Educação, crescimento e fortalecimento profissional do Agente Comunitário de Saúde - estudo etnográfico
Resumo. Este estudo-piloto explorou as ações educativas do agente comunitário de saúde (ACS) junto a populações socialmente não afiliadas1 em área metropolitana do Rio de Janeiro. Através de entrevistas individuais e grupais, observação participante em visitas às comunidades e fotografias, apreendeu-se a dimensão filosófica e empírica do trabalho educativo conduzido pelo ACS. O material coletado foi codificado utilizando-se o software ATLAS ti. 4.2 e analisado segundo o método “Abdução em Comunicação” revelando identidade sócio-profissional, consciência política quanto à organização trabalhista e críticas quanto ao descaso à proteção ocupacional e à falta de apoio governamental. O presente artigo enfatiza a “voz” do ACS como liderança social, principal facilitador do fortalecimento da população assistida e importante otimizador da rede de prestação de serviços de saúde, propondo elementos de reflexão dos pontos de conflitos, contradições e paradoxos na prática profissional e no suporte aos seus desejos de mudar de condição e de liberdade para atuar.
Palavras-chave: Agente comunitário de saúde, Educação, Poder, Liderança.
Resumen. Este estudio piloto exploro las acciones educativas del agente comunitario de salud (ACS) con poblaciones socialmente no afiliadas del área metropolitana de Río de Janeiro. A partir de entrevistas individuales y de grupo, observaciones participativas realizadas durante las visitas en las comunidades y fotografías, se trato de comprender las dimensiones filosóficas y empíricas del trabajo educativo del ACS. El material recogido fue codificado utilizando ATLAS ti. 4.2 y analizado según el método “Extracción en la comunicación”. El análisis mostró elementos sobre la identidad profesional, la conciencia política en relación a su propia organización como grupo profesional y críticas en cuanto a la inseguridad ocupacional y la carencia de ayuda gubernamental. "La voz" del ACS es un instrumento de liderazgo social y un mecanismo importante para fortalecer la población, y promover la optimización del sistema de salud. Ya que su práctica profesional revela conflictos, contradicciones y paradojas, parece necesaria una reflexión colectiva sobre el apoyo necesario para sostener el ACS para el cambio y la libertad de actuar.
Palabras-claves: Agente comunitario de salud, Educación, Poder profesional, Liderazgo.
Introdução
Negro, pobre, pouco instruído, favelado e desempregado – a princípio essas poderiam ser algumas das características aplicáveis aos possíveis candidatos à função de agente comunitário de saúde (ACS), na cidade do Rio de Janeiro. Embora pareça uma síntese discriminatória, ela nos põe frente a frente com as contradições da parceira entre ACS – egressos de grupos sociais que vivem sob condições de não afiliação social1 e os profissionais de saúde e administrativos, lotados em um Centro Municipal de Saúde (CMS) da cidade. A reflexão aqui apresentada é centrada exclusivamente nas narrativas do ACS, o qual é visto pelos autores como capaz de ampliar a voz da comunidade, colher e veicular informações confiáveis, de modo a ajudar na definição e reestruturação do planejamento dos serviços de saúde pública. Deste modo, o ACS cumpriria o papel de construir laços de credibilidade entre os profissionais de saúde, o poder público e a população desassistida e, principalmente, resgataria a imagem social das instituições junto à comunidade.
Problemática
Os resultados de um estudo piloto realizado num complexo de 7 comunidades, área metropolitana do Rio de Janeiro em 2003, nos deu base para analisar o trabalho educacional do ACS em suas contradições e pontos intrigantes. Apesar de a ação do ACS em “favelas” ser uma experiência relativamente recente, ela já manifesta claramente uma visão crítica e, algumas vezes, inconformada da práxis. Justamente por não se sentirem iguais aos “pacientes-clientes”, que aceitam passivamente as decisões determinadas pelas equipes de saúde, eles repensam e adotam atitudes profissionais adequadas e necessárias à construção de parcerias com a comunidade assistida. Em nossa análise, percebemos uma dupla representação do ACS para a comunidade: ser a voz da população e, simultaneamente, a presença do Estado. Um paradoxo que torna obscura a articulação entre ele e os profissionais lotados no CMS o que, conseqüentemente, interfere no seu desempenho profissional. Esse paradoxo demonstra a importância de conhecer os mecanismos utilizados pelo ACS, para se fortalecer pessoal e profissionalmente, o que implica, valorizar as percepções e experiências individuais; oferecer atenção individualizada; aprender mutuamente; compreender empaticamente o outro; possuir senso de controle; possuir senso de competência; e, possuir senso de internalização de objetivos2.
No entanto, as narrativas do ACS indicam percepções de pouco investimento gerencial no seu desenvolvimento pessoal e fortalecimento profissional apesar de ser ele, justamente, o porta-voz de uma política pública que visa mobilizar potencialidades da população para assumir tanto as ações preventivas, quanto participar das ações curativas em matéria de cuidados de saúde. Ele é o responsável por identificar nas comunidades “faveladas” as iniciativas cotidianas, os projetos de saúde, as parcerias para aprender e ensinar para a vida e o bem-estar, mas ele não se sente recebendo apoio para seu próprio desenvolvimento pessoal e fortalecimento profissional. Como situar e entender esta contradição básica?
