AS REDES SOCIAIS DE APOIO NO CUIDADO DOMICILIAR: PESQUISA DESCRITIVA-EXPLORATÓRIA
RESUMO
Introdução: Redes sociais de apoio são importantes para a melhoria das condições de saúde e qualidade de vida das pessoas, especialmente no cuidado domiciliar. Objetivos: Identificar as redes sociais de apoio utilizadas por famílias e aquelas indicadas pelos profissionais de saúde no cuidado domiciliar, para classificá-las de acordo com o tipo de apoio e de relação oferecidos e justapô-las. Metodologia: Pesquisa qualitativa do tipo descritiva-exploratória realizada em 2010, por meio de entrevista semiestruturada com sete familiares e cinco usuários que recebiam cuidado domiciliar e dez profissionais de Unidade de Saúde que atuavam nesta área. Resultados: Para as famílias, o apoio espiritual foi o mais citado, e o afetivo foi pouco significativo; os profissionais indicaram empresas privadas, organizações não-governamentais e fundações como apoio material, mas a maioria deles relatou não se envolver com apoio espiritual. O apoio informal das famílias adveio principalmente de indivíduos e os profissionais citaram pouco este apoio. No apoio formal, as famílias relataram instituições religiosas e os profissionais citaram empresas privadas, órgãos públicos e de defesa. Conclusão: Faz-se necessário que o enfermeiro oriente a família, para que esta se reestruture e divida tarefas que auxiliem no cuidado domiciliar, por meio do uso de redes sociais de apoio. Ademais, sugere-se a articulação dos profissionais de saúde com instituições locais para formação dessas redes, a fim de melhorar a assistência e proporcionar impacto positivo na saúde dos usuários e cuidadores.
Palavras-chave: Apoio social, Assistência domiciliar, Enfermagem.
INTRODUÇÃO
A atenção domiciliar iniciou-se no ano de 1780, nos Estados Unidos, com a criação de um serviço destinado a esse fim, vinculado a uma instituição hospitalar. Porém, somente em 1947, nesse mesmo país, no hospital de Montefiore, no Bronx, o conceito de Home Care, entendido naquele momento como extensão do atendimento hospitalar, foi introduzido, com o objetivo de abreviar a alta. No Brasil, a primeira experiência organizada na área se deu com a criação do Serviço de Assistência Médica Domiciliar de Urgência (SAMDU), em 1949(1).
A necessidade de cuidado no domicílio tem aumentado cada vez mais. O cuidado domiciliar irá firmar-se definitivamente no século XXI e passará a ampliar ainda mais seu espaço, como uma especialidade para todos os profissionais da saúde, mas, sobretudo, para enfermeiros e demais trabalhadores de Enfermagem(2).
A prática do cuidado domiciliar não possui um único e restrito objeto de trabalho, é formada tanto pelo usuário que está carente de cuidado, quanto por seus familiares(3). A família, que possui um ente que precisa de cuidados em seu domicílio, muitas vezes não tem apoio e condições suficientes para tratá-lo de acordo com as suas necessidades, pois ele demanda, entre outros aspectos, de recursos à sua disposição(4).
No Brasil, devido ao crescimento do número de pessoas idosas, há o aumento na demanda de saúde desta população e, nesse contexto, o cuidado domiciliar aparece como uma possibilidade de cuidado. Com isso, destaca-se que o cuidado oferecido à pessoa idosa é garantido pelo Estatuto e pela Política Nacional do Idoso, os quais objetivam assegurar, dentre outros, o direito à saúde, incluindo o atendimento domiciliar ao idoso que necessite ou esteja impossibilitado de se locomover até o serviço de saúde(5,6).
Nesse sentido, é importante preocupar-se com as famílias, os usuários e suas particularidades, os cuidadores e, também, com a formação de uma rede social de apoio capaz de auxiliá-los, principalmente porque esta rede pode contribuir significativamente para a melhoria da saúde de seus participantes(4) e para assegurar os direitos das pessoas assistidas.
