LINGUAGENS DA SISTEMATIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM NAS DISSERTAÇÕES E TESES DOS CATÁLOGOS DO CENTRO DE ESTUDO E PESQUISA EM ENFERMAGEM

 

Viviane Martins da Silva, Taciana Cavalcante de Oliveira, Marta Maria Coelho Damasceno, Thelma Leite de Araujo

 

RESUMO

O estudo teve como objetivo analisar as tendências da utilização das linguagens da sistematização da assistência de enfermagem nas dissertações e teses publicadas nos catálogos do Centro de Estudo e Pesquisa em Enfermagem (CEPEn), no período de 1979 a 2004. Estudo do tipo bibliográfico, desenvolvido entre novembro de 2005 e fevereiro de 2006. Foram analisados 98 resumos que constituíam trabalhos de pesquisa relacionados à sistematização da assistência ou que contemplavam teorias com linguagem própria, vinculada a um processo de enfermagem. Observaram-se como tendências: concentração de estudos nas regiões Sudeste e Nordeste; utilização da NANDA como linguagem de enfermagem; aplicação da Teoria das Necessidades Humanas Básicas; desenvolvimento de estudos de perfil e validação de diagnósticos. As tendências de utilização das linguagens encontradas neste estudo, bem como as lacunas evidenciadas apontam para a necessidade de melhor conhecimento e compreensão dos elementos do processo de enfermagem que dão base às classificações para sua utilização na prática, na pesquisa e no ensino.

 

Palavras-chave: Pesquisa em Enfermagem; Classificação; Educação de Pós-Graduação em Enfermagem.

 

INTRODUÇÃO

A construção do conhecimento em enfermagem foi fortemente influenciada pelas condições culturais de cada período da história da profissão, ao lapidar os vários elementos componentes da prática de enfermagem: técnicas, princípios científicos e modelos teóricos. No período em que as técnicas eram valorizadas, o profissional executava suas tarefas de forma mecânica, sem discernimento científico. Na fase seguinte, os princípios científicos foram incorporados até se chegar ao período contemporâneo, no qual a construção do conhecimento em enfermagem teve seu foco em gradientes teóricos, capazes de direcionar melhor toda base filosófica da profissão(1-2).

Neste último período, embora os acontecimentos relacionados às teorias emergentes e à prática de enfermagem estivessem voltados para o paciente e para a qualidade do cuidado, determinadas linhas de pensamento divergentes já defendiam a atuação do enfermeiro com base em um método científico ou incentivavam o uso de outros modos de saber que incluíam, especialmente, o conhecimento subjetivo. Surgiram, então, os primeiros autores, como Lydia Hall e Ida Orlando, que definiram a profissão como uma atividade processual e defenderam o uso de um processo para o alcance de seus propósitos.

Em seu desenvolvimento, o processo de enfermagem passou de uma abordagem centrada no diagnóstico médico para outra voltada às respostas do paciente, às fases de desenvolvimento do ciclo de vida e ao continuum saúde-doença, levando ao reconhecimento de que o enfermeiro faz e age com base em julgamentos que não somente os vinculados à doença, acrescentando com isso qualidade ao cuidado(3). Sua aplicação nos vários contextos da prática tem ocorrido dentro ou fora de gradientes teóricos. De acordo com a concepção de alguns autores, o processo de enfermagem é composto por um número variado de etapas inter-relacionadas, desde a coleta de dados até a avaliação(4-7).

O processo é visto como um instrumento metodológico para favorecer o cuidado e organizar suas condições de ocorrência(6). No entanto, a dificuldade de correlacionar suas etapas é um dos fatores responsáveis pela resistência entre os profissionais à sua utilização como instrumento de trabalho a ser aplicado em seu cotidiano assistencial.

O processo de enfermagem favorece a construção de uma linguagem própria, cujas finalidades são indexar e classificar uma variedade de dados de enfermagem em prontuários clínicos, em sistemas de enfermagem, na literatura especializada e em relatórios de pesquisa(8). Sistemas de classificação são definidos como conhecimentos estruturados nos quais os elementos ou conceitos substantivos de uma disciplina ou de especialidades de uma disciplina são organizados em grupos ou classes, com base em suas similaridades(9).