Revisão de literatura
Recentemente autores3,4 discutiram a educação informal em saúde, presente em áreas de pobreza onde o ACS trabalha, como forma de lidar com as questões de poder, igualdade e emancipação. Segundo eles, o ACS tornou-se uma “voz” poderosa para populações que enfrentam desigualdades e marginalização social. Outros estudos5 enfatizaram que o ACS pode melhor intermediar os serviços a tais populações por possuir habilidades políticas, autonomia, livre e fácil acesso às comunidades. Outras análises revelaram a particularidade da ação social intermediária do ACS6 e o impacto positivo de suas ações junto às famílias assistidas7. Entretanto, o ACS enfrentou uma forte resistência para ser incluído nas equipes de Enfermagem. Questões múltiplas relativas à segurança da clientela, subordinação hierárquica e divisão do trabalho imbricavam-se com idéias de passividade, submissão, obediência e restrição de poder, como elementos historicamente associados ao gênero feminino na profissão8.
O conjunto de construtos envolvendo as idéias de tomada de consciência, crescimento, fortalecimento, e, aumento de capacidades e de habilidades pessoais tem sido expresso pelo termo “empowerment”9. Devido à multiplicidade semântica e perspectivas teóricas e conceituais, importantes distorções filosóficas têm sido relatadas10. Freqüentemente as áreas de educação, saúde e gestão de recursos humanos o utiliza como meta para a reengenharia dos métodos de trabalhos e autonomia profissional11. Como resultados positivos, encontramos nesses estudos o sentimento de sentir parte de uma equipe, cujo trabalho é reconhecido como importante, motivante e desafiador, gerador de auto-estima e de vontade de assumir riscos inovadores11,12. Neste artigo definimos “empowerment” como sendo a díade “crescimento-fortalecimento” segundo a perspectiva pedagógica freiriana9,13, na qual crescer e fortalecer-se implica a ativação do potencial analítico dos indivíduos quanto às suas circunstâncias de vida. Aprender-experenciando, desde a inocência à tomada de consciência, e o desejo de promover mudanças, combina-se com a oportunidade de ter liberdade de agir no mundo14. Saber e poder tornam-se projetos viáveis de vida social, político e culturalmente sustentados pela existência de escolhas em movimento contínuo de renovação e recriação congruente com uma ética existencial e uma visão pessoal de verdade de si próprio15.
Objetivo
Este artigo se propõe a trazer os resultados da pesquisa que visou dar voz ao ACS, a partir de suas narrativas, sua visão crítica e os impasses que encontram na prática do trabalho. Assim, intencionamos apresentar elementos de reflexão sobre o potencial de crescimento-fortalecimento e emancipação do ACS e seu “imprevisível” surgimento como liderança na comunidade.
Quadro conceitual
Este estudo piloto teve como base conceitual a educação para a conscientização crítica freiriana nos seus fundamentos filosóficos13, 14: (1) a problematização como método de ensino constitui a base do diálogo; (2) as relações assimétricas de poder e de dominação constituem obstáculos para a comunicação em ambientes de aprendizado; (3) a autoridade e a liberdade recíprocas formam a base da aprendizagem; (4) a problematização e os elementos sociais presentes são manifestados pela linguagem; e, (5) a experiência e a aprendizagem devem estar articuladas. O paradigma se completa pelo reconhecimento das experiências prévias e da dignidade da própria cultura daquele que aprende16 e por questões sobre o significado de vida, a identidade moral, a autoridade, a responsabilidade social, a motivação, os sonhos, as frustrações, as dúvidas e os medos17, culminando com a correspondência entre ação e compreensão do agir do homem no mundo. Assim, define-se conceitualmente a prática educativa do ACS como sendo um conjunto de “processos, técnicas, expectativas, desejos, frustrações e a tensão contínua entre a prática e a teoria, entre liberdade e autoridade, onde qualquer ênfase é inaceitável segundo uma perspectiva democrática”13.
Questionamento norteador
Como o ACS pode trabalhar para o crescimento-fortalecimento da clientela por ele assistida, se ele se sente desprovido de apoio para o seu próprio crescimento-fortalecimento pessoal e profissional? Isso posto, como entender a inserção do ACS na implementação de um programa que visa mobilizar e aumentar as potencialidades da clientela socialmente não afiliada?
Método
O protocolo da pesquisa do tipo etnográfico crítico 19 foi aprovado pelos Research Ethics Board da Queen’s University, Kingston, Canadá e a Comissão de Ética do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPUB-UFRJ), assim como autorizado pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (SMS-RJ). A Direção do CMS intermediou o contato dos pesquisadores com autoridades administrativas e participantes potenciais. Inicialmente, o projeto de pesquisa foi apresentado, pelas duas autoras principais deste artigo, aos 45 ACS, em junho 2003, em uma reunião restrita a eles, no Centro de Estudos do CMS. Após discussão, 24 ACS aceitaram participar, agendando encontros e escolhendo se as entrevistas seriam individuais, em dupla ou em grupos. Da amostra final participaram 16 ACS mulheres e 8 ACS homens, com idade entre 20 a 44 anos, quase todos com escolaridade secundária incompleta. Dois meses prévios à coleta de dados, 13 desses ACS concluíram sua qualificação como Auxiliar de Enfermagem (Aux. Enf.).