Apoio social pode ser definido como “qualquer informação, falada, ou não, ou auxílio material oferecidos por grupos ou pessoas, com as quais teríamos contatos sistemáticos, que resultam em efeitos emocionais ou comportamentos positivos”(7:325). A rede social é uma teia de relações que liga os diversos indivíduos que possuem vínculos sociais e propicia que os recursos de apoio fluam por meio desses vínculos(8).
Destarte, para atuar no domicílio é importante ter sensibilidade e capacidade para mobilizar recursos disponíveis para o cuidado(9), e isso poderá ser feito por meio de redes sociais de apoio. Ao considerar que as redes sociais de apoio possuem grande importância para a melhoria das condições de saúde e qualidade de vida, principalmente na atenção domiciliar, os profissionais e instituições de saúde devem estar preparados para oferecer esse suporte, não só como membros dessas redes, mas também como identificadores de recursos existentes na comunidade, a fim de auxiliar, principalmente, aqueles que possuem maior dificuldade econômica(4).
Em revisão integrativa realizada em 2010, cujo objetivo foi compreender quais as correlações estabelecidas entre redes sociais de apoio e assistência domiciliar, verificou-se no final da pesquisa a não existência de estudos brasileiros que buscassem identificar as redes desenvolvidas após a eminência do cuidado domiciliar(10).
Assim, diante do exposto, esta pesquisa teve a seguinte questão norteadora: “Quais são as redes sociais de apoio utilizadas pelas famílias e indicadas pelos profissionais de saúde no cuidado domiciliar?”. Com isso, objetivou-se identificar as redes sociais de apoio utilizadas por famílias e aquelas indicadas pelos profissionais de saúde no cuidado domiciliar, para então classificá-las de acordo com o tipo de apoio e de relação oferecidos, além de justapô-las.
Essa pesquisa torna-se relevante, uma vez que a identificação das redes sociais de apoio existentes em uma comunidade e sua classificação pode contribuir na efetividade do cuidado domiciliar, pois a partir deste conhecimento, os profissionais de saúde podem indicar ao usuário e familiares as redes disponíveis e mais apropriadas de acordo com a realidade e a necessidade de cada um.
METODOLOGIA
Pesquisa qualitativa do tipo descritiva-exploratória realizada em Unidade de Saúde (US) com Estratégia de Saúde da Família (ESF) do município de Curitiba-PR. Os participantes fizeram parte de dois grupos. O primeiro grupo foi composto por 12 pessoas, sendo cinco usuários que recebiam cuidado domiciliar e sete familiares. Esses 12 participantes faziam parte de 10 famílias, uma vez que foi entrevistada apenas uma pessoa em oito famílias, e duas pessoas (usuário e familiar) em duas famílias.
Os critérios de inclusão deste grupo consistiram em: ser familiar ou usuário que recebe cuidado domiciliar por um período superior a seis meses; aceitar participar voluntariamente da pesquisa; e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os critérios de exclusão foram: ser familiar ou usuário que recebe cuidado domiciliar por um período inferior a seis meses e não aceitar participar voluntariamente da pesquisa.
Do segundo grupo fizeram parte 10 profissionais de saúde que realizavam ou coordenavam o cuidado domiciliar na US, presentes no período de realização da pesquisa, sendo seis auxiliares de Enfermagem, duas enfermeiras, um médico e uma Autoridade Sanitária Local. Tais profissionais foram entrevistados por terem uma aproximação com o cuidado domiciliar e, possivelmente, conhecerem sobre redes sociais de apoio.
Para o segundo grupo, os critérios de inclusão foram: ser profissional de saúde da US sede da pesquisa; realizar ou coordenar o cuidado domiciliar; aceitar participar voluntariamente da pesquisa; e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram excluídos aqueles profissionais que não se encaixavam nos critérios de inclusão descritos.
A coleta de dados ocorreu no período de Agosto a Outubro de 2010, por meio de entrevista semiestruturada audiogravada, composta por questões referentes à identificação dos participantes, e perguntas abertas relacionadas aos cuidados recebidos e oferecidos, à ajuda de ordem material, espiritual, financeira e afetiva, às pessoas que indicavam esta ajuda e ainda, para os profissionais, onde encontravam informações para a indicação das redes sociais de apoio às famílias.