Na enfermagem, há diversos sistemas de classificação, fundamentados em uma linguagem comum, vinculados aos elementos do processo de enfermagem: diagnósticos de enfermagem – Taxonomia II de Diagnósticos da North American Nursing Diagnosis Association (NANDA), Classificação das Respostas Humanas para a Prática da Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental, Classificação de Fenômenos da Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE); problemas de enfermagem do Sistema Comunitário de Saúde de Omaha; intervenções de enfermagem – Classificação de Intervenções de Enfermagem (NIC), Classificação das Ações de Enfermagem da CIPE; e resultados esperados – Classificação dos Resultados de Enfermagem (NOC)(6).

Com a evolução do saber científico, os estudos desenvolvidos nos programas de pós-graduação em enfermagem sobre as classificações dos elementos de interesse da profissão passaram a ser alvo de destaque e a contribuir para a construção de um conhecimento mais sólido, com reflexo direto na qualidade da assistência.

A partir desse contexto, surgiu o interesse em analisar as tendências da utilização das linguagens da sistematização da assistência de enfermagem. Conforme se acredita, este estudo poderá fornecer uma visão geral do estado da arte sobre o uso dos vários sistemas de classificação em enfermagem nos programas de pós-graduação brasileiros, além de comparar as tendências desses estudos com o desenvolvimento das classificações realizadas pelos órgãos competentes e de identificar as lacunas de investigação sobre a temática em foco, possibilitando o desenvolvimento de pesquisas futuras.

 

METODOLOGIA

A pesquisa é do tipo bibliográfica, caracterizada pela identificação e análise de dados com base em material já publicado, constituído principalmente de livros, artigos de periódicos e, atualmente, de material disponibilizado na Internet(10). Foi desenvolvida no período de novembro de 2005 a fevereiro de 2006.

O material do estudo foi composto por todos os resumos de dissertações e teses dos catálogos do Centro de Estudo e Pesquisa em Enfermagem, disponíveis no site da Associação Brasileira de Enfermagem - sessão nacional, correspondentes ao período de 1979 a 2004(11-12), cuja temática estivesse relacionada com o uso das linguagens da sistematização da assistência de enfermagem. Optou-se por trabalhar com os catálogos do CEPEn, pois este possui o maior banco de teses e dissertações na área de Enfermagem no Brasil. O corte desse período foi feito em função do material disponível no referido site, buscado em momentos diferenciados.

Foram selecionados os resumos que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: constituir trabalho de pesquisa e ser resumo completo. A escolha por estudos de pesquisa aconteceu em razão do propósito da disciplina Análise da Pesquisa em Enfermagem do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Ceará (UFC) que aborda a análise de pesquisas de enfermagem quanto às temáticas, objetos, aspectos éticos, referenciais teóricos e metodologias. Foram excluídos todos os resumos terminados em reticências ou frases incompletas, relatos de experiência, estudos crítico-reflexivos e aqueles não relacionados a sistemas oficiais de classificação de linguagens de enfermagem.

Ademais, os resumos analisados foram apenas aqueles que estavam disponibilizados na fonte de dados referida. Isto, porém, poderá não representar toda a produção desenvolvida nos programas de pós-graduação em enfermagem brasileiros.

Para a realização do estudo, procederam-se as etapas a seguir: levantamento dos catálogos de número I a XXIII do CEPEn; leitura de todos os resumos de dissertações e teses publicados nos catálogos do CEPEn; seleção dos resumos de dissertações e teses que contemplavam a temática em estudo; leitura dos resumos selecionados a partir dos critérios de inclusão e exclusão e aplicação de um instrumento de coleta de dados composto por itens como: título, instituição formadora, ano de defesa, sujeitos e cenário, utilização das etapas do processo de enfermagem, teorias e linguagens aplicadas, características do estudo e contexto de aplicação. A análise dos resumos foi realizada com base na freqüência numérica levantada a partir da contagem dos itens do formulário aplicado e na literatura específica.

É importante ressaltar que a pesquisa não buscou aprovação de um Comitê de Ética em Pesquisa, como recomendado pela Resolução no 196/96(13), por não se tratar de um estudo envolvendo seres humanos.

 

RESULTADOS

Foram analisados 75 resumos de dissertações e 23 resumos de teses que atenderam aos critérios de inclusão e exclusão. Desses, 58 resumos foram desenvolvidos em programas de pós-graduação em enfermagem e áreas afins da região sudeste, 34 da região nordeste, 5 da região sul e 1 da região centro-oeste.