Devido à inexperiência como participante em uma pesquisa, informamos aos ACS quanto às modalidades do termo de consentimento informado – oral ou escrito. Após leitura conjunta do termo, todos optaram em assiná-lo, sendo-lhes devolvido uma semana após – fotocopiado – em envelopes pessoais e lacrados, visando resguardar a confidencialidade e o sigilo. As pesquisadoras apresentaram, então, o roteiro composto de 13 perguntas semi-abertas, enfatizando que eles poderiam escolher as perguntas a serem feitas. Seguiu-se uma leitura completa do roteiro e uma discussão entre eles, para definir quais seriam respondidas, o que durou em média 15 minutos. Foram realizadas duas entrevistas individuais e cinco entrevistas grupais, gravadas em fitas de áudio, ouvidas e submetidas a uma análise exploratória imediata. Tal procedimento permitiu a identificação e o aprofundamento de novos temas para entrevistas subseqüentes. A coleta de dados incluiu, ainda, 12 horas de observação participante em 3 visitas às 7 comunidades (acompanhando enfermeiros e ACS), documentação fotográfica realizada por 2 ACS. A posteriori, as entrevistas foram transcritas e codificadas usando o software ATLAS ti versão 4.2 para análise qualitativa.
A interpretação utilizou o método de análise das narrativas denominado Abdução em Comunicação18. Este método evidencia as estruturas de pensamento do narrador, ressaltando as que estejam em alternância argumentativa, definidas como categorias de análise. Estas categorias são induzidas, deduzidas e abduzidas das narrativas, organizadas e articuladas entre si em um diagrama-síntese, denominado pelo autor de templum. A indução refere-se à categoria base; a dedução, uma hipótese surgida do discurso enunciado e, finalmente, a abdução, algo não explícito à primeira vista e que pode revelar fatos novos. Essas três categorias são mediadas por outras três sub-categorias, que apresentam argumentações, contra-argumentações e síntese da análise. Os elementos se completam por duas metacategorias, que mediatizam o discurso em pólos opostos, conforme serão apresentados nas sínteses interpretativas. Dois meses após a coleta de dados foram discutidas, in loco e com 5 dos participantes, a síntese da pré-análise dos resultados. Todos concordaram com a orientação geral definida. O resultado do processo interpretativo dos dados, finalizado em agosto de 2004, não foi devolvido aos participantes devido a modificações na equipe dos ACS e perda de contato com os mesmos.
Resultados
Dados da práxis do ACS estão descritos, em três dimensões empírico-conceituais.
Sustentação ao potencial de desenvolvimento social e humano do ACS.
“Revelar o compromisso do sistema com a comunidade” constitui a maior preocupação profissional do ACS. O “sistema”, para ele, é o Programa ACS e o CMS, que lhe cobra resultados, mas não lhes dá suporte para tal, segundo percepção dos entrevistados. Eles situam aí uma ambigüidade: de um lado, sentem que a equipe técnica do programa lhe exige uma autonomia constante; por outro lado, eles gostariam de ter maior apoio para poder desenvolver essa autonomia. Muitas vezes sentem insegurança para atuar profissionalmente e temem as conseqüências de possíveis erros cometidos, especialmente quando os pacientes são familiares de pessoas envolvidas com o crime organizado. A ausência de apoio é descrita por sentimentos de abandono, como ser “lançado à própria sorte na comunidade”, e por nem sempre conseguir trocar suas ansiedades com parceiros de trabalho, já que as relações interpessoais com outros ACS são frágeis ou tensas. Apesar da queixa de abandono pelos gestores, o ACS considera que seu trabalho lhe propicia recompensas e benefícios pessoais e sociais. Assim descreve sua satisfação profissional: “poder transmitir o pouco de conhecimento que possuo... estar disponível para responder as perguntas e tirar dúvidas”. Apesar de ser morador da comunidade, ele se sente “diferente” pelo poder de ajudar os outros. Mas, ele se sente também “diferente” dentro do CMS, quando encontra barreiras burocráticas que inviabilizam sua intenção de atender as demandas da população. Critica a falta de planejamento estratégico para lidar com as especificidades da “clientela carente” e a insensibilidade dos funcionários do CMS para autorizar o ACS a marcar consultas para a clientela, já que existem impossibilidades concretas dela ir ao CMS, exclusivamente para esse fim: nem sempre tem dinheiro para transporte ou a falta de condições de sair da comunidade devido a situações de fechamento de vias de passagem.
Assim, a ânsia de fazer pela e com a comunidade leva alguns ACS a usar o “jeitinho”, como a “amizade com os funcionários do CMS”, para superar o impasse burocrático e contornar a impessoalidade do “sistema”. Procuram, então, correlacionar as situações de autonomia que lhes são cobradas com a consciência de seus limites e possibilidades de agir. Outros, mais conformistas, optam por não questionar o “sistema” e: “apenas pergunta o que a pessoa está tendo como problema e a encaminha ao CMS”, para que ela vá sem sua intermediação. Há, ainda, os ACS que se formaram como Auxiliar de Enfermagem. Estes apontam a importância da qualificação profissional para a sustentação do desenvolvimento pessoal e humano como um marco na trajetória social e história de vida. Essa qualificação os possibilitou uma diferenciação, levando-os a estimular outros a fazerem o curso, “para ficarem juntinho da gente!”, e assumirem, conscientemente, seu papel de ser “uma voz diferente para falar com a equipe do CMS”. Os benefícios dessa qualificação incluíram a capacidade de transmitir maior confiança à clientela, maior segurança pessoal, além da aquisição de conteúdos teórico-práticos para melhorar sua práxis. O impacto do conhecimento adquirido fortaleceu o ACS naquilo que ele já sabia anteriormente e despertou seu desejo de adquirir mais informações. Mas, sobretudo, ajudou-o a ter mais segurança e “se fazer impor e respeitar... agora na condição de ser um profissional após ter concluído o curso”.
Sustentação da prática educativa do ACS pela descoberta da realidade de vida, da saúde e dos saberes da clientela.