Para a caracterização das famílias participantes, utilizaram-se os itens sexo e idade do usuário, número de pessoas no domicílio, renda média, doença que levou o usuário a receber cuidado domiciliar e o período em que este recebia o cuidado no domicílio. Para a caracterização dos profissionais de saúde identificaram-se as variáveis sexo, idade, formação principal, cargo ou função exercidos na US, e tempo de atuação na ESF.
Para a análise dos dados, as redes de apoio utilizadas pelas famílias e indicadas pelos profissionais foram classificadas, primeiramente, de acordo com o tipo de apoio: apoio material, apoio no cuidado, apoio espiritual, apoio financeiro e apoio afetivo; posteriormente, essas mesmas redes foram reclassificadas segundo o tipo de relação, sendo informal ou formal(11,12). Feita tal classificação, realizou-se a justaposição das redes e, em seguida, efetuou-se a discussão dos dados obtidos, com base na literatura.
A pesquisa seguiu os preceitos éticos preconizados pela Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, e o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná (CEP/SD: 940.065.10.06 – CAAE: 0040.0.091.000-10). Recebeu ainda parecer favorável do Comitê de Ética da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
Nas famílias participantes, cinco usuários eram do sexo feminino e cinco do sexo masculino, com média de idade de 72 anos. O número de pessoas no domicílio não ultrapassou quatro membros e a renda mensal variou de um até mais de sete salários mínimos. Os problemas de saúde que mais levaram o usuário a receber cuidado domiciliar foram as doenças crônicas, como acidente vascular cerebral, câncer, diabetes mellitus, doença pulmonar obstrutiva crônica e insuficiência renal, e o período que cada usuário recebia esse cuidado variou entre sete a 60 meses.
O grupo dos profissionais de saúde era formado predominantemente por mulheres, com faixa etária entre 31 e 61 anos e o tempo de atuação na ESF ultrapassou cinco anos. Três dos participantes que atuavam como auxiliares de Enfermagem possuíam também formação superior.
Os dados referentes às redes sociais de apoio foram agrupados em três categorias, assim denominadas: “Redes sociais de apoio utilizadas por famílias que recebem cuidado domiciliar”; “Redes sociais de apoio indicadas pelos profissionais de saúde que realizam cuidado domiciliar”; “Correlação entre as redes sociais de apoio utilizadas pelas famílias e aquelas indicadas pelos profissionais de saúde no cuidado domiciliar”.
Redes sociais de apoio utilizadas por famílias que recebem cuidado domiciliar
O maior número de instituições de apoio citadas pelas famílias capazes de subsidiar o cuidado realizado no domicílio relacionava-se àquelas provedoras de materiais para o cuidado, dentre os quais se destacaram: fraldas, medicamentos, materiais de higiene, materiais para execução do cuidado e produtos para locomoção, como bengalas, cadeiras de rodas e muletas.
Os cuidados ao usuário, na maior parte das famílias, eram exercidos pelos próprios familiares, e revelavam o apoio no cuidado. Estes familiares, algumas vezes, eram orientados por profissionais de saúde. O apoio espiritual foi o mais citado, pois estava presente em oito das 10 famílias participantes, e, em sua maioria, adveio de instituições religiosas. Um dos familiares relatou os programas televisivos como forma deste tipo de apoio.
Em relação ao apoio financeiro, seis das 10 famílias participantes afirmaram não recebê-lo, porém, após análise das entrevistas, percebeu-se que as famílias consideram apoio financeiro apenas aquele recebido em forma de dinheiro, e não os demais apoios, como cestas básicas e auxílio para obtenção de aposentadoria. O apoio afetivo foi pouco expressivo, abrangendo apenas pessoas do próprio grupo familiar, como filhos, esposas e netos.
Quando o apoio foi classificado em formal ou informal, observou-se que o apoio informal provinha de indivíduos geralmente próximos ao domicílio, como familiares (com destaque para filhos e esposa), vizinhos e moradores da região, que auxiliavam tanto na execução do cuidado como no provimento de insumos para este.
Constatou-se ainda, nas redes sociais de apoio do tipo informal, a presença dos funcionários da US, que mesmo vinculados a uma rede social de apoio formal, oferecem apoio capaz de transformar a relação em informal para aqueles que a recebem, ao atuarem de maneira individual.