As dissertações e as teses foram desenvolvidas em doze instituições públicas de ensino superior com cursos de pós-graduação em enfermagem e áreas afins: Universidade Federal da Paraíba (UFPB, Mestrado em Enfermagem criado em 1979); Universidade de São Paulo/São Paulo (USP/SP, Mestrado – 1973 e Doutorado em Enfermagem – 1989; Doutorado em Enfermagem/Interunidades – 1981); Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP, Mestrado – 1978; Doutorado – 1986), Universidade de São Paulo/Ribeirão Preto (USP/RP, Mestrado – 1975 e Doutorado em Enfermagem Psiquiátrica – 1999; Mestrado – 1979 e Doutorado em Enfermagem Fundamental – 1991; Mestrado – 1991 e Doutorado em Enfermagem em Saúde Pública – 1998); Universidade Federal do Ceará (UFC, Mestrado – 1993 e Doutorado em Enfermagem – 1998), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC, Mestrado – 1976 e Doutorado em Enfermagem –1993); Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, Mestrado – 1972 e Doutorado em Enfermagem – 1990), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG, Mestrado – 2003 e Doutorado em Enfermagem – 2005); Universidade Federal da Bahia (UFBA, Mestrado em Enfermagem – 1979), Universidade de Brasília (UNB, Mestrado em Ciências da Saúde – 1995); Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO, Mestrado em Enfermagem – 1982) e Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP, Mestrado em Enfermagem –1979).

Na tabela 1, apresenta-se a produção desses estudos de acordo com as instituições formadoras e as décadas de defesa.

 

Tabela 1 – Distribuição dos resumos publicados nos catálogos do CEPEn, de 1979 a 2004, segundo os programas de pós-graduação em enfermagem e áreas afins. Fortaleza, 2006

 

Instituição

Década

70

80

90

00

Total

M

D

M

D

M

D

M

D

 

UFPB

-

-

-

-

15

-

10

-

25

USP/SP

-

-

1

-

3

5

10

3

22

UNIFESP

-

-

-

-

4

1

5

6

16

USP/RP

-

-

-

-

2

2

6

2

12

UFC

-

-

-

-

2

-

3

3

8

UFSC

-

-

1

-

1

-

2

1

5

UFRJ

-

-

-

-

2

-

1

-

3

UFMG

-

-

-

-

-

-

3

-

3

UFBA

-

-

-

-

1

-

-

-

1

UNB*

-

-

-

-

-

-

1

-

1

UNIRIO

-

-

-

-

1

-

-

-

1

UNICAMP

-

-

-

-

-

-

1

-

1

 Total

-

-

2

-

31

8

42

15

98

 * Apesar de estar publicada nos catálogos do CEPEn, esta dissertação foi desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, nível mestrado.

 

Embora a criação de alguns programas de pós-graduação em enfermagem tenha surgido na década de 1970, observou-se o aparecimento da produção de estudos a partir da década de 1980, inicialmente, na Universidade de São Paulo (1) e Universidade Federal de Santa Catarina (1). Nas décadas posteriores, percebeu-se tendência de crescimento significativo de estudos, especialmente no nível de mestrado, nas instituições das regiões Sudeste e Nordeste do país. Como evidenciado, o Curso de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba destacou-se com o maior número de dissertações defendidas em todo o período (25). Ainda segundo percebeu-se, instituições como a Universidade Federal do Rio de Janeiro, a Universidade Federal da Bahia e a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro aderiram ao desenvolvimento de estudos sobre a temática nas décadas de 1990 e 2000. Contudo, apresentaram produção esporádica nesse período.

Para identificação das tendências de utilização das linguagens de enfermagem, buscou-se determinar se as dissertações e as teses haviam aplicado o processo de enfermagem e quais etapas haviam sido trabalhadas. Do total de resumos analisados, 48 estudos aplicaram o processo parcialmente e 20 utilizaram totalmente. Considerou-se aplicação parcial a utilização de duas ou três etapas do processo. Em 30 resumos não havia referência ao uso do processo de enfermagem. Na década de 1980, os estudos desenvolvidos fizeram a aplicação parcial (1) ou total (1) do processo de enfermagem. Mesmo nas décadas de 1990 e 2000, ainda foi limitado o número de dissertações e de teses que aplicaram a totalidade das etapas do processo de enfermagem.