Os ACS entrevistados descrevem três grandes facilitadores para sua prática educativa: viver e morar na comunidade; ter tempo livre e suficiente para planejar e realizar o trabalho; ter liberdade e autonomia para organizar o próprio serviço, buscando articular, quando possível, com outros ACS de sua micro-área (favela). Algumas vezes se perceberam como “um filho proveniente de uma micro-área, porque ali nasci e cresci”. Por isto, assumem compromissos que vão além das atribuições profissionais, como o acolhimento ou alimentação de crianças que durante o dia não têm cuidados parentais, embora tenham consciência de sua limitação pessoal para modificar a realidade sócio-econômica da comunidade. Também, por se considerarem “a identidade da comunidade”, sentem dificuldades em assumir seu papel profissional na interação com aqueles clientes que tentam usar os vínculos afetivos de uma infância comum, como forma de intimidade e prestígio pessoal. Mesmo aqueles que trabalham fora da região onde nasceram demonstram ter introjetado essa identidade dúbia, de ser e não ser afetivamente envolvido com a comunidade. O envolvimento do ACS em atividades de promoção social com as parcerias que estabelece contribui para sua popularidade, mas também produz distorções na forma como a comunidade o vê. É comum ser chamado(a) de “doutor”/“doutora” e ser solicitado a realizar consultas com moradores que se recusam a ir ao CMS para atendimento. Paralelamente, o ACS utiliza as ferramentas que o “sistema” lhe outorga, como o uso do jaleco ou uniforme que lhe “abre as portas” em outras instituições assistenciais. Essa representação parece estar associada a uma personificação do coletivo, já que o ACS assume ser porta-voz e representante da comunidade, compromissando-se com a busca de soluções externas. Mas, contraditoriamente, ao desempenhar essa função, ele passa a ser visto como o “necessitado”, como se fosse a sua “própria identidade”.
No papel de intermediário entre “sistema” e comunidade, o ACS constrói seu saber e uma filosofia que norteia sua prática educativa: implantar programas governamentais sobre a prevenção de doenças por meio da divulgação da informação sobre saúde. Tal prática caracteriza-se pelo esclarecimento de dúvidas, criação de vínculos de confiança, reforço à solidariedade e escuta à clientela, visando intervir nas vulnerabilidades. Seu público alvo é percebido como pessoas expostas às conseqüências nefastas de certas condições, não conscientes da gravidade dessas, vivendo de modo individualista, com poucos vínculos sociais e afetivos. Com o potencial analítico adquirido nesse processo, alguns ACS apontam aspectos que consideram “ameaçadores” à sua segurança, tranqüilidade e eficácia do programa: (1) transmitir dados cadastrais para o ACS que o substitui na área, pelo receio de quebrar o sigilo da informação, o que impede um registro de dados das famílias e da história do programa; (2) tornar-se alternativa comunitária ao livre acesso no trânsito externo e interno, em períodos de conflitos locais; (3) ter sempre prova material de visitas domiciliares a familiares do pessoal envolvido com o tráfego de drogas; (4) conviver com a interrupção do tratamento devido à falta de fornecimento dos medicamentos e o conseqüente descrédito profissional; (5) enfrentar a incapacidade de prevenir infecções intestinais devido ao consumo de restos alimentares; (6) enfim, a impotência diante dos maus tratos e abandono das crianças. Esses aspectos presentes na práxis/vida do ACS se contrapõem à visão do “pessoal do asfalto”, que revelou ser estritamente médica no prevenir doenças. O ACS restringe seu trabalho ao controle de doenças crônicas ou à prevenção de outras. Ele se vê impossibilitado de promover a saúde porque, para ele, falar de saúde implicaria em ter propostas para viver melhor, para reverter a miséria e para ter melhor perspectiva de futuro ou promover a saúde mental em adultos e idosos.
Interferência do autoritarismo no fortalecimento e nas relações intraprofissionais e interpessoais.
A educação adicional recebida pelos ACS, que são Auxiliares de Enfermagem propiciou sua distinção dentro do grupo. Cientes de terem “evoluído”, tornam-se mais críticos quando são convocados para atender às necessidades contingenciais e realizar algum trabalho administrativo-burocrático no CMS e percebendo-se “desviados” de função. Suas recusas, argumentações, diferenças de opinião nem sempre são resolvidas pacificamente. Como decorrência de seu crescimento profissional, questionam não serem reconhecidos como parceiros de trabalho, mas como pessoas “sem enquadramento funcional”. A essas ambigüidades juntam-se linhas conflituosas de diálogo com profissionais do CMS, o que é visto pelo ACS como um impeditivo à resolução de casos clínicos. Por exemplo, alguns médicos recusam-se a atender encaminhamentos feitos por solicitação de enfermeiros e/ou de ACS, pois alegam que não trabalham desta forma. E também muitos ACS não consideram a gestão interna do programa pró-ativa, quando reivindicam a obtenção de recursos materiais para o trabalho de campo e é constatada a falta de equipamentos de proteção ocupacional. Esse é um ponto crítico da insatisfação no trabalho. O ACS, que a princípio seria apenas como um canal de transmissão de mensagens de saúde à população, fortaleceu-se e tornou-se um emissor espontâneo de reivindicações para a melhoria de suas condições ocupacionais, de modo a assegurar a eficácia de suas ações educativas e a continuidade/resolutividade de ações assistenciais. Percebendo a saúde como algo abrangente que inclui trabalho, alimentação e educação, o ACS problematiza essa realidade e revela a necessidade de haver modificações no gerenciamento e operacionalização do PACS, para que o programa amplie a base de diálogo e propicie o fortalecimento das potencialidades dos ACS.