No apoio formal, ou seja, aquele que provém de instituições, verificou-se que o maior número de apoio citado era referente às instituições religiosas, como igrejas e grupos de auto-ajuda. Observou-se ainda o apoio de órgãos públicos como a prefeitura, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e a Fundação de Ação Social (FAS). É importante destacar que duas das 10 famílias participantes, com exceção do apoio advindo da US, relataram não receber nenhum outro tipo de apoio formal.
Redes sociais de apoio indicadas pelos profissionais de saúde que realizam cuidado domiciliar
Com relação ao apoio material, os profissionais de saúde indicaram as empresas privadas, as Organizações Não-Governamentais (ONGs), as fundações, entre outras. Destaca-se a importância da US como provedora desse tipo de apoio, pois ela fornece material para a realização do cuidado domiciliar. Esperava-se, portanto, que os profissionais de saúde a apontassem como a principal fonte de apoio material para o cuidado domiciliar, mas ela só foi citada por quatro dos 10 profissionais participantes.
Notou-se ainda a participação de instituições religiosas no fornecimento de materiais para o cuidado no domicílio, bem como de empresas da região, as quais se utilizam dos incentivos fiscais para realizar doações.
Quando questionados sobre a indicação de apoio espiritual, seis dos 10 participantes afirmaram não se envolverem com este tipo de indicação. Contudo, foi possível constatar que alguns profissionais citam grupos religiosos presentes na comunidade e preocupam-se em não indicar uma religião específica.
O apoio financeiro indicado relacionava-se principalmente às instituições governamentais, como a FAS, o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), a prefeitura e as instituições religiosas. A orientação mais observada nas entrevistas, advindas desse tipo de apoio, tratava da indicação para o benefício de aposentadoria, seja por motivo de saúde ou idade.
A indicação dos profissionais relativa ao apoio afetivo se constituiu, basicamente, na reunião do grupo familiar para identificação de um cuidador principal, que possa auxiliar os profissionais de saúde na execução e manutenção do cuidado no domicílio. Foram citados, ainda, órgãos públicos de proteção, como o Ministério Público e Conselho do Idoso, quando se tratava de usuário idoso, em especial, aquele que sofre abandono ou maus-tratos. Para esse, neste momento há necessidade de intervenção do Estado para que haja efetivação do cuidado domiciliar.
Ressalta-se que o apoio no cuidado não apareceu entre as redes sociais de apoio citadas pelos profissionais.
Com relação ao apoio informal, os profissionais participantes o citaram pouco, limitando-se à indicação de religiosos, familiares e vizinhos dos usuários, colegas e funcionários da US.
Nas relações do tipo formal foram indicadas empresas privadas, órgãos públicos, como a prefeitura e suas secretarias, e ainda FAS, CRAS, Associação Paranaense de Reabilitação (APR) e US. Órgãos de defesa também foram mencionados, como o Ministério Público e o Conselho do Idoso, além de grupos religiosos, como o Instituto Palazoro, o Lar das meninas e algumas igrejas.
Correlação entre as redes sociais de apoio utilizadas pelas famílias e aquelas indicadas pelos profissionais de saúde no cuidado domiciliar
Ao analisar as falas dos dois grupos de participantes, percebeu-se que no grupo das famílias as redes sociais de apoio eram compostas, em sua maioria, por indivíduos. Já os profissionais de saúde costumam indicar instituições para a busca de auxílio.
Ainda na justaposição das falas constatou-se que o apoio espiritual é muito importante para as famílias que possuem um ente que necessita de cuidado domiciliar, porém, os profissionais de saúde não indicaram de forma significativa este tipo de apoio.
Para a maioria dos profissionais de saúde, a US, dentro de suas atribuições, atende às necessidades dos usuários e familiares que necessitam de cuidado domiciliar, mas o que se pôde perceber nas falas das famílias foi o não reconhecimento dessas funções, uma vez que houve a citação de falhas, as quais não eram da competência dos profissionais ali atuantes.