Na tabela 2 consta o total de resumos segundo o propósito identificado nas dissertações e nas teses.

 

 Tabela 2 - Distribuição dos resumos publicados nos catálogos do CEPEn, de 1979 a 2004, segundo o propósito do estudo. Fortaleza, 2006

 

Propósito

Década

70

80

90

00

Total

M

D

M

D

M

D

M

D

 

Perfil

-

-

1

-

12

3

20

1

37

Validação

-

-

-

-

10

-

6

3

19

Aplicação do processo

-

-

1

-

2

2

6

4

15

Perfil + validação

-

-

-

-

5

1

3

1

10

Mapeamento

-

-

-

-

-

-

3

2

5

Estratégia para ensino

-

-

-

-

-

1

2

1

4

Equivalência semântica

-

-

-

-

-

-

1

1

2

Proposta diagnóstica

-

-

-

-

1

1

-

-

2

Raciocínio clínico ou terapêutico

-

-

-

-

-

-

1

1

2

Software

-

-

-

-

-

-

-

1

1

Aproximação de linguagens

-

-

-

-

1

-

-

-

1

 Total

-

-

2

-

31

8

42

15

98

 

Os propósitos identificados com o maior número de ocorrência foram os seguintes: perfil (37), validação (19), aplicação do processo (15) e perfil e validação (10). Para o propósito perfil, foram considerados resumos que se propunham ao levantamento de perfil de diagnósticos de enfermagem; ao levantamento de perfil diagnóstico, à elaboração de propostas de intervenções e à caracterização diagnóstica. Para o propósito validação, apreciaram-se resumos centrados na validação clínica ou de conteúdo de diagnósticos de enfermagem; na construção e validação de instrumentos de coleta de dados ou protocolos com a finalidade de levantar diagnósticos de enfermagem; na elaboração de roteiros de desenvolvimento de consultas e validação; na validação de diagnósticos e proposta de intervenções com base nos diagnósticos validados, e na reflexão sobre a adequação de determinados diagnósticos de enfermagem.

Quanto ao propósito aplicação do processo, examinaram-se resumos referentes ao levantamento do perfil de diagnósticos de enfermagem e aplicação do processo com base nos diagnósticos de enfermagem identificados; aplicação e avaliação do processo de enfermagem implementado.

Para o propósito perfil e validação, foram considerados: levantamento de perfil de diagnósticos de enfermagem e validação de diagnósticos de enfermagem; levantamento de perfil de diagnósticos de enfermagem, validação de diagnósticos de enfermagem e identificação de condutas aplicadas; levantamento de perfil de diagnósticos de enfermagem, validação de diagnósticos de enfermagem e proposta de intervenções; levantamento de perfil de diagnósticos de enfermagem e construção e aplicação de instrumento de coleta de dados.

 Conforme observado, nas duas últimas décadas, houve uma tendência de crescimento dos estudos de perfil e de validação. Portanto, os trabalhos relativos à elaboração de perfil e de aplicação de processo estiveram presentes ao longo de todo o período.

A tabela 3 apresenta as linguagens de enfermagem utilizadas na sistematização da assistência de enfermagem e empregadas nas dissertações e nas teses.

 

 Tabela 3 - Distribuição dos resumos publicados nos catálogos do CEPEn, de 1979 a 2004, segundo os sistemas de linguagem utilizados para a assistência de enfermagem. Fortaleza, 2006

 

 Linguagem

Década

70

80

90

00

Total

M

D

M

D

M

D

M

D

 

NANDA

-

-

-

-

21

5

21

6

57

Linguagem da Teoria

-

-

2

-

2

2

7

2

15

NANDA + Teoria

-

-

-

-

3

1

4

-

8

Não especificada

-

-

-

-

1

-

3

1

5

CIPESC

-

-

-

-

-

-

3

1

4

NANDA + NIC

-

-

-

-

3

-

1

1

4

CIPE

-

-

-

-

-

-

1

3

4

NANDA + CIPE

-

-

-

-

1

-

1

1

3

Modelo Bifocal

-

-

-

-

-

-

1

-

1

 Total

-

-

2

-

31

8

42

15

98

 

Entre os resumos analisados, notou-se com maior freqüência a utilização da linguagem da NANDA (57) e das linguagens específicas de algumas teorias de enfermagem (15).