Análise e interpretação
A análise dos achados guiou-se por três hipóteses discursivas:
1. O fortalecimento profissional do ACS resultaria também no fortalecimento da população assistida e otimizaria a prestação de serviços.
As narrativas dos ACS revelaram uma trajetória social comum, marcada por sonhos irrealizados, interrupções dos estudos e sub-empregos. Para muitos ter a “carteira assinada” e o primeiro emprego formal levou à percepção das capacidades em dar respostas às necessidades da comunidade e do potencial pessoal, o que possibilitou a descoberta da “vocação”, auto-realização, conscientização e motivação para o contínuo aprendizado. Associando sua trajetória à da população a que assiste, o ACS tomou consciência que o potencial comunitário será fortalecido pelo conhecimento, propiciado por parcerias na área educacional. Tal consciência se expande à reivindicação dos seus direitos trabalhistas (adicional de insalubridade, auxílio-doença e equipamento de proteção) e à discussão da organização da equipe de ACS, formação de associações, sindicalização etc. O agir como elo de ligação entre a comunidade e o sistema de saúde, aproximando realidades distintas e mundos diferentes, constitui o centro do trabalho e do envolvimento comunitário do ACS, e ele sabe disso; mas se ressente quando afirma que o programa deveria ter como estratégia lhe dar sustentação e fortalecimento como liderança social, já que o ACS é um facilitador, cujo status não pode ser conquistado apenas por eles próprios.
Síntese interpretativa 1: O discurso do potencial pessoal e profissional do ACS é analisado a partir de duas categorias básicas: uma negativa, por ter havido um interesse oportunista pelo emprego; outra positiva, por ter descoberto sua vocação. Partindo-se da incompreensão que ele tem dos limites da práxis, hipotetisa-se que tem consciência de suas potencialidades, o que é provado pelas estratégias que criam para consecução de objetivos. Não aceitando o discurso de que a educação é instrumento e produto, critica as formas gerenciais e relações político-trabalhistas, concluindo que as respostas às demandas prioritárias da comunidade são parciais.
2. A concepção de saúde do ACS apresentaria aspectos mais amplos que ultrapassam as dimensões do saber biomédico recebido no treinamento, gerando discordâncias entre o fazer prescrito e as respostas às necessidades da prática.
Por ocasião das visitas à comunidade, observamos sinais externos de um mundo de difícil apreensão. Constatamos o modo como a equipe é abordada, que interações pessoais se estabelecem, como se ensina no meio da rua, à sombra da mangueira. Uma prática simples e harmoniosa com o perfil de vida da clientela a qual, segundo os entrevistados, nem sempre é captada em sua complexidade e peculiaridades pelos gestores de políticas e de programas de saúde e educação, como pode ser conferido nas frases dos ACS, ditas por ocasião das visitas de campo: “a senhora agora entende o que eu falei na entrevista?”...“mas ninguém vem até aqui para ver a realidade da comunidade!”... “tá vendo? Isto é condição de vida de gente? Nem cachorro vive assim tão abandonado!”... “ a senhora viu? Viu a casa? Viu a cozinha? Como eu posso falar em legumes, frutas ....comida com essa gente?”... “a gente faz o que pode....tanta desgraça..sujeira, abandono, pobreza...nem eu sabia que isto existia perto de mim”.
A consciência dessa realidade social demonstrou ser a força desencadeadora para uma postura crítica do ACS. Apesar de ser oriundo da comunidade, só se conscientizou da dimensão do problema quando assumiu o mandato implícito de ser liderança social. O aprendizado diário sobre as carências múltiplas das famílias lhe revelou o extenso abandono social, provocando indignação quanto à ausência de ações sociais efetivas por parte do Poder Público. Essa visão crítica mobilizou sua responsabilidade para ser um “porta-voz” ativo dos problemas ali enfrentados. O ACS considera que as necessidades enfrentadas pela população deveriam ser alvo de ações integradas entre o PACS e o Governo, tais como: sustentação de atividade econômica e oportunidades de trabalho; alfabetização de jovens e adultos; programas de alimentação suplementar extensivos às crianças da primeira infância; programas de mobilização social, além da urbanização para a saúde ambiental. O ACS considera saúde em sua multidimensionalidade, para a qual apenas orientações gerais e o acompanhamento pós-consulta são insuficientes. Daí resultam sentimentos de frustração e receios quanto à sustentação do trabalho realizado. No discurso do ACS não fica evidente se seus questionamentos e sentimentos de ambigüidade, aliados às condições de trabalho, serão reconhecidos pelos gestores.
Síntese interpretativa 2: A sustentação da prática educativa oscila entre as duas categorias que se opõem: a visão biomédica de saúde (-) e da visão multidimensional de saúde (+). O tema paradoxos e contradições transformadores da filosofia educacional do ACS leva à hipotese da dubiedade do envolvimento afetivo-social com a comunidade, abduzindo-se a reafirmação e introjeção da identidade social e profissional. A tese da criação de laços de confiança entre ACS-Comunidade é contraposta pelo confronto com a complexidade comunitária de vida-saúde, concluindo-se pela a insatisfação diante das ações superficiais e soluções parciais do programa.
3. O sistema criou um profissional intermediário apenas para ensinar para a saúde, não imaginando que esse pudesse ter voz e dar voz àqueles que viessem a questionar a ordem vigente.