Além disso, outros profissionais de saúde, não integrantes da equipe de Enfermagem, reconhecem a identificação e indicação das redes sociais de apoio como sendo atribuição específica do enfermeiro.
DISCUSSÃO
Na caracterização das famílias participantes, em relação à idade dos usuários da pesquisa, houve a predominância de idosos, aqueles que no Brasil, de acordo com a Lei n°8.842, em seu artigo 2 inciso I, possuem idade igual ou superior a 60 anos6. Além disso, o processo de envelhecimento traz consigo, entre outras alterações, mudanças do padrão de morbi-mortalidade, com aumento não só da incidência como também da prevalência de doenças crônicas13, problema também enfrentado pelos participantes desse estudo.
No que diz respeito ao número de pessoas que habitam o domicílio, ressalta-se que a convivência entre elas favorece comportamentos de monitoramento em relação a suas patologias14, assim, quanto maior o número de pessoas na família, maior a convivência entre elas, o que poderá melhorar as condições de saúde.
No grupo dos profissionais de saúde entrevistados, verificou-se que o tempo de atuação na ESF ultrapassou cinco anos, fato que deve ser destacado, uma vez que um maior tempo de dedicação à atividade laboral pode possibilitar, ao profissional, o reconhecimento da necessidade em contar com redes sociais de apoio no cuidado desenvolvido no domicílio.
Com relação às redes sociais de apoio utilizadas pelas famílias que recebem cuidado domiciliar, percebeu-se a importância dada ao apoio espiritual, uma vez que esse funciona para os cuidadores/pessoas cuidadas como um amortecedor dos impactos danosos à saúde, serve para elaborar novos sentidos e significados para a vida e apoia as pessoas no enfrentamento das situações adversas15.
O número restrito de apoio afetivo nas famílias pode justificar-se pelo fato de que, ao estar debilitado, o indivíduo não participa, ou diminui a participação em atividades sociais, além de reduzir as iniciativas de trocas com outras pessoas, e isto faz com que ocorra a redução das interações16.
Diversos indivíduos, principalmente familiares, como filhos e esposa, foram citados como provedores de apoio informal para as famílias, capazes de fornecer ajuda e carinho. Isto reforça a ideia de que os filhos e esposas compartilham a tarefa de cuidar, imbuídos de sentimentos afetivos, dever e obrigação, influenciados culturalmente por valores e crenças(4).
No apoio formal, as famílias elencaram algumas instituições, qualificadas como formais, pois possuem uma sistematização na sua forma de apoio e não atingem apenas um indivíduo específico e sim uma população(16).
O fato de duas das 10 famílias participantes relatarem não receber nenhum outro tipo de apoio formal, além daquele advindo da US, é preocupante para a sua qualidade de vida, pois a não existência de redes pode contribuir de forma negativa para o desenvolvimento do cuidado domiciliar.
Em relação às redes sociais de apoio indicadas pelos profissionais de saúde que realizam cuidado domiciliar, constatou-se que o fornecimento de materiais para o cuidado no domicílio advém, principalmente, de instituições religiosas e empresas privadas da região. Esse tipo de apoio engloba o acesso dos indivíduos aos serviços ou aos recursos materiais, em que estão incluídos, por exemplo, a ajuda em dinheiro ou o empréstimo de utensílios(12).
A maioria dos profissionais relatou não indicar o apoio espiritual e isso pode justificar-se pela questão de que fez parte da pesquisa um número maior de auxiliares de enfermagem, e segundo a Lei nº 7.498/8617, que dispõe sobre o exercício da Enfermagem, é privativo ao enfermeiro o planejamento, a organização, a coordenação, a execução e a avaliação dos serviços da assistência de Enfermagem, além da prescrição desta assistência e, ainda, como integrante da equipe de saúde participar em programas e atividades que visem à melhoria de saúde do indivíduo, da família e da população em geral.
Entretanto, um estudo realizado com profissionais de saúde demonstrou que os mesmos creem na proteção divina e reconhecem a religiosidade como algo importante e como forma de conforto para o paciente e seus familiares enfrentarem a situação de adoecimento(18). Nesse sentido, destaca-se a importância da indicação pelo enfermeiro do apoio espiritual, uma vez que a religiosidade é uma necessidade humana básica que precisa ser contemplada no cuidado prestado por este profissional.
