1). No Brasil, as DCNT e as causas externas foram as principais causas de morte em 2009, correspondendo a 85% do total de óbitos(2).

Em 2006, a apresentação da primeira edição do estudo Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas Por Inquérito Telefônico (VIGITEL), mostrou que 11,4% dos brasileiros eram obesos. Em 2007, esse índice subiu para 12,9%(3).

Os principais fatores de risco associados à essas patologias estão relacionados aos parâmetros ligados ao estilo de vida. Dentre eles a inatividade física vem ganhando destaque como um dos principais fatores para o desenvolvimento de diversas doenças crônicas, constituindo um grande problema em termos de saúde pública.

Sabe-se hoje que a inatividade física, aliada ao maior tempo dedicado às atividades de baixa intensidade, como práticas passivas que requerem o mínimo de esforço físico, tais como assistir à televisão, usar computadores por tempo prolongado, videogames e outros, contribuem de forma significativa para o ganho de peso dos adolescentes.

Vários estudos vêm sendo realizados no sentido de investigar a relação entre o risco de DCNT e a prática de atividade física, e as evidências confirmam uma relação inversa entre as variáveis. Além disso, a alta prevalência de sedentarismo na adolescência aumenta a probabilidade de adultos sedentários(4, 5).

A prática regular de atividade física oferece vários benefícios para a saúde, podendo atuar como forma de prevenção, controle, tratamento ou reabilitação de doenças crônicas como o Diabetes tipo 2. 

Os benefícios proporcionados por uma vida fisicamente ativa na infância e adolescência são importantes para o processo biológico de crescimento e desenvolvimento humano, pois ajudam no controle do peso corporal, na concentração da glicose sanguínea e incrementa as funções músculo-esqueléticas. A atividade física tem ainda efeitos psicológicos, já que melhoram a autoestima, a redução da depressão, além de possibilitar uma melhor interação social.

O estudo da prática de atividade física na adolescência e seus fatores relacionados tornam-se relevantes para a promoção da saúde, pois com a propagação de tal prática é possível evitar o aparecimentos de várias DCNTs, cujo manejo é oneroso e, muitas vezes, doloroso para o indivíduo e sua família. Ante o exposto, o presente trabalho tem como objetivo conhecer a prática de atividade física dos adolescentes de escolas públicas na cidade de Picos localizada no estado do Piauí (PI).

 

MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo que faz parte do projeto de pesquisa intitulado “Ações preventivas no controle do Diabetes Mellitus tipo 2”, que possui ainda , um outro subprojeto com o seguinte título: “Investigação dos fatores de risco para Diabetes Mellitus tipo 2 em adolescentes”. O projeto é realizado em duas escolas públicas na cidade de Picos-PI com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPQ. A população estudada é constituída por 145 adolescentes com idades entre 12 e 18 anos, de ambos os sexos, matriculados regularmente nas escolas. 

A seleção dos sujeitos ocorreu de forma aleatória simples, por sorteio, entre os que concordaram em participar da pesquisa e apresentaram o termo de consentimento livre e esclarecido devidamente assinado por eles e por seus pais ou responsáveis. Foram excluídos os alunos com diagnóstico de outras doenças crônicas que interferissem diretamente no peso e na altura e àqueles que, no momento da avaliação, tivessem algum impedimento para a obtenção das medidas antropométricas.

A coleta dos dados foi realizada no período de agosto a dezembro de 2010. Como instrumento de coleta foi utilizado um formulário com as seguintes variáveis: idade, sexo, renda, escolaridade, peso, altura, IMC, classificação da pressão arterial média após três aferições e medida da glicemia capilar ao acaso.

A análise dos dados se deu com o auxílio do software SPSS, versão 17.0 por meio do qual Foram calculadas as médias e desvios padrão das variáveis. Para determinar associações entre as variáveis se empregou o teste c2. Foram consideradas como estatisticamente significantes as análises com p < 0,05.