Sendo o CMS o ponto de interseção entre o ACS, o sistema administrativo formal e o Poder Público, a questão do fortalecimento pessoal-profissional deste encontra-se diluída em dimensões gerenciais intrigantes, a saber: (1) não existe relação funcional oficial com a estrutura hierárquica do CMS, (2) as linhas hierárquicas são ora obscuras, ora multidirecionais, e ainda, (3) existe uma subordinação administrativa contratual a uma organização não-governamental (ONG). O ACS desempenha suas funções em subordinação técnica ao enfermeiro; em subordinação administrativa à Direção do CMS; e em subordinação funcional, a uma ONG que gerencia o PACS. Nessas dimensões do fazer, coordenar e gerenciar, encontram-se as decisões passíveis de influenciar o fortalecimento pessoal e profissional do ACS, ora dispersas, ora simultâneas. Em uma abrangência pluralista, onde muitos veiculam suas idéias, o poder da liderança social legitima-se, entre ACS e clientela, por meandros informais, bem como gera conflitos no encontro com as linhas formais do gerenciamento e supervisão técnica que são feitos pelos profissionais do CMS. O poder que existe imbricado nos processos, políticas e iniciativas gerenciais para a promoção do fortalecimento profissional em relações organizacionais é entendido em quatro dimensões conceituais distintas: o acesso aos recursos; o domínio dos processos; a construção de significados convergentes; e, a iniciativa pessoal em direção à autonomia20. Nessa última dimensão, encontram-se as posturas filosóficas13-16 que nos permitem entender que o jogo do poder envolve sobrevivência, criação de significados e enfrentamentos com os instrumentos disciplinares. Assim, no encontro do ACS com membros da equipe do CMS, tornam-se inevitáveis os conflitos, as oposições, as medidas disciplinares, as insubordinações, o jogo de influências, tudo como estratégias básicas de preservação ou de confrontação com o status quo postas em prática nas diferentes posições sociais dos atores. Embora parecendo desiguais e divergentes, os atores agem em uma mesma direção, nesse cenário de prática profissional: construção, remodelamento e/ou destruição de expectativas de papéis sociais mais consoantes com uma filosofia assistencial de promoção à saúde. Tal prática ousada desafia a pertinência dos discursos teóricos sobre participação e controle comunitário no âmbito da saúde de parte da população.
O trabalho do ACS, num grande centro urbano, traz em si o potencial de desestabilizar a hegemonia das equipes de saúde tradicionalmente constituídas. Curioso notar que, entre a comunidade, os ACS e a equipe profissional do CMS, inexiste uma sincronia no foco do que deve estar na base da promoção e assistência à saúde dessa clientela: para a comunidade deveria ser a alimentação; para os ACS, ofertas e oportunidades de emprego, promoção de bem-estar social, alfabetização, saneamento, educação e saúde; para os profissionais do CMS, informações sobre cuidados de saúde preventiva e controle de condições clínicas através de orientações à saúde. Não deve, pois, causar estranheza que, ante tais disparidades de compreensões - quanto à realidade de vida e saúde da comunidade vivendo em condições de não afiliação social1 e fragilidade de laços sociais, assim como da ausência evidente de objetivos comuns entre todos os atores envolvidos, alguns ACS se encontrem insatisfeitos e deslocados nesse cenário de prática. Em seus depoimentos, foi-nos possível detectar indícios de que tal insatisfação se manifesta também na comunidade e em alguns profissionais de saúde. Enfim, a presente situação nos parece ímpar. Finalmente, em larga escala, ousou-se dar voz aos ACS que desenvolveram uma nova práxis em saúde e que agora se amplia para as questões de saúde e miséria social na grande cidade.
Síntese interpretativa 3: O fortalecimento do ACS na práxis e na estrutura do PACS, oscila entre os pólos: do poder “mudo” institucionalizado (-) e do poder “falante” na comunidade (+). Como tem consciência da extensão do abandono social, deduz-se que o ACS constata as enormes carências sociais, deduzindo que ele introjeta o papel de líder social e de voz comunitária. O argumento que ele tem experiências pessoais de intervir na estrutura do CSM é contraposto à decisão de superar barreiras para servir a comunidade, concluindo que o ACS usa do conhecimento em prol da comunidade.
Discussão e Possibilidades de mudanças na práxis
O processo de despertar o fortalecimento pessoal e profissional conduziu inevitavelmente a situações de conflitos entre as prévias e renovadas maneiras de ser, pensar e agir. Implantar programas comunitários, visando esse fortalecimento para construção de capacidade comunitária sem um plano conjunto de gestão e resolução de conflitos, envolve riscos e constitui um enorme perigo à sua sustentabilidade. A análise da experiência de sete anos de um programa comunitário que visava o fortalecimento, teoricamente fundamentado pela perspectiva freiriana13,14, destacou alguns riscos inerentes à gestão de conflitos: desatenção à vulnerabilidade dos grupos que optem pela neutralidade; negligência do diálogo entre os grupos polarizados; arbitrariedade na exclusão de dissidências, conduzindo à ruptura entre os vínculos intra-grupal; e, imprevisibilidade do nascimento de novas lideranças21. Mobilizar pessoas exige uma infra-estrutura administrativa sensível à emergência de conflitos e consciente do mandato de ouvir/dialogar, negociar/deliberar e mobilizar/sustentar potencialidades humanas. Uma responsabilidade coletiva, qualquer que seja a posição administrativa assumida, deve ser adotada nas políticas de trabalho que são centradas na mobilização de potencial humano. Tal forma de gerenciamento pressupõe lideranças recíprocas, as quais devem ter um papel de comunicador, com respeito, retroação descritiva, suporte e apoio mútuo22. Tais líderes organizariam o trabalho valorizando o potencial das pessoas, introduzindo a visão de desafio a superar, abolindo o individualismo para criar a noção de equipe, tudo isto com uma margem de manobra em suas ações. O exercício cotidiano do aprimoramento humano dos profissionais, para respeitar e apoiar colegas, incentivar e agradecer parceiros, considerar as vozes internas e externas, deve ser intencional.