O apoio no cuidado não apareceu entre as redes sociais de apoio citadas pelos profissionais, por isso acredita-se que a falta de indicação a esse tipo de apoio seja pelo fato de os responsáveis pelo cuidado realizado no domicílio serem a família e os profissionais da US, não havendo indicação de outros setores, serviços, grupos ou instituições.
Nas relações do tipo formal uma pesquisa destaca que, diferentemente do observado na fala das famílias, os profissionais de saúde indicaram associações voluntárias, e estas determinam o grau de organização e atividade de uma sociedade civil14.
Ao correlacionar as redes sociais de apoio apontadas pelos dois grupos de participantes, percebeu-se, na literatura, que é dever do profissional de saúde indicar tais redes para as famílias, para que estas não fiquem sobrecarregadas, sem ajuda ou orientações pertinentes, o que pode interferir diretamente na qualidade de vida do cuidador e do ser cuidado(4).
No que se refere à Enfermagem, ressalta-se, portanto, o cuidado domiciliar cujas especificidades devem ser aprendidas ainda durante a graduação. Essa medida fará com que os futuros profissionais possam, realmente, transpor a barreira do cuidado baseado no modelo biomédico, o qual ainda é amplamente utilizado(19).
Ao conhecer e indicar as redes sociais de apoio disponíveis, os enfermeiros podem auxiliar os usuários no enfrentamento de dificuldades quando da necessidade de cuidado domiciliar, além de utilizar tais redes como instrumentos para potencializar o seu trabalho.
Tal condição é importante, uma vez que o objetivo final do cuidado em saúde, em sua vertente social, é mais do que o tratamento dos sintomas, mas sim a reintegração das pessoas na sociedade, pois o indivíduo integrado à sua comunidade tende a viver mais e pode ter mais recursos para lidar e/ou recuperar-se dos sofrimentos físico, psíquico e social que afetam sua saúde(20).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As redes sociais de apoio são fundamentais para atender às necessidades dos indivíduos e à comunidade, principalmente na eminência do cuidado domiciliar. Com isso, torna-se importante a participação de diversos setores e organizações, pois o processo de manutenção da saúde e prevenção de doenças acontece por meio de uma construção histórico-social e das situações vividas.
Com esta pesquisa foi possível identificar diferentes redes utilizadas pelas famílias e indicadas pelos profissionais de saúde no cuidado domiciliar, o que pode contribuir para a atuação destes trabalhadores, principalmente os enfermeiros. Com a classificação das redes foi possível verificar as diferenças entre as redes utilizadas pelas famílias que recebiam cuidado domiciliar e aquelas indicadas pelos profissionais de saúde, já que o estudo de tais redes permite o mapeamento das relações entre indivíduos ou grupos.
O fato de conhecer as redes sociais de apoio e materializá-las, ou simplesmente falar sobre elas, consiste no primeiro passo para o enfermeiro acessá-las com a finalidade de utilizá-las.
Faz-se necessário que o enfermeiro oriente a família, para que esta se reestruture e divida tarefas que auxiliem no cuidado domiciliar, por meio do uso de redes sociais de apoio. Neste contexto, destaca-se a importância do incentivo em recursos humanos capacitados para atender o usuário que necessita de cuidado domiciliar, aliado à formação e correta indicação das redes sociais de apoio, com o intuito de amenizar a sobrecarga das famílias.
Dentre as limitações encontradas para realização desta pesquisa, ressalta-se a impossibilidade do conhecimento aprofundado sobre as ações específicas realizadas por cada rede. Desta forma, indica-se o desenvolvimento de pesquisas que abordem esta temática. Por fim, sugere-se a articulação dos profissionais de saúde, principalmente do enfermeiro, com outras instituições locais para a formação de uma rede social de apoio que poderá melhorar a assistência e proporcionar impacto positivo na saúde dos usuários e cuidadores.
REFERÊNCIAS
1. Feuerwerker LCM, Merhy EE. A contribuição da atenção domiciliar para a configuração de redes substitutivas de saúde: desinstitucionalização e transformação de práticas. Rev Panam Salud Publica 2008; 24(3): 180-188.