As primeiras dissertações desenvolvidas ainda na década de 1980 usaram o sistema de linguagem próprio das teorias de enfermagem para denominar os fenômenos com os quais a enfermagem vem trabalhando. Nas décadas de 1990 e 2000, percebeu-se tendência ao desenvolvimento de dissertações e de teses com foco no elemento do processo de enfermagem diagnóstico, adotando como linguagem essencial para sua denominação a Taxonomia da NANDA. Os estudos sobre o elemento do processo intervenção inclinaram-se para a utilização das linguagens NIC e CIPESC e começaram a surgir no final da década de 1990.

No decorrer do período de estudo, também foi perceptível a tendência de introdução de novas linguagens. Em cinco resumos, porém, não foi possível determinar a linguagem empregada. No entanto, estes foram incluídos no estudo por deixarem claro no seu conteúdo que trabalharam a etapa diagnóstico de enfermagem.

Como consta na tabela 4, foi possível identificar a utilização de sete teorias de enfermagem. Estas foram empregadas com o propósito de aplicação do seu processo, levantamento de perfil diagnóstico e construção de instrumentos.

 

 Tabela 4 - Distribuição dos resumos publicados nos catálogos do CEPEn, de 1979 a 2004, segundo a utilização das teorias de enfermagem. Fortaleza, 2006

 

Teoria

Década

70

80

90

00

Total

M

D

M

D

M

D

M

D

 

Não utilizada

-

-

-

-

17

5

23

11

56

Horta

-

-

1

-

10

-

8

1

20

Orem

-

-

1

-

-

1

4

2

8

King

-

-

-

-

1

1

2

-

4

Neuman

-

-

-

-

2

-

1

1

4

Roy

-

-

-

-

1

1

1

-

3

Levine

-

-

-

-

-

-

2

-

2

Florence

-

-

-

-

-

-

1

-

1

 Total

-

-

2

-

31

8

42

15

98

 

As teorias de enfermagem identificadas foram as seguintes: Teoria das Necessidades Humanas Básicas de Wanda Horta, Modelo do Autocuidado de Orem, Teoria do Alcance de Metas de King, Modelo de Sistemas de Betty Neuman, Modelo de Adaptação de Roy, Modelo de Conservação de Levine e Teoria Ambientalista de Nightigale. A teoria de Horta e o modelo teórico de Orem surgiram nos estudos desenvolvidos ainda na década de 1980, embora tenham mantido tendência de utilização nas décadas posteriores. Percebeu-se maior interesse dos estudos no nível de mestrado na aplicação da Teoria das Necessidades Humanas Básicas, especialmente aqueles desenvolvidos pelo Curso de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba. Também foram identificados 56 resumos que não utilizaram nenhuma teoria de enfermagem.

A partir dos sujeitos e dos cenários dos estudos, pôde-se identificar a que áreas temáticas as dissertações e as teses estavam vinculadas, como mostra a tabela 5.

 

 Tabela 5 - Distribuição dos resumos publicados nos catálogos do CEPEn, de 1979 a 2004, segundo as áreas temáticas. Fortaleza, 2006

 

Área

Década

70

80

90

00

Total

M

D

M

D

M

D

M

D

 

Saúde do Adulto-Idoso

-

-

2

-

16

5

28

7

58

Pesquisa

-

-

-

-

2

1

8

4

15

Saúde da Mulher

-

-

-

-

4

2

4

3

13

Saúde da Criança

-

-

-

-

7

-

1

-

8

Ensino

-

-

-

-

1

-

1

1

3

Saúde do Adolescente

-

-

-

-

1

-

-

-

1

 Total

-

-

2

-

31

8

42

15

98

 

 Identificaram-se como áreas temáticas: saúde do adulto-idoso, saúde da mulher, saúde do adolescente, saúde da criança, ensino e pesquisa. Nas duas últimas décadas do estudo, as áreas temáticas com maior freqüência de utilização foram: saúde do adulto-idoso (58), pesquisa (15) e saúde da mulher (13). Dentro da área de saúde do adulto-idoso, identificaram-se as subáreas: cardiologia, saúde mental, ortopedia, traumatologia, geriatria, clínica médica, clínica cirúrgica, endocrinologia, doenças transmissíveis, otorrinolaringologia, pneumologia e nefrologia. Ressalta-se que para a área de saúde da mulher, classificaram-se aqueles estudos cujos sujeitos estavam no ciclo reprodutivo ou gravídico-puerperal. Na área de pesquisa, foram classificados os estudos sobre linguagem que não implicassem o cuidado direto ao paciente. Apesar de áreas como saúde do adulto-idoso e pesquisa mostrarem tendência de crescimento no período de estudo, outras áreas como ensino e saúde do adolescente voltaram-se ao desenvolvimento de estudos esporádicos.