A tomada de consciência associada ao poder, conhecimento, respeito aos outros, progresso profissional e prática desenvolvida em um ambiente de sociabilidade, resulta na aquisição progressiva de uma capacidade de resolução de problemas23. Os presentes resultados corroboram as idéias freirianas 24 quanto à liberdade de ajudar os outros e, simultaneamente, se sentir livre para transformar o contexto social como prova de fortalecimento pessoal. Fortalecimento entendido como espaço de ação face às desigualdades sociais em saúde, refletindo a conscientização para mobilização de outros e aglutinação de forças para a criação de alianças25. Sendo uma pessoa oriunda da comunidade e, portanto, conhecedora do mundo do educando13,14,17, o ACS pôde fazer a leitura do mundo dos educandos para responder seu mandato social, o que lhe serviu de impulso para instrumentalizar seu próprio conhecimento adquirido tanto no treinamento inicial, quanto na qualificação profissional para Auxiliar de Enfermagem. Buscando emancipar outros e emancipando-se através da educação informal em saúde, o ACS abordou o cliente, em igualdade de poder, para criar um novo estilo de relação entre prestador de cuidados-cliente. Na sua prática educativa, o ACS confrontou-se com situações nas quais suas identidades pessoais e profissionais co-existiram sob a influência do poder e prestígio pessoal, fidelidade comunitária, compromisso moral e lealdade profissional.
A voz que se ouviu amplificou as vozes comunitárias na denúncia, alerta, desobediência ou reivindicação: alerta para um potencial inexplorado da comunidade; reivindicação ao urgente atendimento às necessidades desta, reiterando as interferências das desigualdades sociais sobre o ensinar e aprender em saúde. Ainda, veiculou um discurso de quem se fortaleceu ao intermediar o diálogo entre mundos distintos, reagindo às incoerências entre a filosofia institucional e a práxis, revelando, por vezes, inconformismo, lealdade ao “sistema” e à comunidade ou, ainda, evitação de conflitos profissionais26. Por outro lado, reiterou compromissos pessoais e exigiu oportunidades de participar nas decisões para fortalecer sua identidade profissional12, o que evidencia a aquisição de consciência política e prática, resultado do processo de transformação14.. Transformação, denúncias e sonhos foram instrumentos primordiais para os ACS locomoverem-se entre as estruturas de divisão do trabalho e intermediação entre comunidade-CMS-PACS.
Finalmente, a partir da análise dos dados coletados, cabe-nos apontar alguns aspectos que se evidenciaram nas entrevistas como demandas dos ACS e que são sensíveis às intervenções por parte dos gestores do programa, à guisa de recomendações: (1) Oferecer educação continuada a todos atores sociais, através de dinâmica integrativa de grupo e oficinas de exercício de gestão e resolução de conflitos; (2) Definir ações coletivas para situações contingenciais, ameaçadoras à sustentabilidade institucional do programa; (3) Construir formas para compartilhar o poder, transformar a instituição, revigorar equipes, prevenir conflitos, aumentar a satisfação no trabalho e a circulação de informações, bem como consolidar lideranças; (4) Incorporar o ACS na comunicação e sociabilização dos saberes, quebrando barreiras para haver diálogo e negociação entre os atores do processo; (5) Organizar a documentação do programa para registrar a história do programa, que hoje existe dispersa, rompendo o isolamento profissional e aumentando a colaboração interprofissional; (6) Reconhecer e legitimar as lideranças, surgidas a partir da práxis e do fortalecimento pessoal e profissional dos ACS, criando condições de possibilidade para que se estruturem em equipes e criem um canal de trocas para as transformações necessárias. Tais recomendações reiteram os desafios ainda vigentes para a consolidação da liderança de enfermeiros na direção participativa.27
Conclusão
A aproximação com o cotidiano do trabalho do ACS na “favela” revestiu-se de extrema importância. Identificamos que o fortalecimento desse se encontra na descoberta da realidade social da comunidade, na contínua satisfação com o trabalho comunitário, incorporação da identidade social da comunidade socialmente desfiliada1 e na aceitação do mandato social de liderança e de ser a “voz” comunitária. Tudo isso gerou uma motivação para continuar sua escolarização e a necessidade de instrumentalizar suas habilidades comunicacionais. A comunicação é crucial não apenas em função de serem grupos que têm prioridades e modos de agir diferentes e que necessitam ter pontos em comum para o diálogo. Ela é o que possibilita o respeito aos aspectos importantes com que cada grupo trabalha e se posiciona diante das questões surgidas. O presente artigo reflete, portanto, os sentimentos e visões dos ACS, sem emitir juízo de valor, relatando suas percepções sobre a práxis, para que profissionais lotados em um CMS possam compreendê-los melhor e contribuir para o robustecimento daqueles que deverão, enfim, facilitar o fortalecimento da população assistida. O desafio que se coloca para gestores é como apreender a idéia de que alfabetizar e orientar para a saúde, apesar da complexidade, requer proposições simples, como a de retirar as lentes do simplório, trazer a discussão-ação para o interior do paradigma científico da complexidade e conceber, então, modalidades de agir simples e eficazes.