2. Hirschfeld MJ, Oguisso T. Visäo panorâmica da saúde no mundo e a inserção do home care. Rev Bras Enferm 2002; 55(4): 452-459.
3. Kerber NPC, Kirchhof ALC, Cezar-Vaz MR. Considerações sobre a atenção domiciliária e suas aproximações com o mundo do trabalho na saúde. Cad Saude Publica 2008; 24(3): 485-493.
4. Nardi EFR, Oliveira MLF. Conhecendo o apoio social ao cuidador familiar do idoso dependente. Rev Gauch Enferm 2008; 29(1): 47-53.
5. Brasil. Ministério da Saúde. Lei n° 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Brasília: Ministério da Saúde; 2003.
6. Brasil. Ministério da Saúde. Lei n° 8.842, de 4 de janeiro de 1994. Dispõe sobre a política nacional do idoso, cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras providências. Brasília: Ministério da Saúde; 1994.
7. Pedro ICS, Rocha SMM, Nascimento LC. Apoio e rede social em enfermagem familiar: revendo conceitos. Rev Latino-Am Enferm [Internet]. 2008 [citado em 2011 nov 02]; 16(2): 324-327. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v16n2/pt_24.pdf
8. Catafesta F, Lacerda MR. Skills of nurses needed for the development of home care: reflection. Online Braz J Nurs [Internet]. 2008 [citado em 2011 nov 02]; 7(2). Disponível em: http://www.objnursing.uff.br//index.php/nursing/article/view/j.16764285.2008.1302/345
9. Valla VV. Educação popular, saúde comunitária e apoio social numa conjuntura de globalização. Cad Saude Publica 1999; 15(Supl 2): 7-14.
11. Nóbrega VM, Collet N, Silva KL, Coutinho SED. Rede e apoio social das famílias de crianças em condição crônica. Rev Eletr Enf [Internet]. 2010 [citado em 2011 nov 02]; 12(3):431-440. Disponível em: http://www.fen.ufg.br/revista/v12/n3/v12n3a03.htm
12. Pinto JLG, Garcia ACO, Bocchi SCM, Carvalhaes MABL. Características do apoio social oferecido a idosos de área rural assistida pelo PSF. Cienc Saude Colet 2006; 11 (3): 753-764. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csc/v11n3/30990.pdf
13. Bastos CC, Lemos ND, Mello AN. Perfil clínico-demográfico dos pacientes inseridos em um programa de assistência domiciliária no município de São Paulo. Rev Kairos 2007; 10(2): 205–224.
14. Andrade GRB, Vaitsman J. Apoio social e redes: conectando solidariedade e saúde. Cienc Saude Colet 2002; 7(4): 925-934.
15. Marques AKMC, Landim FLP, Collares PM, Mesquita RB. Apoio social na experiência do familiar cuidador. Cienc Saude Colet 2011; 16(Supl 1): 945-955.
16. Landin FLP, Comaru JL, Mesquita RB, Collares PM. Redes sociais informais de uma comunidade da periferia de Fortaleza. Cogitare Enferm 2006; 11(1): 16-23.
17. Brasil. Decreto nº. 94.406, de 8 de junho de 1987. Regulamenta a Lei nº. 7.498 de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre o Exercício da Enfermagem e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, p. 8853-8855, jun. 1987.
18. Espíndula JA, Valle ERM, Bello AA. Religião e espiritualidade: um olhar de profissionais de saúde. Rev Latino-Am Enferm [Internet]. 2010 [citado em 2011 nov 02]; 18(6): 1229-1236. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/v18n6/pt_25.pdf
19. Hermann AP, Méier MJ, Wall ML, Bernardino E, Lacerda MR. A formação para o cuidado domiciliar: aspectos encontrados na produção científica da enfermagem brasileira. Cogitare Enferm 2009; 14(4): 748-754.
20. Souza J, Kantorski LP. A rede social de indivíduos sob tratamento em um CAPS ad: o ecomapa como recurso. Rev Esc Enferm USP 2009; 43(2): 373-383.