 Conforme observado, as dissertações e as teses foram desenvolvidas, em sua maioria, em ambiente hospitalar, sendo 48 em unidades de internação ou unidades fechadas como as unidades de terapia intensiva e os centros cirúrgicos, e 10 em ambulatórios vinculados a instituições hospitalares. Os demais cenários de investigação foram: unidade de saúde (7), centro de saúde (7), comunidade (1) e escola (1). Em 17 resumos, não foi possível identificar o cenário de estudo. E em sete resumos o item cenário não se aplicava. Estes estudos possuíam geralmente como propósito a validação de diagnósticos de enfermagem ou de instrumentos. No total de resumos analisados, percebeu-se uma tendência crescente de desenvolvimento de estudos voltados para o contexto assistencial vinculado ao ambiente hospitalar.

 

 DISCUSSÃO

Em inúmeros países e em vários períodos da história, o desenvolvimento de uma linguagem uniformizada tem se constituído em uma preocupação da enfermagem. O uso de uma linguagem comum possibilita a descrição do julgamento clínico pelo qual o enfermeiro se faz responsável, e, ao mesmo tempo, contribui para a visibilidade da profissão na prática clínica, pesquisa, ensino e na determinação de políticas públicas. Como é notório, os sistemas de classificação em enfermagem utilizam linguagens uniformizadas para levantar e comunicar informações sobre sua prática.

Segundo se sabe, os problemas de saúde identificados e tratados por Nightingale durante a Guerra da Criméia, os 21 problemas de Abdellah, as 14 necessidades humanas básicas de Henderson e o modelo de levantamento de dados nas 13 áreas funcionais de McCain buscam o estabelecimento de uma linguagem comum para identificação dos problemas do cliente e são considerados precursores do desenvolvimento de sistemas de classificação na enfermagem (14-16).

As teorias de enfermagem, detentoras de um processo de enfermagem próprio, também têm contribuído para a construção de linguagens uniformizadas com base em conceitos cientifíco-filosóficos específicos. No Brasil, as teorias mais conhecidas são as seguintes: Teoria das Necessidades Humanas Básicas de Wanda Horta, Modelo do Autocuidado de Orem, Teoria do Alcance de Metas de King, Modelo de Adaptação de Roy, Modelo de Conservação de Levine, Teoria das Relações Interpessoais em Enfermagem de Peplau e Modelo Unitário do Homem de Rogers(14).

 Para estes autores, a Teoria das Necessidades Humanas Básicas tem sido o modelo teórico mais utilizado no Brasil. Esta informação corrobora os achados deste estudo. Entretanto, tais achados limitaram-se as dissertações e teses com foco na utilização de linguagens.

Apesar de existir um consenso na enfermagem, segundo o qual as teorias direcionam o olhar sobre fatos e fenômenos, constituem um guia de levantamento de informação e de ação e proporcionam explicações sobre a natureza da ciência, é perceptível a desvinculação entre sua utilização e o desenvolvimento das dissertações e das teses sobre linguagens e sistemas de classificação, pois ainda foi expressivo o número de estudos que não fazem uso das teorias. Talvez este fenômeno venha ocorrendo na pós-graduação brasileira em decorrência do momento histórico vivenciado, ainda preocupado com o grau de representatividade sobre os problemas do paciente constantes de algumas linguagens uniformizadas e sistemas de classificação.

O desenvolvimento da linguagem uniformizada mais conhecida que constituiu o sistema de classificação da NANDA teve início a partir da década de 1970, vinculado às enfermeiras norte-americanas. Em 1982, a NANDA organiza-se formalmente e abre-se para a comunidade internacional. Nesta mesma década, a Universidade Federal da Paraíba formaliza um projeto de intercâmbio técnico-científico com a Universidade de Connecticut/EUA, e, desse modo, favorece a criação de um grupo de interesse em diagnósticos de enfermagem(14). Durante algum tempo, a temática foi retratada de forma reticente, e fazia parte apenas das reflexões e das pesquisas dos grupos de interesse da Universidade Federal da Paraíba, das escolas de enfermagem da Universidade de São Paulo e do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. As duas primeiras instituições promoveram a disseminação de estudos na área e organizaram nos anos de 1991 e 1992 os primeiros simpósios nacionais sobre diagnósticos de enfermagem.