O estudo foi conduzido a partir da aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, conforme o protocolo CAAE 0078.0.045.000-10. Foram atendidas as exigências das Diretrizes e Normas da Pesquisa em Seres Humanos acerca das questões éticas da pesquisa envolvendo seres humanos, apresentadas na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

 

RESULTADOS

Foram avaliados 145 adolescentes de ambos os sexos, sendo que 62,7% eram do sexo feminino. Os participantes tinham idade compreendida entre 12 e 18 anos, com uma média de 14,8 anos. Sobre a renda familiar dos jovens, os resultados mostraram que, na maioria dos casos, os adolescentes vivem em famílias que recebem até dois salários mínimos mensais (84,1%). Quanto à classificação dos alunos por modalidade de ensino, cerca de 75,2% dos estudantes cursavam o ensino fundamental.

No tocante à prática de atividade física, observou-se que 49,7% foram classificados como inativos fisicamente. Destaca-se, ainda, que entre os inativos, 86,1% eram do sexo feminino (p=0,000), 58,3% tinham idade entre 12 e 14 anos, 8,3% tinham IMC elevado, 9,7% apresentavam glicemia duvidosa e 45,8% tinham níveis pressóricos elevados.

 

 

Dos adolescentes que afirmaram praticar algum tipo de atividade, as modalidades mais executadas foram o futebol (54,8%), tanto entre os homens (34,2%) como entre as mulheres (20,6%).

 

DISCUSSÃO

Tendo como referência para classificar como sedentário o adolescente que praticava exercícios físicos por um tempo inferior a trinta minutos e com uma frequência menor do que três vezes por semana(6), o estudo observou que 49,7% dos jovens avaliados não praticam atividade física. Outros estudos encontraram percentuais mais elevados de inatividade física entre os adolescentes, quais sejam, com 67,8%(7) e 64,3%(8).

No que diz respeito ao nível de atividade física entre os gêneros, constatou-se que 18,5% dos rapazes eram inativos, já entre as moças o percentual foi bem superior, 68,1%. É consensual entre muitas publicações o fato de as mulheres serem menos ativas que os homens(9,10,11).

Desde as idades mais precoces já é concebida a ideia de que homens e mulheres possuem papéis diferentes na sociedade, sendo os homens mais tradicionalmente caracterizados por tarefas voltadas ao trabalho e atividades manuais enquanto as mulheres são caracterizadas para atividades familiares e tarefas domésticas (12). Esta diferença nos níveis de atividade física pode ainda ser maior quando o instrumento utilizado para avaliar a atividade física não contempla atividades ocupacionais, tarefas domésticas, transporte ou atividades familiares. No entanto, mesmo quando são utilizados métodos objetivos para avaliar atividade física, os meninos são mais fisicamente ativos do que as meninas(13).

Estudo sobre as barreiras na prática de atividade física entre adolescentes de ambos os sexos apontou que apenas “não ter alguém para levar” não diferiu entre os gêneros. “Não ter a companhia dos amigos” e “ter preguiça” foram as barreiras mais reportadas pelos meninos (30,4%) e meninas (51,8%); no entanto a barreira mais fortemente associada com maior prevalência de níveis insuficientes de atividade física foi “preferir fazer outras coisas” para meninos (OR = 5.02 (2,69 - 9,37); p < 0,05) e meninas (OR = 7.10 (3,71 - 13,60); p < 0,05)(14).

Apesar destas evidências, são escassas as informações sobre as barreiras mais relatadas entre os jovens brasileiros. Até o presente momento foi encontrado apenas um estudo científico sobre o tema na literatura brasileira (15). De fato, a maioria das evidências disponíveis sobre a prevalência de barreiras para atividade física na população brasileira são oriundas de estudos realizados com adultos(16,17).

Um importante resultado de um estudo realizado no estado do Pernambuco também identificou que as mulheres eram menos ativas, e que a participação nas aulas de educação física é um fator associado tanto ao nível de prática de atividades físicas quanto ao hábito de assistir televisão por três horas ou mais por dia (comportamento sedentário).