Referências
1. Castel R. Les métamorphoses de la question sociale: une chronique du salariat. [The transformations of the social question. A chronicle of the salaried staff]. Paris: Fayard, 1995.
2. Nyatanga L, Dann K.L. Empowerment in nursing: the role of philosophical and psychological factors. Nurs Philos 2002; 3(3): 234-39.
3. Senna M.C.M. Eqüidade e política de saúde: algumas reflexões sobre o Programa Saúde da Família. Cad. Saúde Pública. 2002; 18 (Suppl): 203-11.
4. Neri M, Soares W. Desigualdade social e saúde no Brasil. Cad. Saúde Públi. 2002; 18 (Suppl): 77-7.
5. Nunes MO, Trad LB, Almeida BA, Homem CR, Melo MCIC. O agente comunitário de saúde: construção da identidade desse personagem híbrido e polifônico. Cad. Saúde Pública2002; 18(6): 1639-46.
6. Senna D M. O perfil dos Agentes Comunitários de Saúde: a construção de um saber. Livro de Resumos do VII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva; 2003, 29 de julho à 02 de agosto, Brasília, DF. p. 4.
7. Escorel S, Giovanella L, Mendonça, Delgado M. Avaliação do Programa de Saúde da Família em oito grandes centros urbanos: o ponto de vista das famílias. Livro de Resumos do VII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva; 2003, 29 de julho à 02 de agosto, Brasília, DF .p. 62.
8. Peter E, Lunardi VL, Macfarlane A. Nursing resistance as ethical action: literature review. J Adv Nurs 2004; 46(4): 403-16.
9. Bent KN. The people know what they want: an empowerment process of sustainable, ecological community health. ANS Adv Nurs Sci 2003; 26(3): 215-26.
10. Powers P. Empowerment as treatment and the role of health professionals. ANS Adv Nurs Sci 2003; 26(3): 227-37.
11. Valadares KJ. The practicality of employee empowerment: supporting a psychologically safe culture. Health Care Manag (Frederick). 2004; 23(3): 220-4.
12. McDonald R. Individual identity and organisational control: empowerment and modernization in a Primary Care Trust. Sociol Health Illn. 2004; 26(7): 925-50.
13. Freire P. Education for critical consciousness. New York: Continuum; 2000.
14. Freire P. Pedagogy of hope. New York: Continuum; 2003
15. Foucault M. Tecnologies of the self. In Martin LH, Gutman H, Hutton P editors. Technologies of the self: a seminar with Michel Foucault. London: Tavistock; 1988.
16. Gibson R. Paulo Freire and pedagogy for social justice. Theor Res Soc Educ 1999; 27: 129-59.
17. Mustakova-Possardt E. Critical consciousness: an alternative pathway for positive personal and social development. J Adult Dev 1998; 5(1): 13-30.
18. Boudon P. Entre rhétorique et dialectique: la constitution des figures d'argumentation. [Between rhetoric and dialectic: The composition of argumentative figures]. Langages 2000; 137: 63-86.
19. Cook KE. Using critical ethnography to explore issues in health promotion. Qual Health Res. 2005; 15(1): 129-38.
20. Hardy C, Leiba-O’Sullivan, S. The power behind empowerment: implications for research and practice. Hum Relat 1998; 51(4): 451-83.
21. Flick LH, Reese CG, Rogers G, Flectcher P, Sonn J. Building communities for health: lessons from a seven-year-old neighbourhood/university partnership. Health Educ Q 1994; 21(3): 369-80.
22. LaflammeM, Goyette J, Mathieu L. Le gestionnaire en pleine mutation: les huit dimensions et comportements associés à la mobilisation des personnels. [The manager in mutation. The eight dimensions and the behaviours related to personnel mobility]. Revue Organisation & territories 1996; 5(2): 65-76.
23. Kuokkanen L Katajisto J. Promoting or impeding empowerment? Nurses’ assessments of their work environment. J Nurs Adm. 2003; 33(4): 209-15.
24. Shor, I Freire P. A Pedagogy for Liberation: dialogues on transforming education. New York: Bergin & Garvey; 1987.
25. Campbell C Jovchelovitch S. Health, community and development: towards a social psychology of participation. J Community Appl. Soc. Psychol. 2000; 10(4): 255-70.
26. Deetz S. Discursive formations, strategized subordination and self surveillance. In McKinlay A., Starkey K editors. Foucault, management and organization theory. London: Sage; 1998.
27. Santos SR, Moreira RC. The nurse’s leadership: challenges of the practice. Online Brazilian Journal of Nursing (OBJN-ISSN 1676-4285) [online] 2004 December 3(3) Available in: www.uff.br/nepae/objn303santosetal.htm
Notas:
1- Resultados parciais do estudo “Community health agents as social actors sustaining family health literacy”, financiado por Queen’s University Research Initiation Grant e Association of Colleges and Universities of Canada, Latin America and Caribbean Research Exchange Grant 2003, numa parceira entre a Queen’s University-School of Nursing e o IPUB-UFRJ. Agradecemos a autorização concedida pela SMS-RJ, a Escola de Enfermagem Anna Néry [UFRJ] pelo suporte operacional para a realização das entrevistas, a Direção Geral e aos profissionais do PACS, do CMS, pelo apoio logístico imprescindível a realização do estudo. Por questões éticas, seus nomes não são revelados. Nossa gratidão, aos ACS que compartilharam conosco suas vivências, idéias, frustrações e sonhos.
2- As frases e as palavras entre aspas e em itálico referem-se às falas dos ACS entrevistados.
3- Temas correlatos a gestão e avaliação do PACS não são objetos de análise do presente artigo.