Na década atual, observou-se interesse sobre a linguagem diagnóstica. Este fenômeno pode ser explicado pela inserção e liderança da Associação Brasileira de Enfermagem no movimento de divulgação e aperfeiçoamento sobre o tema em âmbito nacional, congregando, assim, um número maior de instituições de ensino e pesquisa(17).

 As dissertações e as teses centradas na abordagem diagnóstica, produzidas nesse período, constituíram estudos sobre o levantamento de perfil e a validação dos diagnósticos para a realidade brasileira.

É perceptível também o surgimento de estudos com base no elemento intervenções de enfermagem ainda na década de 1990. Contudo, a quantidade apresentada ainda é pouco significativa. Conforme evidenciado, o desenvolvimento destes estudos parece assumir a mesma tendência daqueles sobre diagnóstico, pois estão preocupados com o estabelecimento de perfis de intervenções com base em linguagens como NIC e CIPESC, para grupos ou diagnósticos específicos, bem como com a validade destas linguagens. Entretanto, não foram encontradas dissertações e teses abordando o elemento resultado de enfermagem e trabalhando linguagens como a NOC, visto que estas constituem sistemas de classificação ainda pouco usados no Brasil(18).

 Inegavelmente a vinculação das linguagens ao processo de enfermagem é necessária para facilitar o entendimento entre os enfermeiros preocupados com a prestação de uma assistência específica às respostas do paciente nos vários cenários de atenção à saúde. Segundo se nota, apesar de ser possível trabalhar linguagem e processo em todos esses espaços, é grande o número de estudos desenvolvidos nos níveis de atenção secundário e terciário no contexto hospitalar. Talvez este fenômeno seja reflexo do contexto atual no qual o hospital ainda é a porta de entrada principal no sistema de saúde e é possível haver também certa resistência por parte dos enfermeiros que trabalham no nível primário de atenção em adotar uma metodologia de assistência com base no processo de enfermagem(19). 

 

 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 Consoante evidenciado, a análise dos resumos das dissertações e das teses propiciou a identificação de algumas tendências na utilização de linguagens da sistematização da assistência de enfermagem.

A maior parte da produção envolvendo a temática tem se concentrado nas regiões Sudeste e Nordeste, principalmente nas instituições envolvidas no movimento de surgimento e fortalecimento dos sistemas de classificação no Brasil. Como revelou o estudo, a NANDA tem sido a linguagem de enfermagem mais utilizada nas doze instituições formadoras. Teorias de enfermagem também têm sido usadas individualmente ou associadas a outras linguagens para uniformizar a prática de enfermagem. Destas, a Teoria das Necessidades Humanas Básicas de Wanda de Aguiar Horta foi a mais aplicada no período do estudo.

Embora o processo tenha sido introduzido no Brasil ainda na década de 1970, as dissertações e as teses pouco têm vinculado o estudo da utilização das linguagens de enfermagem à aplicação do mencionado processo. No cenário hospitalar, o contexto assistencial vem se destacando entre os vários campos de atuação da enfermagem abordados nas dissertações e nas teses. Mas, é grande a lacuna existente no desenvolvimento de estudos envolvendo o contexto de ensino das linguagens de enfermagem, a despeito de possibilitarem reflexões tanto sobre a integração dessas linguagens nas matrizes curriculares dos cursos de graduação e pós-graduação, como sobre fatores influenciadores dos processos de raciocínio que envolvem os três elementos do processo de enfermagem e estratégias de ensino-aprendizagem.

 Contudo, os estudos com o propósito de levantamento de perfil e validação continuam ganhando espaço na pós-graduação brasileira, provavelmente em decorrência da preocupação dos pesquisadores na área com o grau de representatividade das linguagens uniformizadas e sistemas de classificação sobre os problemas do paciente.

Apesar de se vislumbrar crescentes tendências de utilização das linguagens encontradas neste estudo, as lacunas evidenciadas apontam para a necessidade de melhor conhecimento e compreensão dos elementos do processo de enfermagem que dão base às classificações para sua utilização na prática, na pesquisa e no ensino.

 

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