Além deste fator, os resultados indicam que o local de residência, o turno, a situação ocupacional e o sexo discriminaram significativamente estas condutas de saúde (18).

Em pesquisa realizada na cidade de Maceió com 1.253 estudantes observou-se uma prevalência de sedentarismo em 93,5%, mais frequente em adolescentes do sexo feminino; não houve associação entre nível de atividade física e excesso de peso ou gordura corporal; futebol e dança foram às atividades mais frequentes em meninos e meninas, respectivamente; 60% dos estudantes não têm aulas de Educação Física(19).

Já em estudo no Ceará com 307 estudantes encontrou que mais da metade dos alunos, 207(67,4%), foram classificados como inativos fisicamente. Destaca-se ainda que o percentual de meninos ativos (71%) foi 2,45 vezes superior ao percentual de meninas ativas (29%) (p=0,000) e; que aproximadamente 20% dos adolescentes estavam acima do peso. Além disso, os casos de excesso de peso foram maiores nos jovens inativos como mostra os percentuais de sobrepeso (81%) e obesidade (18%) (p=0, 001). Acerca da pressão arterial foi identificado que 8,7% e 11,7% estavam com a tensão sanguínea limítrofe e elevada, respectivamente (7).

Em escolas da cidade de Teresina-PI foram avaliados 383 estudantes (190 rapazes e 193 moças). Entre os rapazes, 21,5% eram sedentários; 24,2% eram insuficientemente ativos; 2,6% eram obesos e; 8,4% com sobrepeso. Entre as moças, 32,1% eram sedentárias; 9,3% eram insuficientemente ativas; 1,5% eram obesas e; 13,9% com sobrepeso(20).
Assim, percebe-se que a inatividade física pode interferir no peso e níveis pressóricos dos estudantes, predispondo-os à doenças crônicas antes só evidenciadas em adultos.

 

CONCLUSÃO

Na população analisada pôde-se perceber que quase metade da população estudada não praticava atividade física. Uma limitação na realização do presente trabalho, também relatada por outros autores, é a ausência de um instrumento unificado para a classificação de adolescentes ativos e não ativos.

Percebe-se a importância que a escola tem na formação de hábitos saudáveis do adolescente. A escola, juntamente com os pais, professores e dirigentes dos órgãos competentes devem promover atividades que desenvolvam o interesse dos alunos pela prática de exercícios, bem como, os enfermeiros, pois a escola é um campo fértil para ações de promoção da saúde o que é firmado pela parceria da Estratégia de Saúde da Família com o Programa de Saúde na Escola.

Vale ressaltar que uma das escolas participantes deste estudo estava inserida no Programa Mais Educação, criado pelo Governo Federal, em 2007, que tem como objetivo aumentar a oferta educativa nas escolas públicas por meio de atividades optativas. Estas foram agrupadas em macrocampos, quais sejam: acompanhamento pedagógico, meio ambiente, esporte e lazer, direitos humanos, cultura e artes, cultura digital, prevenção e promoção da saúde, educomunicação, educação científica e educação econômica. Grande parte da amostra que praticava atividade física estava inserida nesse programa, o que mostra a importância da sua implantação em todas as escolas.

 

REFERÊNCIAS

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3.Ministério da Saúde (BR). Portal da saúde [ homepage na internet ]. Reportagens Especiais. 13% dos adultos são obesos  [ Cited  2010 out 20 ]. Available from: http://portal.saude.gov.br/portal/aplicacoes/reportagensEspeciais/default.cfm?pg=dspDetalhes&id_area=124&CO_NOTICIA=10078.

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6.Souza LJ, Gicovante Neto C, Chalita FEB, Reis AFF, Bastos DA, Souto Filho JTD, Souza TF, Côrtes VA. Prevalência de obesidade e fatores de risco cardiovasculares em Campos Rio de janeiro. Arq Bras Endocrinol Metab. 2003; 47(6): 669-76.

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Recebido: 30/09/2011
Aprovado: 20/09/2012